RESUMO: O presente artigo versa sobre a extensão da estabilidade prevista no parágrafo único, do artigo 7º, da Lei nº 7.783/1989, aos trabalhadores que integram a categoria profissional participante do movimento paredista. Concluiu-se que também são beneficiários dessa estabilidade provisória os trabalhadores que, embora aderentes ao movimento paredista, continuam a prestar os seus serviços em razão do disposto nos artigos 9º e 11 dessa Lei. Além disso, concluiu-se também que a estabilidade provisória também é garantida aos trabalhadores que, apesar de integrarem a categoria profissional envolvida na greve, não aderiram ao movimento paredista.
Palavras-chave: Greve. Estabilidade provisória. Trabalhador.
INTRODUÇÃO
O artigo 7º, parágrafo único, da Lei nº 7.783/1989, veda a rescisão de contrato de trabalho durante a greve, sendo um importante direito para evitar a frustração do movimento paredista.
Entretanto, o referido dispositivo legal não é claro ao estabelecer se a garantia nele prevista é aplicável aos trabalhadores que não aderiram à greve e continuaram prestando serviços ao empregador.
Nesse contexto, o presente artigo visa identificar o melhor entendimento aplicável a essa problemática.
1. DO DIREITO DE GREVE
A greve é um direito fundamental dos trabalhadores, garantido no artigo 9º da Constituição Federal vigente, que assim dispõe:
Art. 9º É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.
§ 1º - A lei definirá os serviços ou atividades essenciais e disporá sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.
§ 2º - Os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da lei.
Esse direito foi regulamentado pela Lei nº 7.783/1989, cujo artigo 1º estabelece que:
Art. 1º É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.
Parágrafo único. O direito de greve será exercido na forma estabelecida nesta Lei.
Pode-se definir a greve como sendo a paralisação coletiva pelos trabalhadores da prestação pessoal de serviços ao empregador.
Nas lições de Delgado (2013, p. 1446), considerando a evolução normativa da greve, esse instituto jurídico seria:
[...] a paralisação coletiva provisória, parcial ou total, das atividades dos trabalhadores em face de seus empregadores ou tomadores de serviços, com o objetivo de exercer-lhes pressão visando à defesa ou conquista de interesses coletivos, ou com objetivos sociais mais amplos.
O ordenamento jurídico brasileiro garante aos trabalhadores o exercício da greve, entretanto, impõe que sejam observados os requisitos estabelecidos pela Lei nº 7.783/1989, sob pena de o movimento ser considerado abusivo e os participantes serem responsabilidade segundo a legislação trabalhista, civil ou penal.
Dentre os requisitos legais, destaca-se a exigência de tentativa de negociação ou de utilização de recursos via arbitral; a notificação da entidade patronal correspondente ou dos empregadores diretamente interessados com antecedência mínima de 48 horas, exceto em serviços ou atividades essenciais, em que a antecedência mínima deverá ser de 72 horas; e autorização da assembleia geral da entidade sindical obreira correspondente, salvo o caso de sua inexistência, situação em que será necessária a aprovação da comissão de negociação constituída para esse fim.
Além disso, a Lei nº 7.783/1989 estabelece alguns deveres aos trabalhadores, durante o movimento grevista, como a manutenção em atividade, mediante acordo entre os envolvidos, de equipes de empregados com o propósito de assegurar os serviços cuja paralisação resulte em prejuízo irreparável, pela deterioração irreversível de bens, máquinas e equipamentos, bem como a manutenção daqueles essenciais à retomada das atividades da empresa quando da cessação do movimento (artigo 9º).
Outrossim, nos serviços ou atividades essenciais, os envolvidos deverão, de comum acordo, garantir, durante a greve, a prestação dos serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade (artigo 11).
Portanto, verifica-se que, durante a greve, haverá trabalhadores que não suspenderão a prestação pessoal de serviços, apesar de eles terem aderido ao movimento paredista.
Ademais, também haverá trabalhadores que continuarão prestando os seus serviços durante a greve, em decorrência de sua não adesão ao movimento. Assim sendo, os seus contratos de trabalho não serão considerados suspensos, como prevê o artigo 7º, da Lei de Greve:
Art. 7º Observadas as condições previstas nesta Lei, a participação em greve suspende o contrato de trabalho, devendo as relações obrigacionais, durante o período, ser regidas pelo acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho.
Isto posto, passa-se ao estudo da estabilidade prevista na Lei nº 7.783/1989.
2. DA ESTABILIDADE PREVISTA NA LEI DE GREVE
A Lei nº 7.783/1989 prevê estabilidade provisória durante o movimento grevista nos seguintes termos:
Art. 7º Observadas as condições previstas nesta Lei, a participação em greve suspende o contrato de trabalho, devendo as relações obrigacionais, durante o período, ser regidas pelo acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho.
Parágrafo único. É vedada a rescisão de contrato de trabalho durante a greve, bem como a contratação de trabalhadores substitutos, exceto na ocorrência das hipóteses previstas nos arts. 9º e 14.
Sobre esse tema, Cairo Júnior (2012, p. 1095) explica que a manutenção do emprego é o principal direito dos empregados que deflagram e participam da greve:
O principal direito dos empregados que deflagram e participam da greve consiste na manutenção dos respectivos contratos de trabalho. Desse modo, o empregador não pode extinguir o contrato de trabalho daqueles empregados que participaram ou participam do movimento paredista, conforme determina o art. 7º, parágrafo único, da Lei nº 7.783/89.
Dessa forma, Cairo Júnior (2012) indica que a estabilidade provisória é direito dos trabalhadores participantes do movimento grevista, logo, beneficia os trabalhadores que efetivamente suspenderam a prestação pessoal dos serviços e, também, aqueles que, inobstante a sua adesão à greve, continuam prestando os seus serviços em razão dos acordos previstos nos artigos 9º e 11 da Lei nº 7.783/1989.
Ainda com relação a esse ponto, Delgado (2013, p. 1458) leciona que é direito do trabalhador paredista a “proteção contra a dispensa por parte do empregador (o contrato de trabalho encontra-se suspenso, juridicamente – art. 7º, Lei de Greve)”.
No mesmo sentido, Cassar (2013, p. 1279) conclui que “a consequência lógica da suspensão do contrato é a proibição do empregador em despedir, sem justa causa, os empregados que aderiram o movimento paredista”.
Esses autores parecem fundamentar a estabilidade provisória na suspensão do contrato de trabalho durante o movimento paredista, de forma que, caso esse fosse o único fundamento da garantia provisória de emprego, não beneficiaria os trabalhadores não aderentes da greve e aqueles que, embora aderentes do movimento, continuassem a prestar os seus serviços em decorrência dos artigos 9º e 11 da Lei nº 7.783/1989.
No que se refere aos trabalhadores que, embora aderentes do movimento paredista, continuam a prestar os seus serviços por consequência dos artigos 9º e 11 da Lei nº 7.783/1989, mister reconhecer que eles são beneficiários da estabilidade provisória.
Isso porque o caput do artigo 7º estabelece que “a participação em greve suspende o contrato de trabalho”, logo, mesmo havendo prestação dos serviços em razão dos acordos previstos nos artigos 9º e 11 da Lei nº 7.783/1989, os contratos de trabalho desses empregados estariam suspensos, por expressa determinação legal.
Por sua vez, no próximo tópico, será analisada a situação dos trabalhadores não aderentes da greve e que, portanto, continuam prestando os seus serviços durante o movimento paredista.
3. APLICABILIDADE DA ESTABILIDADE PREVISTA NA LEI DE GREVE AO TRABALHADOR QUE NÃO ADERIU AO MOVIMENTO PAREDISTA
O artigo 7º, caput, da Lei nº 7.783/1989, prevê expressamente que a participação em greve suspende o contrato de trabalho, abrangendo tanto os trabalhadores que suspenderam a prestação de serviços, quanto aqueles que continuaram trabalhando em razão da exigência contida nos artigos 9º e 11 dessa lei.
Não se podem considerar suspensos os contratos de trabalho dos empregados que, por não terem aderido ao movimento grevista, continuaram a prestar pessoalmente os seus serviços ao empregador.
Dessa forma, caso se adote a suspensão do contrato de trabalho como o único fundamento da estabilidade provisória no emprego, os trabalhadores que não aderiram à greve e continuaram a prestar serviços ao empregador não seriam beneficiários do direito à garantia provisória de emprego prevista no parágrafo único, do artigo 7º, da Lei de Greve.
Nesse sentido, defendendo que a estabilidade provisória deve ser garantida apenas aos aderentes ao movimento paredista, alguns doutrinadores sustentam que o parágrafo único, do artigo 7º, da Lei n.º 7.783/89, deve ser interpretado de forma harmônica com o caput, e não de forma isolada; e que a estabilidade provisória no emprego seria uma medida para evitar retaliações aos grevistas.
Entretanto, entende-se que essa não é a melhor posição acerca do tema.
Com efeito, o parágrafo único, do artigo 7º, da Lei n.º 7.783/89, dispõe que “é vedada a rescisão de contrato de trabalho durante a greve”, não cabendo ao intérprete incluir uma restrição não prevista em lei, no sentido de que essa garantia se aplicaria apenas aos participantes do movimento grevista.
Outrossim, a greve atinge toda a categoria profissional, não havendo um ato formal em que cada trabalhador manifeste a sua vontade em aderir ao movimento paredista, de forma que o trabalhador pode não estar participando do movimento em um dia e, no dia seguinte, resolver aderir à paralisação.
Diante dessa impossibilidade de se definir exatamente o momento em que cada trabalhador aderiu ao movimento paredista, a garantia provisória de emprego deve ser estendida a todos integrantes da categoria envolvida ou do quadro de empregados das empresas afetadas.
Não se deve olvidar, ainda, que não garantir o direito à estabilidade provisória aos trabalhadores não participantes do movimento grevista seria o mesmo que constrange-los a aderirem à greve, o que violaria o princípio da liberdade sindical e configuraria conduta antissindical vedada pelo artigo 6º, § 1º, da Lei nº 7.783/1989, que assim dispõe:
Art. 6º São assegurados aos grevistas, dentre outros direitos:
I - o emprego de meios pacíficos tendentes a persuadir ou aliciar os trabalhadores a aderirem à greve;
II - a arrecadação de fundos e a livre divulgação do movimento.
§ 1º Em nenhuma hipótese, os meios adotados por empregados e empregadores poderão violar ou constranger os direitos e garantias fundamentais de outrem.
Finalmente, merece registrar que o Tribunal Superior do Trabalho possui julgado que concluiu pela impossibilidade, em regra, do empregador rescindir os contratos de trabalho no decurso de greve, ainda que não se trate de trabalhador grevista, consoante a ementa abaixo transcrita:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. DEFLAGRAÇÃO DE GREVE PELA CATEGORIA. RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO DO RECLAMANTE SEM JUSTA CAUSA, NO CURSO DA GREVE. TRABALHADOR QUE NÃO ADERIU AO MOVIMENTO PAREDISTA. ART. 7º DA LEI 7.783/89. INDENIZAÇÃO. Demonstrado no agravo de instrumento que o recurso de revista preenchia os requisitos do art. 896 da CLT, ante a constatação de violação, em tese, do art. 7º da Lei 7.783/89. Agravo de instrumento provido. RECURSO DE REVISTA. DEFLAGRAÇÃO DE GREVE PELA CATEGORIA. RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO DO RECLAMANTE SEM JUSTA CAUSA, NO CURSO DA GREVE. TRABALHADOR QUE NÃO ADERIU AO MOVIMENTO PAREDISTA. ART. 7º DA LEI 7.783/89. INDENIZAÇÃO. O instituto da greve, ao ser incorporado pela ordem jurídica como um direito, acaba por encontrar nela suas próprias potencialidades e limitações e, entre as potencialidades, está a proteção de dispensa dos trabalhadores, conforme art. 7º, parágrafo único, da Lei 7.783/89. Nessa medida, também o art. 6º da Lei 7.783/89 desautoriza a adoção de condutas antissindicais. Assim, em regra, não será possível ao empregador rescindir os contratos de trabalho no decurso de greve, ainda que não se trate de trabalhador grevista. No caso dos autos, verifica-se que o Reclamante foi dispensado sem justa causa em 21/3/2011, depois de deflagrada greve na categoria em 18/3/2011. Tem-se, com isso, que o ato de dispensa sem justa causa do empregado configura conduta antissindical da empresa. Nessa circunstância, compreende-se razoável fixar indenização como forma de compensação pelo ato ilícito praticado pela empregadora, além de ostentar recomendável diretriz pedagógica. Recurso de revista conhecido e parcialmente provido.
(RR - 1810-20.2011.5.02.0462 , Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 03/09/2014, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 19/09/2014).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ante o exposto, conclui-se que a greve, direito fundamental dos trabalhadores, regulamentado pela Lei nº 7.783/1989, é a paralisação coletiva pelos trabalhadores da prestação pessoal de serviços ao empregador.
Constata-se que o parágrafo único, do artigo 7º, da Lei de Greve, garante estabilidade provisória no emprego durante a greve a todos os integrantes da categoria profissional envolvida no movimento paredista.
Portanto, conclui-se que também são beneficiários dessa estabilidade provisória os trabalhadores que, embora aderentes ao movimento paredista, continuam a prestar os seus serviços em razão do disposto nos artigos 9º e 11 dessa Lei.
Finalmente, conclui-se que a estabilidade provisória também é garantida aos trabalhadores que, apesar de integrarem a categoria profissional envolvida na greve, não aderiram ao movimento paredista e continuaram prestando serviços ao empregador.
REFERÊNCIAS
CAIRO JÚNIOR, José. Curso de direito do trabalho. 7. ed. Salvador: Juspodivm, 2012.
CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 8. ed. São Paulo: Método, 2013.
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 12. ed. São Paulo: Ltr, 2013.
TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. 3ª Turma. RR - 1810-20.2011.5.02.0462. Relator: Ministro: Mauricio Godinho Delgado. Brasília, 03/09/2014. DEJT 19/09/2014.. Disponível a partir de: <http://aplicacao5.tst.jus.br/consultaunificada2/inteiroTeor.do?action=printInteiroTeor&format=html&highlight=true&numeroFormatado=RR%20-%201810-20.2011.5.02.0462&base=acordao&rowid=AAANGhABIAAAGpnAAU&dataPublicacao=19/09/2014&localPublicacao=DEJT&query=>. Acesso em: 30 out. 2014.
Procurador Federal e Professor do curso de Direito da Fundação Universidade do Tocantins. Pós-graduado em Direito Tributário e em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUZA, Renan Marcel Bispo de. Aplicabilidade da estabilidade prevista na lei de greve ao trabalhador não participante do movimento paredista Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 nov 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41554/aplicabilidade-da-estabilidade-prevista-na-lei-de-greve-ao-trabalhador-nao-participante-do-movimento-paredista. Acesso em: 23 dez 2024.
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