Resumo: Este breve artigo busca fazer uma síntese dos aspectos até pouco tempo polêmicos no Sistema Financeiro da Habitação, não obstante a maioria dos temas tratados já tenham sido pacificados na jurisprudência. Ainda assim, entendemos pertinente que se faça uma digressão acerca de tais problemas, a fim de que se possa entender a evolução do raciocínio jurídico que cerca a matéria.
Palavras-chave: SFH. Temas polêmicos. Tabelas de reajuste.
Sumário: 1. INTRODUÇÃO. 2. ALGUNS ASPECTOS POLÊMICOS RELATIVOS AO SFH. 2.1. PLANOS DE REAJUSTE. 2.2. SISTEMAS DE AMORTIZAÇÃO DO CAPITAL. 2.3. DOS JUROS. 2.4. CONTRATOS DE GAVETA. 3. CONCLUSÃO.
1. INTRODUÇÃO.
No presente texto, buscaremos trazer à lume alguns dos temas polêmicos ligados ao Sistema Financeiro da Habitação (SFH), todos eles com discussão já assentada nos Tribunais Superiores.
2. ALGUNS ASPECTOS CONTROVERSOS RELATIVOS AO SFH
O Banco Nacional de Habitação (doravante BNH) foi extinto em 1986, ocasião em que fora sucedido pela Caixa Econômica Federal (CEF), nas tarefas de fomento e execução de políticas habitacionais, em seu ativo e passivo. O objetivo do SFH é naturalmente a política habitacional, que, embora definida pelo Poder Público, será executada pela iniciativa privada. Cabe notar que o Conselho Monetário Nacional (CMN) exerce função de órgão central e o Banco Central (BACEN) de poder de polícia.
O mútuo habitacional atrai a incidência do Código de Defesa do Consumidor (CDC), consoante reiterados entendimentos do STJ sobre o tema. Contudo, a incidência de tais regras não desonera o mutuário do dever de comprovar suas alegações. Ou seja, há de ser demonstrado, de forma individualizada, a abusividade das cláusulas contratuais questionadas.
Além disso, o Poder Judiciário não pode proceder de ofício a revisão das cláusulas contratuais que não tenham sido objeto de impugnação específica do mutuário.É de se notar, porém, que nos contratos que prevejam a cobertura pelo Fundo de Compensação de Variação Salarial (FCVS), o CDC não é aplicável. A razão para tanto se encontra fundada na justificativa de que aqueles contratos que contam com a cobertura FCVS já detém uma garantia ofertada pelo Governo Federal, protetiva do mutuário e do SFH (STJ).
De se notar, ademais, que eventuais valores cobrados indevidamente do mutuário, para serem repetidos em dobro, não prescindem da comprovação de má-fé da instituição financeira.
De mais a mais, normalmente, a contratação do mútuo está atrelada a contratação de um seguro habitacional obrigatório, não havendo necessidade que seja ele contratado com o próprio agente financeiro ou segurador por este indicado, sob pena de incidir em venda casada (súmula 473 do STJ). Releva notar que esse seguro não se destina apenas a cobrir danos físicos no imóvel, mas também a morte por invalidez do mutuário, bem como a responsabilidade civil do consumidor, e seu valor é fixado pela SUSEP.
É de se lembrar que a mera circunstância de o contrato de financiamento ser celebrado durante construção ou no mesmo instrumento do contrato de compra e venda firmado com o vendedor não implica a responsabilidade do agente financeiro pela solidez e perfeição da obra. Seria diferente se ela tivesse ingerência direta na obra.
Ainda, o recolhimento em prol do FUNDHAB é legal, desde que previsto contratualmente (STJ).
Por fim, a União carece de legitimidade passiva para figurar em ação que se discuta reajuste da prestação no âmbito do SFH.
2.1. PLANOS DE REAJUSTE.
Os critérios que trataremos adiante cuidam de forma de reajustar as prestações, e não o saldo devedor.Existem 3 formas de se reajustar um contrato no âmbito do SFH:
O PES apenas incide sobre o reajuste das prestações, não sobre o saldo devedor. Isso pode levar a uma problema conhecido como "amortização negativa". Isso vem a ocorrer quando o valor da prestação mensal - corrigido pelo PES - não é suficiente para amortizar os juros. Essa situação levou o Judiciário, em tais casos, a estabelecer um conta judicial em separado para serem lançados os juros não-amortizados, sobre os quais apenas incide correção monetária, a fim de que a "amortização negativa" não induzisse à cobrança de juros sobre juros (de comum ocorrência na tabela PRICE, nos moldes adotados no Brasil).
O mutuário que for profissional liberal autônomo, que celebre contrato regido pelo PES, terá suas prestações corrigidas pelo IPC.
Se houver redução de renda do mutuário ou alteração na composição da renda familiar, a lei não permite a redução da prestação, devendo ser buscada solução pela dilação do prazo de liquidação do financiamento.
Sobre o FCVS, importante mencionar que a aplicação da regra da exceção do contrato não-cumprido na seguinte hipótese: se, após 60 dias do protocolo do requerimento da revisão dos encargos mensais, motivado este requerimento pela sua variação de renda, o mutuário não receber qualquer resposta da instituição, pode ser suspenso, sem qualquer penalidade, o pagamento dos encargos mensais.
Ainda sobre FCVS, nas ações judiciais em que se discutam contratos com cobertura FCVS, o interesse da União será meramente econômico, razão pela qual não se admite sua intervenção no feito, ainda que a CEF - na qualidade de gestora - esteja no autos (STJ).
Se não houver previsão contratual expressa de cobertura FCVS, o saldo devedor residual, ainda que decorrente da inflação, será suportado pelo mutuário. Por sinal, desde de 1990, vigora a regra de que apenas um contrato por mutuário poderia ser garantido pelo FCVS. Antes disso, não havia essa restrição.
A regra da imputação de pagamento prevista no art. 354 do CC (paga-se primeiro os juros vencidos, sdc) tem perfeita aplicação aqui, de sorte que primeiro é feita a atualização do saldo devedor (juros + correção), e, depois, a amortização do saldo, em perfeita consonância com a súmula 450 do STJ.
No que se refere à correção monetária, a utilização da Taxa Referencial (TR) nos contratos em que ajustadaa correção pelos índices da poupança (ou às contas vinculadas de FGTS), é permitido desde 1991. Ainda que o contrato tenha sido firmado anteriormente àaquele ano, se nele houver cláusula prevendo a atualização pela taxa básica de poupança (sem especificar), incide a TR.
Os encargos mensais englobam tanto a amortização do saldo devedor e seus respectivos juros, bem como o seguro obrigatório.
2.2. SISTEMAS DE AMORTIZAÇÃO DO CAPITAL.
2.3. DOS JUROS.
Atualmente, a limitação de juros no SFH é previsto pelo art. 25 da lei 8692/93, que prevê um patamar máximo de 12%. Esse limite só é aplicável às pessoas físicas, mutuárias do SFH, e não as empresas de construção civil.
A capitalização de juros é possível desde que haja previsão legal para tanto. À mingua de sua autorização, ela resta vedada, o que foi o caso do SFH. Com a edição da lei 11977/2009, foi dada autorização para capitalização de juros no SFH, desde que expressamente pactuada.
2.4. CONTRATOS DE GAVETA.
O mutuário celebra um contrato de compra e venda com terceiro, transferindo a ele a propriedade do imóvel, assim como a dívida assumida perante o agente financeiro. Ele não é lavrado em escritura pública, além de não contar com a participação da instituição financeira concedente, possuindo eficácia apenas entre as partes contratantes.
De todo modo, a jurisprudência tem admitido a defesa da posse pelo adquirente, bem como a apresentação de embargos de terceiro quando o bem é penhorado em ação proposta contra a pessoa que consta na matrícula do imóvel.
Entretanto, esse adquirente não terá legitimidade para propor ação discutindo o contrato de mútuo habitacional com o agente financeiro.
Por outro lado, não se pode olvidar uma exceção. Nesse diapasão, os contratos com cobertura FCVS, cedidos até 25/10/1996, sem a necessária anuência da instituição financeira, desde que não prevejam reajuste das parcelas pelo PCR ou PES (agregam elemento personalíssimo ao contrato), podem ser regularizados.
Quanto às hipotecas, vale lembrar que se ela for firmada entre a construtora e o agente financeiro, antes ou depois da celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel.
3. CONCLUSÃO
Pelo que se vê, diversas questões foram pacificadas pelos Tribunais ao longo do tempo, fazendo que a outrora tormentosa de se lidar com os contratos no âmbito do SFH fosse deveras facilitada, tornando as tarefas do operadores jurídicos menos sujeitas a odiosos casuísmos.
Bibliografia:
XAVIER, Carlos Eduardo Rangel, Leis Especiais para Concursos - v.42 - Sistema Financeiro de Habitação, 1ª ed, Ed. Juspodium, 2012.
VENOSA, Silvio de Sálvio, Direito Civil – Parte Geral, vol. I, 5ª ed., 2005, Atlas.
COVELLO, Sérgio Carlos, Contratos bancários.
Procurador Federal. Mestre em Ciências Jurídico-Econômicas pela Universidade do Porto/PT.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BASTOS, Bruno Medeiros. SFH - breves apontamentos sobre alguns de seus aspectos controvertidos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 12 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42284/sfh-breves-apontamentos-sobre-alguns-de-seus-aspectos-controvertidos. Acesso em: 23 dez 2024.
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