Resumo: O Fator Previdenciário é um fator multiplicativo utilizado no cálculo do valor da aposentadoria por idade e aposentadoria por tempo de contribuição do Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Vale ressaltar que é de utilização facultativa no primeiro caso e obrigatória no último. Foi introduzido em 26 de Novembro de 1999 com a edição da Lei 9.876. Em que pese o seu objetivo de cumprir com o princípio do equilíbrio econômico e atuarial, a sua aplicação ainda é alvo de inúmeras críticas, principalmente no que concerne a sua constitucionalidade. Nesse contexto, o presente artigo objetiva analisar o surgimento do fator previdenciário, seus aspectos legais e jurisprudenciais a fim de esclarecer melhor a questão.
Palavras-Chaves: Fator previdenciário. Aposentadoria por idade. Aposentadoria por tempo de contribuição. Constitucionalidade. Equilíbrio Financeiro e atuarial.
Abstract: The Pension Factor is a multiplicative factor used in the calculation of the retirement age and retirement due to contribution from the General Social Security (RGPS). Note that is optional use in the first case and the last mandatory. It was introduced on November 26, 1999 with the enactment of Law 9876. Despite its aim to comply with the principle of economic and actuarial balance, its application is still subject of much criticism, particularly regarding its constitutionality. In this context, this article aims to analyze the emergence of the security factor, its legal and jurisprudential aspects in order to clarify the issue.
1. Introdução – Aspectos Gerais
A previdência social é organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo, de filiação obrigatória e deve atender uma série de contingências, consoante disposição prevista no art. 201 da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB).
Assim, diante da sua importância, com o fito de preservar a manutenção do sistema, o Fator Previdenciário foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro em um momento de reforma previdenciária.
No seu cálculo leva-se em consideração a idade, a expectativa de sobrevida e o tempo de contribuição do segurado ao se aposentar, conforme art. 29, § 7º da Lei 8.213/91, com redação dada pela Lei 9.876/99.
Insta salientar ainda que a sua aplicação é restrita ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS), não se aplicando aos regimes dos servidores públicos (RPPS).
Por outro lado, a sua introdução não apresentou aspectos positivos para o trabalhador, uma vez que a sua aplicação diminui consideravelmente o valor do beneficio.
A prima facie, portanto, emerge um conflito de interesses entre a Autarquia Previdenciária e o segurado no que se refere ao quantum debeatur.
2. Breve histórico
O Fator Previdenciário tem a sua origem no governo Fernando Henrique Cardoso em 26 de Novembro de 1999 com a edição da Lei 9.876. A justificativa para sua criação foi o controle dos gastos da Previdência Social sob alegação de déficit nas contas.
O governo argumentou, à época, que como a expectativa de vida estava aumentando, o Estado cada vez mais estava gastando no pagamento das aposentadorias, com os segurados na inatividade, e por conseqüência a Previdência Social apresentava forte desequilíbrio entre receitas e despesas.
Nesse contexto, em 1998, teve inicio uma discussão sobre Reforma Previdenciária que procurou introduzir o critério de idade mínima para obtenção de aposentadoria, todavia, tal medida foi rejeitada. Apesar disso, foi editada a emenda constitucional nº 20/98 que introduziu varias alterações no Regime Geral de Previdência Social (RGPS), dentre elas o estabelecimento de um teto para os benefícios do INSS.
Assim, tendo em vista que as pessoas estavam vivendo mais e usufruindo da aposentadoria por mais tempo, em 1999, foi idealizado o fator previdenciário e encaminhado o projeto ao legislativo que o aprovou por meio da Lei nº 9.876.
Esse coeficiente foi criado para diminuir o valor da aposentadoria e desestimular a aposentadoria precoce, fazendo com que os trabalhadores permaneçam mais tempo em atividade.
Ressalte-se que a sua aplicação não é favorável ao trabalhador, uma vez que quanto menor a idade de aposentadoria, maior o redutor e consequentemente menor o valor do benefício.
3. Finalidade e Consequências da aplicação do Fator Previdenciário
A finalidade principal da criação do fator previdenciário é preservar o equilíbrio financeiro e atuarial da previdência social para que sempre seja viável a sua manutenção.
O equilíbrio financeiro almeja que não exista um saldo negativo na Previdência, o que se acontecer muitas vezes pode inviabilizar todo o sistema.
Já o equilíbrio atuarial preocupa-se com o futuro, em assegurar que não só no presente ele exista, mas que continue a existir.
Entretanto, em que pese ser benéfico para a preservação do regime, as conseqüências de sua aplicação é que o trabalhador terá que trabalhar mais para obter um benefício previdenciário com um valor melhor, pois ele diminui consideravelmente o valor do beneficio
Por conseqüência, como os trabalhadores terão que esperar mais tempo para se aposentar, ocorrerá a manutenção da força de trabalho mais velha no mercado de trabalho.
Desta feita, de certa forma, representa um retrocesso na conquista dos direitos dos trabalhadores.
Lado outro, a introdução do fator previdenciário é mais vantajoso ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), pois diminuirá o valor que a autarquia previdenciária terá de pagar aos beneficiários quando da concessão dos benefícios de aposentadoria.
Segundo o artigo 7º da Lei 9.876/99, é facultativa a aplicação do fator previdenciário para o cálculo da aposentadoria por idade e obrigatória para o cálculo da aposentadoria por tempo de contribuição.
Não obstante a mudança, a lei preserva o direito adquirido daquele segurado preencheu os requisitos legais até o dia anterior à data de publicação da lei que instituiu o fator previdenciário, assegurando-lhe o cálculo do benefício segundo as regras até então vigentes, conforme art. 6º da Lei 9.876/99.
4. Discussão sobre a constitucionalidade do fator previdenciário
O fator previdenciário foi e ainda hoje é objeto de muitos questionamentos sobre a sua constitucionalidade.
Dessa forma, tanto na doutrina como na jurisprudência o tema é controvertido, sendo encontrados tanto posicionamentos a seu favor como contra.
Em 2010, um Juiz da Justiça Federal de São Paulo, Marcus Orione Gonçalves Correia, no controle difuso de constitucionalidade, considerou inconstitucional o Fator Previdenciário, sobre o argumento de que o seu raciocínio é “falacioso”, porque só é possível obter o benefício a partir da utilização de elementos não permitidos pela Constituição.
O magistrado questionou a justificativa para se manter o fator a pretexto do equilíbrio atuarial e o chamou de “retrocesso social”. Afirmou ser inadmissível aplicar o fator previdenciário sem considerar as peculiaridades de cada região, atingindo-se, desse modo, o princípio da igualdade, insculpido no art. 5º, “caput”, da Constituição Federal de 1988.
Nesse sentido, os que são contra a sua aplicação defendem que o redutor precisa ser extinto, pois fere o princípio da isonomia (CF, art. 5º, I) e fere o princípio da irredutibilidade de proventos (art. 194, parágrafo único, IV).
Em sede de apelação, o INSS, através da Procuradoria Federal, órgão da Advocacia-Geral da União, conseguiu reverter a decisão no Tribunal Regional federal da 3ª Região, que assim decidiu:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. FUNGIBILIDADE PARA CONHECER COMO AGRAVO LEGAL. AÇÃO AJUIZADA COM VISTAS AO RECÁLCULO DA RENDA MENSAL INICIAL DE APOSENTADORIA SEM INCIDÊNCIA DO FATOR PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO IMPROVIDO.
- Recurso interposto contra decisão monocrática proferida nos termos do art. 557, do CPC. É de se aplicar, in casu, o princípio da fungibilidade recursal, de forma a admitir o agravo interno como se de agravo legal se tratasse, uma vez que não se configura hipótese de erro grosseiro nem de má-fé.
- Diante do princípio tempus regit actum e do preceito legal contido no art. 29 da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 9.876/99, é de rigor que, no cálculo do fator previdenciário, seja utilizada a Tábua de Mortalidade vigente na data da aposentadoria do segurado da Previdência Social, inexistindo previsão legal à utilização de outra não mais vigente.
- Respeitada as normas do art. 285-A do Código de Processo Civil, mencionada decisão anteriormente prolatada, com dados que a identificassem. Desnecessária instrução probatória.
- O caso dos autos não é de retratação. A agravante pleiteia a não aplicação da nova Tábua de Mortalidade, no cálculo de revisão de benefício previdenciário e do art. 285-A do CPC. Decisão objurgada mantida.
- Eventual alegação de que não é cabível o julgamento monocrático no caso presente, resta superada, frente à apresentação do recurso em mesa para julgamento colegiado.
- Agravo legal não provido.
O relator da aludida decisão seguiu o raciocínio de acordo com o princípio do tempus regit actum, pois, tendo sido a benesse concedida sob a égide da Lei 8.213/91, o cálculo do salário de benefício deve obedecer ao artigo 29, I, da Lei de Benefícios, com a redação dada pela Lei 9.876, de 26.11.99, ou seja, deve ser aplicado o fator previdenciário porque constitucional sua aplicação.
Nas oportunidades em que o STF teve para se manifestar sobre a matéria, nas ADInMC 2.110-DF e ADInMC 2.111-DF, no informativo 181 de 13 a 17 de março de 2000, entendeu que a Lei 9.876 é constitucional.
Nesse sentido, confira o trecho, in verbis, extraído do informativo citado acima:
Julgados os pedidos de liminar nas ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos - CNTM e pelo PC do B, PT, PDT e PSB, contra a Lei 9.876/99, que dispõe sobre a contribuição previdenciária do contribuinte individual e sobre o cálculo do benefício. O Tribunal, em razão da falta de demonstração da alegada inconstitucionalidade formal (Lei 9.868/99, art. 3º, I), não conheceu da ação direta, na parte em que se sustentava violação ao processo legislativo (CF, art. 65, § único). Prosseguindo no julgamento, o Tribunal, por maioria, indeferiu o pedido de medida cautelar relativamente ao art. 2º da Lei 9.876/99, na parte em que introduziu o fator previdenciário (nova redação dada ao art. 29 da Lei 8.213/91). Considerou-se, à primeira vista, não estar caracterizada a alegada violação ao art. 201, § 7º, da CF, dado que, com o advento da EC 20/98, os critérios para o cálculo do benefício foram delegados ao legislador ordinário (CF, art. 201: A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: .... § 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições:"). Ainda por maioria, o Tribunal indeferiu o pedido de suspensão dos arts. 3º e 5º da referida Lei, por se tratarem de normas de transição. Vencido o Min. Marco Aurélio, que deferia a liminar por entender que a Lei impugnada reintroduzira um limite mínimo de idade para aposentadoria, o qual já fora rejeitado pelo Congresso Nacional, quando da apreciação da Proposta de Emenda à Constituição que originou a EC 20/98. (ADInMC 2.110-DF e ADInMC 2.111-DF, rel. Min. Sydney Sanches, 16.3.2000.) (grifos nossos
Do trecho citado acima, depreende-se que entre os ministros do próprio STF há divergência sobre o tema.
Atualmente a questão encontra-se novamente em discussão no Recurso, todavia, ainda não houve o julgamento do mérito.
Em um primeiro momento, o relator Ministro Gilmar Mendes mencionou que o Supremo Tribunal Federal já declarou a constitucionalidade formal da Lei 9.876/99, razão pela qual restam insubsistentes os fundamentos do recorrente, pois não restou comprovada qualquer afronta à Constituição (RE 639856).
Entretanto, opostos embargos de declaração, o Ministro reconsiderou a decisão e decidiu pela submissão da matéria ao plenário.
O Tribunal, por unanimidade, reputou constitucional a matéria e reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada.
O Recurso Extraordinário ainda não foi definitivamente julgado.
Dessa feita, o que se percebe é que a aplicação do fator previdenciário não resta definitivamente pacificada sendo objeto de constantes debates nos Tribunais Superiores.
5. Conclusão
O fator previdenciário surgiu em um momento de reforma previdenciária com o objetivo de preservar a manutenção do sistema, entretanto, de certa forma, a sua utilização no cálculo dos benefícios previdenciários prejudica os trabalhadores, pois diminui o quantum debeatur.
Apesar da sua introdução no ordenamento jurídico em 1999, o tema ainda hoje é controvertido. Resta-nos - após reconhecimento da existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada - aguardar o pronunciamento do STF sobre a questão, com o fito de acabar com a insegurança jurídica e uniformizar o entendimento sobre a matéria.
6. REFERÊNCIAS
BRASIL. LEI Nº 8.213, DE 24 DE JULHO DE 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8213cons.htm> Acesso em: 09 de setembro de 2014.
BRASIL. LEI No 9.876, DE 26 DE NOVEMBRO DE 1999.
Dispõe sobre a contribuição previdenciária do contribuinte individual, o cálculo do benefício, altera dispositivos das Leis nos 8.212 e 8.213, ambas de 24 de julho de 1991, e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9876.htm> Acesso em: 16 de setembro de 2014.
CARNEIRO, Pascoal. Sobre o fator previdenciário. Disponível em: < http://www.bancariosirece.com.br/website/index.php?option=com_content&view=article&id=1528%3Apascoal-carneiro-&catid=36%3Aopiniao-classista&Itemid=40> Acesso em: 13 de agosto de 2014.
Procurador Federal, pós graduado em Direito e Processo Civil pela UNICOC
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: AZEVEDO, Armstron da Silva Cedrim. Aspectos legais e jurisprudenciais sobre aplicação do fator previdenciário nos benefícios da previdência social Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 out 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41382/aspectos-legais-e-jurisprudenciais-sobre-aplicacao-do-fator-previdenciario-nos-beneficios-da-previdencia-social. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Maurício Sousa da Silva
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Por: DESIREE EVANGELISTA DA SILVA
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