Resumo: O artigo trata, basicamente, da publicação dos atos da Administração no que tange aos afastamentos do País de seus servidores, ou seja, da sua necessidade, já que esse ato administrativo pode acarretar diversos desmembramentos.
1. Introdução
As colocações aqui tecidas referem-se à publicidade dos atos da Administração, em específico acerca da necessidade de publicação dos atos relativos ao afastamento do País dos servidores públicos e suas decorrências, como é o caso de alterações no período, mudanças de finalidade da missão, dentre outros. A publicação está umbilicalmente ligada à transparência e à moralidade do ato, garantindo conhecimento por parte da sociedade da prática administrativa. A publicação representa pressuposto de validade do próprio ato administrativo.
2. Desenvolvimento
No que toca ao regime jurídico imposto pelo ordenamento jurídico em relação à publicidade dos atos do Poder Público, tem-se que a Constituição Federal de 1988 impôs esse dever (art. 5º, incisos XIV, XXXIII, XXXIV, LX, art. 93, inciso IX, e art. 37, caput). Assim, a regra, no âmbito administrativo, é a publicidade dos atos. O sigilo só terá lugar em sendo imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.
A principal finalidade do princípio da publicidade é possibilitar o controle dos atos do Estado, reduzindo as ameaças de desvios, defeitos e omissões. A necessidade de transparência dos atos é fruto da titularidade da coisa pública, que não é do agente e sim da sociedade. O outro objetivo da publicidade é informar os interessados sobre determinado ato administrativo.
No plano jurídico-formal o princípio da publicidade aponta para a necessidade de que todos os atos administrativos estejam expostos ao público, que se pratiquem à luz do dia, até porque os agentes estatais não atuam para a satisfação de interesses pessoais, nem sequer da própria Administração, que, sabidamente, é apenas um conjunto de pessoas, órgãos, entidades e funções, uma estrutura enfim, a serviço do interesse público, que, este sim, está acima de quaisquer pessoas. Prepostos da sociedade, que os mantém e legitima no exercício de suas funções, devem os agentes públicos estar permanentemente abertos à inspeção social, o que só se materializa com a publicação/publicidade dos seus atos.[1]
Grifou-se.
A publicidade é gênero, sendo atendida quando o ato chega ao conhecimento alheio. A publicação é forma específica de se cumprir a publicidade. Essa forma pode se dar por meio de veículos oficiais, jornais de grande circulação, boletins internos, murais, diários eletrônicos etc.
É cabível uma distinção entre publicidade geral e publicidade restrita. A primeira tem como destinatária toda a sociedade. Nesse caso, a divulgação deve ser ampla e o veículo deve ser oficial (o Diário Oficial da União é um exemplo). A publicidade restrita busca assegurar o conhecimento dos atos pelos diretamente interessados. Em relação a esses atos internos, a veiculação no âmbito do próprio órgão é suficiente.
A regra, como já salientado, é a publicidade plena. Apenas os atos do Poder Público que, por força de lei, são excluídos desse dever, estão dispensados de veiculação no Diário Oficial da União. A Imprensa Nacional, órgão oficial incumbido de publicar todos os atos de interesse geral emanados do Poder Público (Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário), editou a Portaria nº 268, de 5 de outubro de 2009. Esta portaria dispõe sobre normas para publicação de matérias nos Jornais Oficiais.
Pela referida Portaria, somente atos normativos de interesse geral, exceto os de caráter interno, devem ser publicados. Aliás, consta como vedação expressa a publicação, nos Jornais Oficiais, de atos de caráter interno ou que não sejam de interesse geral (art. 14).
A referida Portaria nº 268/2009 da Imprensa Nacional praticamente esmiúça um pouco mais o disposto no Decreto nº 4.520, de 16 de dezembro de 2002, que estabelece regras sobre a publicação do Diário Oficial da União e do Diário da Justiça pela Imprensa Nacional da Casa Civil da Presidência da República. Este decreto, em seu art. 4º, assim estabelece:
Art. 4o Os atos relativos ao pessoal civil e militar do Poder Executivo, de suas autarquias e das fundações públicas, bem assim dos servidores do Poder Legislativo e do Poder Judiciário, cuja publicação decorrer de disposição legal, são publicados no Diário Oficial da União.
Grifou-se.
Assim, quando houver determinação legal no sentido de publicar algum ato, ainda que interno, a publicidade oficial e ostensiva terá lugar.
Em relação aos afastamentos do País de servidores civis da Administração Pública Federal, existe um diploma legal regente, que é o Decreto nº 1.387, de 7 de fevereiro de 1995. No que concerne à questão da publicação no Diário Oficial da União, existe a seguinte disposição:
Art. 3º A autorização deverá ser publicado no Diário Oficial da União, até a data do início da viagem ou de sua prorrogação, com indicação do nome do servidor, cargo, órgão ou entidade de origem, finalidade resumida da missão, país de destino, período e tipo do afastamento.
Grifou-se.
Por conta de tal disposição, o afastamento de servidor público federal do País requer a publicidade em veículo oficial, qual seja, o Diário Oficial da União. Em razão do detalhamento feito no reproduzido preceito (indicação do nome do servidor, cargo, órgão ou entidade de origem, finalidade resumida da missão, país de destino, período e tipo do afastamento), sobretudo o período, a interpretação que se faz é a de que, na eventualidade de ocorrerem fatos que alterem o afastamento, a retificação deverá ser feita no DOU.
Na hipótese de ocorrerem fatos modificantes do afastamento, é certo que a situação original publicada se alterou. O que foi tornado público inicialmente já não existe mais. O publicado deve, sempre, retratar o que efetivamente ocorreu. De que adiantará uma publicação de algo que já foi transmutado? De nada.
A mudança de período de afastamento, por exemplo, exigiria a publicação do ato em veículo oficial. Assim, tanto o ato original quanto os dele decorrentes, como retificações diversas demandam publicação no DOU.
É certo que a atuação da Administração deve atender o princípio da economicidade e prestigiar alternativas que racionalizem os custos. A divulgação oficial representa um ônus considerável em relação aos recursos disponíveis. O gestor da coisa pública tem o dever de minimizar os custos operacionais da Administração.
Se por um lado existe o princípio da economicidade, por outro está o da publicidade, princípio de fundamental importância na Administração, propiciador da moralidade e transparência administrativa.
Não seria o caso, todavia, de se utilizar a ponderação de interesses, técnica hermenêutica de solução de conflito entre princípios constitucionais, porquanto existe norma expressa no sentido da publicação do afastamento. O princípio da legalidade terá lugar e deverá ser respeitado.
Já decidiu o Supremo Tribunal Federal no seguinte sentido:
HC 102.819, Rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 5-4-2011, Primeira Turma, DJE de 30-5-2011
Inquérito. Publicidade. Norteia a administração pública – gênero – o princípio da publicidade no que deságua na busca da eficiência, ante o acompanhamento pela sociedade. Estando em jogo valores, há de ser observado o coletivo em detrimento, até mesmo, do individual.
SS 3.902-AgR-segundo, Rel. Min. Ayres Britto, julgamento em 9-6-2011, Plenário, DJE de 3-10-2011
(...) A prevalência do princípio da publicidade administrativa outra coisa não é senão um dos mais altaneiros modos de concretizar a República enquanto forma de governo. Se, por um lado, há um necessário modo republicano de administrar o Estado brasileiro, de outra parte é a cidadania mesma que tem o direito de ver o seu Estado republicanamente administrado. O ‘como’ se administra a coisa pública a preponderar sobre o ‘quem’ administra – falaria Norberto Bobbio –, e o fato é que esse modo público de gerir a máquina estatal é elemento conceitual da nossa República. O olho e a pálpebra da nossa fisionomia constitucional republicana. A negativa de prevalência do princípio da publicidade administrativa implicaria, no caso, inadmissível situação de grave lesão à ordem pública.”
A publicação do afastamento gera não somente a sensação de transparência do ato administrativo. Ela possibilita o controle público e coletivo da atuação administrativa. Propicia, sobretudo, efeitos jurídicos relevantes. É da publicação no Diário Oficial que inicia o prazo, por exemplo, para impugnação do ato na via do mandado de segurança. Eis a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
REsp 65468 / DF – Recurso Especial 1995/0022319-8,
Órgão Julgador: T5 - QUINTA TURMA, Relator Min. Assis Toledo
Data de Julgamento: 02/04/1996
EMENTA: Administrativo. Afastamento de servidor do País com ônus limitado. Pedido de indenização de representação no exterior. Decadência. Se o ato que autorizou o afastamento do servidor, com ônus limitado, não estava correto, a partir de sua publicação, no Diário Oficial, começou a correr o prazo para impugná-lo na via do mandado de segurança. Prazo decadencial ultrapassado.
Recurso improvido.
Dessa forma, se houve alteração, por exemplo, em relação ao período de afastamento do servidor do País, a retificação deverá ser feita por meio de publicação no Diário Oficial da União, para que, assim, comecem a operar todos os efeitos jurídicos do ato. O mesmo se dá quando houver qualquer outra alteração do afastamento, como por exemplo, a mudança na finalidade da missão (art. 3º do Decreto nº 1.387/1995).
É a publicação no Diário Oficial da União que confere legalidade aos afastamentos dos servidores do País. Nesse sentido, merecem registro as determinações do Tribunal de Contas da União, exaradas no Acórdão nº 1.087/2007-Primeira Câmara, Rel. Min. Marcos Bemquerer:
9.2.1. em respeito aos princípios da publicidade e eficiência, inseridos no art. 37 da Constituição Federal, e da motivação dos atos administrativos, inclua nos processos de concessão de diárias e passagens todas as informações necessárias à perfeita descrição das viagens, como a justificativa dos deslocamentos e respectivos locais, datas e horários dos compromissos assumidos, bem assim a contribuição esperada do servidor;
9.2.2. exija dos seus servidores que fizerem viagens internacionais dos tipos com ônus ou com ônus limitado, no prazo de 30 (trinta) dias, contados da data do término do afastamento do país, relatório circunstanciado das atividades exercidas no exterior, nos termos do art. 16 do Decreto n. 91.800/1985;
9.2.3. reveja sua sistemática de concessão de diárias e passagens ao exterior, solicitando das unidades pleiteantes informações e justificativas fundamentadas quanto à real necessidade da despesa e registrando nos autos informações seguras acerca do pleno atendimento das disposições contidas nos Decretos ns. 91.800/1985 e 1.387/1995;
9.2.4. anexe às Propostas de Concessões de Diárias - PCDs os convites, folders ou outros documentos que evidenciem o planejamento, o motivo da viagem realizada, a eventual alteração no período e a antecipação da viagem, em observância ao art. 2º, inciso I, da Portaria n. 98, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, de 16/07/2003;
9.2.5. exija dos beneficiários das passagens a devolução dos canhotos dos cartões de embarque, visando a compor o processo de prestação de contas, conforme disposto no art. 3º da mencionada Portaria n. 98/MPOG;
9.2.6. busque a juntada dos bilhetes das respectivas passagens como comprovação da sua utilização, bem como efetue pagamento dessas despesas somente às viagens que tiverem por objeto matéria correlata com as atividades da entidade;
9.2.7. observe a obrigatoriedade insculpida no art. 3º do Decreto 1.387/1995, relativa à publicação no Diário Oficial da União da autorização para afastamento do país;
9.2.8. cumpra o art. 5º do Decreto n. 5.992, de 19/12/2006, de modo que as diárias sejam pagas antecipadamente, de uma só vez, atentando para as exceções consignadas nos incisos I e II desse artigo;
9.2.9. atente para o prazo de cinco dias, contados da data do retorno à sede originária de serviço, para a restituição de diárias recebidas em excesso, de acordo com o art. 59 da Lei n. 8.112/1990 e com o art. 7º do Decreto n. 5.992/2006;
9.2.10. faça constar dos processos de concessão de diárias a comprovação do pagamento ao servidor;
9.3. alertar ao Inmetro sobre a possibilidade de apenação dos responsáveis e do julgamento pela irregularidade das contas anuais, caso seja configurado o não-cumprimento das deliberações desta Corte ou a reincidência no seu descumprimento, a teor do disposto no art. 16, § 1º, c/c o art. 58, inciso VII e § 1º, da Lei n. 8.443/1992, c/c o art. 268, § 3º, do Regimento Interno/TCU;
3. Conclusão
Dessa forma, em relação à necessidade ou não de republicações no Diário Oficial da União do ato de autorização para afastamento do País de servidor, quando ocorrerem alterações no período de afastamento de servidor, entende-se pela necessidade, sobretudo por conta do teor contido no art. 3º do Decreto nº 1.387, de 7 de fevereiro de 1995. Assim, a compreensão ora defendida é no sentido da indispensabilidade da publicação da retificação no DOU, quaisquer que sejam as alterações de afastamento.
4. Referências Bibliográficas
MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. Editora Saraiva; 2ª edição; 2008.
A Constituição e o Supremo. 4ª Edição. Brasília. 2011. . Acesso em 05/11/2014.
[1] In MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. Editora Saraiva; 2ª edição; 2008, p. 834.
Procuradora Federal em Brasília - DF
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MOREIRA, Teresa Resende. Da necessidade de publicação dos atos relativos ao afastamento de servidores públicos do País Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 dez 2014, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42326/da-necessidade-de-publicacao-dos-atos-relativos-ao-afastamento-de-servidores-publicos-do-pais. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
Por: BRUNO SERAFIM DE SOUZA
Por: Fábio Gouveia Carneiro
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
Precisa estar logado para fazer comentários.