Resumo: O presente artigo tem como objetivo analisar o caráter especial da proteção ambiental conferida à Floresta Amazônica pelo ordenamento jurídico pátrio.
Palavras chave: Floresta Amazônica. Constituição Federal. Tratados Internacionais. Supralegalidade.
Introdução
A Floresta Amazônica possui proteção especial no Brasil, tendo a aludida proteção sido objeto de tratamento pelo texto da Carta Magna, o que significa que sua utilização far-se-à nos termos da legislação aplicável e de maneira a preservar maximamenteseus atributos naturais.
Desenvolvimento
A Floresta Amazônica foi prevista como patrimônio nacional, recebendo tratamento especial,haurido diretamente do texto constitucional.
Assim, dispõe a Constituição Federal em seu art. 225, § 4º, da Constituição da República de 1988 – CR:
A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais (art.225§4ºCR).
A respeito da proteção especial conferida pela CR à Floresta Amazônica, pontuam Leonardo Medeiros Garcia e Romeu Thomé em sua Obra Direito Ambiental:
“A Floresta Amazônica, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato - Grossense e a Zona Costeira, são ecossistemas considerados PATRIMÔNIO NACIONAL pelo artigo 225, §4º da Constituição de 1988, o que significa dizer que sua utilização far-se-á na forma da lei e dentro de condições que assegurem a preservação dos seus atributos biológicos. A Carta Magna, ao se referir expressamente a esses riquíssimos biomas, pretendeu enfatizar a sua importância ambiental estabelecendo uma proteção genérica, assegurando, por exemplo, a defesa de interesses do Brasil diante de eventuais ingerências estrangeiras.”
Da leitura das explanações acima, conclui-se que a Floresta Amazônica integra o rol das áreas consideradas frágeis, além de que possuidoras de expressiva diversidade biológica, razão pela qual receberam proteção especial pela Constituição da República.
Nesse contexto, para disciplinar a utilização da Floresta Amazônica, evitando sua destruição pelo desflorestamento, queimadas, atividades madeireira e agropecuária, o revogado Código Florestal, Lei nº 4.771/41, dispunha nos seus artigos.15 e 19:
Art.15.Fica proibida a exploração sob forma empírica das florestas primitivas da bacia amazônica, que só poderão ser utilizadas em observância a planos técnicos de condução e manejo a serem estabelecidos por ato do Poder Público, a ser baixado dentro do prazo de um ano.
[...]
Art.19.A exploração de florestas e formações sucessoras, tanto de domínio público como de domínio privado, dependerá de prévia aprovação pelo órgão estadual competente do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, bem como da adoção de técnicas de condução, exploração, reposição florestal e manejo compatíveis com os variados ecossistemas que a cobertura arbórea forme.
Tais dispositivos foram regulamentados pelo Decreto 5975/2006, que dispõe no seu art.1º que a “exploração de florestas e de formações sucessoras de que trata o art.19 da Lei no 4.771, de 15 de setembro de 1965, bem como a aplicação dos seus arts.15, 16, 20 e 21, observarão as normas deste Decreto”, e no seu art.2º dispõe que tal exploração, quando sob oregime de manejo florestal sustentável, “dependerá de prévia aprovação do Plano de ManejoFlorestal Sustentável- PMFS pelo órgão competente do Sistema Nacional do Meioambiente – SISNAMA”, tendo sido, ainda editado o Decreto n°6.321, de 21 de dezembro de 2007, que estabeleceu uma série de ações de forma prevenir, monitorar e controlar o desmatamento ilegal no bioma Amazônia.
Nesse contexto, com o objetivo de promover a proteção da Floresta Amazônica, estabelecida a nível constitucional, foi criado o Programa Piloto para proteção das Florestas Tropicais, surgido em 1990, na Convenção de Houston, que reuniu os países do G7 (Canadá, França, Itália, Alemanha, Estados Unidos da América, Japão, Reino Unido), em prol da proteção das florestas tropicais brasileiras, e ratificado na Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), a Rio 92, através da edição de uma declaração de princípios sobre florestas.
O mundo vivia a onda contra a devastação da floresta Amazônica. Governos e sociedade civil estavam juntos na procura por soluções que poderiam combinar a conservação da floresta Amazônica e da Mata Atlântica com o uso sustentável de seus recursos naturais, ao mesmo tempo em que essas soluções poderiam melhorar as condições de vida da população local.
O Programa é uma iniciativa do governo brasileiro em parceira com a comunidade internacional, foi considerado um dos maiores programas de cooperação multilateral relacionado a uma temática ambiental de importância global, tendo sido financiado pelos governos dos países do G7, Países Baixos e União Europeia. Os recursos foram complementados com contribuição do próprio governo brasileiro, governos dos estados e sociedade civil. O Banco Mundial administrou o Rain Forest TrustFund (RFT), criado para absorver as contribuições dos diferentes doadores.
Sobre o assunto, mister pontuar que grande parte dos mais renomados doutrinadores pátrios defende que os tratados internacionais assinados pelo Brasil possuem um status de supralegalidade, estando abaixo da Constituição, mas acima do arcabouço legislativo infraconstitucional.
Analisemos passagem da Obra A opção do Judiciário brasileiro em face dos conflitos entre Tratados Internacionais e Leis Internas.Revista CEJ, Brasília-DF, n. 14, p. 112-120, mai./ago. 2001, de Valério de Oliveira Mazzuoli:
"os tratadosinternacionais ratificados pelo Brasil situam-se em um nível hierárquico intermediário: estão abaixo da Constituição e acima da legislação infraconstitucional, não podendo ser revogados por lei posterior, posto não se encontrarem em situação de paridade normativa com as demais leis nacionais".
O Supremo Tribunal Federal, ao analisar a questão, manifestou-se favoravelmente à tese da supralegalidade dos tratados de direitos humanos não internalizados na forma preceituada pelo art. 5º, § 3º, da CR.
Vejamos a análise de Bernardo Gonçalves Fernandes em sua Obra Curso de Direito Constitucional sobre a questão:
“A tese vencedora no STF propugnada pelo Ministro Gilmar Mendes foi a de que esses TIDH que não passaram pelo procedimento do art. 5º, §3º da CR/88 não poderiam adentrar como leis ordinárias por serem de direitos humanos (o que não mais caberia frente a nova assertiva trazida pela EC nº 45/04), mas também não seriam normas constitucionais por não terem sido aprovadas nos mesmos moldes das Emendas Constitucionais. Segundo o Ministro, eles deveriam adentrar no ordenamento pátrio como normas supralegais, ou seja, um meio termo (posição intermediária) entre as normas constitucionais e as leis ordinárias. Nesse sentido, estariam acima das leis ordinárias e abaixo das normas constitucionais. Portanto, passamos agora, em virtude desse posicionamento, assente de forma majoritária no STF a ter 3 hipóteses sobre a recepção de Tratados Internacionais em nosso ordenamento.”
Tal tese encontra amparo no raciocínio que defende que a indiferença às conseqüências do descumprimento do tratado no plano internacional, a que se comprometeu a cumprir de boa-fé, acaba por afrontar o disposto no art. 27 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, que determina:
Artigo 27
Direito Interno e Observância de Tratados
Uma parte não pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar o inadimplemento de um tratado.Esta regra não prejudica o artigo 46.
Ora, se o Estado no livre e pleno exercício de sua soberania ratifica um tratado, não pode posteriormente obstar seu cumprimento, até por que o término de um tratado está submetido à disciplina da denúncia, ato unilateral do Estado pelo qual manifesta seu desejo de deixar de fazer parte de um tratado. Assim, na hipótese de inexistência do ato da denúncia, persiste a responsabilidade do Estado na ordem internacional.
Conclusão
Assim, com base nas considerações acima formuladas, conclui-se que o caráter especial da proteção conferida à Floresta Amazônia encontra fundamento no texto constitucional, nos Tratados Internacionais e demais compromissos internacionais assinados pelo Brasil, o que nos leva à conclusão de que tal proteção especial deve subsistir, mesmo diante do advento de leis ordinárias que venham a restringir ou minimizá-la, em face da hierarquia constitucional e supralegal a que foi elevada a proteção do bioma Floresta Amazônica.
Referências Bibliográficas
MAZZUOLI, Valério (2001), “A opção do Judiciário brasileiro em face dos conflitos entre Tratados Internacionais e Leis Internas”.Revista CEJ,14, 112-120.
GARCIA, Leonardo & THOMÉ, Romeu. Direito Ambiental. 7ª ed. Salvador: Editora Jus Podivm, 2014.
FERNADES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 6ª ed. Salvador: Editora Jus Podivm, 2014.
Procuradora Federal com atuação na Procuradoria Regional Federal da 1ªRegião - Brasília - DF
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CUNHA, Renata Maria Periquito Pontes. Floresta Amazônica - A proteção especial conferida pelo Ordenamento Jurídico Pátrio Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 dez 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42299/floresta-amazonica-a-protecao-especial-conferida-pelo-ordenamento-juridico-patrio. Acesso em: 23 dez 2024.
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