RESUMO: O presente artigo faz um relato histórico da evolução dos meios de produção, relacionando isso ao crescimento imensurável dos índices de desemprego e falência dos empregadores. Explana que a forma encontrada para não deixar o pequeno produtor desamparado, nem seus empregados, foi a criação do instituto de direito empresarial chamado Recuperação Judicial, benefício concedido a empresas que passam por crises econômico-financeiras, mas possuidora de viabilidade para se recuperar e, conseqüentemente, se manter no mercado econômico.
PALAVRAS-CHAVE: desemprego; falência; direito; recuperação judicial; mercado econômico.
1. ASPECTOS HISTÓRICOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Com o desenvolvimento econômico acelerado em todo o mundo e, logo após a revolução industrial, como fora constatado por vários estudiosos das ciências econômicas, com a intensificação da globalização, houve um crescimento na demanda mundial por bens e serviços, porém, os meios de produção que eram empregados pelas indústrias, não possuíam condições de suprir tais necessidades. Na medida em que se produziram novas tecnologias, capazes de substituir a mão-de-obra por maquinário, onde o mesmo produz por cem pessoas em um período de tempo bem menor, as empresas passaram a demitir seus funcionários e investiram em tais tecnologias.
Ocorre que tais máquinas não custavam barato, só o empresário com altos recursos poderia adquirir o equipamento necessário para a elevação de sua produção e faturamento. Contudo, vale lembrar que o mesmo empresário, por ter mais recursos, presume-se que seja o que mais possua empregados, visto que a mão-de-obra do homem era um dos poucos meios de produção existentes à época da revolução industrial.
Como o pequeno empresário, não se referindo ao descrito na Lei Complementar Federal 123/06, e sim a um empresário cujo faturamento seja o suficiente apenas para sua subsistência e de seus empregados, não possuía condições para a compra de tais meios de produção, era obrigado a fechar as portas de seu estabelecimento, visto que o grande produtor produzia mais barato, e conseqüentemente poderia vender mais barata, monopolizando as atividades industriais e comerciais.
O único ponto em comum para os dois casos, seja o grande ou pequeno produtor, é o desemprego gerado por conta do emprego de tais tecnologias. Não se que dizer que o avanço tecnológico é maléfico para a sociedade, pois, se não fosse por tal avanço, a população mundial talvez passasse por mais necessidade e fome do que já passa. Se o grande produtor não precisa mais de tantos empregados para produzir, o pequeno produtor não precisa de empregados porque parou de produzir.
Por tanto, pode-se presumir que a partir de então, os operadores do direito, sejam na figura dos magistrados, advogados, ou até mesmo dos legisladores, passaram a se preocupar com a possibilidade de manter o funcionamento do empreendimento que se encontra em crise, mantendo assim os empregos que o mesmo gera. Com o advento do instituto da recuperação judicial, tal situação deixa de ser apenas uma possibilidade para, de fato, dar continuação à função social do empreendimento (produzir bens ou serviços, gerar empregos, o bom relacionamento com os credores, ou seja, manutenção da atividade econômica como um todo), bem assim expressa o art. 47 da Lei 11.101/2005:
“Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.”
2. DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS E PROCESSO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Como já fora citado, a recuperação judicial surgiu para que a empresa que se encontrasse em situação de crise econômico-financeiro, pudesse continuar a desenvolver seus trabalhos, com condições especiais de funcionamento, como, por exemplo, prazos maiores para pagamentos de créditos, ou até mesmo, a possibilidade de deixar de apresentar certidões negativas expedidas pelos órgãos públicos para negociações econômicas e financeiras.
De acordo com o art. 48 da Lei 11.101/2005, o empresário não pode ser falido para requerer o benefício da recuperação judicial, e, caso já estejam extintas as obrigações, poderá o mesmo requerer a concessão de tal benefício, desde que com a apresentação de sentença transitada em julgado. Também não poderá requerer a recuperação judicial, a empresa que obteve esse benefício há menos de 5 (cinco) anos, ou 8 (anos), se tratar-se o empreendimento de uma micro empresa ou empresa de pequeno porte, com base nas definições legais do Estatuto da Micro Empresa (Lei Comp. 123/2006).
Para se requerer a recuperação judicial, a solicitante, ou seja, a empresa em crise econômico-financeira, deve moldar seu anseio no que preconiza o art. 51 da Lei 11.101/2005, descrevendo detalhadamente quais foram os motivos que levaram esta a passar por dificuldades, apresentando, inclusive, demonstrações contábeis como balanços e fluxos de caixa dos três exercícios anteriores, deve apresentar também a relação de credores e de empregados, com os respectivos valores de débitos e indenizações trabalhistas, se for o caso, a relação dos bens dos administradores e sócios da empresa (caso se trate de sociedade empresarial), bem como certidões expedidas pelos órgãos de registro de empresas e de cartórios de títulos e protestos, nos quais a empresa tenha sede ou filiais. Observa-se a lista completa de requisitos que devem compor a petição inicial no próprio art. 51 da Lei 11.101/2005.
Vale ressaltar que para o deferimento judicial de processamento do pedido, o que se faz por despacho judicial, a petição inicial deve conter todos os requisitos elencados no art. 51 da referida Lei. Em tal despacho, o juiz nomeará de imediato o Administrador Judicial, que ficará responsável por presidir a Assembléia Geral dos Credores, órgão responsável pela aprovação ou não do plano de recuperação judicial, já apresentado pela empresa na data que deverá ter sido estipulada pelo despacho que defere o processamento da ação de recuperação judicial.
O plano de recuperação, apresentado pela solicitante, deverá demonstrar aos credores e ao administrador judicial que o mesmo possui viabilidade econômica de ser posto em prática, tal estudo de viabilidade deve ser apresentado por um laudo técnico feito por profissional habilitado ou empresa especializada, contendo ainda em tal plano, a discriminação detalhada de quais meios de recuperação serão utilizados para o “salvamento” da empresa. Bem assim expressa o art. 53 da Lei 11.101/2005. Quanto aos meios empregados na recuperação judicial, o art. 50 expressa da seguinte maneira:
“Art. 50. Constituem meios de recuperação judicial, observada a legislação pertinente a cada caso, dentre outros:
I – concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas;
II – cisão, incorporação, fusão ou transformação de sociedade, constituição de subsidiária integral, ou cessão de cotas ou ações, respeitados os direitos dos sócios, nos termos da legislação vigente;
III – alteração do controle societário;
IV – substituição total ou parcial dos administradores do devedor ou modificação de seus órgãos administrativos;
V – concessão aos credores de direito de eleição em separado de administradores e de poder de veto em relação às matérias que o plano especificar;
VI – aumento de capital social;
VII – trespasse ou arrendamento de estabelecimento, inclusive à sociedade constituída pelos próprios empregados;
VIII – redução salarial, compensação de horários e redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva;
IX – dação em pagamento ou novação de dívidas do passivo, com ou sem constituição de garantia própria ou de terceiro;
X – constituição de sociedade de credores;
XI – venda parcial dos bens;
XII – equalização de encargos financeiros relativos a débitos de qualquer natureza, tendo como termo inicial a data da distribuição do pedido de recuperação judicial, aplicando-se inclusive aos contratos de crédito rural, sem prejuízo do disposto em legislação específica;
XIII – usufruto da empresa;
XIV – administração compartilhada;
XV – emissão de valores mobiliários;
XVI – constituição de sociedade de propósito específico para adjudicar, em pagamento dos créditos, os ativos do devedor.
§ 1o Na alienação de bem objeto de garantia real, a supressão da garantia ou sua substituição somente serão admitidas mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia.
§ 2o Nos créditos em moeda estrangeira, a variação cambial será conservada como parâmetro de indexação da correspondente obrigação e só poderá ser afastada se o credor titular do respectivo crédito aprovar expressamente previsão diversa no plano de recuperação judicial.”
Caso o plano de recuperação seja aprovado pela Assembléia, o juiz decretará a concessão da recuperação judicial para a empresa em crise, nos termos do art. 58 da já mencionada Lei 11.101/2005, onde, com base no que prevê o art. 61, ficará tal empresa em recuperação judicial até que sejam cumpridas as obrigações elencadas no plano de recuperação, mesmo as que só tiverem seu vencimento 02 (dois) anos depois do decreto de concessão para a recuperação judicial. Caso sejam pagos os débitos da empresa, o juiz decretará a sentença de encerramento nos moldes do art. 63 da Lei 11.101/2005, entretanto, se no prazo do art. 61, a empresa não cumprir com suas obrigações, ficará livre o credor para escolher entre a execução judicial de seu título de crédito, ou então peticionar a decretação de falência da empresa em crise.
3. ESTUDO DE CASO
Para elaboração do estudo de caso, foi instruído pela docência que se deveria utilizar o caso de recuperação judicial da empresa Parmalat Brasil S.A. Indústria de Alimentos.
A Parmalat Brasil é uma empresa ligada ao Grupo Parmalat, de origem italiana, no ramo de produção de laticínios. Sua presença no Brasil estava em cerca de 370 municípios, gerando em torno de 3.174 empregos diretos, e cerca de 12.600 empregos indiretos. Com a crise mundial se espalhando pelo grupo, e com o grande número de credores receosos executando os seus títulos de crédito, a Parmalat Brasil resolve pedir concordata, que é deferida no dia 10 de agosto de 2004.
No dia 24 de junho de 2005, a Parmalat entra com pedido de migração para a recuperação judicial, com base no art. 51 da Lei 11.101/2005, que é deferido em 04 de julho de 2005.
A Assembléia Geral dos Credores aprovou o plano de recuperação judicial em 22 de dezembro de 2005, que se baseava basicamente na emissão de debêntures e aumento de capital. Como pode ser verificado através da denominação social da empresa, Parmalat Brasil S.A. Indústria de Alimentos, a mesma se trata de uma sociedade anônima. Para o aumento do capital social da mesma, foi necessária a emissão de ações ao mercado de capitais, viabilizando assim o processo de capitalização (aumento de capital).
Sendo assim, no dia 07 de fevereiro de 2006, foi concedido a Parmalat Brasil S.A. Indústria de Alimentos o benefício da recuperação judicial, sendo um, dos mais variados empreendimentos existentes no Brasil, que tiveram a possibilidade de se manter no mercado econômico, satisfazendo os seus credores com o cumprimento das obrigações, bem como aos seus funcionários e dependentes que continuam com a fonte de renda.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Observa-se que a Lei de Recuperação Judicial (Lei 11.101/2005), demonstra sucesso na sua aplicabilidade, visto que seu principal objetivo é a superação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
Esse objetivo do legislador brasileiro é atingido no caso da Parmalat Brasil S.A. Indústria de Alimentos.
A crise econômica da Parmalat foi superada graças aos procedimentos utilizados no plano de recuperação judicial, quais sejam a emissão de ações para o aumento de seu capital social, bem como a emissão de debêntures, um título representativo de crédito a longo prazo. Além do arrendamento de seus meios de produção para outras empresas, como forma de sanar arrecadar fundos imediatos para o cumprimento de obrigações emergenciais.
Foi permitida à Parmalat Brasil a manutenção da entidade produtora, que, através do trabalho de seus funcionários, que também foram mantidos, conseguiram com que seus produtos retornassem ao mercado, com preços competitivos e capazes de gerarem lucro para a mesma, promovendo assim o cumprimento das obrigações com os credores, deixando o ramo de indústria de laticínios mais competitivo, estimulando assim a atividade econômica.
REFERÊNCIAS
BASTOS, Joel Luís Thomaz. OS CASOS DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL EM ANDAMENTO PARMALAT BRASIL S.A. INDUSTRIA DE ALIMENTOS. Slide show disponível em: < www.mariaceleste.adv.br/site_arquivos/parmalat.ppt >. Acesso em:18, mar. 2011.
BOFF, Leonardo; ARRUDA, Marcos. GLOBALIZAÇÃO: Desafios socioeconômicos, éticos e educativos. São Paulo: Editora Vozes, 2002.
COELHO, Fábio Ulhoa. COMENTÁRIOS À NOVA LEI DE FALENCIAS E DE RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS. Ed. 6ª. São Paulo: Saraiva, 2009.
FORRESTER, Viviane. O HORROR ECONOMICO. São Paulo: Editora UNESP, 1997.
RAMOS, André Luiz Santa Cruz. CURSO DIREITO EMPRESARIAL: o novo regime jurídico-empresarial brasileiro. Ed. 4ª. Salvador: Jus PODIUM.
SZKLAROWSKY, Leon Frejda. RECUPERAÇÃO E FALÊNCIA. Disponível em: < http://jus.uol.com.br/revista/texto/6835/recuperacao-e-falencia >. Acesso em: 25, mar. 2011.
Bacharelando do Curso de Direito da Faculdade AGES.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NASCIMENTO, Joao Paulo de Andrade. O instituto da recuperação judicial e o caso Parmalat Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 out 2014, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41358/o-instituto-da-recuperacao-judicial-e-o-caso-parmalat. Acesso em: 23 dez 2024.
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