RESUMO: O artigo em baila objetiva realizar uma abordagem sobre a pretensão regressiva do Instituto Nacional do Seguro Social em face daqueles que deram causa a concessões de benefícios assegurados pela Previdência Social. Estudaremos, em especial, o termo inicial da prescrição da pretensão regressiva à luz do entendimento do Superior Tribunal de Justiça.
INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, a Procuradoria-Geral Federal, órgão de assessoramento e representação judicial da Autarquias e Fundações Públicas Federais, tem envidado esforços para buscar o ressarcimento, aos cofres do Instituto Nacional do Seguro Social, dos dispêndios decorrentes da concessão de benefícios, cujo fato gerador tenha se originado de alguma conduta ilícita.
Inicialmente, a atuação foi focada nos benefícios concedidos em decorrência dos inúmeros acidentes de trabalho ocorridos no Brasil. O trabalho desenvolvido buscou, ainda, incentivar a observância pelas empresas das normas de segurança e higiene do trabalho. A Lei de Benefícios da Previdência Social prevê expressamente a adoção da ação regressiva para o caso em apreço:
Lei n. º 8.213/1991:
Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.
Art. 121. O pagamento, pela Previdência Social, das prestações por acidente do trabalho não exclui a responsabilidade civil da empresa ou de outrem.
É cediço que a hipótese prevista na Lei de Benefícios é apenas exemplificativa, cabendo os demais casos serem regidos pelas regras gerais de reponsabilidade civil, conforme disposição nos artigos 186 e 927 do Código Civil, ipsis litteris:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Em seguida houve a ampliação da atuação da Procuradoria-Geral Federal (PGF), alcançando outras condutas ilícitas que ensejaram a concessão de benefício previdenciário, como os casos de acidentes de trânsito e de violência doméstica.
O órgão de representação judicial (PGF) do Instituto Nacional do Seguro Social vem obtendo êxito nas ações regressivas ajuizadas, já tendo, inclusive, precedente favorável em relação ao caso de violência doméstica. No caso em apreço, determinado indivíduo tirou a vida de sua ex-companheira, fato que acarretou a concessão de pensão por morte em favor dos filhos da falecida. Decidiu o Tribunal Regional Federal da 4ª Região que o autor da conduta ilícita deve ressarcir o INSS pelo dispêndio decorrente da concessão do benefício. Vejamos o seguinte aresto:
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL, CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. ASSASSINATO DE SEGURADA PELO EX-MARIDO. VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER. RESPONSABILIDADE CIVIL DO AGENTE, QUE DEVERÁ RESSARCIR O INSS PELOS VALORES PAGOS A TÍTULO DE PENSÃO POR MORTE. CORREÇÃO MONETÁRIA. INCIDÊNCIA.
1. Cabe ao agente que praticou o ato ilícito que ocasionou a morte do segurado
efetuar o ressarcimento das despesas com o pagamento do benefício previdenciário, ainda que não se trate de acidente de trabalho. Hipótese em que se responsabiliza o autor do homicídio pelo pagamento da pensão por morte devida aos filhos, nos termos dos arts. 120 e 121 da Lei nº 8.213/91 c/c arts. 186 e 927 do Código Civil.
2. O ressarcimento deve ser integral por não estar comprovada a corresponsabilidade do Estado em adotar medidas protetivas à mulher sujeita à violência doméstica.
3. Incidência de correção monetária desde o pagamento de cada parcela da
pensão.
4. Apelação do INSS e remessa oficial providas e apelação do réu desprovida.
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5006374-73.2012.404.7114/RS
Nessa senda, observa-se que o manejo das ações regressivas pelo Instituto Nacional do Seguro Social possui duplo objetivo. Almeja-se, inicialmente, o ressarcimento dos danos ocasionados ao Erário, bem como a difusão do caráter pedagógico das ações de regressos. Espera-se que haja a diminuição do número de ocorrências de condutas ilícitas da espécie.
Pois bem, feito esse intróito, passemos a analisar a prescrição da pretensão regressiva do INSS.
Por prescrição, nas lições de Maria Helena Diniz, entende-se “é fator de extinção da pretensão, ou seja, do poder de exigir uma prestação devida em razão de inércia, deixando escoar o prazo legal”1.
O Instituto Nacional do Seguro Social sustenta a tese da imprescritibilidade da pretensão regressiva, com fulcro no art. 37, §5º da Carta Magna, que assim dispõe:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
§ 5º - A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento.
Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça abraçou a tese de que o prazo prescricional é de 05 (cinco) anos, não havendo o que se falar em imprescritibilidade da pretensão do Instituto Previdenciário. Em observância ao princípio da isonomia, aplica-se, à hipótese, os ditames do Decreto n. º 20.910/1932, ipis litteris:
“Artigo 1º - As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, estadual ou municipal, seja qual for a natureza, prescrevem em 5 (cinco) anos, contados da data do ato ou fato do qual se originarem.
art. 2º - Prescrevem igualmente no mesmo prazo todo o direito e as prestações correspondentes a pensões vencidas ou por vencerem, ao meio soldo e ao montepio civil e militar ou a quaisquer restituições ou diferenças.
Nesse sentido, vejamos os seguintes julgados do Colendo Superior Tribunal de Justiça:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO DE REGRESSO MOVIDA PELO INSS. PRAZO. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. AGRAVO INTERNO. DECISÃO. FUNDAMENTOS NÃO IMPUGNADOS.
1. O agravo que deixa de impugnar especificamente os fundamentos da decisão agravada não merece conhecimento, em decorrência de expressa previsão legal (art. 544, § 4º, inc. I, do CPC), assim também do óbice representado pela Súmula 182/STJ, aplicável à espécie.
2. Pelo princípio da isonomia, o prazo para o ingresso da ação regressiva pelo ente previdenciário deve observar aquele relativo à prescrição nas ações indenizatórias ajuizadas contra a Fazenda Pública. Precedentes.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no AREsp 523.412/RS, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/09/2014, DJe 26/09/2014)
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO ESPECIAL. CARÁTER MANIFESTAMENTE INFRINGENTE. RECEBIMENTO COMO AGRAVO REGIMENTAL. FUNGIBILIDADE RECURSAL. MÉRITO DO RECURSO ADESIVO PREJUDICIAL AO RECURSO PRINCIPAL. POSSIBILIDADE. AÇÃO REGRESSIVA AJUIZADA PELO INSS. PRAZO PRESCRICIONAL. ART. 1º DO DECRETO N.
20.910/32. APLICABILIDADE.
1. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental dado o caráter manifestamente infringente da oposição, em observância ao princípio da fungibilidade recursal.
2. A admissão do recurso adesivo é que está subordinada à admissibilidade do principal. No caso, ambos os recursos foram admitidos, mas a questão de mérito do recurso adesivo, prescrição, é prejudicial aos honorários discutidos no recurso principal, razão pela qual este ficou prejudicado.
3. É quinquenal o prazo prescricional para as ações ajuizadas pela Fazenda Pública contra os administrados. Princípio da Isonomia. Precedentes.
4. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental a que se nega provimento.
(EDcl no REsp 1349481/SC, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/12/2013, DJe 03/02/2014)
Traçada essa premissa (da prescritibilidade da ação de regresso), cabe-nos averiguar qual o termo inicial do prazo de prescrição.
Em recente sessão realizada em 14/10/2014, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que o termo a quo da prescrição da pretensão regressiva coincide com a data da concessão do benefício. O julgado foi assim ementado:
EMENTA
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SEGURADO FALECIDO EM ACIDENTE DE TRABALHO. DEMANDA RESSARCITÓRIA AJUIZADA PELO INSS CONTRA O EMPREGADOR. PRAZO PRESCRICIONAL. INCIDÊNCIA DO ART. 1º DO DECRETO Nº 20.910/32. INAPLICABILIDADE DOS ARTS. 103 E 104 DA LEI Nº 8.213/91.
1. Nas demandas ajuizadas pelo INSS contra o empregador do segurado falecido em acidente laboral, visando ao ressarcimento dos danos decorrentes do pagamento da pensão por morte, o termo a quo da prescrição da pretensão é a data da concessão do referido benefício previdenciário.
2. Em razão do princípio da isonomia, é quinquenal, nos termos do art. 1º do Decreto nº 20.910/32, o prazo prescricional da ação de regresso acidentária movida pelo INSS em face de particular.
3. A natureza ressarcitória de tal demanda afasta a aplicação do regime jurídico-legal previdenciário, não se podendo, por isso, cogitar de imprescritibilidade de seu ajuizamento em face do empregador.
4. Recurso especial a que nega provimento.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.457.646 - PR (2014/0132173-9) RELATOR: MINISTRO SÉRGIO KUKINA (grifos nossos)
Portanto, concedido o benefício, o INSS contará com o prazo de 05 (cinco) anos para ajuizar a ação regressiva em face daquele que, agindo ilicitamente, deu causa ao evento que ensejou o pagamento do benefício pela Autarquia Previdenciária.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ante o entendimento sedimentado no Colendo Superior Tribunal de Justiça, caberá ao Instituto Nacional do Seguro Social a adoção de medidas que viabilizem a celeridade na identificação dos casos passíveis de ajuizamento das ações regressivas, evitando-se que a pretensão ressarcitória seja fulminada pela prescrição.
REFERÊNCIAS
CUNHA, Leonardo Carneiro da. A Fazenda Pública em Juízo. 9ª Edição. São Paulo: Dialética, 2011.
DINIZ, Maria Helena Diniz. Código Civil Anotado. 11ª ed., São Paulo: Saraiva, 2005.
FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de Direito Administrativo. 17ª ed., Rio de Janeiro, 2007.
ROCHA, Daniel Machado da; JÚNIOR, José Paulo Baltazar. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. 8ª ed., Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora: Esmafe, 2008.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 26 de novembro de 2014.
BRASIL. Lei n. º 8.213/1991 (Lei de Benefícios). Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8213cons.htm>. Acesso em: 26 de novembro de 2014.
BRASIL. Decreto n. º 20.910/1932 (Regula a Prescrição Quinquenal). Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1930-1949/D20910.htm>. Acesso em: 27 de novembro de 2014.
NOTAS
1DINIZ, Maria Helena Diniz. Código Civil Anotado. 11ª ed., São Paulo: Saraiva, 2005, p. 224.
Bacharel em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal de Pernambuco. Especialista em Direito Civil e Processual Civil. Membro da Advocacia-Geral da União.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: THIAGO Sá ARAúJO THé, . Termo a quo da prescrição da pretensão regressiva do instituto nacional do seguro social à luz do entendimento do Superior Tribunal de Justiça Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42117/termo-a-quo-da-prescricao-da-pretensao-regressiva-do-instituto-nacional-do-seguro-social-a-luz-do-entendimento-do-superior-tribunal-de-justica. Acesso em: 23 dez 2024.
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