Primeiramente, urge mencionar, a Lei nº 9.784/99 estabelece a disciplina geral do processo administrativo no âmbito da administração pública federal.
O seu artigo 1º estabelece seu âmbito de aplicação, vejamos:
Art. 1o Esta Lei estabelece normas básicas sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Federal direta e indireta, visando, em especial, à proteção dos direitos dos administrados e ao melhor cumprimento dos fins da Administração.
§ 1o Os preceitos desta Lei também se aplicam aos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário da União, quando no desempenho de
Nesse contexto, Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo, em sua Obra Direito Administrativo Descomplicado, 2014, analisam:
“É importante atentar para o âmbito de aplicação da Lei nº 9.784/1999. Trata-se de uma lei administrativa federal, isto é, suas normas são aplicáveis à administração pública federal, direta e indireta, inclusive, aos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário da União, quando estes estiverem desempenhando funções administrativas (art. 1ª, caput e, § 1º).”
Outro aspecto digno de nota em relação à aplicabilidade da Lei nº 9.784/99 é o seu caráter supletivo e subsidiário, o que significa que, diante da inexistência de lei específica a tratar de determinado processo administrativo, serão aplicáveis os preceitos da Lei nº 9.784/99.
Mais adiante prelecionam Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo na Obra Direito Administrativo Descomplicado, 2014:
“Quanto à aplicação da Lei nº 9.784/1999 aos processos administrativos federais, aspecto relevante a observar é o seu caráter supletivo e subsidiário.Com efeito, a Lei nº 9.784/199 não revogou nem alterou nenhuma lei específica disciplinadora de processos administrativos determinados, conforme expressamente estabelece o seu art. 69, os processos administrativos que sejam regulados em leis específicas permanecem regidos por essas leis, sendo apenas subsidiariamente aplicáveis os preceitos da Lei nº 9.784/1999.”
Nesse contexto, imprescindível destacar que não existe no arcabouço legislativo ambiental pátrio disposição normativa específica estabelecendo a forma de contagem dos prazos para manifestação dos Interessados em Processos Administrativos Ambientais.
A lei nº 9.784/99, Lei Geral do Processo Administrativo, por sua vez, trata da contagem dos prazos processuais no âmbito dos processos administrativos federais, em seus artigos 66 e 67, vejamos:
Art. 66. Os prazos começam a correr a partir da data da cientificação oficial, excluindo-se da contagem o dia do começo e incluindo-se o do vencimento.
§ 1o Considera-se prorrogado o prazo até o primeiro dia útil seguinte se o vencimento cair em dia em que não houver expediente ou este for encerrado antes da hora normal.
§ 2o Os prazos expressos em dias contam-se de modo contínuo.
§ 3o Os prazos fixados em meses ou anos contam-se de data a data. Se no mês do vencimento não houver o dia equivalente àquele do início do prazo, tem-se como termo o último dia do mês.
Art. 67. Salvo motivo de força maior devidamente comprovado, os prazos processuais não se suspendem.
Da análise dos dispositivos legais acima colacionados, conclui-se que, de fato, há uma lacuna na aludida norma, uma vez que não foi contemplada a hipótese em que o dia de início da contagem do prazo ocorra em dia não-útil.
Já o Código de Processo Civil (CPC), trata expressamente da questão, ao prever em seu 184 , vejamos:
Art. 184. Salvo disposição em contrário, computar-se-ão os prazos, excluindo o dia do começo e incluindo o do vencimento. (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1973)
§ 1o Considera-se prorrogado o prazo até o primeiro dia útil se o vencimento cair em feriado ou em dia em que: (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1973)
I - for determinado o fechamento do fórum;
II - o expediente forense for encerrado antes da hora normal.
§ 2o Os prazos somente começam a correr do primeiro dia útil após a intimação (art. 240 e parágrafo único).(Redação dada pela Lei nº 8.079, de 1990)
Como se vê, o CPC fez a ressalva de que os prazos processuais apenas começariam a correr no primeiro dia útil subseqüente à intimação, já o art. 66, da Lei nº 9.784/99 afirma tão somente que os prazos começam a correr a partir da data da cientificação oficial, excluindo-se da contagem o dia do começo, não fazendo, portanto, qualquer tipo de exigência expressa de que o dia do início do prazo seja útil.
Nesse contexto, a melhor interpretação é a que assevera que o art.66 da Lei nº 9.784/99 não deve ser interpretado pela sua literalidade, mas de forma sistemática, dentro do contexto fático que permeia a questão.
Assim, mesmo que não tenha sido contemplada a hipótese da data de início da contagem do prazo cair em dia que não haja expediente na repartição pública, há de se aplicar, por analogia, a sistemática adotada nos demais ramos do direito processual.
Maria Helena Diniz, ao conceituar analogia em sua Obra Lacunas do Direito/1991, disserta:
“Por fim, MARIA HELENA DINIZ entende que a analogia consiste em aplicar a um caso não previsto de modo direto ou específico por uma norma jurídica, uma norma prevista para uma hipótese distinta, mas semelhante ao caso não contemplado, fundado na identidade do motivo da norma e não na identidade do fato.”
A analogia,por sua vez, deve ser conceituada como um método de integração jurídica, constituindo-se em um raciocínio por meio de um exemplo, uma comparação com um problema semelhante e a utilização da mesma resposta. Para o direito, a analogia seria assim uma forma de solucionar o problema por meio de uma identidade com outro, buscando atender à uma finalidade maior da lei, ou seja, é um raciocínio lógico que visa ao preenchimento de lacunas na lei, aplicando-se a determinada relação jurídica uma solução normativa já prevista para casos similares.
Em que pese a relevância da analogia para a interpretação do direito, sua aplicação demanda o preenchimento de alguns requisitos, sob pena de o intérprete usurpar a função privativa do legislador na elaboração das normas.
Tais requisitos, expõe Júlio Ricardo de Paula Amaral em seu artigo As lacunas da lei e as formas de Aplicação do Direito são: “1º) o caso deve ser absolutamente não previsto em lei; 2º ) deve existir elementos semelhantes entre o caso previsto e aquele não previsto; 3º ) esse elemento deve ser essencial e não um elemento qualquer, acidental.Somente após observados tais requisitos é que serálícito ao aplicador da lei valer-se da analogia.”
Ora, com base nas considerações acima expostas, conclui-se que não há fundamento hábil a justificar a diferenciação de tratamento para a forma de contagem de prazos que possuem a mesma natureza jurídica, qual seja, processual, refiram-se eles a processo civil ou processo administrativo.
Na verdade, importante considerar que a regra atual inserta no bojo do CPC é fruto de uma construção jurisprudencial que remonta ao ano de 1963, entendimento este consagrado através da edição da súmula nº 310, do STF:
S310, STF - Quando a intimação tiver lugar na sexta-feira, ou a publicação com efeito de intimação for feita nesse dia, o prazo judicial terá início na segunda-feira imediata, salvo se não houver expediente, caso em que começará no primeiro dia útil que se seguir.
Em verdade, tal entendimento foi sumulado no país enquanto ainda vigorava o antigo Código de Processo Civil de 1939 que, ao tratar do assunto, da mesma forma que a Lei de Processo Administrativo Federal, Lei nº 9.784, era omisso.
Conforme já mencionado, em momento posterior, o aludido entendimento foi incorporado ao CPC, bem como incorporado a outros ramos do direito, tal como o direito processual do trabalho, através da edição dos Enunciados nº 01 e 262 do TST.
Enunciado nº 01 - Quando a intimação tiver lugar na sexta-feira, ou a publicação com efeito de intimação for feita nesse dia, o prazo judicial será contado da segunda-feira imediata, inclusive, salvo se não houver expediente, caso em que fluirá do dia útil que se seguir.
Enunciado nº 262 - I - Intimada ou notificada a parte no sábado, o início do prazo se dará no primeiro dia útil imediato e a contagem, no subseqüente. (ex-Súmula nº 262 - Res. 10/1986, DJ 31.10.1986) II - O recesso forense e as férias coletivas dos Ministros do Tribunal Superior do Trabalho (art. 177, § 1º, do RITST) suspendem os prazos recursais. (ex-OJ nº 209 da SBDI-1 - inserida em 08.11.2000)
Assim, à vista das considerações acima formuladas, não vejo porque não aplicar a aludida regra ao processo administrativo em geral, uma vez que o fundamento utilizado para prorrogar-se o prazo processual é idêntico em relação ao processo administrativo e o processo civil, qual seja: a falta de razoabilidade em se iniciar contagem de prazos em dia em que a parte interessada não pode ter acesso aos autos, por não haver expediente na repartição competente.
Desta feita, conclui-se que o início da contagem do prazo deve recair em dia em que o atendimento ao ato processual respectivo seja possível, de modo que admitir entendimento contrário significaria admitir que existem diferentes prazos para o cumprimento das mesmas obrigações, a depender da data em que se realize a intimação.
Por fim, importante destacar que a Lei nº 9.784/99 assegura a observância do critério da “adoção de formas simples, suficientes para propiciar adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados” (art. 2º, parágrafo único), o que se coaduna perfeitamente com o entendimento acima delineado.
Em vista do exposto, conclui-se que, embora não haja disposição normativa específica, seja no arcabouço normativo ambiental pátrio, seja na Lei de Processo Administrativo, Lei nº 9.784/99, há de se aplicar, por analogia, o art. 184, § 1º, do CPC, que determina que a contagem dos prazos processuais terá início no primeiro dia útil seguinte à intimação.
- ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.
- DINIZ, Maria Helena. Lacunas no direito. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991.
- http://jus.com.br/artigos/30/as-lacunas-da-lei-e-as-formas-de-aplicacao-do-direito/3#ixzz3KHSr0429
- Alexandrino, Marcelo&Paulo, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado. 22ª ed. São Paulo: Método. 2014.
Procuradora Federal com atuação na Procuradoria Regional Federal da 1ªRegião - Brasília - DF
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CUNHA, Renata Maria Periquito Pontes. A contagem dos prazos nos processos administrativos ambientais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 dez 2014, 04:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42239/a-contagem-dos-prazos-nos-processos-administrativos-ambientais. Acesso em: 23 dez 2024.
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