“Chama-se público (populicum, publicum) aquilo que; e destinado a todos, ao povo, o que a todos é patente. A antítese de publicum é privatum, proprium (quod proprio est), istoé, o que é destinado ao homem privado, o que cada um tem para si só e de que excluem osoutros. Toda a antítese gira em torno da comunidade ou do exclusivismo do interesse”.
Rudolf Von Hering
SUMÁRIO: Propriedade industrial. Invenção. Modelo de utilidade. Desenho industrial. Marca. Papel do INPI na proteção da ordem econômica. Defesa do consumidor.
INTRODUÇÃO:
A finalidade da proteção à propriedade industrial, na qual o INPI desempenha relevante função, é, por um lado, impedir a usurpação, o proveito econômico, parasitário e o desvio desleal de clientela alheia, evitando também que o consumidor seja prejudicado. A Lei nº9.279/96 traz requisitos para que essa proteção possa ser concretizada. Abordaremos as aplicações da Lei de Propriedade Industrial bem como o papel fundamental do INPI e do Judiciário na proteção à ordem econômica.
DESENVOLVIMENTO
O Brasil é unionista, signatário de Convenção Internacional sobre a propriedade industrial. Assim, não é admissível a criação de distinção entre nacionais e estrangeiros em matéria de Direito Industrial. O Brasil reconhece o princípio da prioridade, pelo qual é possível a qualquer cidadão de país signatário da União reivindicar prioridade de privilégio ou o registro industrial no Brasil, à vista de igual concessão obtida anteriormente em seu país de origem, desde que no prazo.
A vigente Lei de Propriedade Industrial (LPI – Lei n. 9.279/96) aplica-se às invenções, ao módulo de utilidade, aos desenhos industriais e às marcas.
1. INVENÇÃO E MODELO DE UTILIDADE
A invenção é todo produto original da inteligência humana e que tem alguma aplicação na indústria (deve ter aplicação industrial). Deve também ser nova.
Nesse sentido, João da Gama Cerqueira, em seu clássico Tratado da Propriedade Industrial, RT, 1982, v. 1º, pp. 305/6, nº 114, verbis:
"Para que as invenções possam ser objeto de proteção jurídica é necessário que satisfaçam a certas condições estabelecidas pela lei. Como tivemos ocasião de expor (n. 66, supra), o direito do inventor origina-se de sua criação, a qual, por sua vez, justifica o reconhecimento desse direito e a sua proteção pelo Estado. Por outro lado, a lei assegura ao inventor um privilégio, cujo objeto é a própria invenção. Importando esse privilégio restrição à atividade do comércio e da indústria, em benefício do inventor, com detrimento, ainda, dos interesses da coletividade, é evidente que esse direito não pode ter por objeto coisas pertencentes ao domínio público ou comum, sob pena de se criarem monopólios injustos, incompatíveis com a liberdade de trabalho; nem coisas que não constituam invenção, o que seria contrário à motivação do direito do inventor e à sua origem e fundamento.
Do mesmo modo, tendo a lei de patentes, como fim não só reconhecer o direito do inventor, mas, também, promover o progresso das indústrias e desenvolver o espírito de invenção, estes objetivos seriam frustrados se os privilégios fossem concedidos para coisas que não ofereçam vantagens ou utilidade para a indústria. Por esses motivos, as leis de todos os países exigem, como condição para a concessão da patente, que a invenção seja nova e que se revista de caráter industrial."
O modelo de utilidade é toda alteração introduzida na forma de objetos já conhecidos, de forma a melhorar a sua utilidade. Não há uma novidade absoluta, mas sim uma novidade parcial, que é agregada a um objeto já conhecido. Ex.: inventa-se um mecanismo que engarrafa mais líquido.
Para que a invenção e o modelo de utilidade possam ter proteção jurídica, deverá o seu autor/criador requerer a concessão de uma patente perante o INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial).
A patente conferirá o direito de exploração exclusiva do invento ou modelo de utilidade ao inventor. Ela é o único instrumento de prova admissível pelo Direito para a demonstração da concessão do direito de exploração exclusiva da invenção ou do modelo de utilidade.
A patente de modelo de utilidade e invento deve atender aos requisitos de novidade e ato inventivo. O que a lei de patentes procura resguardar e proteger é a pesquisa, o estudo e o caráter inovador dos membros da sociedade, fomentando o desenvolvimento e a melhoria da qualidade de vida da população, tão caros a um país ainda em desenvolvimento como o nosso. Todo o trabalho de cunho intelectual deve ser incentivado e especialmente protegido, situação que há muitos anos já é objeto de proteção nos países desenvolvidos. O que se deve evitar, outrossim, de modo a não desvirtuar os fins previstos na lei de proteção intelectual, é o simples registro de produtos de uso corriqueiro pela sociedade com vista apenas a buscar um ganho financeiro.
Portanto, para que o INPI possa emitir a patente, deverão ser preenchidos determinados requisitos, a criação deve ser desconhecida pela comunidade científica, técnica ou industrial. A lei diz que para atender ao requisito da novidade, a invenção ou o modelo não poderão estar compreendidos pelo estado da técnica (tudo aquilo que é considerado de domínio público anterior à data do depósito do pedido da patente). Não basta que seja original (caráter subjetivo), deve ter alguma aplicação na indústria. Se apresentar criação puramente artística, o invento ou o modelo serão protegidos pelo direito autoral, e não poderão ser patenteados e deve ter atividade inventiva, o que requer que para um técnico no assunto não decorram obviamente do estado da técnica. Devem despertar nos técnicos um sentido de real progresso.
Há impedimento legal para a patenteabilidade quando a invenção ou o modelo afrontar a moral, os bons costumes, a segurança, a ordem e saúde pública ou quando houver substâncias resultantes de transformação do núcleo atômico ou se constituir de seres vivos (exceto os transgênicos, que podem ser patenteados).
Ausentes os requisitos, não deverá o INPI emitir a patente, sob pena de ser declarado nulo o ato administrativo que a ensejou. Assim manifestou Francisco Campos,in Pareceres do Consultor Geral da República, Rio de Janeiro, 1951, v. I, p. 622, verbis:
"Ora, quando um ato administrativo se funda em motivos ou em pressupostos de fato, sem a consideração dos quais, da sua existência, da sua procedência, da sua veracidade ou autenticidade, não seria o mesmo praticado, parece-me de boa razão que, uma vez verificada a inexistência dos fatos ou a improcedência dos motivos, deva deixar de subsistir o ato que neles se fundava.
O ato não seria praticado, não fosse a convicção de que uma determinada situação de fato impunha ou legitimava a sua prática. Posteriormente se vem a verificar que a situação de fato, que funcionara como motivo determinante do ato, não era a de cuja existência se convencera a administração. O motivo não tinha fundamento na realidade. Era um motivo invocado de boa fé, mas um motivo que se referia a fatos imaginários ou inexistentes. Desaparecido, por verificada a sua improcedência, o motivo determinante do ato, motivo sem a convicção do qual a Administração não teria agido como o fez, claro é que a conseqüência lógica, razoável e legítima deva ser, com a queda do motivo, a do ato que nele se originou ou que o teve como causa declarada e suficiente."
Vê-se que a Administração Pública pode revogar o ato administrativo quando praticado em violação ao texto constitucional. A jurisprudência da Suprema Corte é no sentido de que não há falar-se em direito subjetivo à manutenção dos efeitos de ato administrativo, se praticado em desconformidade com a lei, sendo, para tal, irrelevante ainda o tempo decorrido (RE nº 136.236-SP, rel. Min. GILMAR GALVÃO, in RTJ 146/658).
c) Vigência da patente
Estes prazos contam-se a partir do depósito de pedido de patente (protocolo no INPI). Não há prorrogação em nenhuma hipótese. O prazo de duração do direito industrial não poderá ser inferior a 10 anos para as invenções e a 7 anos para os modelos, contados da expedição da patente.
Após esse prazo, as invenções passam ao domínio público e passam ao domínio da técnica (não há mais o direito de exploração exclusivo).
A patente confere o direito de exploração exclusiva, mas este direito pode ser transferido por meio do contrato de licença.
Em duas hipóteses a licença é compulsória:
-se o titular da patente estiver exercendo os direitos dela decorrentes de forma abusiva ou praticando uma infração contra a ordem econômica. Sempre que a patente estiver sendo utilizada com essas intenções/objetivos, há infração contra a ordem econômica, o que causará como sanção a obrigatoriedade de contrato de licença;
- se o titular da patente não estiver explorando as obrigações dela decorrentes ou se a exploração não atender às necessidades do mercado. Concedida a primeira licença compulsória, o licenciado tem 2 anos para iniciar a exploração econômica da invenção ou modelo, sob pena de caducidade da patente, ou seja, o inventor perde o direito e o modelo ou a invenção caem no domínio público.
Ocorre:pela expiração do prazo de vigência;pela renúncia do seu titular aos direitos industriais (desde que não cause prejuízo a terceiros);pela caducidade;pela falta de pagamento da taxa devida ao INPI (denominada “retribuição anual”);pela falta de representante legal com poderes para receber citação no Brasil, quando o titular é domiciliado no exterior.
Extingue-se também a patente concedida a favor de pessoa estrangeira se esta deixar de nomear no Brasil representante legal com poderes para receber citação inicial. A maioria dos textos legais prevê a obrigatoriedade de representante legal brasileiro para receber a citação em nome do estrangeiro. Isso para proteger os brasileiros que contratam com o estrangeiro.
O art. 10 da Lei n. 9.276/96 relaciona as criações intelectuais que não são consideradas invenções ou modelos de utilidade, não podendo ser protegidas por patente. Ex.: teses acadêmicas, obras literárias, projetos arquitetônicos – gozam de proteção como direito autoral, mas não como patente.
Não se podem patentear seres vivos naturais e materiais biológicos. Exceção: microorganismos que atendam aos requisitos de patenteabilidade (novidade, aplicação industrial e atividade inventiva) podem ser patenteados. Ex.: criação de um microorganismo.
2. DESENHOS INDUSTRIAIS
Desenho industrial diz respeito à forma dos objetos. Marca é o signo que identifica produtos e serviços.
Desenho industrial (design): são formas novas de um produto industrial ou conjunto de linhas e cores que têm por objeto aprimorar a sua ornamentação, proporcionando a possibilidade de um visual novo. Não visa melhorar a utilidade, visa aprimorar sua ornamentação.
Ex.: novo formato de uma garrafa.
É passível de proteção jurídica perante o INPI.
O desenho industrial deve atender aos requisitos:
-novidade: não poderá estar compreendido pelo estado da técnica. O resultado visual deve ser inédito. É uma questão de técnica;
- originalidade: configuração própria, não encontrada em outros objetos ou combinação com originalidade de elementos já conhecidos. É uma questão estética;
- desimpedimento legal e aplicação industrial: deve ter uma utilidade.
Vigência
O prazo de vigência do registro de desenho industrial é de 10 anos, prorrogáveis por 3 vezes, por períodos de 5 anos cada. O prazo máximo é de 25 anos.
Decorridos 25 anos, passa a ser compreendido pelo estado da técnica, caindo em domínio público.
3. MARCA
A marca corresponde a todo sinal ou expressão que designa um produto ou determina prestação de serviços e que estabelece entre consumidor e fornecedor uma identificação.
Há duas espécies de marcas:marca de produto (para a identificação do produto) e marca de serviço.
A lei criou duas espécies de marcas: a marca de certificação, que atesta a conformidade de produtos ou serviços em relação a determinadas normas de qualidade fixada por organismo oficial ou particular. Ex.: submeter o produto a uma análise para garantir a qualidade e para vender mais e amarca coletiva, utilizada para a identificação de produtos ou serviços oriundos de membros de uma determinada entidade ou associação. Ex.: a associação dos produtos de leite pode ter uma marca.
A proteção em favor da marca só ocorre com um registro perante o INPI.
Para a marca ser registrada, devem ser atendidos três requisitos:
- Novidade relativa:
A expressão ou símbolo que se quer utilizar não precisa ser absolutamente nova, mas nova deve ser a utilização que se dá a esses elementos. Assim, defere o registro da marca a determinado campo de atividade econômica. (ex.: aquele que fabrica panelas pode utilizar a mesma marca que uma fábrica de tecidos);
- Veracidade:
O empresário só terá o registro de uma marca com relação a uma atividade efetivamente explorada por ele. Se a atividade não for explorada, o direito caduca. A rigor a marca só tem proteção em seu campo de atividade.
Exceção: marca de alto renome – é protegida em todos os ramos de atividade econômica. Ex.: Coca-Cola é uma marca que não poderá ser utilizada para outra atividade econômica.
Deve-se resguardar o direito daquele que investe na propaganda.
A marca notoriamente conhecida possui proteção no Brasil dentro de um determinado ramo de atividade econômica, independentemente de registro, desde que assim registrada em outro país signatário da Convenção de Paris.
O registro de determinada marca na categoria de alto renome é ato discricionário do INPI, insuscetível de revisão pelo Poder Judiciário, senão quanto aos seus aspectos formais.
- Não impedimento
O art. 124 da Lei n. 9.279/96 enumera as expressões e símbolos que não podem ser registrados como marcas (ex.: Brasão das Forças Armadas, sinais de programas, número isolado).
O prazo de vigência do registro de uma marca é de 10 anos, prorrogável por igual período, infinitamente (não passa a ser compreendida pelo estado da técnica). Caso a sua utilização não se inicie no prazo de 5 anos ou se houver suspensão de tal utilização por período de 5 anos, ocorrerá a caducidade.
Caduca uma patente se, decorridos 2 anos a contar da licença compulsória (devido à utilização abusiva), esse prazo se mostrar insuficiente para o abuso ou o desuso.
Importante ressaltar que a Lei n. 9.279/96 traz proteção a dois outros bens incorpóreos: sinais ou expressões de propaganda e títulos de estabelecimentos.
A proteção jurídica não se dá por registro ou patente, mas sim por meio da tipificação de sua utilização indevida como crime (art. 191 da Lei n. 9.279/96). Segundo a doutrina, a proteção deveria ser por meio de registro.
Sinais ou expressões: são legendas, anúncios, gravuras etc. que objetivam atrair a atenção do consumidor para determinados produtos ou serviços (visam recomendar determinados produtos ou serviços). Ex.: slogans.
Título de estabelecimento: são expressões ou designação do estabelecimento comercial. Ex.: Casas Pernambucanas (local em que se exerce atividade econômica).
Nome empresarial: nome sob o qual se desenvolve a atividade, assumindo obrigações e direitos. Ex.: Silva e Pereira.
Marca: identifica o produto ou serviço. Ex.: Marca X.
As expressões que compõem o nome empresarial podem ser as mesmas da marca e do estabelecimento.
Assim dispõe o art. 129 da LPI:
Art. 129. A propriedade da marca adquire-se pelo registro validamente expedido, conforme as disposições desta Lei, sendo assegurado ao titular seu uso exclusivo em todo o território nacional, observado quanto às marcas coletivas e de certificação o disposto nos arts. 147 e 148.
§ 1º Toda pessoa que, de boa fé, na data da prioridade ou depósito, usava no País, há pelo menos 6 (seis) meses, marca idêntica ou semelhante, para distinguir ou certificar produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, terá direito de precedência ao registro.
§ 2º O direito de precedência somente poderá ser cedido juntamente com o negócio da empresa, ou parte deste, que tenha direta relação com o uso da marca, por alienação ou arrendamento.
Este artigo da Lei n. 9.279/96 (LPI) consagra o sistema atributivo de registro de marca, isto é, a sua propriedade e o seu uso exclusivo só são adquiridos pelo registro, se contrapondo esse sistema ao declarativo de direito sobre a marca, no qual o direito resulta do primeiro uso e o registro serve apenas como uma simples presunção de propriedade.
O art. 129 da Lei 9.279/96 subordina o direito de uso exclusivoda marca ao seu efetivo registro no INPI, que confere ao titular odireito real de propriedade sobre a marca.
O parágrafo primeiro do art. 129 da LPI comporta uma exceção, que é o direito do usuário anterior, qual seja, toda pessoa que, de boa fé, na data da prioridade ou do depósito, usava no país, há pelo menos 6 (seis) meses, marca idêntica ou semelhante, para distinguir ou certificar produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, terá direito de precedência ao registro.
Com efeito, significa dizer que o direito de precedência seria um instituto excepcional, ou, buscando o ensinamento de Denis Borges Barbosa, ao citar Gama Cerqueira, “é uma chance que a lei, sob condições estritas, oferece aos possuidores de marcas não registradas, para que defendam os seus interesses contra os prejuízos de sua própria negligência”.
Dessa forma, conferir uma leitura extensiva ao instituto do direito de precedência, admitindo que esse venha a ser oposto mesmo após a concessão do registro, poderá privilegiar e favorecer pessoas a partir de sua própria negligência ou mesmo torpeza e produzir um ambiente de insegurança jurídica e de temeridade a qualquer negócio sustentado naquela marca registrada, porquanto essa estará sujeita a questionamentos judiciais até o 5º ano após a sua concessão.
Dessa forma, considerando que a segurança jurídica é o maior objetivo de uma legislação, a interpretação que resulta razoável e adequada na espécie é no sentido de que o instituto do direito de precedência dever ser entendido e aplicado de forma restritiva, porquanto se trata de uma exceção à regra estabelecida pelo princípio atributivo e uma interpretação mais ampliativa ao parágrafo primeiro do art. 129 seria o mesmo que negar a existência do princípio atributivo previsto em seu caput, negando mesmo a eficácia e relevância do registro de uma marca.
Sendo assim, desde que não seja configurada a hipótese de má-fé daquele que depositou o pedido de registro, em face do disposto no art. 6 bis, 3 da Convenção da União de Paris, o direito de precedência fixado no art. 129 da LPI só poderá ser arguido dentro da fase administrativa, que anteceda a concessão do registro, notadamente naquela forma estabelecida no art. 158 da mesma lei, qual seja em sede de oposição ao pedido de registro, não devendo pois ser admitido se alegado apenas em sede de processo administrativo de nulidade ou em ação de nulidade.
Assim, por meio das provas produzidas em Juízo poderá ser decidido pelo Judiciário se houve má-fé no pedido de registro da marca pela primeira ré, com prática de concorrência desleal, devendo ser ressaltado que administrativamente a parte autora não apresentou oposição ou requereu a instauração de processo administrativo de nulidade, tendo, portanto, o INPI agido de acordo com a lei quando da concessão do registro em favor da primeira ré.
Nesse sentido, a doutrina sobre o tema:
'A qualquer tempo, o interessado pode pleitear ao Poder Judiciário uma decisão sobre sua pretensão, consistente na declaração da nulidade da marca. Da mesma forma, o INPI, se já houver decorrido o prazo de 180 dias para a instauração (ex officio' do processo administrativo de nulidade de marca, também possui legitimidade ativa para a propositura da ação judicial com tal finalidade.
Portanto, o interessado pode, desde logo, ajuizar a ação de nulidade, sem a necessidade de esgotar a via administrativa. Portanto, tem legitimidade ativa para propor a ação de nulidade demarca, além do INPI, a pessoa que tiver um interesse jurídico ou econômico em que determinada marca seja declarada nula.' (Luiz Guilherme de A V. Loureiro, in 'A Lei de Propriedade Industrial Comentada').
Ora, é fundamental ter-se em linha de conta que se marca é um sinal ou equivalente que se destina a diferenciar um produto de outros tantos similares, e que se, uma vez concedida, é bem incorpóreo que pode restringir seriamente o direito de terceiros, como já exposto, não é possível ter por sinal ou termo registrável como marca aquele que represente a denominação usual de um determinado produto, que seja necessária à sua fácil e comum identificação genérica. Acaso assim não fosse, desvirtuada estaria a finalidade do registro de marca, que passaria, não a servir ao propósito de individuar um determinado produto, em função de sua origem ou qualidade, frente aos seus similares, mas sim, a servir como instrumento ilegítimo de pressão para que todo e qualquer produtor de um bem pertencente a determinado gênero de produto passasse a, injustificada e injustamente, dever satisfações ou contribuições àquele concorrente que primeiro tivesse se apropriado do termo genérico, gerando verdadeiro enriquecimento sem causa lícita do mais ladino ou astuto. Daí porque se veda o registro de 'marcas genéricas', por expressa disposição de lei, em mais de um dispositivo normativo.
Nesse sentido, a doutrina, representada pelo excerto que segue:
"A marca deve permitir a identificação de um produto ou serviço entre produtos e serviços da mesma natureza da concorrência. Ela deve ter, portanto, um caráter distintivo. Um sinal cujo uso seja indispensável para a apresentação de todos os produtos ou serviços de uma mesma natureza, não é considerado distintivo e não pode ser utilizado como marca. O monopólio do nome ou do sinal genérico em beneficio de um comerciante poderia gerar uma exclusividade inadmissível e injusta, além de prejudicial aos concorrentes, que não teriam como apresentar seus produtos.
(....)
Em síntese, não podem ser registradas as denominadas 'marcas genéricas', que são aquelas constituídas unicamente pela denominação usual do produto designado ou serviço oferecido.
(....) Tal vedação se justifica pelo fato de serem estas marcas comuns a todos os objetos semelhantes e os comerciantes não podem se apropriar de termos indispensáveis aos concorrentes para a definição de qualidades e características do produto.'
(Luiz Guilherme de A V. Loureiro, in 'A Lei de Propriedade Industrial Comentada')
Também importante referir que a jurisprudência brasileira considera banais e comuns e que, portanto, não podem ser apropriados por qualquer comerciante, os nomes de esportes, pois nomes de esportes não podem gerar uma exclusividade de marca, havendo incrível ofensa jurídica permitir-se a alguém o monopólio desses títulos, num injusto enriquecimento para a cessão do direito de uso.
Nesse sentido o art. 124 da LPI:
“Art. 124 - Não são registráveis como marca:
(....)
VI - sinal de caráter genérico, necessário, comum, vulgar ou simplesmente descritivo, quando tiver relação com o produto ou serviço, quanto à natureza, nacionalidade, peso, valor, qualidade, e época de produção ou prestação do serviço, salvo quando revestidos de suficiente forma distintiva.”
4. POSIÇÃO PROCESSUAL DO INPI NA DEFESA DA ORDEM ECONÔMICA
O posicionamento da Autarquia é de que a mesma figura como Assistente, tendo em vista que o INPI não é o sujeito de direito real controvertido, que pertence única e exclusivamente ao titular do registro sub judice.
Em ações que visam à nulidade de registro de marca, a posiçãoé a de assistência, segundo preceitua o art. 175 da Lei nº 9279/96 (Lei da Propriedade Industrial - LPI), transcrito a seguir:
“Art.175 - A ação de nulidade do registro será ajuizada no foro da justiça federal e o INPI, quando não for autor, intervirá no feito.
§ 1º - O prazo para resposta do réu titular do registro será de 60 (sessenta) dias.
§ 2º - Transitada em julgado a decisão da ação de nulidade, o INPI publicará anotação, para ciência de terceiros.”
Verifica-se que não se trata de litisconsórcio, já que é pressuposto da intervenção uma lide instalada entre partes, na qual um terceiro intervém. Da exegese desse dispositivo depreende-se que cabe ao INPI atuar como assistente de parte, seja do autor, seja do réu. A mens legis não é no sentido de que a Autarquia, quando não autora, seja ré na ação de nulidade. Se assim fosse, a redação seria diversa, com a integração do INPI no feito na qualidade de réu, o que de fato não ocorre.
O objeto da ação de nulidade não é um bem pertencente à Autarquia. A nulidade de uma marca importa ao Instituto de maneira diversa do interesse privado do titular. O INPI, como órgão executor das normas de propriedade industrial, deve obedecer a princípios impessoais, como o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País, enquanto o titular tem interesse de ordem particular sobre o bem incorpóreo atacado.
Em outras palavras, o ato de deferimento de uma marca não se confunde com o bem imaterial que dele deriva. O registro de marca desvincula-se do INPI, assumindo condição jurídica de bem móvel, não sendo o ato administrativo de que se originou.
A própria lei lhe faculta a possibilidade de promoção da ação de nulidade, garantindo-lhe, com isso, autonomia de posicionamento frente à questão. No caso, a figura da assistência litisconsorcial, prevista no art.54 do CPC, é a que mais se assemelha à intervenção prevista no art. 175 da LPI.
Tanto é assim que o INPI poderá manifestar-se pelo prosseguimento da ação, não obstante eventual acordo firmado entre as partes.
Há no entanto, jurisprudênciacontrária a esse posicionamento, que reconhece a legitimidade passiva do INPI nas ações de nulidade de registro de marca ou patente, verbis:
PROCESSUAL CIVIL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. AÇÃO DE NULIDADE DE REGISTRO DE PATENTE. INPI. LITISCONSORTE PASSIVO NECESSÁRIO.
I - O INPI, nas ações destinadas a anular registro de marca patentes, é parte autônoma e não mero assistente.
II - A ação de nulidade de registro de marca ou patente há que ser proposta contra o titular do registro, tendo o INPI como co-réu, já que é a autarquia responsável pela concessão do registro de marcas e patentes.
III - Recurso improvido.
(TRF 2ª Região; AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5680 Processo: 9202086737/RJ; QUINTA TURMA; Relator(a) Desembargadora Federal TANYRA VARGAS;DJU - Data::08/02/2000)
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. AÇÃO ORDINÁRIA - NULIDADE DE REGISTRO DE MARCA. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INPI. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA - HIGIDEZ DOS FUNDAMENTOS DECISÓRIOS. SUCUMBÊNCIA (CPC, ART. 20, §§3º E 4º). 1. Preliminar rejeitada. 2. Apelação e remessa improvidas. (TRF4, APELREEX 5025695-82.2011.404.7000, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, D.E. 31/05/2013)
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INPI. REGISTRO DE MARCA CUJA EXPRESÃO JÁ ERA UTILIZADA COMO TÍTULO DE ESTABELECIMENTO COMERCIAL. IMPOSSIBILIDADE. VEDAÇÃO CONSIGNADA NO ART. 124, V, DA LEI Nº 9.279/96. PREVELÊNCIA DO REGISTRO MAIS ANTIGO. PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR. O INPI é parte legítima para figurar no pólo passivo de demanda que se pretende a anulação de registro de marca indevidamente concedido. É de ser anulado o registro de marca que possui a mesma expressão utilizada como título de estabelecimento que possui registro anterior, sob pena de violação do disposto no art. 124, V, da Lei nº 9.279/96. Ademais, a coincidência entre título de estabelecimento pertencente a um empresário e a marca pertencente a outro, que concomitantemente revendem um mesmo produto, numa mesma região, de empresa estrangeira possuidora do mesmo nome, pode levar a erro o consumidor. (TRF4, APELREEX 5004235-39.2011.404.7000, Terceira Turma, Relatora p/ Acórdão Maria Lúcia Luz Leiria, D.E. 09/03/2012)
No STJ, alguns arestos relativos ao tema da proteção à propriedade industrial e o papel do INPI na lide:
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE NULIDADE. ATOADMINISTRATIVO. REGISTRO DE MARCA. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC.INEXISTÊNCIA. ANÁLISE DE VIOLAÇÃO DE DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL.IMPOSSIBILIDADE. COLIDÊNCIA ENTRE NOME EMPRESARIAL E MARCA.PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE DO REGISTRO NO INPI. MITIGAÇÃO PELOSPRINCÍPIOS DA TERRITORIALIDADE E DA ESPECIALIDADE. SUMULA 7/STJ.
1…
2…
3. Peculiaridade da colidência estabelecida entre a marca registradano INPI e o nome empresarial registrado anteriormente na JuntaComercial competente.
4. A aferição da colidência não apenas com base no critério daanterioridade do registro no NPI, mas também pelos princípios daterritorialidade e da especialidade. Precedentes específicos destaCorte.
5…..
6. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.” (AgRg no REsp 1347692 / RJ
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL
2012/0208496-3, RelatorMinistro PAULO DE TARSO SANSEVERINO (1144), TERCEIRA TURMA, julgamento em 11/03/2014, DJe 18/03/2014.)
“RECURSO ESPECIAL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. CONCORRÊNCIA DESLEAL.JUSTIÇA ESTADUAL. ABSTENÇÃO DE USO DE MARCA REGISTRADA PELO PRÓPRIOTITULAR. JUSTIÇA FEDERAL. COMPETÊNCIA. NECESSÁRIA PARTICIPAÇÃO DOINPI. VIOLAÇÃO AO ART. 129 DA LEI DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL.
1…
2…
3. Compete ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial- INPIavaliar uma marca como notoriamente conhecida. Precedente.
4. A desconstituição do registro por ação própria é necessária paraque possa ser afastada a garantia da exclusividade em todo oterritório nacional. (REsp 325158/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI,Rel. p/ Acórdão Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRATURMA, julgado em 10/08/2006, DJ 09/10/2006, p. 284). Não háprevisão legal para autorizar a retirada da eficácia de atoadministrativo de concessão de registro marcário sem a participaçãodo INPI e sem o ajuizamento de prévia ação de nulidade na JustiçaFederal.
5. Recurso especial provido.” (Resp1189022 / SP/ RECURSO ESPECIAL2010/0062457-8, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO (1140), QUARTA TURMA, data do julgamento 25/02/2014, DJe 02/04/2014.)
“RECURSO ESPECIAL. AÇÃO RESCISÓRIA. FUNDAMENTO NO ART. 485, IV e V,DO CPC. MARCA NOTÓRIA "VIGOR". REGISTRO DEFERIDO PARA FRUTAS,VERDURAS, LEGUMES E CEREAIS (Da Classe 29.30). AÇÃO DE ABSTENÇÃO DEUSO DE MARCA JULGADA PROCEDENTE NA JUSTIÇA ESTADUAL, A QUALTRANSITOU EM JULGADO COM JULGAMENTO PROFERIDO PELO STJ. ANULATÓRIADE INDEFERIMENTO DE ATO ADMINISTRATIVO JULGADA PROCEDENTE,POSTERIORMENTE, PELA JUSTIÇA FEDERAL, AUTORIZANDO O REGISTRO DAMARCA "VIGOR" PARA O PRODUTO ARROZ. OFENSA À COISA JULGADACARACTERIZADA. AÇÃO RESCISÓRIA JULGADA PROCEDENTE.
1….
2.- No caso, a ausência do INPI como parte no primeiro processo,ação de abstenção de uso de marca, por si só, não autoriza dizer queo resultado do julgamento não possa adquirir "autoridade de coisajulgada", pois que o cotejo das sentenças proferidas,respectivamente, nas Justiças Estadual e Federal demonstra ocontrário, na medida em que o ponto controvertido das lides de Bagée do Rio de Janeiro gira em torno da expressão "VIGOR" com vistas aidentificar o mesmo produto alimentício - arroz - fabricado pela orarecorrida, ao fundamento de distinção de classes.
3.- Vige no Brasil o sistema declarativo de proteção de marcas epatentes, que prioriza aquele que primeiro fez efetivo e concretouso da marca, constituindo o registro no órgão competente merapresunção, que se aperfeiçoa pelo uso. Pelo princípio daespecialidade, em decorrência do registro no INPI, o direito deexclusividade ao uso da marca é, em princípio, limitado à classepara a qual foi deferido, não abrangendo esta exclusividade produtosoutros não similares, enquadrados em outras classes, excetuadas,contudo, as hipóteses de marcas notórias, justamente o que severifica no caso em análise, em que a marca VIGOR pertence, hádezenas de anos, à ora Recorrente e é efetivamente usada com amplanotoriedade.
4.- Na hipótese, o registro da marca "VIGOR" como "notória" foiconcedido à empresa ora recorrente, atraindo a interpretação docaput do art. 67 da Lei n. 5.772/71, vigente à época: "A marcaconsiderada notória no Brasil, registrada nos termos e para osefeitos deste Código, terá assegurada proteção especial, em todas asclasses, mantido registro próprio para impedir o de outra que areproduza ou imite, no todo ou em parte, desde que hajapossibilidade de confusão quanto à origem dos produtos, mercadoriasou serviços, ou ainda prejuízo para a reputação da marca."
5.- Portanto, em se tratando de "marca notória" (art. 67, caput, daLei n. 5.772/71, atual marca "de alto renome", em consonância com oart. 125 da Lei nº 9.279/96), como tal declarada pelo INPI, não seperscrutará acerca de classes no âmbito do embate marcário, porquedesfruta tutela especial impeditiva do registro de marcas idênticasou semelhantes em todas as demais classes e itens.
6….
7.- O entendimento do Acórdão rescindendo no sentido dapossibilidade da convivência das marcas em confronto não se mostracompatível com o sistema legislativo pátrio, seja na vigência doart. 59 da Lei n. 5.772/71, seja na vigência da Lei n. 9.279/96,cujo art. 125 assegura à marca registrada no Brasil considerada dealto renome - expressão que substituiu a marca notória da leianterior - proteção especial, em todos os ramos de atividade.
8…
9…
10.- Ademais, no caso, não se vislumbra de que forma o entendimentoadotado pelo Acórdão recorrido venha a beneficiar o mercado, uma vezque possibilita, inclusive, a existência de confusão por parte doconsumidor, levado a crer, diante da identidade dos sinais, quetanto um como outro produto provenham de uma mesma origem.
11.- Recurso Especial provido, julgando-se procedente a Ação
Rescisória.”(REsp1353531/RJ, RECURSOESPECIAL 2012/0239926-4, Relator
Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, data do julgamento 17/12/2013,
DJe 20/03/2014.)
“PROPRIEDADE INDUSTRIAL. RECURSO ESPECIAL. MARCA. NOTORIAMENTECONHECIDA. DECLARAÇÃO. PROCEDIMENTO. CONTROLE PELO PODER JUDICIÁRIO.LIMITES. CONVENÇÃO DA UNIÃO DE PARIS. NOME COMERCIAL.
1. …
2. Compete ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial- INPIavaliar uma marca como notoriamente conhecida, ensejandomalferimento ao princípio da separação dos poderes e invadindo aseara do mérito administrativo da autarquia digressão do Poder
Judiciário a esse respeito.
3. O artigo 124, XIX, da Lei da Propriedade Industrial expressamenteveda o registro de marca que imite outra preexistente, ainda que emparte e com acréscimo "suscetível de causar confusão ou associaçãocom marca alheia". Todavia, o sistema de proteção de propriedadeintelectual confere meios de proteção aos titulares de marcas aindanão registradas perante o órgão competente.
4. Conforme decidido no REsp 1.105.422 - MG, relatado pela MinistraNancy Andrighi, a finalidade da proteção ao uso das marcas é dupla:por um lado protegê-la contra usurpação, proveito econômicoparasitário e o desvio desleal de clientela alheia e, por outro,evitar que o consumidor seja confundido quanto à procedência do
produto (art. 4º, VI, do CDC).
5. Tratando-se, depois da cisão levada a efeito, de pessoasjurídicas e patrimônios distintos, não há como permitir acoexistência das marcas HARRODS da recorrente e da recorrida, sematentar contra os objetivos da legislação marcária e induzir osconsumidores à confusão.
6. A legislação observa o sistema atributivo para obtenção doregistro de propriedade de marca, considerando-o como elementoconstitutivo do direito de propriedade (art. 129 da Lei n.9.279/1996); porém também prevê um sistema de contrapesos,reconhecendo situações que originam direito de preferência àobtenção do registro, lastreadas na repressão à concorrência desleale ao aproveitamento parasitário.
7. A Lei da Propriedade Industrial reprime a concessão de registroscomo marcas de: a) nome comercial, título de estabelecimento ouinsígnia alheios (art. 124, V e 195, V); b) sinais que reproduzemmarcas que o requerente evidentemente não poderia desconhecer emrazão de sua atividade, cujo titular seja sediado em país com o qualo Brasil mantenha acordo, se a marca se destinar a distinguirproduto idêntico semelhante ou afim suscetível de causar confusão ouassociação com aquela marca alheia (art. 124, XXIII); c) marcanotoriamente conhecida em seu ramo de atividade nos termos do art.6º bis (I) da Convenção da União de Paris para Proteção daPropriedade Industrial.
8. A Convenção da União de Paris, de 1883, deu origem ao sistemainternacional de propriedade industrial com o objetivo de harmonizaro sistema protetivo relativo ao tema nos países signatários, dosquais fazem parte Brasil e Reino Unido.. O Tribunal de origem, aoasseverar que, após a criação da Harrods Buenos Aires, houve acordo,
em 1916, para que Harrods Limited atuasse como agente de comprasdaquela, deixa claro que, na verdade, a pretensão da Harrods BuenosAires incide na vedação inserta no art. 6º septies da Convenção daUnião de Paris.
9. Independentemente do negócio firmado no passado, não havendoexpressa autorização da sociedade anterior criadora desta, aobtenção e a manutenção de direitos marcários deverão respeitar osprincípios e a finalidade do sistema protetivo de marcas, bem como oprincípio da livre concorrência, um dos pilares de ordem econômicabrasileira, previsto no art. 170, inc. IV, da Constituição daRepública Federativa do Brasil.
10. O INPI, na decisão que declarou nulos os registros n.812.227.786 e 812.227.751 em nome da recorrente, asseverou que amarca HARRODS é notoriamente conhecida, além de nome comercial darecorrida, estabelecendo, deste modo, a proteção dos arts. 6º bis e8º da Convenção de Paris. O objetivo de tais dispositivos é,justamente, reprimir o benefício indireto que ocorreria para um dosconcorrentes, quando consumidores associassem os sinais deste com amarca notoriamente conhecida atuante no mesmo segmentomercadológico, como é o caso dos autos. Constitui, assim, exceção aoprincípio da territorialidade, gozando a marca de proteçãoextraterritorial nos países signatários da Convenção da União deParis.
11. Mesmo que não fosse a marca de Harrods Limited admitida peloINPI como notoriamente conhecida, esbarraria a pretensão darecorrente na proibição do art. 124, inc. XXIII, segundo o qual nãoé registrável o sinal que reproduza ou imite marca que o depositanteevidentemente não poderia desconhecer, especialmente em razão de suaatividade, desde que o titular desta seja domiciliado em país com oqual o Brasil mantenha acordo ou assegure reciprocidade detratamento.
12. A tutela ao nome comercial no âmbito da propriedade industrial,assim como à marca, tem como fim maior obstar o proveito econômicoparasitário, o desvio de clientela e a proteção ao consumidor, demodo que este não seja confundido quanto à procedência dos produtoscomercializados.
13. A confusão e o aproveitamento econômico, no caso, pareceminevitáveis, se admitida a coexistência das marcas HARRODS darecorrente e da recorrida no Brasil, tanto mais quando se observaque estas sociedades, embora hoje estejam completamentedesvinculadas, já apareceram no passado ora como filial ora comoagente de compras uma da outra, atuando no mesmo segmentomercadológico.
14. Recurso especial não provido.” (Resp 1190341/RJ RECURSO ESPECIAL2010/0069361-0, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, data do julgamento 05/12/2013, DJe 28/02/2014.)
Informações adicionais:
VOTO VISTA MIN. MARIA ISABEL GALLOTTI
“ Não é possível a manutenção do registro de marca notoriamente conhecida em nome de empresa independente sediada na Argentina, ainda que tenha sido fundada pela matriz sediada na Inglaterra, na hipótese em que se operou a cisão entre as companhias e não houve expressa autorização da matriz para a manutenção de direitos marcários em relação à empresa independente. Isso porque, em se tratando de registro de marcas, o que deve preponderar é o interesse público e, no caso, a manutenção do registro de marca notória em nome da empresa independente causaria confusão ao consumidor que poderia pensar estar adquirindo produtos com a proveniência e chancela da empresa matriz, quando na verdade estaria adquirindo um produto de outra empresa.”
VOTO VENCIDO MIN. RAUL ARAÚJO
“ É possível a manutenção do registro de marca notoriamente conhecida em nome de empresa independente sediada na Argentina, que fora fundada pela matriz sediada na Inglaterra, ainda que se tenha operado a cisão entre as companhias, não tendo havido deliberação em sentido contrário ao uso da marca pela empresa independente. Isso porque se trata de hipótese sui generis que não enseja propriamente a aplicação de dispositivos de proteção marcária, devendo a questão ser resolvida de forma contratual entre as próprias litigantes. Não se pode olvidar o relacionamento existente entre as duas demandantes, já que uma foi criada pela outra, tendo elas, em dado momento de sua história, usado justamente o mesmo nome e marca, por fazerem parte do mesmo grupo econômico. No caso, a matriz optou por vender a empresa independente, permitindo que continuasse a existir nas mãos de outros titulares, operando regularmente, não podendo requerer a exclusividade do uso de uma marca que compartilhou com aquela que criou e deixou continuar existindo paralelamente. Acrescente-se que a manutenção do registro não implicará confusão para o consumidor, já que poderá ser facilmente instruído a esse respeito.”
RECURSO ESPECIAL. DIREITO MARCÁRIO. COLIDÊNCIA ENTRE NOME
EMPRESARIAL E MARCA. NOME EMPRESARIAL. PROTEÇÃO NO ÂMBITO DO ESTADOEM QUE REGISTRADO. PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE DO REGISTRO NO INPI.MITIGAÇÃO PELOS PRINCÍPIOS DA TERRITORIALIDADE E DA ESPECIALIDADE.RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1 - Conflito em torno da utilização da marca "Vera Cruz" entre aempresa sediada em São Paulo que a registrou no INPI em 1986 e asociedade civil que utiliza essa denominação em seu nomeempresarialdevidamente registrado na Junta Comercial do Estado do Pará desde1957.
2 - Peculiaridade da colidência estabelecida entre a marcaregistrado no INPI e o nome empresarial registrado anteriormente naJunta Comercial competente.
3 - Aferição da colidência não apenas com base no critério daanterioridade do registro no NPI, mas também pelos princípios daterritorialidade e da especialidade.
4 - Precedentes específicos desta Corte, especialmente o acórdão noRecurso Especial nº 1.232.658/SP (Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI,Terceira Turma, julgado em 12/06/2012, DJe 25/10/2012): "Para aaferição de eventual colidência entre marca e signos distintivossujeitos a outras modalidades de proteção - como o nome empresarial
e o título de estabelecimento - não é possível restringir-se àanálise do critério da anterioridade, mas deve também se levar emconsideração os princípios da territorialidade e da especialidade,como corolário da necessidade de se evitar erro, dúvida ou confusãoentre os usuários".
5. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.” (REsp1191612/PA, RECURSO ESPECIAL 2010/0078010-9, Relator Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, Data do julgamento 22/10/2013, DJe 28/10/2013)
“RECURSO ESPECIAL - PROPRIEDADE INTELECTUAL - AÇÃO ORDINÁRIA DE
ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO EMANADO DO INPI - PEDIDO JULGADO
IMPROCEDENTE, MANTENDO O INDEFERIMENTO E ARQUIVAMENTO DOREQUERIMENTO DE REGISTRO DE MARCA - SENTENÇA REFORMADA PELO TRIBUNALDE ORIGEM, A FIM DE RESTABELECER O CURSO REGULAR DO PROCEDIMENTO DEREGISTRO DO SINAL DISTINTIVO - IMPOSSIBILIDADE DE APROPRIAÇÃO DEELEMENTO COMUM - PROTEÇÃO À LIVRE INICIATIVA E COMBATE ÀCONCORRÊNCIA DESLEAL - MARCA FRACA, SEM ORIGINALIDADE MARCANTE OUCRIATIVIDADE EXUBERANTE - IMPOSIÇÃO DE CONVIVÊNCIA COM OUTRASSEMELHANTES - PRECEDENTES - RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.
Ação ordinária de anulação de ato administrativo proferido pelo INPIque indeferiu e arquivou o requerimento de registro de sinaldistintivo: "CLASSIFICADAS AMARELAS". Pedido julgado improcedente, afim de manter a exclusão registral determinada pelo órgãoadministrativo.Sentença reformada pelo Tribunal de origem, determinando orestabelecimento do curso regular do procedimento instaurado perante
oINPI para o registro da marca - "CLASSIFICADAS AMARELAS" -, aofundamento de ser signo distintivo formado por elemento comuminapropriável.
1. Conflito entre marcas: "PÁGINAS AMARELAS" e "LISTAS AMARELAS"versus "CLASSIFICADAS AMARELAS". Os sinais distintivos em análisesão constituídos por elemento comum inapropriável que expressacaracterística essencial do objeto comercializado, razão pela qualdar exclusividade ao seu uso a bem da recorrente atenta contra alivre iniciativa, tendo em vista a inexorável dificuldade deinserção de novos bens de consumo congêneres no mercado, mormente,pela impossibilidade de denomina-los por aquilo que eles realmentesão em sua essência.
1.1 Registre-se que o uso de elemento comum descritivo do serviçoprestado - "AMARELAS" - traz à mente do consumidor a imediataassociação de característica do objeto comercializado. Contudo avantagem comercial advinda deste expediente atrai, em contrapartida, o ônus de se criar um sinal distintivo fraco, semoriginalidade marcante ou criatividade exuberante, o que, em últimaanálise, impõe a sua convivência com outros símbolos comerciaisformados pela expressão comum - "AMARELAS".
2. Importa assinalar ser possível o registro perante o InstitutoNacional de Propriedade Industrial - INPI de marca formada pelacombinação de dois ou mais termos genéricos, desde que esta junçãose revista de caráter original e distintivo. Embora este tipo de
signo comercial seja passível de proteção jurídica, a tuteladestinada a ele tem abrangência menor, por ter a nova marca em suagênese elementos comuns inapropriáveis. Isto é, mesmo sendo defeso areprodução e a utilização integral de marca composta por elementoscomuns, este sinal comercial terá que conviver no mercado com outrossignos comerciais semelhantes a ele, pois a vantagem de incorporar àmarca característica descritiva do objeto comercializado atrai, emcontra partida, o ônus de se criar um sinal distintivo fraco, semoriginalidade marcante ou criatividade exuberante.
3. É notório que o contraste estabelecido pela superposição da corpreta sobre a amarela tem o efeito de destacar as informaçõesinseridas em texto assim formatado. Não é de hoje que esta técnica éusada por revistas, jornais e demais periódicos, sobretudo quando sedestina a anúncios comerciais, pois dá maior legibilidade àpublicação, favorecendo a concentração do leitor.
3.1. Embora a recorrente alegue ser pioneira na utilização destetipo de recurso gráfico para vinculação de notícias, não é possívelobstar a criação e o registro de outras marcas semelhantes, pois ossignos marcários em análise são compostos por elementos comuns, cujouso é impossível vedar ou dar exclusividade, daí que não há comoconceder tutela à pretensão que objetiva a apropriação de coisainexoravelmente comum.
4. Proibir o registro e a utilização da marca "CLASSIFICADASAMARELAS", segundo a pretensão da recorrente, prejudicaria a livreconcorrência, pois a recorrida e, de maneira reflexa, todos osdemais empresários que comercializam anúncios em folhas de coramarela teriam grandes dificuldades para inserirem seus produtos nomercado, uma vez que a expressão "AMARELAS" designa característicaessencial do objeto comercializado
5. Aponte-se, ainda, a suficiência da distintividade das marcas emanálise. Os elementos "PÁGINAS" e "LISTAS" possuem conteúdo fonéticoe gráfico aptos a se distinguir da expressão "CLASSIFICADAS", razãopela qual os sinais distintivos "PÁGINAS AMARELAS" e "LISTASAMARELAS" podem conviver com a marca "CLASSIFICADAS AMARELAS".
6. Ademais, não se vislumbra confusão apta a conduzir o consumidor aerro, pois os símbolos marcários em questão têm distinguibilidadeprópria, uma vez que a utilização das expressões "PÁGINAS", "LISTAS"e "CLASSIFICADAS" mostra-se satisfatória para discriminar osempresários fornecedores de serviços congêneres, bem como possuemhabilidade suficiente a particularizar cada produto posto nomercado.
7. Recurso especial desprovido.” (REsp 1107558 / RJ RECURSO ESPECIAL 2008/0285289-0, Relator Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, data do julgamento 01/10/2013, DJe 06/11/2013.)
“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO EMPRESARIAL. MARCA.MARCA DE ALTO RENOME. ATRIBUIÇÃO DO INPI.
1.- Na linha dos precedentes desta Corte, cabe ao InstitutoNacionalde Propriedade Industrial - INPI e não ao Poder Judiciário examinarse determinada marca atende aos requisitos para se qualificar como"marca de alto renome" e assim, na forma do artigo 125 da LPI,excepcionar o princípio da especialidade para desfrutar de proteçãoem todas as classes.
2.- Nessa seara, o Poder Judiciário somente pode ser chamado ainterver como instância de controle da atividade administrativa doINPI.
3.- Agravo Regimental improvido.” (AgRg no REsp 1165653 / RJ
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL2009/0221169-6, RelatorMinistro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, data do julgamento 17/09/2013, DJe 02/10/2013)
CONCLUSÃO
A propriedade de uma patente reveste-se em bem econômico, em negócios que têm no registro a certeza de defesa extraterritorial.
A Propriedade Industrial visa não somente à proteção jurídica, mas também servir de instrumento de política da sociedade como o intuito de promover seu desenvolvimento socioeconômico.
Neste contexto, primordial o papel do INPI na análise dos pedidos bem como do Judiciário quando necessária sua intervenção, para proteção da economia e de todos consumidores, coibindo a concorrência desleal e primando pelos interesses de seus legítimos titulares, de forma a fomentar o desenvolvimento econômico do país.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
- FAZZIO JR., Waldo. Manual de direito comercial. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004.
- COELHO, Fabio Ulhoa. Manual de direito comercial. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
- RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito Empresarial Esquematizado. 1. ed. São Paulo: Método, 2011.
- REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. V. 1.
- CERQUEIRA, João da Gama Cerqueira, Tratado da Propriedade Industrial, RT, 1982, v. 1º, pp. 305/6, nº 114,
- LOUREIRO, Luiz Guilherme de A V..A Lei de Propriedade Industrial Comentada.
- CAMPOS, Francisco, Pareceres do Consultor Geral da República, Rio de Janeiro, 1951, v. I, p. 622.
- HERING, Rudolf Von. A Evolução do Direito. (Zweck Im Recht). Livraria Progresso editora, 2ª edição. Pag:242 pt 138.
Procuradora Federal
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SIXTO, Luisa Webber Troian. A proteção da propriedade industrial e o papel do INPI - Instituto Nacional de Propriedade Industrial na defesa da ordem econômica e dos consumidores Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 nov 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41535/a-protecao-da-propriedade-industrial-e-o-papel-do-inpi-instituto-nacional-de-propriedade-industrial-na-defesa-da-ordem-economica-e-dos-consumidores. Acesso em: 23 dez 2024.
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