Resumo:Pretende-se com o presente trabalho cotejar o art. 7º, §2º, da Lei n. 12.016/2009, com os postulados da nossa Lei Maior, perquirindo sobre sua adequação aos preceitos constitucionais.
Palavras-chave: Mandado de Segurança. Constitucionalidade Art. 7º, §2º, Lei 12.016/2009.
1. Vedação de liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários
O artigo 7º, §2º, da 12.016/2009 vedou a concessão de liminar que tenha por objeto (a) a compensação de créditos tributários, (b) a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, (c) a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e (d) a concessão de aumento ou extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza:
Eis a redação integral do mencionado dispositivo:
§2º. Não será concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza.
Nosso trabalho cingir-se-á às hipóteses de vedação de liminar quando esta tenha por objeto a compensação de créditos tributários e a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior.
É sabido que o Superior Tribunal de Justiça já havia pacificado, por meio da edição da Súmula 212, que a compensação de créditos tributários não poderia ser deferida por medida liminar, o que foi sobressaltado pela nova lei do mandado de segurança.
Acontece que a Corte também editou a Súmula 213, afirmando o entendimento de que o mandado de segurança constitui ação adequada para a declaração do direito à compensação tributária.
Ora, tal vedação tolhe a máxima efetividade do mandamus, pois se a compensação constitui um direito líquido e certo do contribuinte, por que não reconhecê-lo e deferi-lo por meio da concessão da liminar?,
Sendo assim, pode-se concluir que é inconstitucional a vedação de concessão de liminar para compensação de tributos, pois fere o artigo 5º, inc. XXXV, da Constituição, na medida em que retira do contribuinte o direito de acesso à jurisdição para defesa de direito líquido e certo, e, consequentemente, estremece o princípio da separação dos poderes insculpido no artigo 2º, da Carta de 1988.
2. Proibição de liminar para a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior
É sabido que vige no ordenamento jurídico pátrio a Lei n. 2.770/1956, editada sob a égide da Constituição de 1946, que vedava a concessão de liminar para liberação de mercadorias, bens ou coisas de qualquer espécie proveniente do exterior, através de qualquer procedimento judicial (art. 1º), e que a mesma foi tacitamente revogada pela Lei n. 12.016/09.
Acontece que essa lei não foi recepcionada pela Carta Política de 1988, e a lei do mandado de segurança manteve essa norma restritiva, privando esse instrumento de efetividade.
A inconstitucionalidade da proibição é evidente, pois consiste em meio coercitivo para obrigar o jurisdicionado a recolher o tributo.
Não se desconhece que muitas vezes as mercadorias e bens advindos do exterior são perecíveis, e, por isso, haveria maiores prejuízos ao impetrante caso ele tivesse que esperar o provimento final para ter liberadas suas mercadorias ou seus bens.
Deve-se levar em conta, ainda, que a retenção das mercadorias acontece em Zonas Alfandegárias Primárias - Portos e Aeroportos, onde as tarifas de armazenagem são elevadíssimas e podem, inclusive, a depender do tempo de retenção dos bens, causar a inviabilidade da importação, pois o importador pode não reunir condições para resgatar as mercadorias nas zonas alfandegárias.
Com isso, nota-se que a retenção de mercadorias nas Zonas Aduaneiras, como meio de obrigar o contribuinte a recolher o tributo, desrespeita até mesmo o princípio do não-confiscoinsculpido no art. 150, inc. IV, da Constituição, pois a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal não poderão usar o tributo como uma forma de confisco.
Esse posicionamento já vinha esposado nas Súmulas n. 323 e n. 547 do STF, estabelecendo que era ilícita a apreensão de mercadorias como medida coercitiva para pagamento de tributos, tornando inviável o exercício das atividades profissionais, ferindo, com isso, o art. 170, caput, da Constituição.
Por conseguinte, a inconstitucionalidade da vedação da concessão de liminar para liberação de mercadoria torna-se visível pelo fato de atentar contra a separação dos poderes, na proporção em que impõe limitação à atuação do Poder Judiciário e, ainda, afronta a inafastabilidade da jurisdição, bem como o princípio do não-confisco, com a retenção das mercadorias como meio de coação do contribuinte para a compensação do tributo.
São muitas as decisões monocráticas que concederam liminares para liberação de mercadorias, tendo em vista a inconstitucionalidade do dispositivo ora tratado.
O Juiz Tales Krauss Queiroz, quando do deferimento da liminar no Mandado de Segurança impetrado pela empresa AVATAR, na Justiça Federal do Distrito Federal, em trâmite perante a 8ª Vara Federal, considerou inconstitucionais os §§2º e 5º do artigo 7º da Lei nº 12.016/09, na parte que proíbe a concessão de liminar para entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior:
Os §§2º e 5º do art. 7º da Lei nº 12.016/09, na parte em que proíbem a concessão de medidas de urgência para entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, são inconstitucionais (ou a eles deve ser dada interpretação conforme a Constituição, para evitar a aplicação em casos urgentes, segundo a especificidade do caso), visto que: - ofendem o princípio da inafastabilidade da jurisdição (inciso XXXV do art. 5º: ‘a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito’ – destaquei); estiolam o poder geral de cautela, ínsito à atividade jurisdicional; - contrariam Súmula do Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição (Súmula 323).
Pelas razões acima, posicionamo-nos pela inconstitucionalidade da proibição da concessão de liminar para liberação de mercadorias ou bens, pois não pode a norma infraconstitucional limitar um instrumento constitucional que tem status de direito e garantia fundamental e nem limitar a atuação do magistrado quando esse entender que, no caso concreto, estão presentes os requisitos para a concessão da tutela antecipada, conforme o art. 273, do Código de Processo Civil e do princípio do não confisco traçado no art. 150, inc. IV, da Constituição.
Conclusão
Em face da evidente inconstitucionalidade dos dispositivos analisados, espera-se que o Judiciário afastesua aplicação, concretizando o direito fundamental à tutela adequada e efetiva.
Referências bibliográficas:
BRASIL. Lei nº 12.016, 07 de agosto 2009. (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L12016.htm).
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula n° 212. A compensação de créditos tributários não pode ser deferida por medida liminar. Disponível em http://www.dji.com.br/normas_inferiores/regimento_interno_e_sumula_stj/stj__0212 htm. Acesso em: 01.12.2014.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula n° 213. O mandado de segurança constitui ação adequada para a declaração do direito à compensação tributária. Disponível em http://www.dji.com.br/normas_inferiores/regimento_interno_e_sumula_stj/stj__0213htm. Acesso em: 01.12.2014.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula n° 323. É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos. Disponível em http://www.dji.com.br/normas_inferiores/regimento_interno_e_sumula_stf/stf_0323.htm. Acesso em: 01.12.2014.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula n° 512. Não cabe condenação em honorários de advogado na ação de mandado de segurança. Disponível em http://www.dji.com.br/normas_inferiores/regimento_interno_e_sumula_stf/stf_0512.htm. Acesso em: 01.12.2014.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula n° 547. Não é lícito a autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais. Disponível em http://www.dji.com.br/normas_inferiores/regimento_interno_e_sumula_stf/stf_0547.htm. Acesso em: 01.12.2014.
Procuradora Federal lotada na Procuradoria Federal Especializada do INSS em Juazeiro/BA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PACHECO, Patrícia Wilma Correia. Está o artigo 7º, §2º, da Lei do Mandado de Segurança em consonância com a CF/88? Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42374/esta-o-artigo-7o-2o-da-lei-do-mandado-de-seguranca-em-consonancia-com-a-cf-88. Acesso em: 23 dez 2024.
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