RESUMO: O Governo deve trabalhar considerando alguns valores para guiar as suas funções. Para contratar o particular a fim de servir ao público, o Estado deve respeitar os princípios da moralidade e legalidade, selecionando pessoas e serviços por interesses gerais públicos, e não para satisfazer interesses de particulares, com a intenção de exercer suas funções com eficiência. Para contratar um particular, é necessária, em regra, uma seleção pública. Durante toda a execução do contrato, há que se atender o interesse público, a todo o tempo. E para isso, um fiscal é nomeado para verificar a correição das atividades. Esse fiscal será responsabilizado se não exercer a fiscalização da melhor forma possível. No entanto, o Governo deve buscar aprimorar e capacitar esse fiscal, pois, caso contrário, este não pode ser forçado a qualquer indenização.
Palavras chave: licitação, fiscal, responsabilidade pessoal, capacitação, irresponsabilidade.
ABSTRACT: The government has to work considering some values to guide its functions. In order to hire the particular to serve the public, the State has to respect the principles of morality and legality, selecting people and services by general public interest, not to satisfy private interests, with the intention of exercising its function effectively. To hire the particular, a public selection is necessary. Throughout all the execution of the contract, the public interests have to be satisfied at all times. For this to happen, an inspector is hired to verify the correct activities. This person will be blamed if he doesn´t verify the activities in the best possible way. However, the government should to improve and enhance the fiscal’s capacity, because, otherwise, he can’t be forced to indemnity.
Key words: bidding, inspector, personal responsibility, improvement, irresponsibility.
INTRODUÇÃO
A Administração Pública é regida pelos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, dentre outros. É o que reza o artigo 37 da Constituição Federal. Já a Lei nº 9.784/99 enumera ainda outros princípios que são também cerne da atuação estatal em todas as suas nuances: legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
Com base neles, o Poder Público se pauta na prática de suas ações, quer atuando como particular, quer atuando sob as prerrogativas de quem é o responsável por gerir a coisa pública. Essas prerrogativas são conferidas por lei.
No âmbito das contratações públicas, tais princípios obviamente se fazem também presentes. Em razão disso a Constituição Federal traz a imposição de submissão da Administração a esses princípios no processo licitatório. Como se vê a seguir:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.
A licitação, regida pela Lei 8.666/93, é processo prévio às contratações, e se mostra imprescindível à boa contratação, prezando pela aplicação da imparcialidade, moralidade, desde a seleção da proposta mais vantajosa até toda a execução do contrato por todo o prazo previsto.
Reza o artigo 3º da referida lei:
Art. 3º. A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.
Uma licitação defeituosa pode implicar sérios problemas ao deslinde do contrato. E por vezes, o servidor encarregado de sua fiscalização encontra enormes dificuldades ao acompanha-lo, e, assim, é responsabilizado, mesmo trabalhando em condições precárias e sem qualquer treinamento oferecido por parte da Administração. Esse posicionamento, no entanto, não é o mais justo e cabível.
Da licitação “defeituosa”
Segundo o artigo 7º da Lei 8.666/93:
Art.7º As licitações para a execução de obras e para a prestação de serviços obedecerão ao disposto neste artigo e, em particular, à seguinte sequência:
I - projeto básico;
II - projeto executivo;
III - execução das obras e serviços.
§ 1o A execução de cada etapa será obrigatoriamente precedida da conclusão e aprovação, pela autoridade competente, dos trabalhos relativos às etapas anteriores, à exceção do projeto executivo, o qual poderá ser desenvolvido concomitantemente com a execução das obras e serviços, desde que também autorizado pela Administração.
Pode não parecer, mas o trabalho do fiscal do contrato está intimamente ligado a um bom projeto básico, um projeto executivo viável e uma boa execução de obras e serviços, conforme fixado em edital. Alguns erros no instrumento convocatório, por vezes, só poderão ser conhecidos ou seus efeitos sentidos apenas quando se esta pondo em prática a obra ou serviço.
Já o artigo 27 e seguintes da Lei de Licitações dispõe acerca dos documentos necessários para a habilitação jurídica da empresa a participar do certame, bem como os necessários ao atesto de sua regularidade fiscal e qualificação técnica. O instrumento convocatório traz o elenco dos itens imprescindíveis, havendo exigência não prevista em lei, há possibilidade de impugnação. Aqui também há que se averiguar acerca da boa condição financeira da empresa.
Ocorre que, muitas vezes, a Administração não cura de verificar todos os requisitos legais, implicando assinatura de contratos com empresas que não atendam a todos os itens de habilitação, ou mesmo que apresentem um projeto básico mal feito. Assina-se um contrato, mas posteriormente descobrem-se defeitos insanáveis que muitas vezes podem ocasionar uma rescisão, quando não a anulação de processo licitatório.
Por exemplo, a contratação de empresa que apresente documentos falsos de sua regularidade financeira pode acarretar o descumprimento de pagamento de verbas trabalhistas aos terceirizados, implicando uma condenação subsidiária da Administração pelo valor não pago pelo contratado. E se tal qualificação é permanente, mês a mês a dívida se acumula.
Considerando a possibilidade desses percalços ocorrerem periodicamente na execução do contrato, trouxe a Lei 8.666/93 a figura do “fiscal do contrato”, para fins de acompanhamento diário das condições contratuais e sua execução, até o fim.
Há que se diferenciar, porém, “gestor de contrato” de “fiscal de contrato”, que muitos ainda confundem. E após, é necessário inteirar-se de suas obrigações.
Gestor e fiscal do contrato
A prerrogativa de fiscalização dos contratos administrativos é conferida à Administração pelo artigo 58 da Lei nº 8.666/93.
O artigo 67 do mesmo diploma legal retromencionado prevê a designação de representante da Administração para acompanhar e fiscalizar o contrato.
Reza o artigo 67 da Lei 8.666/93:
Art. 67. A execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição.
§ 1º O representante da Administração anotará em registro próprio todas as ocorrências relacionadas com a execução do contrato, determinando o que for necessário à regularização das faltas ou defeitos observados.
§ 2º As decisões e providências que ultrapassarem a competência do representante deverão ser solicitadas a seus superiores em tempo hábil para a adoção das medidas convenientes.
A Lei de Licitações não fez distinção entre a figura do gestor e fiscal do contrato, mas há orientação do Tribunal de Contas da União que estabelece diferenças e responsabilidades.
O gestor do contrato nada mais é do que a autoridade competente para autorizar a realização de licitações, assinar o contrato, permitir o aditamento do mesmo, aplicar penalidades, ordenar pagamento à contratada, rescindir a avença. Essa diferenciação é feita claramente na IN nº 04/2010 do Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão - MPOG, quanto à contratação de soluções de Tecnologia da Informação, bem como pela PORTARIA-TCU Nº 297, de 14 de novembro de 2012 quanto a outros contratos. Reza o artigo 2º da referida portaria:
Art. 2º Para os fins desta norma, entende-se por:
(..).
III – gestora do contrato: unidade ou subunidade da Secretaria do TCU, vinculada ou não ao objeto do contrato, responsável pela fiscalização da documentação comprobatória da contratada;
(...)
V – fiscal técnico do contrato: servidor formalmente designado para acompanhar a execução dos serviços terceirizados de natureza continuada que tenham sido contratados;
Verifica-se que antes da execução do contrato, há uma série de fases e requisitos a serem atendidos por quem pretende ser contratado pelo Estado.
Ao assinar o contrato, o agente que representa a Administração deve ter o cuidado de verificar a regularidade da avença de acordo com a lei. Após assinado, deve ser nomeado um servidor ou terceiro para fiscalização das atividades.
Dessa forma, na prática, o que se vê são duas figuras típicas com tarefas diferentes. O fiscal, com sua obrigação de acompanhar diariamente a regularidade da prestação contratada, atestar notas a serem pagas como contraprestação, relatar faltas, solicitar diligências diretamente ao representante da empresa, ou mesmo notifica-la. Recebe o contrato pronto e assinado, com suas perfeições e imperfeições.
De outro lado o gestor, que não se atém ao acompanhamento cotidiano, é a autoridade responsável pela aplicação das penalidades sugeridas pelo fiscal, pela eventual assinatura de aditivo necessário ao contrato, ou pela sua prorrogação, rescisão do contrato. É, assim, autoridade superior.
Conclui-se, então, que quem lida diretamente com a empresa, por meio de seu preposto, é o fiscal do contrato, mas não é este quem penaliza, e sim o gestor, que paga a contraprestação ao contratado.
Pode ser que as figuras coincidam em uma pessoa só, mas na prática da Administração Pública Federal, o que se vê é um agente público (geralmente comissionado) responsável pelo pagamento, assinatura, rescisão contratual e outro responsável por fiscalizar, notificar e sugerir ao superior aplicação de penalidade e/ou adequação contato.
Geralmente, o gestor é pessoa de grande conhecimento acerca de licitações, conhecimentos contábeis e financeiros. O mesmo não pode ser dito, porém, quanto ao fiscal do contrato. Muitos são postos na função sem qualquer preparação ou conhecimento.
A par dessas figuras, há o ordenador de despesa, que é responsável pela ordem efetiva de pagamento pela prestação regular.
Segundo o artigo art. 80, §1º do DL 200/67 “ordenador de despesa é toda e qualquer autoridade de cujos atos resultarem emissão de empenho, autorização de pagamento, suprimento ou dispêndio”. Logo, esse é o responsável pelo efetivo pagamento, pela liberação do dinheiro. Não precisa ter conhecimento de detalhes do contrato. Pauta-se apenas em atestos de regularidade feitos pelo fiscal e aprovado pelo gestor, que determina o pagamento. Sua responsabilidade pode decorrer de erro ou negligência na verificação do aval do fiscal e gestor.
O fiscal do contrato, por sua vez, tem papel auxiliar, sendo imprescindível seu papel de acompanhamento, que servirá de lastro às decisões do gestor do contrato. Isso porquê, qualquer falta na prestação deve ser relatada antes da determinação do pagamento da fatura periódica. E o efetivo pagamento cabe ao ordenador de despesa. Ou seja, não realizado o pagamento de verbas trabalhistas da empresa contratada aos terceirizados, por exemplo, deve o ordenador não pagar a fatura, solicitar ao gestor, que impelirá o fiscal a exigir da empresa que todos os deveres trabalhistas sejam cumpridos para que haja o regular pagamento pelos serviços. Não pode ser fiscal de contrato aquele que estiver respondendo a processo de sindicância ou processo administrativo disciplinar; possuir em seus registros funcionais punições em decorrência da prática de atos lesivos ao patrimônio público, em qualquer esfera do governo; houver sido responsabilizado por irregularidades junto a Tribunais de Contas; possuir condenação em processo criminal por crimes contra a Administração Pública.[1]
Pode o servidor se negar a ser fiscal de contrato?
Deve haver motivo fundado para tal recusa. Pela leitura da Lei 8.112/90, em seu artigo 116, é dever dos servidores o exercício com zelo e dedicação das atribuições do cargo, a lealdade às instituições a que servir, o cumprimento de ordens superiores não manifestamente ilegais, a observância de normas legais e regulamentares.
Existe ainda, em lei, a previsão de contratação de terceiro para a fiscalização. Para isso, necessário se fazer nova licitação. Segundo o TCU, a contratação de empresa para elaboração do projeto executivo não confere, por si só, direito subjetivo a essa empresa de ser também contratada para prestação dos serviços de supervisão[2]:
“A contratação de serviços de coordenação, supervisão e controle de obras, não se insere nas hipóteses de dispensa e inexigibilidade de que trata a Lei de Licitações”. [Acórdão 20/2007 – TCU – Plenário].
A contratação de terceiro não transfere para este a responsabilidade pela fiscalização do contrato, que continua sendo da Administração, mas a atividade de assessoria deficiente pode levar à responsabilização do terceiro contratado. O servidor também será responsabilizado, caso não tenha agido com diligência adequada.
Da responsabilidade do fiscal do contrato
Como se observa, a Administração Pública tem o dever de fiscalizar a execução do contrato. Nesse sentido o TCU:
A propósito, vale registrar que a prerrogativa conferida à Administração de fiscalizar a implementação da avença deve ser interpretada também como uma obrigação. Por isso, fala-se em um poder-dever, porquanto, em deferência ao princípio do interesse público, não pode a Administração esperar o término do
contrato para verificar se o objeto fora de fato concluído conforme o programado, uma vez que, no momento do seu recebimento, muitos vícios podem já se encontrar encobertos. [TCU – Acórdão 1632/2009 – Plenário]
Como já dito, uma fiscalização débil tem o condão de fazer a Administração ser condenada por indenizações a terceiros.
Segundo reza o art. 71 da lei 8.666/93, o contratado será responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato. Há exceção apenas quantos aos encargos previdenciários:
Art. 71. O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato.
§ 1o A inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 2o A Administração Pública responde solidariamente com o contratado pelos encargos previdenciários resultantes da execução do contrato, nos termos do art. 31 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
O STF já decidiu pela constitucionalidade deste artigo, como se vê a seguir:
Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 16 (DJ 09/09/2011)
EMENTA: RESPONSABILIDADE CONTRATUAL. Subsidiária. Contrato com a administração pública. Inadimplência negocial do outro contraente. Transferência consequente e automática dos seus encargos trabalhistas, fiscais e comerciais, resultantes da execução do contrato, à administração. Impossibilidade jurídica. Consequência proibida pelo art., 71, h 1q, da Lei federal nº 8.666/93. Constitucionalidade reconhecida dessa norma. Ação direta de constitucionalidade julgada, nesse sentido, procedente. Voto vencido. É constitucional a norma inscrita no art. 71, h 1q, da Lei federal nº 8.666, de 26 de junho de 1993, com a redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995.[3]
No entanto, o TST tem posicionamento diferente. Julga haver responsabilidade sim do ente da Administração, desde que tenha havido falha na fiscalização e tenha o ente público feito parte do título executivo da condenação:
Súmula nº 331 do TST
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011
I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).
II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).
III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.
Havendo condenação do Estado, há que se discutir acerca da responsabilidade pela fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço.
No entanto, para haver ação de regresso contra o servidor, fiscal, ou gerente, é necessário haver dolo ou culpa. Ademais, condições precárias de fiscalização, falta de instrução pela Administração são causas que elidem a responsabilidade pessoal do fiscal do contrato.
Nesse sentido o TCU:
Demonstrado nos autos que a responsável pela fiscalização do contrato tinha condições precárias para realizar seu trabalho, elide-se sua responsabilidade". Foi a essa uma das conclusões a que chegou o TCU ao apreciar recursos de reconsideração em sede, de originariamente, tomada de contas especial, na qual foram julgadas irregulares as contas de diversos responsáveis, relativas à execução do Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador (Planfor), no Distrito Federal, no exercício de 1999. No caso, diversas contratações foram efetivadas, e, dentre elas, uma celebrada com o Sindicato Nacional dos Trabalhadores em Sistemas de TV por Assinatura e Serviços Especiais de Telecomunicações (Sincab), na qual se constataram diversas irregularidades graves,algumas delas imputadas à executora técnica do contrato, a quem incumbiria, segundo as normas de execução financeira e orçamentária do DF, supervisionar, fiscalizar e acompanhar a execução da avença, o que não teria sido feito, conforme as apurações iniciais levadas à efeito pelo TCU. Ao examinar a matéria, a unidade instrutiva consignou que o DF não houvera proporcionado à servidora responsável pela fiscalização da avença "condições adequadas para o desempenho de tal função, ao mesmo tempo em que sabia que eventual inexecução do contrato seria de responsabilidade desse executor técnico (Ac. TCU 839/2011-Plenário)[4].
A falha na fiscalização do contrato, porém, pode ser imputada ao fiscal do contrato, ao gestor do contrato ou ao ordenador de despesa, ou a todos conjuntamente, se se comprovar que agiram mediante culpa.
O gestor do contrato se responsabiliza principalmente quanto às formalidades do contrato, quanto ao atendimento aos requisitos da lei, quanto a qualificação do contratado, detalhamento do projeto básico, executivo. Sua atuação é de imperiosa importância, haja vista que é na fase inicial que deve já começar a verificar o atendimento às imposições editalícias e legais. Qualquer defeito aqui pode macular a execução do contrato em sua inteireza e não pode o fiscal do contrato ser por isso responsabilizado.
O fiscal do contrato, por sua vez, responsabiliza-se quanto atua de forma desidiosa, negligente. Atua assim, por exemplo, quanto atesta uma nota (ato de verificar que deve ser pago em razão de os serviços contratados terem sido feitos) sem cuidar de verificar o cumprimento do contratado tal qual estipulado em edital. A responsabilidade nesse caso deverá ser pessoal do fiscal, porque agiu com dolo e culpa. E por isso, a praxe na administração pública federal é que o próprio fiscal contrate advogado para defendê-lo na ação de ressarcimento ao erário. Isso porque a Advocacia da União se presta a defender o Estado, que invariavelmente estará no polo passivo da ação de ressarcimento. Isso quanto à eventual ação cível. Na ação criminal e na esfera administrativa, deverá de igual modo o fiscal contratar patrono particular, uma vez que não cabe a advocacia pública patrocinar causas patrimoniais, particulares de servidores públicos.
Segundo a PORTARIA-TCU Nº 297[5], de 14 de novembro de 2012, o fiscal tem o dever de verificar a conformidade da prestação dos serviços e da alocação dos recursos necessários, de acordo com o objeto do contrato; atestar as notas fiscais e as faturas correspondentes à prestação dos serviços; prestar informações a respeito da execução dos serviços e de eventuais glosas nos pagamentos devidos à contratada; e quando cabível, manter o controle das ordens de serviço emitidas e cumpridas.
Segundo orientação da Controladoria Geral da União, o fiscal deve ser capacitado para exercer seu mister com eficiência. Deve ter conhecimento do projeto básico ou termo de referência e do projeto executivo, assim conhecimento técnico do objeto e das cláusulas do contrato. Nesse sentido, o TCU:
Acórdão nº 2.632/2007 - Plenário, Relator Ministro Augusto Nardes, DOU 11.12.2007.
9.2.3. Organize a gestão dos contratos de modo que sejam designados, formalmente, servidores públicos qualificados que serão responsáveis pela execução de atividades e/ou pela vigilância e garantia da regularidade e adequação dos serviços(...) [6]
Assim, conclui-se que a responsabilização do fiscal do contrato, bem como do gestor, e ainda do ordenador de despesa só encontra guarida se a Administração os capacite para o desempenho de seu mister. Não havendo capacitação, a autoridade omissa sim deve ser responsabilizada, em caso de dano ao erário.
Capacitados, porém, respondem pela má fiscalização. Pode responder por processo administrativo disciplinar, penal, e deverá ainda reparar o prejuízo ao erário. Há na esfera federal um processo próprio, previsto no art. 8º da Lei nº 8.443/9, de tomada de contas especial. Embora prevista em lei federal, tem sido usada como base em legislações estaduais.
CONCLUSÃO
A obrigação de fiscalizar a execução de contratos administrativos é um dever da administração. Por meio de um representante, que deve ser especialmente designado para acompanhar o contrato, podendo ser servidor efetivo ou mesmo terceiro, a Administração é responsável por verificar a regularidade da execução contratual em acordo com os ditames editalícios e legais.
O bom cumprimento do contrato depende de regularidade do processo de licitações, desde o inicio, na apresentação dos projetos básicos, fase de habilitação e qualificação.
A falha na fiscalização pode acarretar responsabilização do Estado e este, em ação de regresso, pode buscar ressarcimento junto ao fiscal, se este atuou com dolo e culpa. Essa responsabilidade do fiscal/gestor/ordenador de despesa é afastada pela não capacitação dos mesmos pela Administração, sendo a autoridade superior omissa responsabilizada pelo dano decorrente. O trabalho em condições precárias, a falta de informação acerca de detalhes do contrato devem ser sanadas, a fim de ajudar na fiel execução do mister a que o fiscal de contrato foi impelido.
Assim, o fiscal do contrato é responsável pela má fiscalização do contrato na medida de sua capacidade, cujo capacitação é responsabilidade imediata da Administração. Sem instrução, o mesmo não pode ser responsabilizado. Para arcar com o prejuízo também, deve ter agido com dolo ou culpa. Nesses casos, deverá buscar a promoção de sua defesa por meio de advogado particular, em razão de não caber à advocacia pública a defesa do fiscal nesses casos.
Referencias bibliográficas
Sites visitados:
1.SPINELLI, Mário Vinícius Claussen; luciano, Vagner de Souza. LICITAÇÕES E CONTRATOS. Disponível em:http://porteiras.r.unipampa.edu.br/portais/cmp/files/2010/08/Apostila_de_Licitacoes_e_Contratos_Administrativos.pdf. Acesso em 23/06/2014.
2. Portal de Licitações do Empreendedor. Disponível em: http://www.conlicitacao.com.br/sebrae_am/checklist/documentos.php. Acesso em 01/07/2014.
3. COSTA, Antônio França da. Aspectos Gerais sobre o fiscal do Contrato. Disponível em : http://jus.com.br/artigos/24855/aspectos-gerais-sobre-o-fiscal-de-contratos-publicos . Acesso em 24/06/2014.
4. Controladoria Geral da União. Manual de Porcesso Administrativo Disciplinar. Disponível em: http://www.cgu.gov.br/publicacoes/guiapad/Arquivos/Manual_de_PAD.pdf. Acesso em 02/07/2014.
5. Rcl 13281 RO, Ministro Luiz FUX. Disponível em: http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/23889942/agreg-na-reclamacao-rcl-13281-ro-stf. Acesso em 02/07/2014.
6. BLOG PÚBLICO DIREITO. TCU - FISCAL DE CONTRATO SÓ PODE SER RESPONSABILIZADO SE TIVER CONDIÇÕES APROPRIADAS PARA ATUAR. Disponível em: http://publicodireito.blogspot.com.br/2012/02/tcu-fiscal-de-contrato-so-pode-ser.html. Acesso em: 03/07/2014.
7. VIEIRA, Antonieta Pereira. VIEIRA, Henrique Pereira. Terceirização a luz do entendimento do Tribunal de Contas da União – TCU. Disponível em: http://www.professoraantonieta.com.br/visualizar_conteudo.php?form_id_conteudo=170. Acesso em 07/07/2014.
8. Controladoria Geral da União Regional Mato Grosso do Sul. Fiscalização dos Contratos. Disponível em: http://www-nt.ufms.br/manager/titan.php?target=openFile&fileId=1322. Acesso em: 03/07/2014.
Livros consultados:
9.DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 27ª. ed. São Paulo: Atlas, 2014. 1008p.
10.JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e contratos administrativos. 15ª. ed. São Paulo: Dialética, 2012. 294 p.
11.MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 30ª. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2013. 775p.
12.PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Comentários à Lei de Licitações e Contratações da Administração Pública. 8ª ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Renovar; 2009. 1261p.
[1] http://www.cgu.gov.br/publicacoes/guiapad/Arquivos/Manual_de_PAD.pdf
[2] http://jus.com.br/artigos/24855/aspectos-gerais-sobre-o-fiscal-de-contratos-publicos
[3] http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/23889942/agreg-na-reclamacao-rcl-13281-ro-stf
[4] http://publicodireito.blogspot.com.br/2012/02/tcu-fiscal-de-contrato-so-pode-ser.html
[5] http://www.professoraantonieta.com.br/visualizar_conteudo.php?form_id_conteudo=170
[6] http://www-nt.ufms.br/manager/titan.php?target=openFile&fileId=1322
Analista processual do Ministério Público do Distrito Federal E Territórios. Pós graduanda em Direito Administrativo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FERNANDES, Camila Padilha. A responsabilidade do fiscal de contrato administrativo Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 out 2014, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41418/a-responsabilidade-do-fiscal-de-contrato-administrativo. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
Por: BRUNO SERAFIM DE SOUZA
Por: Fábio Gouveia Carneiro
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
Precisa estar logado para fazer comentários.