Nos últimos anos, o Estado passou por reformas estruturais, as quais o levaram a reduzir a participação direta das estruturas do aparelho nas atividades econômicas e sociais.
No início dos anos 1990, as propostas de desestatização, desregulação, privatização e enxugamento da máquina administrativa foram ideias advindas com a proposta de reforma.
Da análise do contexto histórico, verifica-se que as constituições dos séculos XVIII e XIX representavam o Estado Liberal, em face da exigência da não intervenção do Estado na vida dos cidadãos. Buscava proteger as liberdades individuais como instrumento de tutela do bem-estar geral, em sentido puramente material.
Porém, verificou-se que esse modelo de Estado não conseguia ser eficaz para toda a população, pois uma pequena parcela dos afortunados se desenvolvia, enquanto a grande maioria da população continuava cada vez mais pobre.
Foi então preciso rever esse modelo para conferir condições econômicas como garantia da preservação da dignidade da pessoa humana e, não tendo a sociedade meios para assegurar o gozo dos direitos fundamentais, foi atribuído ao Estado a responsabilização pela efetivação desses direitos.
As constituições brasileiras, desde a de 1934, sob a inspiração da Constituição da República de Weimar preveem os direitos sociais, adotando o Estado brasileiro os compromissos de um Estado Social, comprometido com a preservação dos direitos fundamentais.
Após a Segunda Guerra Mundial, consolida-se o Estado Social, também chamado Estado Providência, Estado Social de Direito.
O Estado assume, portanto, compromissos perante a sociedade, para cumprir com a finalidade de oferecer bens e serviços à população. O Estado Social, caracterizado como um Estado Provedor, passa a desempenhar mais diversas tarefas, que antes era de iniciativa privada.
O crescimento do Estado não possibilitou a consecução dos objetivos almejados, como a disponibilidade dos serviços e bens essenciais a toda a população. Por outro lado, a manutenção da estrutura estatal exigia recursos vultosos a serem obtidos por intermédio da tributação, sendo atribuída ao Estado a característica da ineficiência.
No Estado Social, com o crescimento desmensurado do Estado, houve um fortalecimento do poder Executivo, passou-se a conferir atribuição normativa ao Executivo, houve quem falasse em “burocratização do mundo”, acabou por contribuir para a ineficiência do Estado na prestação dos serviços, com isso, houve violação ao Princípio da Separação dos Poderes, entre outros entraves.
Outro aspecto negativo foi a violação ao Princípio da Legalidade, a lei passou a ser vista em seus aspecto puramente material e isso trouxe uma instabilidade do direito. O Poder Judiciário tornou-se deficiente, porque não acompanhava o crescimento do Estado, surgiu uma situação calamitosa.
Passou-se, portanto, a repensar a atuação do Estado, passando-se a defender a necessidade de uma reforma, visando reduzir suas atividades, incentivando, por outro lado, a atuação da sociedade na prestação de serviços e produção de bens.
Nesse cenário de mudanças, o Estado brasileiro tem ampliado cada vez mais as opções de relação integrativas com pessoas jurídicas de direito privado.
Tais relações integrativas inserem-se num campo de atividades cuja competência para seu desenvolvimento é pública, mas não exclusiva.
A reforma do Estado deve ser entendida dentro do contexto da redefinição do papel do Estado, que deixa de ser o responsável direto pelo desenvolvimento econômico e social pela via de produção de bens e serviços, para fortalecer-se na função de promotor e regulador desse desenvolvimento.
Nesse contexto, buscou-se promover as privatizações, a fim de incentivar o exercício de atividades econômicas pela iniciativa privada, limitando-se o Estado a agir quando a atuação fosse necessária aos imperativos de segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme previsto no art. 173, CF. Salienta-se também o processo de publicização, que foi a descentralização para o setor público não estatal da execução dos serviços que não envolvem o exercício do poder de Estado, mas devem ser subsidiados por ele.
Nas lições de Maria Sylvia Zanella Di Pietro[1]:
Com o crescimento dos chamados direitos sociais e econômicos, postos perante o Estado, este ampliou desmesuradamente o rol de suas atribuições, adotando diferentes atitudes:
a) Algumas atribuições foram assumidas pelo Estado como serviços públicos, entrando na categoria de serviços públicos comerciais, industriais e sociais; para desempenhar esses serviços, o Estado passou a criar número de empresas estatais e fundações;
b) Outras atividades, também de natureza econômica, o Estado deixou na iniciativa privada, mas passou a exercê-las a titulo de intervenção no domínio econômico, por meio de sociedades de economia mista, empresas públicas e outras empresas sob controle acionário do Estado;
c) Finalmente, outras atividades, o Estado nem definiu como serviço público nem passou a exercer a título de intervenção no domínio econômico; ele as deixou na iniciativa privada e limitou-se a fomentá-las, por considerá-las de interesse para a coletividade. Desenvolveu-se, então, o fomento como uma atividade administrativa de incentivo à iniciativa privada de interesse público. O Estado fomenta a iniciativa privada de interesse público. O Estado fomenta a iniciativa privada por diferentes meios, como, os honoríficos (prêmios, recompensas, títulos e menções honrosas), os jurídicos (outorga de privilégios próprios do poder público, que outras entidades não têm) e os econômicos (auxílios, subvenções, financiamentos, isenções fiscais, desapropriações por interesse social etc).
Desse modo, o Estado reduz seu papel de executor ou prestador direto dos serviços, mantendo-se, entretanto, no papel de regulador e provedor ou promotor destes, principalmente dos serviços sociais.
Pretendeu-se, com tal reforma, reduzir os custos do Estado, obter melhores resultados com menores gastos, por se acreditar que a iniciativa privada pode ser mais eficaz, devendo, em consequência, ser ampliada a participação da comunidade na resolução dos seus problemas.
Fala-se, hoje, no fim do Estado Social e na necessidade de encontrar um caminho intermediário entre Estado Liberal, individualista e o Estado Social.
O Estado, portanto, está deixando de ser produtor de bens essenciais, passando a ser um Estado regulador, sendo criadas para o exercício dessa função, as agências reguladoras.
Tais agências permitem que o Estado deixe de prestar diretamente determinados serviços, passando a regular as atividades das empresas privadas, a fim de resguardar os interesses da sociedade, evitando que a população fique exposta à dominação do mercado.
No Brasil, a Reforma do Estado trouxe uma classificação proposta por Luis Carlos Bresser Pereira, acerca de um “espaço público não estatal”, no qual as relações entre Estado e organizações privadas sem fins lucrativas passariam a ser desenvolvidos com maior amplitude e extensão.
Entende-se que são públicas, porque prestam atividade de interesse público e não estatais, porque não integram a Administração Pública direta ou indireta. Nessa proposta de reforma do Estado que se inserem as instituições pertencentes ao Terceiro Setor, representado pelas entidades privadas que atuam em atividades de interesse público, sem finalidade lucrativa.
As Organizações Sociais – OS e Organizações Sociais da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP são entidades sem fins lucrativos, que passam a se qualificar para receber incumbências do Estado na prestação dos serviços públicos não exclusivos, podendo receber incentivos econômicos oficiais em troca da prestação desses serviços, devidamente contratualizados em contratos de gestão (OS) e termo de parceria (OSCIP), tornando-se mais claras, produtivas e controláveis as relações entre o Estado e o Terceiro Setor.
Assim conclui Maria Sylvia Zanella Di Pietro[2]:
Com todas essas alterações, objetiva-se a “reforma do Estado”, com vistas a fazer reverter os males instaurados pelo Estado intervencionista: de um lado, visto do lado do cidadão, quer-se restaurar e prestigiar a liberdade individual e a livre concorrência; isso leva às ideias de privatização, fomento, parceria como o setor privado; visto do lado do Estado, quer-se alcançar a eficiência na prestação dos serviços públicos, o que leva à ideia de desburocratização. Na realidade, poder-se-ia falar apenas em “privatização” em sentido amplo, na qual se inserem todos esses objetivos”.
Continua a autora[3]:
Com isso, a parceria serve ao objetivo de diminuição do tamanho do aparelhamento do Estado, na medida em que delega ao setor privado algumas atividades que hoje são desempenhadas pela Administração, com a consequente extinção ou diminuição de órgãos públicos e entidades da administração indireta, e diminuição do quadro de servidores; serve também ao objetivo de fomento à iniciativa privada, quando seja deficiente, de modo a ajuda-la no desempenho de atividades de interesse público; e serve ao objetivo de eficiência, porque introduz, ao lado da forma tradicional de atuação da Administração Pública burocrática, outros procedimentos que, pelo menos teoricamente (segundo os idealizadores da Reforma), seriam mais adequados a esse fim de eficiência.
Foi nesse contexto de modernização e aumento da eficiência da administração pública resultante desse complexo de reformas, pelo qual se busca fortalecer a administração direta e descentralizar por meio da implantação de agências autônomas e de organizações sociais, controladas por contratos de gestão, que surgiu e se fortaleceu as organizações sociais e consequentemente o Terceiro Setor.
BIBLIOGRAFIA
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 27ª edição. São Paulo: Atlas, 2014.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella.Parcerias na Administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização e outras formas.5. ed. São Paulo: Atlas, 2006.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 30ª edição. São Paulo: Malheiros, 2013.
[1]DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização e outras formas. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2006.págs. 27/28.
[2]DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização e outras formas. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2006.pág. 39.
[3]DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização e outras formas. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2006.pág. 41.
Procuradora Federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: OLIVEIRA, Katiane da Silva. A reforma administrativa do Estado e o terceiro setor Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42165/a-reforma-administrativa-do-estado-e-o-terceiro-setor. Acesso em: 23 dez 2024.
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