1. INTRODUÇÃO
O Cadastro Informativo dos créditos não quitados de órgãos e entidades federais – CADIN é importante meio de consulta dos órgãos da Administração Pública Federal, sendo utilizado tanto pela Administração Direta, quanto pela Indireta.
A Lei n. 10.522/02 que prevê o Cadastro dispõe, a parte sua natureza informativa, a necessidade de comunicação ao devedor da existência do débito passível de inscrição naquele Cadastro, fornecendo-se todas as informações pertinentes ao débito.
A importância desta comunicação é o tema tratado neste breve artigo, que tem a finalidade de expor a legislação e jurisprudência da matéria.
2. DESENVOLVIMENTO
O Cadastro Informativo dos créditos não quitados de órgãos e entidades federais – CADIN previsto na Lei n. 10.522, de 19/7/2002, e objeto de sucessivas reedições da Medida Provisória n. 1442, de 10/5/1996, foi criado como meio de consulta da Administração dos créditos não pagos.
A referida Lei impõe à Administração a consulta prévia nos casos do art. 6º, in verbis:
Art. 6o É obrigatória a consulta prévia ao Cadin, pelos órgãos e entidades da Administração Pública Federal, direta e indireta, para:
I - realização de operações de crédito que envolvam a utilização de recursos públicos;
II - concessão de incentivos fiscais e financeiros;
III - celebração de convênios, acordos, ajustes ou contratos que envolvam desembolso, a qualquer título, de recursos públicos, e respectivos aditamentos.
Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica:
I - à concessão de auxílios a Municípios atingidos por calamidade pública reconhecida pelo Governo Federal;
II - às operações destinadas à composição e regularização dos créditos e obrigações objeto de registro no Cadin, sem desembolso de recursos por parte do órgão ou entidade credora;
III - às operações relativas ao crédito educativo e ao penhor civil de bens de uso pessoal ou doméstico.
A despeito da necessidade da obrigatoriedade de consulta, o Supremo Tribunal Federal já decidiu que esta não é óbice à realização dos atos previstos. Confira-se a ementa do julgamento da ADI n. 1454/DF:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA PROVISÓRIA 1.442, DE 10.05.1996, E SUAS SUCESSIVAS REEDIÇÕES. CRIAÇÃO DO CADASTRO INFORMATIVO DE CRÉDITOS NÃO QUITADOS DO SETOR PÚBLICO FEDERAL - CADIN. ARTIGOS 6º E 7º. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 6º RECONHECIDA, POR MAIORIA, NA SESSÃO PLENÁRIA DE 15.06.2000. MODIFICAÇÃO SUBSTANCIAL DO ART. 7º A PARTIR DA REEDIÇÃO DO ATO IMPUGNADO SOB O NÚMERO 1.863-52, DE 26.08.1999, MANTIDA NO ATO DE CONVERSÃO NA LEI 10.522, DE 19.07.2002. DECLARAÇÃO DE PREJUDICIALIDADE DA AÇÃO, QUANTO AO ART. 7º, NA SESSÃO PLENÁRIA DE 20.06.2007. 1. A criação de cadastro no âmbito da Administração Pública Federal e a simples obrigatoriedade de sua prévia consulta por parte dos órgãos e entidades que a integram não representam, por si só, impedimento à celebração dos atos previstos no art. 6º do ato normativo impugnado. 2. A alteração substancial do art. 7º promovida quando da edição da Medida Provisória 1.863-52, de 26.08.1999, depois confirmada na sua conversão na Lei 10.522, de 19.07.2002, tornou a presente ação direta prejudicada, nessa parte, por perda superveniente de objeto. 3. Ação direta parcialmente prejudicada cujo pedido, no que persiste, se julga improcedente.(ADI 1454, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 20/06/2007, DJe-072 DIVULG 02-08-2007 PUBLIC 03-08-2007 DJ 03-08-2007 PP-00029 EMENT VOL-02283-01 PP-00184 LEXSTF v. 29, n. 346, 2007, p. 29-50)
A inscrição no CADIN, conquanto não vincule o administrador para celebração dos atos previstos no art. 6º, deve orientá-lo, já que está atrelado ao princípio da moralidade administrativa. Como destaca Odete Medauar, “a percepção da imoralidade administrativa ocorre no enfoque contextual; ou melhor, ao se considerar o contexto em que a decisão foi ou será tomada. A decisão, de regra, destoa do contexto, e do conjunto de regras de conduta extraídas da disciplina geral norteadora da Administração”[1].Desta forma, atentaria a moralidade administrativa celebrar contrato de serviço com empresa, quando, após avaliar o Cadastro, o administrador identifique que esta está próxima da insolvência, considerando o valor de seus débitos.
A necessidade de observância deste Cadastro culmina com a afirmação que a inclusão no CADIN acaba sendo uma via de cobrança indireta, pois o particular ou a empresa acabam compelidos a regularizar a situação, seja pagando ou parcelando a dívida, para poder executar suas atividades.
De se notar que a legislação brasileira tem caminhado no sentido de se criar bancos de dados com informações de adimplemento de pessoas naturais ou de pessoas jurídicas para formação de histórico de crédito, como se vê da Lei n. 12.414/2011, o chamado cadastro positivo.
Com efeito, o CADIN, diversamente, não relaciona os adimplentes, mas sim, os inadimplentes, razão pela qual, a própria Lei prevê que o devedor deve ser comunicado de sua inscrição previamente, como dispõe expressamente o art. 2º, § 2º, da Lei n. 10.522/2002:
§ 2o A inclusão no Cadin far-se-á 75 (setenta e cinco) dias após a comunicação ao devedor da existência do débito passível de inscrição naquele Cadastro, fornecendo-se todas as informações pertinentes ao débito.
A necessidade de comunicação do devedor ocorre porquanto é garantido ao devedor regularizar a situação, quitando o débito, ou mesmo questioná-lo pela via administrativa ou judicial, antes da inscrição do crédito. É materialização dos princípios do contraditório e ampla defesa, insculpidos no art. 5º, LV, da Constituição[2].
A obrigatoriedade da comunicação prévia implica que sua ausência é capaz de nulificar todo o procedimento, conforme entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça. Neste sentido, recente acórdão, publicado agora em 18 de novembro de 2014:
TRIBUTÁRIO. INCLUSÃO DO DEVEDOR NO CADIN. NECESSIDADE DE COMUNICAÇÃO PRÉVIA. ART. 2º, § 2º, DA LEI Nº 10.522/02. PRECEDENTES.
1. Impossibilidade de análise da alegada ofensa ao art. 37, caput, da Constituição Federal por se tratar de tema que foge à competência do Superior Tribunal de Justiça prevista no art. 105, III, da Constituição Federal.
2. A comunicação prévia do débito ao devedor é etapa fundamental do procedimento de inscrição no CADIN, na forma do § 2º do art. 2º da Lei nº 10.522/02, e deve ser observada pela Administração, sobretudo porque haverá o interstício de 75 dias entre a comunicação e a registro, de forma que nesse prazo o devedor poderá providenciar a regularização da situação que deu causa a inclusão para que se proceda à respectiva baixa, na forma do § 5º do referido dispositivo legal.
3. Situação diversa é aquela em que ocorre a reativação do registro no CADIN, hipótese em que não haverá necessidade de nova comunicação ao devedor, conforme orientação já adotada pela Primeira Turma desta Corte no âmbito do REsp nº 1.238.650/MG, de relatoria do Ministro Benedito Gonçalves, DJe de 29.06.2012. No caso dos autos, porém, a premissa fática que consta do acórdão recorrido é no sentido da inexistência de comunicação do débito ao devedor no caso de inclusão no CADIN, pois a Corte a quo entendeu ser desnecessária na hipótese, não se referindo, em nenhum momento, à reativação do registro.
4. Não tendo ocorrido a comunicação prévia do devedor antes de sua inscrição no CADIN, é de se considerar maculado o procedimento administrativo e, em razão disso, deve ser reformado o acórdão recorrido para assegurar à recorrente sua exclusão do CADIN.
5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.
(REsp 1470539/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/11/2014, DJe 18/11/2014)
Neste acórdão o eminente Ministro Relator esclarece, ainda, que “situação diversa é aquela em que ocorre a reativação do registro no CADIN, hipótese em que não haverá necessidade de nova comunicação do devedor, conforme orientação já adotada pela Primeira Turma desta Corte no âmbito do REsp N. 1.238.650/MG, da relatoria do Ministro Benedito Gonçalves, DJe 29.06.2012”[3]. Confira-se a ementa do julgado referido:
PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 458 E 535 DO CPC. VÍCIOS NÃO CONFIGURADOS. CONTRIBUINTE EXCLUÍDO DO REFIS. REGISTRO NO CADIN NA PENDÊNCIA DE RECURSO ADMINISTRATIVO.NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. DESNECESSIDADE. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 2º, § 2º, DA LEI 10.522/2002.
1. Afasta-se a alegada violação aos artigos 458 e 535, inciso II, do CPC, porquanto o acórdão recorrido apreciou, de forma expressa e devidamente fundamentada, o ponto indicado pela recorrente como omisso.
2. Discussão a respeito da necessidade de notificação prévia do devedor acerca da reinclusão de seus débitos no CADIN, nas hipóteses em que o débito não é novo, mas decorre da exclusão do regime de parcelamento de tributos denominado REFIS.
3. Não é necessária a realização de nova notificação do contribuinte nos casos de "reativação" da inscrição então suspensa, por força de causa de suspensão da exigibilidade do débito. Inteligência dos artigos 2º, §§ 2º e 4º e 7º, da Lei 10.522/2002.
4. Recurso especial provido.
(REsp 1238650/MG, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/06/2012, DJe 29/06/2012)
Com efeito, no caso de reativação da inscrição, por força de inadimplemento de parcelamento, ou mesmo de pedido improvido em ação judicial, não teremos um novo crédito. É o mesmo crédito já objeto de comunicação prévia, como previsto no art. 2º, § 2º, acima referido. Isso porque o crédito volta a constar no Cadastro, ante ao afastamento da causa suspensiva prevista no art. 7º da multicitada lei.
A lei, portanto, exige comunicação prévia, apenas nos casos de primeira inclusão, já que os débitos já inscritos e porventura suspensos, já foram objeto de contraditório e ampla defesa naquela oportunidade.
3. DA CONCLUSÃO
A necessidade de comunicação prévia do devedor nos casos de inscrição no CADIN decorre da necessária observância dos princípios do contraditório e ampla defesa, eis que, embora o fato de constar no referido Cadastro não seja óbice a realização dos atos previstos no art. 6º da Lei n. 10.522/2002, é indicativo que deve ser observado pela Administração, sob pena de violação ao princípio da moralidade administrativa.
Por outro lado, nos casos em que já houve esta comunicação prévia, tendo havido suspensão da inclusão, por força do art. 7º da Lei n. 10.522/2002, que por algum motivo cessou, desnecessária nova comunicação, porquanto os débitos já foram objeto de contraditório e ampla defesa na primeira oportunidade em que inscritos.
BIBLIOGRAFIA
MEDAUAR, Odete. Direito administrativo. 7ª ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 139.
ADI 1454, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 20/06/2007, DJe-072 DIVULG 02-08-2007 PUBLIC 03-08-2007 DJ 03-08-2007 PP-00029 EMENT VOL-02283-01 PP-00184 LEXSTF v. 29, n. 346, 2007, p. 29-50.
REsp 1470539/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/11/2014, DJe 18/11/2014.
REsp 1238650/MG, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/06/2012, DJe 29/06/2012
[1] MEDAUAR, Odete. Direito administrativo. 7ª ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 139.
[2] Art. 5º (...) LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
[3]REsp 1470539/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/11/2014, DJe 18/11/2014.
Procuradora Federal. Graduada em Direito pela Universidade Federal de Goiás. Especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Universidade Federal de Goiás.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FARIA, Carolina Lemos de. A inscrição no CADIN e a necessidade de comunicação prévia do devedor Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42189/a-inscricao-no-cadin-e-a-necessidade-de-comunicacao-previa-do-devedor. Acesso em: 23 dez 2024.
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