RESUMO: o controle dos atos da administração pública dá-se em diversas searas, desde mecanismos internos de aferição de metas e validade de seus atos, passando por mecanismoS externos atribuíveis aos demais Poderes da Federação Brasileira, não excluindo a necessária participação da sociedade no controle direto, por meio de ações constitucionais e representação por atos de improbidade administrativa, tudo como exercício de sua cidadania.
PALAVRAS-CHAVE: Administração – Controle Interno e Externo – Plebiscito – Referendo – Iniciativa Popular – Poder Legislativo – Mandado De Segurança – Mandado De Injunção – Habeas Corpus – Habeas Data – Ação Popular – Ação de Improbidade Administrativa – Cidadania.
O Estado de Direito, por definição, possui como característica a edição de normas jurídicas a todos oponíveis, i.e., cuja observância pode ser cobrada tanto dos administrados como do próprio Estado. Nesta seara, exatamente para aferir o cumprimento de seu papel, o Estado de Direito estabelece mecanismos de controle sobre seus próprios atos, subdivididos em mecanismos de controle interno e de controle externo.
Isto não afasta, por óbvio, a possibilidade de participação da sociedade no controle dos atos praticados pela Administração Pública, notadamente se ao Estado for conferida feição ideológica como o fez a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Referido controle passa a ser exercido não apenas pelos representantes eleitos pela sociedade para representá-la no Congresso Nacional, mas também pelos mecanismos de participação direta, como o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular, sem prejuízo das ações constitucionais de mandado de segurança, mandado de injunção, habeas corpus, habeas data e ação popular.
De qualquer modo, quando se fala em controles externo e interno da Administração Pública, atém-se, em verdade, aos mecanismos de controle exercidos pelos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Quando a própria Administração Pública exerce controle mediante seus órgãos, aferindo seus próprios atos e agentes, caracteriza-se o chamado controle interno da Administração Pública. Já quando se verificar o controle exercido por órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário sobre atividades da Administração Pública, Direta ou Indireta, é de controle externo que se cuida.
Não obstante, tanto no controle externo como no interno da Administração Pública, o sistema de freios e contrapesos, essencial à manutenção da integridade do princípio da separação de poderes, deve ser rigidamente respeitado. Quer isto significar, em outras palavras, que o controle da Administração Pública deve se restringir aos limites estabelecidos em lei, preservando a autonomia do gestor público na condução das políticas de Estado.
Entretanto, eventual controle de legalidade do ato administrativo praticado, por si só, não implica necessariamente sua validade. De rigor, neste contexto, exercer o controle finalístico das atividades administrativas, em que pesem as opções políticas adotadas, haja vista que em qualquer hipótese deve ser preservado um núcleo mínimo de direitos e condições sociais, hábeis a sustentar a manutenção das bases do conceito de dignidade da pessoa humana.
O controle administrativo, necessário deixar estabelecido, não depende do exercício do controle da sociedade, correspondendo à aferição que a Administração Pública exerce sobre a atuação de seus próprios órgãos, tanto diante da descentralização como da desconcentração administrativas.
Já o controle exercido pela sociedade é, atecnicamente, conhecido como recurso administrativo (pois, muitas vezes de recurso não se trata, mas sim de iniciativa do administrado). Sua razão fundante encontra-se no direito de petição e na garantia da ampla defesa, previstos, respectivamente, no artigo 5º, incisos XXXIV e LV, da Constituição Federal Brasileira.
No exercício do controle social, mediante a prática de recursos administrativos, pode o administrado discutir a legalidade do ato administrativo sob as mais diversas formas. Neste contexto, a irregularidade pode ser comunicada à própria Administração Pública ou a órgãos de controle (representação); impugnação de ato ilegal provocador de lesão ou ameaça a direito do administrado (reclamação administrativa) e solicitação de reexame do ato praticado ao próprio agente de que emanado (pedido de reconsideração) ou à autoridade imediatamente superior (recurso hierárquico).
O pedido de reexame do ato praticado à autoridade imediatamente superior ao agente administrativo, recurso hierárquico, pode ser próprio ou impróprio. Será próprio quando a autoridade administrativa hierarquicamente superior fizer parte da mesma estrutura do órgão administrativo a que pertencer o autor do ato administrativo impugnado; será imprópria, por sua vez, se não fizer parte da mesma estrutura hierarquizada do órgão do agente administrativo que praticou o ato discutido.
Mas o controle dos atos administrativos, em que pesem os inúmeros mecanismos retromencionados, não se restringe àquela esfera, sendo legítimo o controle exercido pelo Poder Judiciário sobre a Administração Pública, considerado como controle externo. Impende destacar que esta análise abarca tanto a legalidade quanto a legitimidade dos atos administrativos, permitindo-se a discussão de validade, nos casos de lesão ou ameaça de direito, de direitos políticos, inclusive.
O princípio da ubiquidade, ou da inafastabilidade da jurisdição, está esculpido no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal Brasileira, estabelecendo o princípio da jurisdição una. Referido princípio não pode ser afastado pelo poder constituinte derivado, sob pena de ofensa a cláusula pétrea (direitos e garantias individuais, art. 60, §4º, inciso IV, da Constituição Federal Brasileira). O próprio poder constituinte originário, no entanto, excepcionou o princípio da ubiquidade no que diz respeito à justiça desportiva, nos termos do art. 217, §1º, da Constituição Federal Brasileira, exigindo o esgotamento das instâncias daquela justiça antes de os fatos serem submetidos ao Poder Judiciário.
Fica claro, portanto, que ao cidadão é apresentado farto leque de possibilidades de controle dos atos administrativos, seja pela linha direta como pela indireta, neste último caso provocando órgão ou entidade encarregada da fiscalização dos atos administrativos a adotar providências de qualquer ordem. No entanto, não se podem desprezar os mecanismos de controle direto do cidadão, que, no mais das vezes, contam com a atuação direta do Poder Judiciário para permitir sua execução.
E este papel exercido pelo Poder Judiciário reflete, exatamente, um de seus principais papéis: o das substitutividade. Através do resultado da atividade do Poder Judiciário, impõe-se a vontade concreta da lei, pondo-se fim à lide, revestindo-se essa decisão de eficácia que a torna imutável.
O papel do Poder Judiciário é tão importante que mesmo as decisões proferidas por “tribunais administrativos” (que, por exemplo, examinam matérias fiscais) não se revestem do atributo da imutabilidade e poderão ser, sempre, revistas perante o Poder Judiciário.
Por tais motivos, merecem destaque os meios especialmente previstos pela Constituição Federal Brasileira para o controle dos atos administrativos, amplamente conhecidos como ações constitucionais.
A primeira delas é prevista no art. 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal Brasileira, atinente à figura do habeas corpus. Trata-se de ação constitucional de natureza penal com o escopo de proteger a liberdade de locomoção se e quando ameaçada ou violada por ilegalidade ou abuso de poder.
Já o artigo 5º, incisos LXIX e LXX, do Texto Maior albergam o instituto do mandado de segurança, tanto individual como coletivo. Constituem remédio constitucional a proteger direito líquido e certo, individual ou coletivo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, violado ou ameaçado de violação por ato ou omissão de autoridade pública ou de agente de pessoa jurídica de direito privado no exercício de atribuições públicas, praticado ilegalmente ou com abuso de poder. A proteção, neste caso, afigura-se de tal sorte importante que este remédio constitucional pode ser manejado não apenas com caráter corretivo (após a prática do ato lesionador), mas, inclusive e principalmente, na seara preventiva. Não se pode admitir a violação do direito para, somente após, buscar-se a proteção do ordenamento jurídico; de fato, o resguardo eficaz do bem jurídico tutelado pela norma permite o acionamento de mecanismos de proteção antes mesmo que o dano ou atentado ao direito ocorram.
Em terceiro lugar, o mandado de injunção também se apresenta como ação constitucional segundo disposto no art. 5º, inciso LXXI, da Constituição Federal Brasileira. Busca, por seu turno, a garantia de efetivação dos direitos individuais e coletivos não exercidos porque ausente norma regulamentadora.
Ao lado destes instrumentos, tem-se o habeas data, previsto no art. 5º, inciso LXXII, da Constituição Federal Brasileira, destinado ao direito de acesso a dados ou informações pessoais constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público.
Há, ainda, a ação popular, definida pelo art. 5º, inciso LXXIII, da Constituição Federal Brasileira como ação constitucional em que o cidadão a propõe pretendendo anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência.
Por fim, não se pode olvidar a figura da ação civil pública, estabelecida no art. 129, inciso III, da Constituição Federal Brasileira, para proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos. Antes da atual Constituição Federal Brasileira esta ferramenta de controle já era prevista na Lei Federal n. 7.347/85,cujo art. 1º atualmente apresenta a seguinte redação:
Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:
l - ao meio-ambiente;
III – a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;
IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo.
V - por infração da ordem econômica;
VII – à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos.
VIII – ao patrimônio público e social.
No mais, em se tratando de controle dos atos da administração pública, inconcebível deixar de tratar dos famigerados atos de improbidade administrativa, mencionada no art. 15, inciso V, da Constituição Federal Brasileira como causa de suspensão dos direitos políticos e, no art. 37, §4º, do mesmo Diploma Maior, como ensejadora de graves sanções.
Como maneira de dar efetividade à aplicação das sanções preconizadas no art. 37, §4º, da Constituição Federal Brasileira, editou-se lei de âmbito nacional n. 8.429/92, aplicável a todas as entidades políticas, definindo: sujeitos ativos e passivos do ato de improbidade, ato de improbidade, sanções cabíveis, regras processuais aplicáveis à ação de improbidade administrativa.
Embora se relacionem, os conceitos de probidade e moralidade administrativa não se equivalem; ao contrário, complementam-se. Cumpre dizer, neste lanço, que a violação ao princípio da probidade administrativa, embora compreenda a violação do princípio da moralidade administrativa, é mais ampla. De fato, o ato ímprobo viola não apenas o princípio da moralidade administrativa, mas sim todos os princípios da Administração Pública.
Não apenas os componentes da Administração Pública Direta e Indireta podem ser sujeitos passivos dos atos de improbidade, mas qualquer entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público, bem como cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra de qualquer forma.
Sujeitos ativos dos atos de improbidade administrativa não são apenas os agentes públicos (e aqui resta essencial a participação da sociedade no controle dos atos administrativos, denunciando eventuais irregularidades aos órgãos competentes à persecução e penalização dos agentes ímprobos), mas também terceiros que induzam ou concorram para a prática da improbidade ou dela se beneficiem sob qualquer forma – direta ou indireta.
Impende dizer, por outro lado, que a ação de improbidade administrativa não afasta a concomitância de concomitantes mecanismos de controle, podendo o cidadão ou o órgão controlador adotar todas as outras providências já mencionadas neste texto (sejam elas medidas administrativas, judiciais ou mesmo constitucionais), posto que eventual responsabilização em sede de ação de improbidade administrativa não impede, muito menos afasta, possíveis sanções penais, civis e administrativos que se afigurem aplicáveis à espécie.
Por todo o exposto, pode-se concluir que são inúmeros os mecanismos de controle dos atos administrativos, iniciando-se pelos controles internos que cada órgão ou Poder deve exercer, passando pelos mecanismos de controle externo (mesmo que ainda administrativos) e, por fim, não excluindo mecanismos judiciais de controle direto, seja por meio de ações constitucionais ou pela atuação de órgãos legitimados a promover a responsabilidade no âmbito judicial daqueles que agiram com desvio ou abuso de poder no trato da coisa pública. De fato, mister se faz que a sociedade seja cada vez mais informada a respeito destes instrumentos, para que possa, eficazmente, zelar pelo efetivo exercício de sua cidadania.
Procurador Federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: JANNUCCI, Alessander. Controles interno e externo da Administração Pública Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 12 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42274/controles-interno-e-externo-da-administracao-publica. Acesso em: 23 dez 2024.
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