RESUMO: A presente artigo objetiva analisar as linhas gerais da antecipação dos efeitos da tutela no ordenamento jurídico brasileiro, partindo-se do seu histórico.
Palavras-chave: Tutela Antecipada, Tutela Definitiva, Tutela Provisória, Fazenda Pública.
1. INTRODUÇÃO
O artigo científico analisará as características gerais da tutela antecipada, a partir do breve histórico do instituto, bem como o que o novo texto do art. 273 do CPC dispõe sobre o assunto.
Versará também sobre a possibilidade de o juiz conceder ao autor ou réu um provimento liminar que, provisoriamente, lhe assegure o bem jurídico a que se refere a prestação de direito material reclamado como objetivo da relação envolvida no litígio.
Ainda, buscará compreender essa espécie de tutela, distinguindo-a de outras tutelas de urgência existentes no ordenamento pátrio.
2 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO
2.1 Histórico da tutela antecipada
A tutela antecipada é espécie de tutela jurisdicional satisfativa, prestada, em regra, no bojo do modulo processual de conhecimento, e que se concede com base em juízo de probabilidade, razão pela qual foi considerada como espécie de tutela jurisdicional sumaria. Este tipo de tutela jurisdicional já vinha regulada no Direito brasileiro há muito tempo, mas era cabível apenas nas hipóteses para as quais fosse expressamente prevista, como nas ações possessórias e mandados de segurança.[1]
A tutela antecipada só era prevista, excepcionalmente, para a satisfação imediata de alguns direitos, tutelados por procedimentos especiais, como nas ações possessórias, mandado de segurança, ação de alimentos. Mas para a generalidade dos direitos, tutelados pelos ritos comuns, ordinário e sumário, não havia previsão de tutela provisória satisfativa. Essa lacuna legislativa revelava a inadequação e insuficiência do rito comum para a tutela provisória dos direitos.
Diante desta limitação imposta ao poder judicial de conceder medidas antecipatórias satisfativas, a tutela cautelar passou a ser desvirtuada. Passou-se a utilizar na praxe forense, o poder geral de cautela para conceder-se medidas antecipatórias atípicas satisfativas, como cautelares fossem, criando-se, jurisprudencialmente, as chamadas “cautelares satisfativas”, com isso, deformou-se, na sua essência, a tutela cautelar.[2]
Com a primeira etapa da reforma do Código de Processo Civil, porém, passou-se a ter esse instrumento como aplicável genericamente ao modulo processual de conhecimento, sendo cabível qualquer que seja o procedimento aplicável, comum ou especial. Daí falar-se de um poder geral de antecipação de tutela.[3] A reforma se deu por meio da lei n. 8952/1994, que alterou os arts. 273 e 461 §3º, do CPC, generalizando a autorização legislativa para a concessão da tutela antecipada satisfativa, agora permitida para qualquer direito, e não apenas para aqueles que se tutelavam por alguns procedimentos especiais. Promoveu-se a “ordinarização” da tutela antecipada satisfativa, ou seja, o que antes era privilégio de alguns procedimentos especiais tornou-se regra no nosso sistema, não havendo mais espaço, hoje em dia, para falar-se em cautelar satisfativa.[4]
A generalização da tutela antecipada satisfativa, e não sua criação, em 1994, é um marco histórico para evolução do direito processual civil brasileiro, principalmente por ter incorporado, ao processo de conhecimento, atividade jurisdicional executiva, dando inicio ao sincretismo processual que, anos depois, acabou por consolidar-se no direito brasileiro.[5]
2.2 Tutela jurisdicional
Não se pode confundir os conceitos de jurisdição e de tutela jurisdicional. Sendo a jurisdição uma função do Estado, todos tem direito a que a mesma seja prestada. Nem por isso tem direito à tutela jurisdicional.
Tutela jurisdicional é uma modalidade de tutela jurídica, ou seja, uma das formas pelos quais o Estado assegura proteção a quem seja titular de um direito subjetivo ou outra posição jurídica de vantagem. Assim sendo, só tem direito à tutela jurisdicional aquele que seja titular de uma posição jurídica de vantagem.[6]
O direito a tutela jurisdicional, porém, deve ser entendida como direito a tutela jurisdicional adequada, tal direito é corolário do princípio constitucional da inafastabilidade do controle jurisdicional (art. 5º XXXV, CF).
2.3 Tutela definitiva e provisória
A tutela jurisdicional oferecida pelo estado-juiz pode ser definitiva ou provisória. A tutela definitiva é aquela obtida com base em cognição exauriente, com profundo debate acerca do objeto do processo, garantindo-se o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa. É predisposta a produzir resultados imutáveis, cristalizados pela coisa julgada material. Prestigia, sobretudo, o valor segurança jurídica.
A tutela jurisdicional é dividia em provisória e definitiva como visto acima, e esta se subdivide em tutela definitiva satisfativa ou não satisfativa.
Tutela definitiva satisfativa é aquela que visa certificar ou efetivar o direito material discutido. Predispõe-se à satisfação de um direito material com entrega do bem da vida almejado.[7] É a chamada tutela padrão.[8]
As atividades processuais necessárias para a obtenção de uma tutela satisfativa são lentas e demoradas, gerando delongas processuais que colocam em risco o resultado útil e proveitoso do processo e a própria realização do direito afirmado, é o perigo da demora (periculum in mora).
Daí a criação de uma tutela não satisfativa, de cunho assecuratório, para conservar o direito afirmado e, com isso, neutralizar os efeitos maléficos do tempo: a tutela cautelar.[9]
A tutela cautelar não visa à satisfação de um direito, mas sim assegurar a sua futura satisfação, protegendo-o, não tem um fim em si mesma, pois serve a uma outra tutela (cognitiva ou executiva), de modo a garantir-lhe a efetividade, de acordo com o art. 796, CPC.
Tem como característica ser temporária por ter sua eficácia limitada no tempo, mas essa temporariedade não exclui a sua definitividade, temporários são seus efeitos fáticos, práticos, afinal a cautela perde sua eficácia quando reconhecida e satisfeito o direito acautelado, mas a decisão que a concedeu, ainda assim, permanece imutável, inalterável em seu dispositivo. Pode-se observar que a decisão é definitiva, mas seus efeitos são temporários.[10]
Assim, a tutela cautelar não é provisória, pois nada vira em seu lugar da mesma natureza, é ela a tutela assecuratória definitiva e inalterável daquele bem da vida. Mas seus efeitos tem duração limitada e, cedo ou tarde, cessarão.[11]
Por fim, ratifica-se que a tutela definitiva pode ser satisfativa, certificação ou efetivação, ou não satisfativa, assecuratória ou cautelar, mas sempre será exauriente e predisposta à coisa julgada.
A tutela provisória também chamada de tutela antecipada é aquela que da eficácia imediata à tutela definitiva (satisfativa ou cautelar), permitindo sua pronta fruição. E, por ser provisória, será necessariamente substituída por uma tutela definitiva. É marcada por duas características essenciais: a sumariedade da cognição e precariedade.
Identifica-se por ser fundada em uma cognição sumaria, uma analise superficial do objeto da causa, que conduz o magistrado a um juízo de probabilidade. Particulariza-se, ainda, por sua precariedade, já que pode ser revogada ou modificada a qualquer tempo. E, por ser assim sumaria e precária, a tutela provisória é inapta a produzir coisa julgada material.[12]
Pode se concluir que a tutela provisória, por excelência, é a tutela antecipada. É está que antecipa os efeitos da tutela definitiva, permitindo o gozo imediato de direitos que apenas poderiam ser usufruídos ao final da demanda.
A tutela antecipada serve a qualquer tutela definitiva, quer dizer que existe tutela antecipada executiva, cautelar e de conhecimento. Cuidado com provisório e temporário não são sinônimos. Uma tutela antecipada é provisória, a tutela cautelar é temporária e dura enquanto for útil.
2.4 Espécies de tutela antecipada
Apesar de a tutela antecipada ser invarialvelmente associada à tutela de urgência, a analise do art. 273 do CPC permite a conclusão de que na realidade existem três espécies distintas de tutela antecipada.
A primeira e mais comum é a tutela antecipada como espécie de tutela de urgência, os requisitos para sua concessão são a prova inequívoca da verossimilhança da alegação e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação (art. 273, I do CPC). Trata-se de tutela provisória e concedida mediante cognição exauriente (juízo de probabilidade).[13]
A segunda espécie é a tutela antecipada sancionatória, que funciona como forma de apenar a parte que, na forma prevista em lei, viola os princípios da boa-fé e lealdade processual. Seus requisitos são a prova inequívoca da verossimilhança da alegação (art. 273, caput, do CPC) e o abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório (art. 273, II, do CPC). Trata-se de tutela provisória, concedida mediante cognição sumaria.[14]
Não existe nenhuma vinculação da tutela antecipada fundada no abuso do direito de defesa e manifesto propósito protelatório do réu com a circunstancia de o tempo funcionar como inimigo da efetividade da tutela jurisdicional. Ao dispensar o preenchimento do requisito do fundado receio de dano, o legislador desvinculou de forma absoluta e indiscutível esse espécie de tutela antecipada do âmbito de tutela de urgência.[15]
A terceira espécie de tutela antecipada é aquela que gera uma maior polêmica quanto à sua natureza. Para sua concessão estão dispensados o requisito tradicional da prova inequívoca da verossimilhança, bem como o perigo de dano ou ato desleal. Seu único requisito esta previsto no art. 273, § 6º do CPC que transcreve que “um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostra-se incontroverso”.
O art. 273, §6º do CPC prevê que a tutela antecipada poderá ser concedida quando um ou mais pedidos cumulados, ou parcela deles, mostra-se incontroverso. Ainda que o dispositivo legal preveja o termo “poderá”, não existe nesse caso discricionariedade judicial, não havendo genuinamente uma escolha fundada em juízo de oportunidade ou conveniência entre conceder ou negar a tutela antecipada.[16]
2.5 Distinção entre liminar e tutela antecipada
Liminar é um adjetivo que significa “início”, “limiar”, assim, uma decisão será liminar quando for proferida no início do processo. Nesse sentido, o indeferimento de uma petição inicial é uma decisão liminar. Ocorre que o adjetivo “liminar” foi substantivado, passando a significar “tutela antecipada concedida no início do processo”, devendo-se recordar neste ponto que a tutela antecipada nem sempre será liminar, podendo ser concedida até mesmo na fase de recurso.
Tutela antecipada é aquela que adianta os efeitos da tutela jurisdicional, provisoriamente. E essa tutela cujos efeitos podem ser precipitados pode ser de conhecimento ou cautelar.
A medida antecipatória, seja em processo cautelar, seja em processo de conhecimento, pode ser dada liminarmente, no momento inicial do processo, ou não.
2.6 Tutela antecipada e julgamento antecipado da lide
Não se pode confundir tutela antecipada e julgamento antecipado da lide. A única semelhança existente entre elas é a sua natureza satisfativa. Ambas voltam-se à satisfação de direitos materiais discutidos. Enquanto a tutela antecipada satisfaz o direito provisoriamente, e com base em cognição sumaria, sendo insusceptível, pois, de imunizar-se pela coisa julgada material, o julgamento antecipado da lide é decisão que certifica, com base em cognição euxariente, o direito discutido, estando predisposta, pois, a acorbertar-se pelo manto da coisa julgada. A tutela antecipada é uma tutela jurisdicional provisória, urgente e fundada em cognição sumaria. Satisfaz antecipadamente o direito deduzido. Prestigia os valores da efetividade e celeridade.[17]
O julgamento antecipado da lide é a decisão que concede tutela jurisdicional definitiva, fundada em cognição exariente. Esse julgamento diz-se antecipado, tão somente, pelo fato de atividade cognitiva necessária ser mais restrita, dispensando fase de instrução.[18]
Pode-se concluir que o julgamento antecipado da lide antecipa o próprio provimento final, já a tutela antecipada antecipa os efeitos do provimento final.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Há uma evolução nas leis processuais civis na direção de agilizar a prestação jurisdicional e de contornar as crises dos procedimentos clássicos mediante expedientes expeditos, comprometidos muito mais com a garantia da justiça do que simplesmente com os ritos e sociedades que sempre representam, na ordem pratica, mais embaraço do que incentivo à real tutela aos direitos subjetivos violados ou ameaçados.
O legislador atual tomou conhecimento da dura verdade de que o processo, tal como concebido em seu rito comum ou ordinário, não estava suficientemente aparelhado para enfrentar problemas de emergência. Assim como a Medicina tem aperfeiçoado, cada vez mais, as técnicas cirúrgicas de emergência, para salvar pacientes em risco de vida, também o direito processual tem de conceber expedientes capazes de tutelar, em caráter de urgência, os direitos subjetivos que não podem deixar de ser prontamente exercitados. Sob pena de parecerem e de conduzirem os respectivos titulares a um profundo descrédito no processo judicial como um todo[19].
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 19º Ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris. 2009
DIDIER Jr, Fredie. Curso de direito processual civil. 5º Ed. Salvador-BA: jus podivm 2010
ASSUMPÇÃO, Daniel. Manual de processo civil. 1º Ed. São Paulo – SP. Método. 2009.
ZAVASKI. Teoria Albino. Antecipação de tutela. 2º ed. São Paulo: Saraiva, 1999
BATISTA DA SILVA, Ovídio. Processo cautelar. 3º Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006
GUSMÃO CARNEIRO, Da antecipação
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 43° Ed. Rio de Janeiro 2008
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada. 2° Ed. 2001
SCARPINELLA BUENO, Tutela Antecipada.
[1] Câmara, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 19º Ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris. 2012. p. 454
[2] Didier Jr, Fredie. Curso de direito processual civil. 5º Ed. Salvador-BA: jus podivm 2010. P. 465
[3] Câmara, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 19º Ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris. 2012. p. 455
[4] Didier Jr, Fredie. Curso de direito processual civil. 5º Ed. Salvador-BA: jus podivm 2010. P. 467
[5] Ibidem. P. 467
[6] Câmara, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 19º Ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris. 2012. p. 86
[7] Didier Jr, Fredie. Curso de direito processual civil. 5º Ed. Salvador-BA: jus podivm 2010. P. 451
[8] Zavaski. Teoria Albino. Antecipação de tutela. 2º ed. São Paulo: saraiva, 1999, p.18
[9] Didier Jr, Fredie. Curso de direito processual civil. 5º Ed. Salvador-BA: jus podivm 2010. P. 452
[10] Ibidem P. 453
[11] Batista da Silva, Ovídio. Processo cautelar. 3º Ed. Rio de Janeiro: forense, 2006, p. 86
[12] Didier Jr, Fredie. Curso de direito processual civil. 5º Ed. Salvador-BA: jus podivm 2010. P. 456
[13] Assumpção, Daniel. Manual de processo civil. 1º Ed. São Paulo – SP. Método. 2009. P. 1033
[14] Assumpção, Daniel. Manual de processo civil. 1º Ed. São Paulo – SP. Método. 2009. P. 1034
[15] Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 27, p. 35
[16] Assumpção, Daniel. Manual de processo civil. 1º Ed. São Paulo – SP. Método. 2009. P. 1035
[17] Didier Jr, Fredie. Curso de direito processual civil. 5º Ed. Salvador-BA: jus podivm 2010. P. 479
[18] Ibidem p. 479
[19] Theodoro Júnior, Humberto. Curso de direito processual civil. 46° Ed. Rio de Janeiro 2008. P. 692
Advogado da União. Pós Graduado em Direito Constitucional pela rede LFG.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ARRUDA, Weslley Rodrigues. Tutela Antecipada: linhas gerais, breve histórico e sua distinção de outras espécies de tutela Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42407/tutela-antecipada-linhas-gerais-breve-historico-e-sua-distincao-de-outras-especies-de-tutela. Acesso em: 23 dez 2024.
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