RESUMO: O presente artigo analisa o direito do estagiário ao recesso, segundo as prescrições da Lei nº 11.788/2008, que dispõe sobre o estágio de estudantes e dá outras providências, e da Orientação Normativa SGP/MPOG Nº 04/2014, que estabelece orientações sobre a aceitação de estagiários no âmbito da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional. Nesse sentido, este estudo aborda, quanto ao estágio, os seus tipos, jornada de atividade e duração; e, com relação ao recesso, a sua extensão e possibilidade de fracionamento.
Palavras-chave: Recesso. Estagiário. Administração Pública Federal.
INTRODUÇÃO
As relações de estágio são reguladas, atualmente, pela Lei nº 11.788/2008, que revogou a Lei nº 6.494/1977 e trouxe diversas inovações no regramento dessa espécie de relação de trabalho.
Nesse sentido, diferentemente da norma atual, a lei revogada não previa a concessão obrigatória de um recesso aos estagiários, havia a prescrição apenas de que, nos períodos de férias escolares, a jornada de estágio seria estabelecida de comum acordo entre o estagiário e a parte concedente do estágio, sempre com interveniência da instituição de ensino.
Ocorre que o descanso anual é indispensável a qualquer trabalhador, inclusive ao estagiário, uma vez que visa à garantia de sua saúde física e mental.
Isto posto, o presente artigo analisará os principais aspectos relativos ao recesso do estagiário previsto na Lei nº 11.788/2008 e na Orientação Normativa SGP/MPOG Nº 04/2014.
1. DA RELAÇÃO DE ESTÁGIO
A relação de estágio se encontra regulada pela Lei nº 11.788/2008, que define o estágio nos seguintes termos:
Art. 1o Estágio é ato educativo escolar supervisionado, desenvolvido no ambiente de trabalho, que visa à preparação para o trabalho produtivo de educandos que estejam frequentando o ensino regular em instituições de educação superior, de educação profissional, de ensino médio, da educação especial e dos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e adultos.
Conforme os ditames da mencionada lei, o estágio poderá ser obrigatório, aquele cuja carga horária é requisito para aprovação e obtenção de diploma, ou não-obrigatório, aquele desenvolvido como atividade opcional.
Noutro ponto, a referida lei prevê que o estágio obrigatório poderá ser remunerado ou não remunerado; e o não-obrigatório deverá ser realizado mediante o pagamento de contraprestação e de auxílio-transporte.
A relação de estágio não gera vínculo de emprego desde que presentes os requisitos previstos nos incisos do artigo 3º, da Lei de Estágio, quais sejam:
I – matrícula e freqüência regular do educando em curso de educação superior, de educação profissional, de ensino médio, da educação especial e nos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e adultos e atestados pela instituição de ensino;
II – celebração de termo de compromisso entre o educando, a parte concedente do estágio e a instituição de ensino;
III – compatibilidade entre as atividades desenvolvidas no estágio e aquelas previstas no termo de compromisso.
Ademais, a Lei nº 11.788/2008 estabelece que a jornada de atividade em estágio não poderá exceder de seis horas diárias, salvo nos casos de estudantes de educação especial e dos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional de educação de jovens e adultos, quando ela não poderá ultrapassar quatro horas diárias.
Uma importante inovação da nova norma foi o estabelecimento da duração máxima do estágio, na mesma parte concedente, de dois anos, salvo quando se tratar de estagiário portador de necessidades especiais, situação em que a relação de estágio poderá ser mantida até a conclusão do curso em que o estudante esteja matriculado.
Feitas essas considerações, passa-se a analisar um dos principais direitos conquistados pelos estagiários por meio da Lei nº 11.788/2008, o período de recesso.
2. DO DIREITO AO RECESSO
A Lei nº 11.788/2008 estabelece que:
Art. 13. É assegurado ao estagiário, sempre que o estágio tenha duração igual ou superior a 1 (um) ano, período de recesso de 30 (trinta) dias, a ser gozado preferencialmente durante suas férias escolares.
§ 1o O recesso de que trata este artigo deverá ser remunerado quando o estagiário receber bolsa ou outra forma de contraprestação.
§ 2o Os dias de recesso previstos neste artigo serão concedidos de maneira proporcional, nos casos de o estágio ter duração inferior a 1 (um) ano.
Pode-se definir o recesso como o período em que, não obstante a relação de estágio continuar em vigor, fica sustada a principal obrigação do estagiário: a prestação de suas atividades.
Entende-se que o recesso, assim como as férias, possui a finalidade de garantir a saúde do estagiário e de contribuir para sua maior integração familiar e social.
Logo, o recesso constitui verdadeira medida de saúde e segurança no trabalho, cujas normas são aplicáveis ao estagiário por determinação do artigo 14, da Lei nº 11.788/2008, que prescreve:
Art. 14. Aplica-se ao estagiário a legislação relacionada à saúde e segurança no trabalho, sendo sua implementação de responsabilidade da parte concedente do estágio.
Desse modo, o artigo 13, da Lei do Estágio, é norma de ordem pública, logo, o direito ao recesso é irrenunciável e indisponível, sendo inválido qualquer acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a sua supressão ou redução.
Segundo o artigo 14, § 1º, da Lei nº 11.788/2008, nos casos de estágio remunerado, o recesso necessariamente será remunerado, não havendo essa obrigatoriedade quando se tratar de estágio sem contraprestação.
Ademais, entende-se que o recesso deverá ser gozado dentro da vigência do termo de compromisso de estágio, preferencialmente durante as férias escolares.
A nova Lei do Estágio garante ao estagiário um período de recesso correspondente a trinta dias, nos casos em que a relação é celebrada por prazo igual ou superior a um ano; ou, se o estágio tiver duração inferior a um ano, o recesso será por período proporcional, correspondente a dois dias e meio por mês de vigência do termo de compromisso.
Nesse ponto, considerando que a duração do estágio poderá ser de até dois anos, salvo quando se tratar de estagiário portador de necessidades especiais, discute-se sobre o período do recesso nos casos em que o estágio é celebrado pelo prazo máximo de dois anos.
A partir de uma interpretação literal do artigo 14, caput, da Lei do Estágio, é possível concluir que a duração máxima do recesso será de trinta dias, mesmo que o termo de compromisso do estágio seja celebrado por período superior a um ano.
Sobre o tema, Cassar (2013, p. 319) leciona que:
Recesso de 30 dias, preferencialmente durante as férias escolares, de forma remunerada para os estágios remunerados e não remunerado para o estágio não remunerado, e em qualquer hipótese desde que o período de estágio seja superior a 1 ano (art. 13).
Por sua vez, Cairo Júnior (2012, p. 161) explica que a nova legislação (Lei nº 11.788/2008) assegura “o direito a trinta dias de férias (recesso), a serem gozadas preferencialmente durante as férias escolares, para os estágios com duração igual ou superior a um ano”.
Dessa forma, esses autores parecem adotar o entendimento de que a duração máxima do recesso será de trinta dias, ainda que o termo de compromisso do estágio seja firmado pelo prazo máximo de dois anos.
Entretanto, Delgado (2013, p. 326) cita essa garantia decorrente da nova norma legal como “recesso anual de 30 dias, ou proporcional a período de estágio menor, inclusive com pagamento, caso se trate de estágio remunerado (art. 13 e seus parágrafos)”.
Tendo em vista a utilização da expressão “recesso anual”, esse doutrinador segue a corrente que defende a duração do recesso como sendo de trinta dias por ano de estágio, de maneira que o recesso será de sessenta dias nos casos em que o termo de compromisso for celebrado pelo período máximo de dois anos.
A Cartilha esclarecedora sobre a lei do estágio: lei nº 11.788, de 25 de setembro de 2008, elaborada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (2008, p. 28), responde que:
52. O estagiário tem direito a recesso?
Sim. É assegurado ao estagiário, sempre que o estágio tenha duração igual ou superior a 1 (um) ano, período de recesso de 30 (trinta) dias. Nos casos de o estágio ter duração inferior a 1 (um) ano os dias de recesso serão concedidos de maneira proporcional.(caput e § 2º do art. 13 da Lei 11.788/2008).
O Instituto Euvaldo Lodi (2010, p. 37-38), por meio da cartilha Lei de Estágio: tudo o que você precisa saber, explica que:
7.8 Recesso
É assegurado ao estagiário, sempre que o estágio tenha duração igual ou superior a um ano, período de recesso de 30 (trinta) dias, a ser gozado preferencialmente durante suas férias escolares.
Nos casos de o estágio ter duração inferior a um ano, os dias de recesso serão concedidos de maneira proporcional.
Portanto, verifica-se que o Ministério do Trabalho e Emprego e o Instituto Euvaldo Lodi também adotam o entendimento de que, segundo a Lei do Estágio, o recesso terá duração máxima de trinta dias, ainda que o termo de estágio seja celebrado por prazo superior a um ano.
Não obstante a divergência de entendimentos em relação ao que determina a Lei nº 11.788/2008, pondera-se que a parte concedente, pessoa que oferece o estágio, possui a liberdade para ampliar o prazo de trinta dias, sendo vedado apenas a sua supressão ou redução.
Por essa razão, é comum encontrar estagiários gozando recesso com duração maior do que trinta dias, nos casos em que o estágio é celebrado por prazo superior a um ano.
Finalmente, é oportuno destacar que não há previsão de fracionamento do recesso pela Lei nº 11.788/2008.
Com relação a esse ponto, a cartilha Lei de Estágio: tudo o que você precisa saber, do Instituto Euvaldo Lodi (2010, p. 37-38), explica que:
7.8 Recesso
[...]
A lei não proíbe o fracionamento do recesso. Assim, entende-se que é possível fracioná-lo. Todavia, recomenda-se que: a) o recesso seja fracionado, no máximo, em dois períodos; b) o recesso não seja fracionado quando inferior a 20 (vinte) dias, de modo que nenhum período de recesso seja inferior a 10 (dez) dias; c) no recesso fracionado, pelo menos um dos períodos coincida com as férias escolares.
Igualmente, a Cartilha esclarecedora sobre a lei do estágio: lei nº 11.788, de 25 de setembro de 2008, elaborada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (2008, p. 28), prevê que “O recesso poderá ser concedido em período contínuo ou fracionado, conforme acordado entre as partes, preferencialmente nas férias escolares”.
Entretanto, não parece ser o melhor entendimento a posição adotada pelo Ministério do Trabalho e Emprego e pelo Instituto Euvaldo Lodi, quanto à possibilidade de fracionamento do período de recesso.
Com efeito, a lei não permite o fracionamento do recesso, que é garantido por norma de ordem pública, visando à proteção da saúde do estagiário, logo, dotado do caráter de indisponibilidade.
Ademais, embora o descanso em análise não se confunda com férias, às quais não tem direito o estagiário, os dois institutos jurídicos possuem finalidades semelhantes, como mencionada no início deste tópico.
Assim sendo, merece ser aplicado ao descanso do estagiário o postulado de que as férias, em regra, não podem ser fracionadas, salvo em casos excepcionais; bem como a vedação de fracionamento quando se tratar de trabalhadores menores de dezoito anos ou maiores de cinquenta anos de idade.
Nesse sentido, dispõe o artigo 134, da CLT:
Art. 134 - As férias serão concedidas por ato do empregador, em um só período, nos 12 (doze) meses subseqüentes à data em que o empregado tiver adquirido o direito.
§ 1º - Somente em casos excepcionais serão as férias concedidas em 2 (dois) períodos, um dos quais não poderá ser inferior a 10 (dez) dias corridos.
§ 2º - Aos menores de 18 (dezoito) anos e aos maiores de 50 (cinqüenta) anos de idade, as férias serão sempre concedidas de uma só vez.
Diante do exposto, entende-se que o período do recesso do estagiário, regra geral, não pode ser objeto de fracionamento.
Isto posto, no próximo tópico, será analisada a regulamentação do recesso do estagiário no âmbito da Administração Pública Federal.
3. DO RECESSO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL
A Orientação Normativa nº 04, de 4 de julho de 2014, expedida pela Secretária de Gestão Pública do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, estabelece orientações sobre a aceitação de estagiários no âmbito da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional.
Quanto ao direito ao período de recesso, a mencionada orientação normativa prescreve que:
Art. 15 - Na vigência dos contratos de estágio obrigatório e não obrigatório é assegurado ao estagiário período de recesso proporcional ao semestre efetivamente estagiado, a ser usufruído preferencialmente nas férias escolares, observada a seguinte proporção:
I - um semestre, 15 dias consecutivos;
II - dois semestres, 30 dias;
III - três semestres, 45 dias; e
IV - quatro semestres, 60 dias.
§ 1º Os períodos de recesso deverão ser usufruídos durante a vigência do TCE e aqueles de que tratam os incisos II a IV do caput deste artigo poderão ser parcelados em até três etapas, a critério do supervisor do estágio.
§ 2º Os períodos de recesso do estagiário que perceba bolsa estágio serão remunerados.
§ 3º Na hipótese dos desligamentos de que tratam os incisos I a VII do art. 16, o estagiário que receber bolsa-estágio e não houver usufruído do recesso remunerado, proporcional ou integral, durante a vigência do contrato celebrado, fará jus ao seu recebimento em pecúnia.
Como se vê, constata-se que a União utilizou da faculdade de ampliar o período do recesso previsto na Lei nº 11.788/2008, de forma que é possível o gozo de até sessenta dias de descanso, quando o estágio tiver duração de dois anos.
Quanto ao alargamento do período de recesso, entende-se que a orientação normativa não incorreu em violação à lei, uma vez que o ordenamento jurídico veda apenas a supressão ou a redução do direito do estagiário, podendo ser aplicado o postulado da aplicação da norma mais favorável.
Noutro ponto, a orientação normativa permite o fracionamento do período de recesso do estagiário, a critério do supervisor do estágio, até o máximo de três etapas, desde que cada período não seja inferior a quinze dias.
Finalmente, merece destacar que, nos estágios remunerados, caso o estagiário não usufrua o recesso durante a vigência do termo de compromisso de estágio, ele terá direito ao seu recebimento em dinheiro.
Contudo, a orientação normativa silencia acerca da não concessão do descanso nos casos de estágio não remunerado, situação em que alguns juristas defendem que o estagiário fará jus a uma indenização correspondente, com fundamento no princípio da vedação do enriquecimento sem causa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, conclui-se que o recesso é direito irrenunciável e indisponível do estagiário, configurando-se medida de saúde e segurança no trabalho, garantido por norma de ordem pública, sendo inválido qualquer acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a sua supressão ou redução.
Outrossim, conclui-se que, salvo norma mais favorável estabelecida por quem oferecer o estágio, o período de recesso corresponde a trinta dias, nos casos em que a relação é celebrada por prazo igual ou superior a um ano; ou, se o estágio tiver duração inferior a um ano, o recesso corresponde a dois dias e meio por mês de vigência do termo de compromisso.
Quanto à possibilidade de fracionamento do recesso, verifica-se que não há permissão na Lei nº 11.788/2008, sendo admissível apenas em casos excepcionais.
Finalmente, quando a Administração Pública Federal for o poder concedente, o período de recesso corresponderá a 15 dias por semestre de vigência do termo de estágio, até o máximo de 60 dias; e será permitido o fracionamento do período de recesso, desde que cada etapa não seja inferior a quinze dias.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Cartilha esclarecedora sobre a lei do estágio: lei nº 11.788, de 25 de setembro de 2008. Brasília: MTE, SPPE, DPJ, CGPI, 2008. Disponível a partir de: <http://portal.mte.gov.br/data/files/FF8080812CD2239D012CDFC2CA6F44A7/capa-cartilha-estagio-web.pdf>. Acesso em: 05 nov. 2014.
CAIRO JÚNIOR, José. Curso de direito do trabalho. 7. ed. Salvador: Juspodivm, 2012.
CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 8. ed. São Paulo: Método, 2013.
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 12. ed. São Paulo: Ltr, 2013.
INSTITUTO EUVALDO LODI. Lei de Estágio: tudo o que você precisa saber. Brasília, 2010. Disponível a partir de: <http://arquivos.portaldaindustria.com.br/app/conteudo_18/2012/03/23/136/20121018153717346023i.pdf>. Acesso em: 05 nov. 2014.
Procurador Federal e Professor do curso de Direito da Fundação Universidade do Tocantins. Pós-graduado em Direito Tributário e em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUZA, Renan Marcel Bispo de. O recesso do estagiário à luz da lei do estágio e da orientação aplicável à Administração Pública Federal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 12 nov 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41594/o-recesso-do-estagiario-a-luz-da-lei-do-estagio-e-da-orientacao-aplicavel-a-administracao-publica-federal. Acesso em: 23 dez 2024.
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