1. Introdução
O presente artigo tem por escopo expor noções acerca da prescrição punitiva (propriamente dita e intercorrente) no processo administrativo ambiental, trazendo a legislação que dispõe sobre o tema, bem como a interpretação da jurisprudência sobre o assunto.
O processo administrativo ambiental tem como fundamento os princípios da legalidade, da segurança jurídica e da razoável duração do processo. A prescrição, como mecanismo de segurança jurídica e estabilidade das relações sociais, tem incidência sobre o procedimento determinando o prazo inicial e final do regular processo administrativo, bem como visa evitar a paralisação injustificada do curso regular do processo administrativo.
O presente trabalho tem por finalidade estudar os tipos de prescrição punitiva (propriamente dita e intercorrente) que podem ocorrer durante o procedimento administrativo ambiental e prejudicar a imposição de sanção pela prática de conduta ilegal ao meio ambiente passível de sanção.
2. Noções introdutórias sobre o instituto da prescrição
Prescrição é a perda do poder de agir decorrente do seu não exercício do direito no tempo fixado em lei. Possui como objetivo garantir a estabilidade das relações jurídicas e punir a inércia do detentor do direito.
A prescriçãovisajustamente a conferirestabilidade à relação jurídica, pois imprime solidez e firmeza ao liamejurídico constituído entre os integrantes desta relação.
O conceito de prescrição está ligado à noção de estabilidade, segurança jurídica de situações consolidadas pelo tempo.
A segurança jurídica é princípio basilar na salvaguarda da pacificidade e estabilidade das relações jurídicas. Não é à toa que a segurança jurídica é base fundamental do Estado de Direito.
A prescrição ocorre quando há o decurso do tempo, capaz de nascer e de consolidar novas situações jurídicas, albergadas ou não pelo direito e a inércia do titular envolvido.
A prescrição gera não a perda do direito material, mas sim a pretensão de exercê-lo.
Dispõe o artigo 189 do Código Civil sobre a prescrição: “Violado o direito subjetivo, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206”.
O instituto afeta o direito de ação, ou seja, a prescrição faz extinguir a pretensão.
Assim, a prescrição, quando consumada, esvai a pretensão e não direito de ação, afetando a exigibilidade do direito de que se alega ser titular.
O direito subjetivo se mantém, porém não pode mais ser exigido da parte contrária, eis que acabada a pretensão com a ocorrência da prescrição.
A inércia na tomada de iniciativa para efetividade de determinado direito material, dentro de um prazo assinalado em lei, possui a força de sepultar situações lesivas ao interesse.
No direito administrativo não é diferente, pois a prescrição se inscreve como princípio formador de todo o ordenamento jurídico brasileiro, não se admitindo incerteza nas relações reguladas pelo direito.
A prescrição é, portanto, a extinção do direito de ação em razão da inércia do seu titular pelo decurso de determinado lapso temporal. O que se extingue é a ação e não propriamente o direito, ficando este incólume. Entretanto, este não terá nenhuma eficácia no plano prático, porquanto não poderá ser utilizado.
No procedimento administrativo, há três tipos de prescrição. A primeira se refere à perda do direito de interpor recurso administrativo para rever decisão que entenda o administrado seja desfavorável. Há prescrição quando ocorre perda de prazo para que a Administração reveja seus próprios atos. E, também, há prescrição com a perda do prazo para aplicação de penalidades administrativas.
No caso das multas aplicadas pelo IBAMA, a prescrição tem como efeito obstar as ações da Administração tendentes à apuração da prática de infração contra o meio ambiente, a constituição definitiva do crédito decorrente da multa aplicada e sua respectiva cobrança.
Imprescindível ressaltar que o §4° do artigo 21 do Decreto n° 6.514 de 2008 prevê expressamente que a prescrição atinge somente a sanção pecuniáriaou outras sanções impostas administrativamente, não abrangendo a obrigação de reparar o dano causado ao meio ambiente, eis que o dever de reparar o dano pode e deve ser exigido a qualquer tempo, conforme dispõe o art.225 da Constituição Federal.
A prescrição da pretensão punitiva ainda se subdivide em prescrição da pretensão punitiva propriamente dita e prescrição da pretensão punitiva intercorrente
O presente artigo discorre sobre a perda do prazo para aplicação de penalidades administrativas, ressaltando a prescrição da pretensão punitiva (propriamente dita e intercorrente) no processo administrativo ambiental, com a análise dos dispositivos legais pela Lei nº 9.873, de 22 de novembro de 1999, e, posteriormente, de forma específica, pelo Decreto nº 6.514, de 22 de julho de2008, bem com as orientações jurídicas normativas do IBAMA.
3. Prescrição da pretensão punitiva propriamente dita no processo ambiental
A prescrição da pretensão punitiva está ligada à atuação do Estado com o objetivo apurar eventual infração administrativa ambiental e aplicar a penalidade dela decorrente.
Caso a Administração se mantenha inerte por determinado período de tempo fixado em lei, ficará impossibilitada de exercer seu poder-dever punitivo.
O Decreto nº 6.514 de 2008 estabelece o procedimento administrativo federal para apuração das infrações administrativas ao meio ambiente e as sanções aplicáveis.
O diploma legal acima citado dispõe que o procedimento administrativo ambiental é iniciado pela lavratura do auto de infração pelo agente de fiscalização, o qual deverá conter a identificação do autuado, a descrição clara e objetiva das infrações ambientais constatadas e a indicação dos respectivos dispositivos legais e regulamentares infringidos.
A autuação decorre do exercício do poder de polícia ambiental e deverá observar o prazo legal, sob pena da perda do direito de ação para apurar a prática de infrações contra o meio-ambiente e, consequentemente, da possibilidade de se impor as devidas sanções.
A Lei nº 9.873 de 1999 estabelece o prazo prescricional de cinco anos para o exercício da ação punitiva da Administração Pública Federal, Direta ou Indireta. O artigo 1º da lei dispõe que “Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.”.
Por sua vez, o artigo 1º-C, da Lei nº 9.469/1997, dispõe que, “Verificada a prescrição do crédito, o representante judicial da União, das autarquias e fundações públicas federais não efetivará a inscrição em dívida ativa dos créditos, não procederá ao ajuizamento, não recorrerá e desistirá dos recursos já interpostos”.
Outrossim, nos termos da Portaria nº 796/2010/PGF, que regulamentou o dispositivo acima transcrito, “Verificada a prescrição do crédito posteriormente à inscrição em dívida ativa, o processo administrativo deverá ser restituído, após o cancelamento da inscrição e a desistência da ação, se já ajuizada, bem como da desistência dos recursos eventualmente interpostos, à Procuradoria Federal, especializada ou não, junto à autarquia ou fundação pública federal, para que seja observado o disposto no parágrafo anterior”.
O Decreto nº 6.514 de 2008 também dispõe que “prescreve em cinco anos a ação da administração objetivando apurar a prática de infrações contra o meio ambiente, contada da data da prática do ato, ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que esta tiver cessado”.
As infrações permanentes são aquelas em que a prática ilegal se prolonga no tempo. Nesses casos, o prazo prescricional somente começa a contar a partir da cessação da atividade ilegal.
Além do mais, verifica-se o trânsito em julgado administrativo no momento processual administrativo no qual, proferido o julgamento pela autoridade julgadora de primeira instância e escoado o prazo regulamentar sem recurso ou ainda, quando proferido o julgamento pela autoridade julgadora de segunda instância e transcorrido o prazo para pagamento do débito, operando-se a preclusão temporal ou consumativa para reforma do julgado administrativo, nos termos da IN/10/2012/IBAMA.
Nos termos do acima exposto, a contagem do prazo prescricional da pretensão punitiva propriamente dita se inicia a partir do fato (conduta ou resultado) e se encerra com a coisa julgada administrativa.
Praticado o ato ilícito contra o meio ambiente, ou, no caso das infrações permanentes ou continuadas, quando da cessação da atividade ilegal, inicia para a Administração Pública a contagem do prazo de cinco anos para a instauração do processo administrativo ambiental e apuração da conduta ilícita.
Ressalte-se que a prescrição punitiva ambiental terá prazo semelhante ao previsto na legislação penal quando o fato objeto da infração também constituir crime, conforme o § 2º do artigo 1º da Lei nº 9.873 de 1999 que traz a regra diferenciada, excepcionando a contida no caput, ou seja, quando se estiver diante de suposta infração administrativa que também configure infração penal, para a definição do prazo de prescrição deve-se verificar qual o tipo penal do ato cometido e, a partir do máximo da pena privativa de liberdade cominada ao respectivo crime, aplicar a tabela de prazos prevista no art. 109 do Código Penal.
Registre-se que será aplicado o §2º quando o resultado implicar numa situação mais gravosa para o administrado, ou seja, quando a utilização do prazo prescricional criminal importar num prazo maior para a Administração concluir a apuração do ilícito e consolidar a sanção, com fins de que o autuado não seja privilegiado com um prazo mais curto quando a sua conduta, na realidade, é mais gravosa.
Caso o prazo prescricional criminal for mais curto de prescrição, aplica-seo prazo previsto no caput do artigo 1º, qual seja, o de 05 (cinco) anos.
Conclui-se que o prazo prescricional das infrações ambientais poderá ser maior do que 05 anos quando a conduta praticada também constituir crime, caso em que deverá serobservado o artigo 109 do Código Penal, observando-se um único requisito objetivo, qual seja, o enquadramento da infração administrativa ambiental também como crime.
Tem-se que o prazo prescricional da pretensão punitiva ambiental propriamente dita não é ininterrupto A lei que estabelece alguns atos capazes de interromper o prazo prescricional. Ou seja, cada vez que o Estado pratica um ato que se enquadra nos requisitos legais, o prazo que ele possui para apurar a infração e consolidar a penalidade é interrompido, voltando a correr integralmente.
A disciplina geral sobre a prescrição da pretensão punitiva pela Administração Pública Federal consta da Lei nº 9.873 de 1999. Há dispositivo legal específico para aplicação em relação aos processos administrativos punitivos ambientais, qual seja, oDecreto nº 6.514 de 2008.
Acercados prazos interruptivos da prescrição, são observadas as normas constantes do artigo 2º da Lei nº 9.873 de 1999 e do artigo 22 do Decreto nº 6.514 de 2008. Portanto, Uma vez instaurado o procedimento administrativo ambiental (art. 98 do Decreto nº 6.514/2008), o prazo quinquenal da prescrição da pretensão punitiva poderá ser interrompido se ocorrer quaisquer das hipóteses elencadas no rol meramente exemplificativo do artigo 22 do Decreto nº 6.514, de 2008:
“Art. 22. Interrompe-se a prescrição:
I - pelo recebimento do auto de infração ou pela cientificação do infrator por qualquer outro meio, inclusive por edital;
II - por qualquer ato inequívoco da administração que importe apuração do fato; e
III - pela decisão condenatória recorrível.
Parágrafo único. Considera-se ato inequívoco da administração, para o efeito do que dispõe o inciso II, aqueles que impliquem instrução do processo.”
A Orientação Jurídica Normativa nº 06/2009/PFE/Ibama traz o regramento e a aplicação dos atos capazes de interromper o prazo prescricional, praticados no bojo do processo administrativo para apuração deinfração ambiental, destacando os atos administrativos que se possuem o condão de suspender a prescrição do processo administrativo, nos termos do art. 2º da Lei nº 9.873/99.
Necessário se faz registrar que cada tipo de ato interruptivo da prescrição poderá ocorrermais de uma vez. Assim, é possível que alguns atos sejam realizados por mais de uma vez no processo administrativo punitivo que, por enquadráveis nas categoriaslegais, serão capazes de interromper o prazo prescricional todas as vezes que realizados, provocando, assim, o reinício de sua contagem.
Assim, a prescrição da pretensão punitiva do Estado, decorrente do poder de polícia, interrompe-se, regra geral, toda vez queverificada a ocorrência de evento com previsão no artigo 2º da Lei nº 9.873 de 1999,reiniciando-se, por inteiro, a do prazo, independentementedo número de vezes que os atos interruptivos ocorram.
A jurisprudência é no sentido da possibilidade de o prazo prescricional ser interrompido mais de uma vez e voltar a fluir integralmente:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. MULTAS ADMINISTRATIVAS.PRESCRIÇÃO.
1. Tratando-se de multa administrativa, não se aplicam as disposições do
Código Civil. Tendo em vista a natureza pública da relação que originou a multa executada, esta não pode ser regida por disposições destinadas a regular as relações de natureza privada, especialmente quando há normas específicas que regem a matéria.
2. A decadência e a prescrição das penalidades administrativas aplicadas no
exercício do poder de polícia devem observar o disposto na Lei n° 9.873/99, em seus artigos 1º a 4º.
3. Transcorrido o prazo de cinco anos sem interrupção, deve ser reconhecida
a prescrição (TRF 4ª Região. Agravo de Instrumento 200504010514348. Rel.
MarcianeBonzanini, 2ª Turma. Julgado em 18/03/2008, publicado em 02/04/2008).
PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. VÍCIOS DO ARTIGO 535 DO CPC. AUSÊNCIA. PRETENSÃO PUNITIVA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INTERRUPÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. ARTIGO 2º, II, DA LEI 9.873/99. EMBARGOS REJEITADOS.
1. O embargante afirma que o aresto recorrido não se pronunciou sobre o artigo 2º da Lei 9.873/99, o qual disciplina que a prescrição da pretensão punitiva apenas se interrompe pela citação, notificação ou condenação do infrator.
2. O artigo 2º, II, da Lei /9.87399 permite a interrupção do prazo prescricional "por qualquer ato inequívoco, que importe apuração do fato". O processo administrativo em questão teve origem na Empresa Brasileira de Correios e Telegráfos - ECT, a qual, após a apuração da conduta, encaminhou o feito para o Ministério das Comunicações concretizar a medida sancionatória, o que ocorreu em 10.09.08. Dessa feita, bem antes do transcurso do prazo prescricional, iniciado em 01.10.2000, a administração pública praticara atos concretos para a apuração da conduta infrativa, interrompendo sua fluência.
3. Embargos de declaração rejeitados (STJ. Edcl no MS 15036 DF 2010/0024838-0, rel. Ministro Castro Meira. 1ª Sessão. Julgamento em23/02/2011, publicado no Dje de 04/03/2011).
AÇÃO ORDINÁRIA. ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DISCIPLINAR. OAB. CERCEAMENTO DE DEFESA. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIAS. IRREGULARIDADES NÃO COMPROVADAS. OBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, COM AMPLA DEFESA, E CONTRADITÓRIO. 1. Não se evidencia cerceamento de defesa pela falta de requisição de cópia do procedimento disciplinar, porquanto aquelas carreadas pelo apelante na inicial são suficientes para substanciar o julgamento da causa 2. Inocorrente a prescrição, que se rege, no caso, pela Lei nº 9.873, de 23.11.1999, posto que verificada sua interrupção com a notificação válida e apresentação de defesa, bem como prolação da decisão condenatória recorrível, encerrando-se o procedimento disciplinar antes de decorrido o quinquênio legal. 3. Também não há nulidade no julgamento proferido por advogados não conselheiros, ante a previsão estampada no art. 58, XIII, da Lei nº 8.906/94 e Regimento Interno da Seccional São Paulo (art's. 134/136). 4. Ademais, o certo entendimento do Conselho Federal da OAB, reporta-se a presença de advogados não conselheiros nos julgamentos efetivados pelo Conselho Seccional da Ordem e no caso, ou o julgamento e os atos ordinatários ou pareceres, ocorreram no âmbito dos chamados Tribunais de Ética e Disciplina, composto não por conselheiros eleitos pela classe mas sim escolhidos dentre advogados de reputação ilibada, com mais de cinco anos de exercício profissional. Não cuidou de comprovar, assim, que os participantes do julgamento ocorrido no Conselho Seccional não ostentavam esta condição. Donde que, mesmo afastando-se os argumentos o certo é que estes não se convalescem, à míngua de prova do quanto alegado (CPC: art. 333, inciso I). 5. À OAB, como órgão de classe, está afeta a competência disciplinar definida pela Lei nº 8.906/94, devendo limitar-se o judiciário ao controle da regularidade e legalidade no procedimento, sem, contudo, adentrar no mérito administrativo. 6. O contexto probatório, no caso, é suficiente à comprovação de que observados os aludidos princípios constitucionais, não se verificando ilegalidade ou imoralidade no trâmite do procedimento administrativo. 7. Apelação da autoria a que se nega provimento. (Apelação Cível nº 2008.61.0002659-37, rel. Juiz Convocado Roberto Jeuken, 3ª Turma, julgamento em 18/03/2010, publicado no Dje de 13/04/2010).
MANDADO DE SEGURANÇA. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. CASSAÇÃO DO EXERCÍCIO DA MEDICINA. PRESCRIÇÃO DA PUNIBILIDADE ADMINISTRATIVA. INOCORRÊNCIA. LEIsNºs 6.838/80 e 9.873/99. 1.Interrompida a prescrição da ação punitiva pelo CREMESP em fevereiro de 1998, nos termos da Lei nº 6.838/80, o curso da prescrição recomeçou a correr com a apresentação da defesa prévia na seara administrativa em abril de 1998. Sendo proferida decisão administrativa recorrível em 07 de dezembro de 2002, verifica-se nova causa de interrupção da prescrição, nos termos do art. 2º, inciso III, da Lei nº 9.873/99, de aplicação imediata, por dispor de matéria processual. 2.Resta não configurada a prescrição. 3.Apelação do impetrante a que se nega provimento. Apelação em Mandado de Segurança 200461000175580 (TRF3).
Além do mais, é certo que a sistemática disposta no Código Civil e a disciplinada no Decreto nº 20.910/1932 não alcança a prescrição da pretensão punitiva, a qual resta especificamente regulada pela Lei nº 9.873/99. A prescrição da pretensão punitiva da Administração, decorrente do poder de polícia, interrompe-se a cada evento ocorrido que tenha previsão no art. 2º da Lei nº 9.873/99, devolvendo-se, por inteiro, o interstício temporal, ressaltando-se que atos de igual tipologia procedimental praticados em momentos distintos do processo administrativo podem dar ensejo a mais de uma interrupção da prescrição da pretensão punitiva propriamente dita.
Relate-se como exemplos de atos do processo administrativo ambiental capazes de interromper o curso do prazo quinquenal, impondo que seja realizado nova contagem a partir do dia da interrupção: o pedido da autoridade julgadora no sentido de requerer parecer técnico ou contradita (art. 119 do Decreto nº 6.514/2008); e, a requisição de informações, documentos, contraditas pelo servidor do NUIP – Núcleo de Instrução Processual de Auto de Infração do IBAMA para subsidiar a instrução processual determinada pela autoridade julgadora (art. 76, parágrafo único da Instrução Normativa IBAMA nº 10, de 2011).
Ressalve-se que não há previsão legal de suspensão do prazo prescricional em razão do ajuizamento de ação impugnando o Auto de Infração, ou ato administrativo praticado no bojo do processo de apuração do ilícito ambiental. Assim, mesmo que haja impugnação na via judicial, o processo administrativo deverá seguir seu procedimento regular, a não ser que haja decisão judicial determinando a suspensão do processo administrativo. Deve haver a diferenciação entre a decisão judicial que determina o sobrestamento do processo administrativo daquela que veda a execução (cobrança) da multa, eis que essa última não impede a apuração dos fatos e prosseguimento do procedimento.
4. Prescrição punitiva intercorrente no processo administrativo ambiental
O processo administrativo segue o princípio da oficialidade, ou seja, a iniciativa da instauração e do desenvolvimento do processo administrativo compete à própria Administração. Além disso, tem a administração o dever de concluir os processos para a verificação da conduta a ser adotada, satisfazendo, assim, o interesse da coletividade.
O instituto da Prescrição Intercorrente Administrativa está preconizado no art. 1º, § 1º da Lei nº 9.873 de 23 de novembro de 1999, que estabelece prazo de prescrição em face da desídia da Administração Pública Federal, direta e indireta, em apurar infração, in verbis:
Art. 1º. Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.
§ 1º. Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso.
A ocorrência do instituto da Prescrição Intercorrente no Processo Administrativo se dá quando ocorre uma paralisação nos atos procedimentais durante um lapso temporal superior a 03 (três) anos.
A prescrição intercorrente está expressamente prevista na legislação ambiental, especificamente no §1º do artigo 1° da Lei n° 9.873 de 1999 e no §2° do artigo 21 do Decreto nº 6.514 de 2008, in verbis:
Artigo 21
(...)
§2º Incide a prescrição no procedimento de apuração do auto de infração paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação (redação dada pelo Decreto nº 6.686 de 2008).
Pelo o que se percebe dos dispositivos acima citados, a prescrição intercorrente é aquela que tem curso somente durante o processo que visa àapuração a infração ambiental.Finalizado este, não há mais se falar em sua caracterização.
Assim, se a desídia da Administração Pública para apurar uma suposta infração extrapolar o lapso temporal prescricional de 3 (três) anos, deve haver o reconhecimento da prescrição administrativa Intercorrente
No processo administrativo de apuração de infração ambiental, a prescrição da pretensão punitiva intercorrente inicia-se com a lavratura do auto de infração e enquanto perdurar o procedimento administrativo.
Ressalte-se que durante o processo administrativo, transcorrem, concomitantemente, os prazos da prescrição da pretensão punitiva intercorrente e da prescrição da pretensão punitiva propriamente dita.
Portanto, quando sobrestado o curso do processo administrativo por mais de três anos, e desde que, nesse período, não tenha sido praticado qualquer ato processual, operar-se-á a prescrição extintiva intercorrente.
Ocorre que a paralisação deve ser imputável à Administração, pois o instituto tem por objetivo sancionar a inércia do titular do direito, ou da pretensão. A prescrição punitiva intercorrente somente ocorrerá se a Administração, sem qualquer justificativa, não adotar medida tendente ao exercício da pretensão de apurar a conduta ilícita, objeto do processo administrativo ambiental, e assim concluir o processo administrativo. Se a inércia ocorre em virtude da conduta do administrado e, desde que devidamente comprovada e certificada nos autos, ou, ainda, em virtude de determinação judicial, a prescrição estará afastada. Conclui-se desse raciocínio que não restará configurada a prescrição intercorrente em hipóteses nas quais o sobrestamento do feito decorre de ação ou omissão do administrado.
Nesse sentido é a jurisprudência:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO. PARALISAÇÃO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO POR PRAZO SUPERIOR A 3 ANOS. PRESCRIÇÃO ADMINISTRATIVA CONFIGURADA. INTELIGÊNCIA DO ART. 1º, § 1º DA LEI Nº 9.873/99. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. 1. Havendo permanecido o feito administrativo paralisado por período superior ao triênio de que trata o art. 1º, § 1º da Lei nº 9.873/99, mister o reconhecimento da prescrição administrativa intercorrente na espécie, contaminando a multa imposta pelo PROCON. 2. Sentença reformada para, reconhecendo a prescrição, anular a penalidade imposta pela Administração. (TJBA; APL: 00566088820098050001/BA; Relatora: Cynthia Maria Pina Resende; Quarta Câmara Cível; Data de Publicação: 22/01/2014)
A prescrição intercorrente no processo ambiental visa inibir a inércia da administração pública, que não pode deixar o interessado à mercê de processos administrativos infindáveis.
O atual entendimento das decisões judiciais amparadas na lei citada visam coibir a inércia da administração pública, dando guarida ao princípio da eficiência, previsto na Constituição Federal, que deve nortear as atividades da Administração.
A prescrição intercorrente tem o condão de garantir a aplicação do o princípio da segurança jurídica, já que o interessado não pode permanecer por tempo demasiado na incerteza da cobrança decorrente do processo administrativo.
Novamente, registre-se que a prescrição punitiva intercorrente poderá se dar enquanto perdurar o processo administrativo, bastando que, de forma injustificada, reste paralisado, sem qualquer movimentação, por mais de três anos.
A ocorrência da prescrição intercorrente no procedimento administrativo acarreta a necessária apuração da responsabilidade funcional do servidor desidioso, verificando a ocorrência de dolo ou negligência, nos termos da Lei nº 8.112, de 1991, observando-se sempre o Princípio da Razoabilidade.
Tem-se que qualquer despacho lançado nos autos é capaz de interromper a prescrição intercorrente. Também a movimentação do processo obsta o transcurso do referido prazo prescricional. A ocorrência da regularização de um vício formal ou a repetição de uma diligência, desde que formalizada nos autos tem o efeito de interromper a prescrição.
Destaque-se que os despachos e as movimentações, para interromper a prescrição intercorrente devem se dar no intuito do prosseguimento do feito.
Para início da ocorrência da prescrição intercorrente o procedimento deve estar paralisado e pendente de despacho ou de julgamento pela administração. Apenas quando findo o prazo para manifestação do autuado é que se dá o termo inicial da prescrição. Assim, a apresentação de defesa por si só não interrompe a prescrição. Existindo, no entanto, o encaminhamento da peça para análise por determinado órgão da administração, a partir daí se reinicia a intercorrente, vez que estará caracterizada a pendência do julgamento.
5. Conclusão
O artigo dispôs sobre a prescrição punitiva, enfatizando o processo administrativo ambiental que apura infrações ao meio ambiente.
Ressaltou-se que o procedimento administrativo ambiental, em sua fase constitutiva, tem como início a lavratura do auto de infração e a consequente abertura do procedimento administrativo ambiental, finalizando-se com o julgamento no sentido da homologação ou não do auto de infração e seu transito em julgado.
Na fase constitutiva do processo administrativo ambiental, discorreu o artigo sobre a prescrição da pretensão punitiva, quer seja a prescrição da pretensão punitiva propriamente dita, quer seja da prescrição intercorrente, ressaltando as disposições legais que tratam do tema, bem como o posicionamento jurisprudencial e diferenciando os dois tipos de prescrição que podem ocorrer no curso procedimental.
A prescrição da pretensão punitiva propriamente dita tem por característica principal o decorrer do prazo de cinco anos, sem a finalização do processo administrativo ambiental, o que acaba por retirar da Administração Pública o poder de impor sanções às condutas indesejadas, desde que não ocorram as possibilidades de interrupção da prescrição elencadas no presente artigo.
Jáa prescrição intercorrente ocorre no curso do procedimento administrativo, quando há unicamente da inércia da Administração Pública em promover atos necessários à finalização do procedimento. A paralisação injustificada do processo por mais de três anos ensejará o reconhecimento de ofício da prescrição intercorrente e demandará a apuração da responsabilidade funcional.
Além disso verificou-se que não se aplica à prescrição da pretensão punitiva, os dispositivos do Decreto nº 20.910/1932 e tampouco do Código Civil de 2002, aplicando-se para fins de verificação da ocorrênciada prescrição, no processo administrativo de apuração de infrações ambientais a Lei nº 9.873/99 e o Decreto nº 6.514 de 2008, bem como as orientações jurídicas normativas do IBAMA.
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Procurador Federal com exercício na Procuradoria Regional da 1ª Região.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BORGES, Edilson Barbugiani. Da prescrição punitiva no processo administrativo ambiental Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 nov 2014, 07:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41932/da-prescricao-punitiva-no-processo-administrativo-ambiental. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Medge Naeli Ribeiro Schonholzer
Por: VAGNER LUCIANO COELHO DE LIMA ANDRADE
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