RESUMO: Esse artigo busca analisar como se dá o processo de incorporação dos Tratados internacionais na ordem jurídica interna brasileira.
PALAVRAS-CHAVE: Tratados Internacionais, processo, incorporação, ordem jurídica interna.
1. INTRODUÇÃO
Um tratado internacional não é incorporado imediatamente ao ordenamento de nosso país. O processo de incorporação dos tratados internacionais possui algumas fases, as quais contam com a participação dos Poderes Executivo e Legislativo.
Somente após cumpridas uma série de etapas e trâmites, previstos sobretudo na Constituição Federal, é que o tratado passa a integrar a ordem jurídica nacional.
Essa breve exposição visa, pois, detalhar como se opera o referido processo de integração das normas internacionais.
2. DESENVOLVIMENTO
A incorporação de um tratado internacional no Brasil precisa observar algumas regras, como competência para celebrar e para aprovar, a promulgação e publicação, para ter validade como norma infraconstitucional ou força constitucional.
Como se vê no art. 84, VIII da Constituição Federal, compete privativamente ao Presidente da República, celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional. Essa regra deve ser associada com o art. 49, I da CF que estabelece como sendo de competência exclusiva do Congresso Nacional, materializada através de decreto legislativo, resolver, definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional.
2.1 Celebração
A primeira fase é o ato de celebração do tratado, convenção ou ato internacional, para posteriormente e internamente o parlamento decidir sobre sua viabilidade, conveniência e oportunidade.
Tal etapa compete privativamente ao Presidente da República, pois a este cabe celebrar todos os tratados e atos internacionais (CF, art 84, VIII).
No Brasil, concede-se poderes[1] de negociação de convenções internacionais a pessoas específicas, ou seja, aqueles munidos de ‘plenos poderes’ para negociar em nome do Presidente da República: os Chefes de Missões Diplomáticas, sob a responsabilidade do Ministério das Relações Exteriores. Com isso, exime-se o Chefe de Estado de negociação corriqueiro no âmbito das relações internacionais.
São duas as formas através das quais se originam um tratado internacional: a primeira pela aprovação do texto por uma instância de organização internacional, ou pela assinatura de um documento por sujeitos de direitos internacional público, De forma simples tem-se a negociação, conclusões e assinatura do contrato[2].
De acordo com Flavia Piovesan, os efeitos decorrentes da assinatura do contrato são os seguintes:
A assinatura do tratado indica tão somente que o tratado é autêntico e definitivo diz ainda que o consentimento do Estado em obrigar-se por um tratado pode ser expresso mediante assinatura, troca de instrumentos constituintes do tratado, ratificação, aceitação, aprovação ou adesão, ou através de qualquer outro meio acordado.[3]
2.2 Aprovação pelo Parlamento
A segunda etapa é de competência exclusiva de o Congresso Nacional, pois cabe a esse resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretam encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional (art. 49, I CF).
Concordando o Congresso Nacional com a celebração do ato internacional, elabora-se um decreto legislativo, de acordo com o art. 59, VI da Constituição Federal, que é o instrumento adequado para referendar e aprovar a decisão do Chefe do Executivo dando-se a este uma carta branca para que possa ratificar ou aderir ao tratado se não o tinha feito.[4]
Ressalta-se que a edição do decreto legislativo, aprovando o tratado, não contém, todavia uma ordem de execução do tratado no território nacional, uma vez que só ao Presidente da República cabe decidir sobre sua ratificação.[5]
2.3 Ratificação pelo Presidente da República
Após essa primeira fase, com o objetivo que o tratado se incorpore e com isso passe a poder ter efeitos no ordenamento jurídico interno, é a fase que o Presidente da República, mediante decreto, promulga o texto, publicando-o em português, em órgão da imprensa oficial, dando-se, pois, ciência e publicidade da ratificação da assinatura já lançada. Com a promulgação do tratado esse ato normativo passa a ser aplicado de forma geral e obrigatória[6].
O posicionamento do STF é que a expedição, pelo Presidente da República, de referido decreto, acarreta três efeitos básicos que lhes são inerentes: a promulgação do Tratado Internacional, a publicação oficial de seu texto, a executoriedade do ato internacional, que passa, então, a vincular e a obrigar no plano do direito positivo interno. Referido ato normativo integra o ordenamento jurídico interno com caráter de norma infraconstitucional, situando-se nos mesmos planos de validade, eficácia e autoridade em que se posicionam as leis ordinárias, guardando relação de paridade normativa com referidas leis ordinárias, podendo ser ab-rogadas (revogação total) ou derrogadas (revogação parcial) por norma posterior, bem como ser questionada a sua constitucionalidade perante Tribunais, de forma concentrada ou difusa[7].
Assim o sistema constitucional brasileiro não exige para efeito dos Tratados Internacionais a edição de lei formal de acordo com a teoria dualista radical, sendo que o Brasil adotou o posicionamento da teoria dualista moderada necessitando de aprovação do Congresso Nacional e promulgação do Presidente da República. Destaca-se, no ponto, a posição adotada pelo STF, no julgamento da ADIn 1480-DF, conforme transcrito abaixo:
É na Constituição da República - e não na controvérsia doutrinária que antagoniza monistas e dualistas - que se deve buscar a solução normativa para a questão da incorporação dos atos internacionais ao sistema de direito positivo interno brasileiro. O exame da vigente Constituição Federal permite constatar que a execução dos tratados internacionais e a sua incorporação à ordem jurídica interna decorrem, no sistema adotado pelo Brasil, de um ato subjetivamente complexo, resultante da conjugação de duas vontades homogêneas: a do Congresso Nacional, que resolve, definitivamente, mediante decreto legislativo, sobre tratados, acordos ou atos internacionais (CF, art. 49, I) e a do Presidente da República, que, além de poder celebrar esses atos de direito internacional (CF, art. 84, VIII), também dispõe - enquanto Chefe de Estado que é - da competência para promulgá-los mediante decreto. O iter procedimental de incorporação dos tratados internacionais - superadas as fases prévias da celebração da convenção internacional, de sua aprovação congressional e da ratificação pelo Chefe de Estado - conclui-se com a expedição, pelo Presidente da República, de decreto, de cuja edição derivam três efeitos básicos que lhe são inerentes: (a) a promulgação do tratado internacional; (b) a publicação oficial de seu texto; e (c) a executoriedade do ato internacional, que passa, então, e somente então, a vincular e a obrigar no plano do direito positivo interno.[8]
São três fases, portanto, para a incorporação de um tratado internacional na ordem brasileira.
2.4 Tratados que versem sobre Direitos Humanos: Surgimento do §3° do art. 5º da CF com a EC. 45/2004
No dia 31 de dezembro de 2004, foi publicada a Emenda de n. 45, intitulada de Reforma o Judiciário, que veio a acrescer a no art. 5º da Constituição Federal o §3º, in verbis:
Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.
Com o surgimento desse §3º do art. 5º, possibilitou-se que os tratados e convenções internacionais de direitos humanos que forem assinados pelo Brasil e que forem incorporados no nosso ordenamento com o mecanismo de aprovação baseada em emendas constitucionais, assim serão consideradas.
A propósito, vale dizer que com advento do §3º do art. 5º da CF surgiram duas categorias de tratados internacionais de proteção de direitos humanos: a) os materialmente constitucionais e b) os material e formalmente constitucionais. Frise-se que todos os tratados internacionais de direitos humanos são materialmente constitucionais, por força do § 2º do art.5º. Para além de serem materialmente constitucionais, poderão a partir do §3º do mesmo dispositivo, acrescer a qualidade de formalmente constitucionais, equiparando-se a emendas à Constituição, no âmbito formal.[9]
3. CONCLUSÃO
Analisado o tema acima, à luz da doutrina pátria e da Constituição Federal, conclui-se que os tratados ou convenções internacionais passam por diversas etapas, contando com a participação do Executivo e do Legislativo, antes de se incorporarem ao ordenamento pátrio.
Uma vez incorporados ao direito interno, situam-se, em regra, no sistema nos mesmos planos de validade e de eficácia das leis ordinárias. Contudo, após a Emenda Constitucional de n. 45, caso os tratados de direitos humanos sejam incorporados no nosso ordenamento com o mecanismo de aprovação próprio das emendas constitucionais, serão equiparadas as estas.
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
LENZA Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 14º Ed. São Paulo: Saraiva 2010
GOMES, Luiz Flavio, Piovesan Flávia. O sistema interamericano de proteção dos direitos humanos e o direito brasileiro. São Paulo: Revista dos tribunais
PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 3. ed. São Paulo: Saraiva
MORAIS, Alexandre. Direito Constitucional. 24. ed. São Paulo: atlas, 2008
ANTUNES, Eduardo Muylaert. Natureza jurídica da declaração de direitos humanos revista dos tribunais. São Paulo
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 27. ed. São Paulo: Malheros, 2006
Filho, Manoel Gonçalves. Direitos humanos fundamentais. São Paulo: Saraiva 1995
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2000
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 2. ed. Porto Alegra: Livraria do Advogado, 2001
ARAÚJO, Nadia de; Inês da Matta Andreiuolo.
LAFER, Celso. A internacionalização dos direitos humanos. São Paulo: Manole 2005
GALINDO, George Rodrigo Bandeira. Tratados internacionais de direitos humanos e constituição brasileira. Belo horizonte: Del Rey, 2002
FRAGOSO, Roberta. Escola Superior do Ministério Público, FESMPDFT. Direito Constitucional. 2009
NERY Júnior, Nelson. Constituição Federal Comentada. 2. ed. São Paulo: revista dos tribunais
[1] Por meio do Decreto-lei 9.121 de abril de 1946.
[2] GOMES, Luiz Flavio, Piovesan Flávia. O sistema interamericano de proteção dos direitos humanos e o direito brasileiro. São Paulo: Revista dos tribunais, 2000, p. 155
[3] PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, p . 77
[4] MORAIS, Alexandre. Direito Constitucional. 24. ed. São Paulo: atlas, 2008, p. 689
[5] Ibidem, p. 690
[6] LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 440
[7] LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 385
[8] STF, ADIn 1480, rel. Celso de Mello: medida liminar apreciada em 04.09.1997 e julgamento final do processo, sem apreciação do mérito, em 26.06.2001 em virtude do objeto do referido processo de controle abstrato de constitucionalidade.
[9] idem. Temas de direitos humanos. 9. ed. São Paulo: Saraiva 2009, p. 24
Advogado da União. Pós Graduado em Direito Constitucional pela rede LFG.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ARRUDA, Weslley Rodrigues. Tratados internacionais: processo de incorporação ao ordenamento jurídico interno Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42436/tratados-internacionais-processo-de-incorporacao-ao-ordenamento-juridico-interno. Acesso em: 22 dez 2024.
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