Resumo: A adoção foi incorporada no Brasil pelo Código Civil de 1916, sem que houvesse proibitivo à adoção de netos pelos avôs. Diversas foram as legislações posteriores a regular a adoção interna, porém nenhuma anterior à Constituição proibiu taxativamente a adoção de netos pelos avós. Assim, em vista a legalidade estrita cumulada com o princípio do tempus regit actum defende-se que, até advento do Estatuto da Criança e do Adolescente, é legal a adoção de seus próprios netos pelo avós, inclusive contemplando os demais direitos civis.
Palavras-chaves: Adoção, netos, avós, limitações legais, tempus regit actum, legalidade.
Abstract: The adoption was incorporated in Brazil by 1916 civil code, with no prohibitive to the adoption of grandchildren by grandparents. Several were later to regulate domestic adoption laws, but none categorically forbade the adoption of grandchildren by grandparents. Thus, in view of the strict legality combined with the principle of tempus regit actum argues that until the advent of the Statute of Children and Adolescents, is legal to adopt their own grandchildren by grandparents, even contemplating other civil rights.
Com advento do Código Civil (Lei n 3071/1916), na redação dos artigos 368 a 378, houve previsão da constituição, por simples escritura pública, do ato de adoção. A regra era assim disposta:“A adoção far-se-á por escritura pública, em que não se admite condição nem termo”.
Assim, o Código de 1916 efetivou a relação jurídica de parentesco civil entre adotante e adotado, com o objetivo de conferir a filiação àqueles que estivessem impossibilitados de tê-los do próprio sangue.
Tinha como requisitos a ausência de filhos legítimos ou legitimados e apenas aqueles com idade superior a 50 (cinquenta) anos gozavam da prerrogativa da adoção, sendo observada a diferença de 18 (dezoito) anos entre as idades do adotante e adotado. Ainda, devia o adotado consentir na adoção, quando capaz, ou, se incapaz ou nascituro, o consentimento deveria ser dado pelo representante legal.
Já com o advento da Lei nº 3.133/57, que alterou a redação dos arts. 368, 369, 372, 374 e 377 do Código Civil de 1916, a idade mínima do adotante passou a ser de 30 (trinta) anos e a diferença entre eles passou para 16 (dezesseis) anos, e a proibição de ter filhos legítimos ou legitimados não mais era exigida (a adoção passou a ter caráter assistencial). Assim, não havia qualquer vedação de o avô adotar seus netos, bastando seguir as regrais legais vigentes à época do CC/16.
A lei 4655/65 complementou a regras do CC/16 com instituto da legitimação adotiva., sem fazer qualquer proibição à adoção de netos.
O Código de Menores (lei n 6697/79) trouxe novas formas de adoção, revogando expressamente o instituto da legitimação adotiva, porém permanecendo a possibilidade de os avós adotarem seus netos, diante da ausência de proibitivo legal.
Neste contexto, até advento do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei nº. 8.069 de 12 de julho de 1990), não havia nenhum proibitivo para adoção de netos pelos avós, sejam eles paternos ou maternos.
É através da Lei n. 8.069/90 que se proíbe o ascendente de adotar seus descendentes bem como a adoção de irmãos.
Assim, para aqueles adotados antes do advento da legislação que vedou parcialmente a adoção de descendentes por ascendentes, deve-se verificar o enquadramento da lei no tempo (tempus regit actum).
Os descendentes adotados até 12.07.1990 tinham seus atos abarcados pela legislação vigente à época.
Já os adotados posteriormente a esta data, aplica-se o preconizado no art. 42, da Lei n 8069/90, de 13 de julho de 1990 assim dispõe:
Art. 42. Podem adotar os maiores de 18 (dezoito) anos, independentemente do estado civil. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
§ 1º Não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando. (grifo nosso)
§ 2º A adoção por ambos os cônjuges ou concubinos poderá ser formalizada, desde que um deles tenha completado vinte e um anos de idade, comprovada a estabilidade da família.
§ 2o Para adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
§ 3º O adotante há de ser, pelo menos, dezesseis anos mais velho do que o adotando.
§ 4º Os divorciados e os judicialmente separados poderão adotar conjuntamente, contanto que acordem sobre a guarda e o regime de visitas, e desde que o estágio de convivência tenha sido iniciado na constância da sociedade conjugal.
§ 5º A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença.
§ 4o Os divorciados, os judicialmente separados e os ex-companheiros podem adotar conjuntamente, contanto que acordem sobre a guarda e o regime de visitas e desde que o estágio de convivência tenha sido iniciado na constância do período de convivência e que seja comprovada a existência de vínculos de afinidade e afetividade com aquele não detentor da guarda, que justifiquem a excepcionalidade da concessão. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
§ 5o Nos casos do § 4o deste artigo, desde que demonstrado efetivo benefício ao adotando, será assegurada a guarda compartilhada, conforme previsto no art. 1.584 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
§ 6o A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença.(Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
Diversas são as decisões neste sentindo da possibilidade de adoção de descendentes por ascendentes antes da entrada em vigor do Estatuto da Criança e do adolescente.
A título de exemplo, podemos citar o acórdão da Sexta Câmara do TJRJ, de 22/03/1993, na Ap. 3998, Relator, Desembargador Cláudio Viana (ADV 63.630), no qual se decidiu que, sendo maior a adotanda, não se aplica, nem analogicamente, o Estatuto da Criança e do Adolescente, e que o Código Civil, regulador da adoção, não veda seja adotante o avô materno.
No mesmo sentido a 83 Câmara, reg. em 12/4/1994, Ap. 2.861, Relator Desembargador Carpena Amorim, firmou entendimento no sentido de que, atendidos os pressupostos objetivos previstos na lei civil, não há como se negar a averbação da escritura de adoção de pessoa maior pelo avô no cartório competente, não se aplicando, ao caso, o Estatuto da Criança e do Adolescente.
No TJSP, a 23 Câmara em v.u. de 6/3/1975, Ap. 234.102, Relator Desembargador Dias Filho, assim concluiu: “é perfeitamente possível a adoção de neto pelos avós" (RT 496/103). Analogamente, a 43 Câmara, em acórdão de 2/12/1969, diante do silêncio da lei considera "juridicamente possível a adoção dos netos pelos avós" (RJ 11/96). Ainda outro, de 26/2/1970, no que consignou-se: adoção deve ser facilitada. Admite-se, pois que avós adotem neto" (RT 418/139 e RJ 12/54).
No RE 89.457-8 GO, Relator Ministro Cordeiro Guerra, decidiu à unanimidade a 2a Turma do STF, aos 17/11/1981 (RT 558/22): Adoção simples, de neto, feita pelos avós, por escritura pública, não é nula. Recurso extraordinário não conhecido. "
Nunca é demais salientar que a adoção tem por objetivo essencial proteger o interesse do menor desprovido de tutela parental, portanto, o intérprete, em sua labuta hermenêutica,não poderia conferir uma interpretação extensiva àquilo que o legislador não restringiu.
Com efeito, há de se ressaltar que, mesmo com o advento do ECA e seu art. 42, parágrafo primeiro, é necessário ao hermeneuta, atento ao caso, em ocorrendo a adoção posterior a mencionada lei, conciliar a legislação com o art. 6 do diploma mencionado a fim de fazer uma interpretação teleológica e permitir a adoção pelo ascendente mediante arbítrio do juiz. Logo, mesmo com advento do ECA, não há impossibilidade absoluta, porque prevalece o interesse do menor.
Assim dispõe o art. 6º do mencionado estatuto:
Art. 6º Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.
Destarte, no que concerne à adoção de descendentes por ascendentes, não houve qualquer vedação pelo Código Cívil de 1916 e legislações posteriores mencionadas, tampouco pela Constituição de 1988, sendo expressamente tratado o tema pela primeira vez no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) em 1990.
Se nos termos do art. 5º, inciso II, da Constituição Federal, “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”, forçoso concluir que somente a lei poderá criar direitos, deveres e também vedações.
Frise-se que, se a lei não vedou a adoção de netos por avôs desde o advento do CC/16 até o ECA, aplica-se o princípio constitucional da legalidade a fim de que não se crie vedações ao arrepio da lei.
Logo, atendendo aos fins sociais da norma, sem proibitivo anterior à vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente, conclui-se pela possibilidade de adoção de netos/descendentes por avós/ascendentes que formalmente aconteceram antes de 12.07.1990, inclusive para efeitos de direitos hereditários e previdenciários.
Referências bibliográficas:
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria geral do direito civil. 28.ed. v.1. 2011
BEVILÁQUA, CLÓVIS. Direito de Família – Edição Histórica. Rio de Janeiro: Editora Rio,1976.
SILVA FILHO, Artur Marques da. Adoção. Editora Revista dos Tribunais, 2009.
http://www.camara.gov.br/Internet/InfDoc/conteudo/colecoes/Legislacao/Legimp-K.pdf
http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=128
Procurador Federal, pós graduado em Direito e Processo Civil pela UNICOC
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: AZEVEDO, Armstron da Silva Cedrim. A possibilidade de adoção de netos pelos avós anterior ao advento do Estatuto da Criança e do Adolescente Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 20 nov 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41714/a-possibilidade-de-adocao-de-netos-pelos-avos-anterior-ao-advento-do-estatuto-da-crianca-e-do-adolescente. Acesso em: 23 dez 2024.
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