RESUMO: A Filosofia do Direito mostra-se como peça fundamental na efetivação dos direitos do homem, considerando os seus anseios e expectativas mais profundas, pois baseia-se na intersubjetividade, na incompletude das normas e na busca de respostas para as questões jurídicas com alicerce em aspectos circunstanciais, temporais e espaciais, não se subsumindo estritamente à tecnicidade do Direito, portanto.
Palavras-chaves: Filosofia do Direito; incompletude; intersubjetividade.
1. INTRODUÇÃO:
Primeiramente, deve-se ter em mente que a Filosofia do Direito é um ramo da filosofia, e não um ramo da Ciência do Direito e muito menos da Dogmática Jurídica.
A Filosofia do Direito faz reflexão sobre questões jurídicas essenciais, sobre problemas jurídicos fundamentais, discutindo-os e dando-lhes, tanto quanto possível, uma resposta. Tenta responder, por exemplo, o que é o direito, em que circunstâncias, em que medida e de que forma existe conhecimento de direito.
Enquanto o argumento da Dogmática Jurídica é imanente ao sistema vigente e permanece intocado, a Filosofia do Direito tenta indagar aquilo que está por detrás dos problemas e pressupostos fundamentais das ciências e dos sistemas, tomando, assim, uma atitude que transcende os sistemas.
Desse modo, conclui-se que a Filosofia do Direito e a Dogmática Jurídica são distintas e não há uma relação de hierarquia entre elas.
2. O ÄMBITO DA FILOSOFIA DO DIREITO:
A filosofia não se preocupa com as particularidades, mas com o todo, com o contexto, com o essencial. Ademais, não possui um objeto material e o seu objeto formal é indefinido, pois trata do “ser em geral” (universalidade do objeto formal).
O filósofo deve reconhecer o todo, mas a razão humana está estruturada de tal modo que o homem só consegue focar o particular. Assim, mesmo quando a filosofia se dirige ao todo, ela acaba por se realizar apenas no particular.
A filosofia requer interação, intersubjetividade, consenso, convergência, constituindo a variedade dos pontos de vista e o pluralismo da doutrina uma condição necessária para o seu completo desenvolvimento, afastando, assim, o famigerado problema do relativismo filosófico da Filosofia do Direito.
Na filosofia, não existe urgência em procurar um sentido para as perguntas. Em princípio, é possível chegar ao todo a partir de qualquer detalhe, desde que se proceda corretamente, isto é, a parte não pode ser conhecida sem a (pré)-compreensão do todo e o todo só se conclui a partir do conhecimento da parte (relação parte-todo).
O número das perguntas e dos problemas jurídico-filosóficos possíveis é infinito, o que distingue a filosofia das ciências particulares, nas quais é limitado a priori o número de problemas.
A correta formulação de perguntas filosóficas constitui um problema de grande alcance e de responsabilidade científica considerável: uma filosofia só pode ser compreendida a partir das questões que coloca.
Como a filosofia de uma época não perspectiva o todo, a filosofia de um novo tempo tem a tarefa de captar e dominar as partes até então desprezadas. Desse modo, colocam-se constantemente à filosofia, a partir da história, tarefas novas e diferenciadas.
3. A NECESSÁRIA INCOMPLETUDE DA FILOSOFIA DO DIREITO E SEU CONTRAPONTO COM A TEORIA DO DIREITO:
O erro do cientismo refere-se à sobrevalorização da ciência (particular e dogmática) numa orientação parcial do pensamento jurídico-científico.
Afirmações filosóficas nunca representam soluções acabadas, sendo apenas aspectos, linhas de visão, que se mostram essenciais numa certa perspectiva espaço-temporal.
Uma formação de escolas contradiz a natureza da filosofia, pois causam um endurecimento da opinião da escola ao deixar de se abrir para outras correntes. Só o que está em aberto, o incompleto, o que questiona está vivo.
Somente por razões históricas a Filosofia do Direito encontra-se ao lado de uma Teoria do Direito. O que está em causa é a emancipação face à filosofia; o jurista quer responder ele próprio às questões filosóficas do direito, através de uma “filosofia dos juristas” por ele dirigida. Ressalte-se aqui que, originariamente, todas as ciências naturais estavam indissociavelmente ligadas à filosofia.
Em suma, até hoje não existe nenhum critério que permita estabelecer as fronteiras entre a Teoria do Direito e a Filosofia do Direito, mas podem-se diferenciar os seus núcleos: na Teoria do Direito, o interesse recai mais sobre os momentos formais e estruturais; na Filosofia do Direito, sobre o conteúdo.
4. ORIGENS DA FILOSOFIA DO DIREITO:
A filosofia está sujeita à historicidade (regularidade), tendo Jaspers apontado 3 (três) origens principais da filosofia: o espanto; a dúvida e; a comoção, que correspondem, respectivamente, a três disciplinas da filosofia: a ontologia, a teoria do conhecimento e a filosofia da existência.
4.1. O Espanto e a Ontologia (o mundo como objetividade):
Toda filosofia ontológica se dirige, primordialmente, ao objeto, ao ser, que, em princípio, está indisponível.
A ontologia parte do princípio de que alguma coisa “é”, independentemente de nosso pensamento, baseando-se na confiança no ser, que se orienta pela realidade objetiva.
Uma verdadeira doutrina do direito só será possível onde o direito for apreendido como uma realidade que existe por natureza, onde não seja negada a essencialidade do direito, independentemente do nosso pensar e do nosso querer.
Em última instância, a doutrina do direito natural é sempre ontologia do direito.
4.2. A Dúvida e a Teoria do Conhecimento (o mundo como subjetividade):
Aqui a consciência, e não o ser, é a origem.
O ser é qualificado como um produto da consciência. O homem torna-se a medida de todas as coisas (Protágoras).
A filosofia torna-se absolutamente subjetivista, torna-se a filosofia da consciência. Prioriza-se o conhecimento, a consciência, o método, em detrimento do ser, do objeto, da coisa. Nega-se, assim, uma essencialidade autônoma ao direito, que passa a ser apenas um conceito nominal.
4.3. A Comoção e a Filosofia da Existência (o mundo como processo de autorrealização):
A comoção existencial se apodera do homem quando este é confrontado com “situações-fronteira” de existência. Nesse sentido, diz Ernst Bloch: “A aflição ensina a pensar.”.
O homem só atinge a verdadeira e própria existência quando se coloca, decidido, perante as situações-limite, quando as insere, com sentido, em seus planos e no seu agir, e quando assim, pela transformação da consciência de si próprio, torna-se completamente ele mesmo. Ou seja, ele se decide pelas suas próprias possibilidades e, desse modo, atinge a realização de si próprio.
É a filosofia típica das viragens de época, de crise, de ruptura.
O jurista que fecha os olhos perante a limitação, a incompletude do direito e a impossibilidade de nele se confiar, tal como ele nos é acessível, entrega-se cegamente a ele e abandona-se a todas as suas fatalidades. Essa postura é característica do positivista e do jusnaturalista, teorias que se desencontram com o modo de existência do direito, de modo que, em nenhuma delas, o direito chega a si próprio.
4.4. A síntese das diferentes correntes:
Temos como objeção à ontologia (da substância) o fato de que o direito não é um objeto, mas sim a estrutura das relações nas quais os homens estão uns perante os outros e perante as coisas (ontologia das relações).
Em relação à teoria do conhecimento, entende-se que é errado diluir tudo no subjetivo, negando todo o ontológico. Há aqui o perigo do direito estar inteiramente à disposição do legislador.
Por fim, quanto à filosofia existencialista, deve-se evitá-la em seus extremos: Sartre (o homem constroi sua própria moral) e o funcionalismo de Niklas Luhmann (o direito só surge e se legitima através do procedimento).
Assim, defende-se uma teoria processual da justiça objetivamente (pessoalmente) fundada: a pessoa e também o direito são simultaneamente dados adquiridos e renunciados, são irrevogavelmente objetividade e subjetividade num só, tanto o “quê” como o “como” do processo de realização pessoal, através do qual atingem a sua concreta forma de ser, sem se limitarem a ser exclusivamente produto deste processo.
5. CONCLUSÃO:
O conhecimento filosófico exige um esforço cooperativo: a realização da filosofia – e assim a realização do homem que pratica a filosofia - acontece no ato da comunicação filosófica com outros filósofos.
A meta do discurso filosófico é alcançar um consenso intersubjetivo e, neste sentido, a verdade. A comunicação não significa necessariamente consenso, podendo significar a compreensão e a aceitação recíprocas precisamente em relação àquelas perguntas que têm de ser suportadas sem resposta (princípio da tolerância).
Hoje, os homens vão continuar a partilhar entre si as perguntas “que realmente interessam” para, desse modo, chegarem até eles mesmos, porque, na realização dessa tarefa, jamais um autômato ou uma máquina poderá substituí-los.
Em suma, não se deve levar tão longe a racionalidade técnica - a jurisdicionalização do nosso mundo é parte dela – de modo que se esqueça do homem e dos seus anseios fundamentais.
6. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:
KAUFMANN, Arthur. Introdução à filosofia do direito e à teoria do direito contemporâneas. Filosofia do direito, teoria do direito, dogmática jurídica. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002.
KAUFMANN, Arthur. Filosofia do Direito. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004.
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 1998. Cap. I – Direito e Natureza.
Procuradora Federal; Mestre em Constitucionalismo, Filosofia e Direitos Humanos (UFPA), Especialista em Direito Processual: Grandes Transformações pela Rede de Ensino LFG, e; Especialista em Direito Previdenciário pela Rede de Ensino LFG.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LEVY, Karine de Aquino Câmara. A filosofia do direito como instrumento de concretização dos anseios do homem Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 nov 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41649/a-filosofia-do-direito-como-instrumento-de-concretizacao-dos-anseios-do-homem. Acesso em: 23 dez 2024.
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