Resumo: Imprescindibilidade do licenciamento ambiental para atividades e empreendimentos localizados na Zona Costeira. Necessidade de observação da Lei nº 7.661/1988. Exigência de EIA/RIMA para todos os empreendimentos e obras localizados na Zona Costeira. Impossibilidade dos Estados da federação dispensarem o licenciamento de atividade ou empreendimento localizados na Zona Costeira. Zona Costeira erigida a Patrimônio Nacional pela Constituição Federal.
Palavras-Chave: Licenciamento ambiental. Zona Costeira. Patrimônio Nacional. Observância da Lei nº 7.661/1988.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por objetivo tecer uma análise a cerca da imprescindibilidade de licenciamento ambiental para atividades e empreendimentos localizados na Zona Costeira em consonância com as disposições da Lei nº 7.661/1988 e entendimento jurisprudencial que reconhece a necessidade de prévio Estudo de Impacto Ambiental para todos os empreendimentos na Zona Costeira, independentemente dos impactos do empreendimento.
O estudo mostrará que aos Estados da federação não cabem a dispensa de licenciamento de atividade ou empreendimento localizados na Zona Costeira, área erigida a Patrimônio Nacional pela Constituição Federal, impondo-se à Administração Pública exercer o necessário controle sobre as atividades humanas que interferem nas condições ambientais.
DESENVOLVIMENTO
A Lei Complementar 140/2011 , fixou normas, nos termos dos incisos III, VI e VII, do caput e do parágrafo único, do art. 23 da Constituição Federal, para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nas ações administrativas decorrentes do exercício da competência comum relativas à proteção das paisagens naturais notáveis, à proteção do meio ambiente, ao combate à poluição em qualquer de suas formas e à preservação das florestas, da fauna e da flora e alterou a Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981.
Da leitura da citada LC 140/2011, observa-se que se estabeleceu a competência dos Estados de promover o licenciamento ambiental de atividades ou empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, com a ressalva do quanto disposto nos arts. 7º e 9º, nos termos do inciso XIV, do seu art. 8º.
Assim, tem-se que órgãos ambientais dos Estados detém, como regra, a competência para licenciar atividades ou empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, com a exceção das atividades que causem impactos meramente locais, em que a competência será dos órgãos municipais e daquelas que possuam determinadas características especiais (em razão da localização ou especificidade da atividade licenciada), em que a competência será da União.
Nesse contexto, os Estados, dentro de sua competência licenciatória e legislativa, vem editando normativas em que se admite que alguns empreendimentos e atividades, por sua natureza ou porte, não sejam passíveis de licenciamento ambiental.
No que tange à atividade licenciatória, cumpre destacar que a Lei Federal nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, relaciona o licenciamento como um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente e estabelece, no seu art. 10, que dependerão de prévio licenciamento ambiental “a construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental”.
A Resolução CONAMA nº 237, de 19 de dezembro de 1997, por sua vez, conceitua o licenciamento ambiental como “procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso”.
Como se vê, o escopo do licenciamento é a compatibilização da proteção do meio ambiente com o desenvolvimento econômico sustentável, com foco nos impactos ambientais da atividade/empreendimento.
Contudo, quando a atividade ou empreendimento se localizar no Zona Costeira, a questão reveste-se de maior atenção, impondo-se à Administração Pública exercer o necessário controle sobre as atividades humanas que interferem nas condições ambientais, valendo-se do instrumento do licenciamento ambiental, conciliando o desenvolvimento econômico com o uso dos recursos naturais.
A Zona Costeira abriga um mosaico de ecossistemas de alta relevância ambiental, cuja diversidade é marcada pela transição de ambientes terrestres e marinhos, com interações que lhe conferem um caráter de fragilidade e que requerem, por isso, atenção especial do poder público, conforme demonstra sua inserção na Constituição brasileira como área de patrimônio nacional.
A maior parte da população mundial vive em Zonas Costeiras, e há uma tendência permanente ao aumento da concentração demográfica nessas regiões. A saúde, o bem-estar e, em alguns casos, a própria sobrevivência das populações costeiras depende da saúde e das condições dos sistemas costeiros, incluídas as áreas úmidas e regiões estuarinas, assim como as correspondentes bacias de recepção e drenagem e as águas interiores próximas à costa, bem como o próprio sistema marinho. Em síntese, a sustentabilidade das atividades humanas nas Zonas Costeiras depende de um meio marinho saudável e vice-versa (...).
Nesse diapasão, a Lei nº 7.661/1988 prescreve que o licenciamento para parcelamento e remembramento do solo, construção, instalação, funcionamento e ampliação de atividades, com alterações das características naturais da Zona Costeira, deverá observar, além do disposto nesta lei, as demais normas específicas federais, estaduais e municipais, respeitando as diretrizes dos Planos de Gerenciamento Costeiro.
Rezam os arts. 6º da Lei nº 7.661, de 1988, que Institui o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, in verbis, que:
“Art. 6º O licenciamento para parcelamento e remembramento do solo, construção, instalação, funcionamento e ampliação de atividades, com alterações das características naturais da Zona Costeira, deverá observar, além do disposto nesta Lei, as demais normas específicas federais, estaduais e municipais, respeitando as diretrizes dos Planos de Gerenciamento Costeiro.
§ 1º. A falta ou o descumprimento, mesmo parcial, das condições do licenciamento previsto neste artigo serão sancionados com interdição, embargo ou demolição, sem prejuízo da cominação de outras penalidades previstas em lei.
§ 2º Para o licenciamento, o órgão competente solicitará ao responsável pela atividade a elaboração do estudo de impacto ambiental e a apresentação do respectivo Relatório de Impacto Ambiental - RIMA, devidamente aprovado, na forma da lei.” (grifei)
Assim, o §1° e §2°, do art. 6°, da referida Lei 7661/1988, expressamente fazem referência à existência de um procedimento licenciatório ao especificar condições para o licenciamento ambiental que envolvam alterações das características naturais da Zona Costeira.
Desse modo, a construção e instalação de atividades localizadas na Zona Costeira deverá necessariamente ser precedido de prévio licenciamento ambiental, independentemente do porte e natureza, em face do quanto disposto na Lei 7661/1988.
Em função disso, é necessário a licença ambiental para todas as atividades e construções desenvolvidas nessas áreas, assim como em seu entorno, independentemente da natureza ou porte dos empreendimentos e atividades, não sendo possível que Estados ou Municípios dispensem o licenciamento de atividades/obras localizadas na Zona Costeria.
Quanto a esse ponto, cumpre destacar o entendimento do Tribunal Regional Federal da 1ª Região de que o Estudo de Impacto Ambiental é obrigatório para todos os empreendimentos na Zona Costeira, por expressa previsão da Lei 7.661/88, independentemente dos impactos do empreendimento.
Nesse contexto, se o Estudo de Impacto Ambiental é obrigatório para todos os empreendimentos na Zona Costeira, não se pode admitir a dispensa ou inexigibilidade de licenciamento ambiental para as atividades e construções desenvolvidas nessas áreas, senão vejamos:
“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL PARA LICENCIAMENTO DE OBRA EM ZONA COSTEIRA.
1. A autoridade administrativa não pode prescindir da elaboração de prévio Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e da apresentação de seu respectivo relatório (RIMA) aprovado pelo órgão competente para o licenciamento de obra em zona costeira, louvando-se, apenas, em pareceres de seus técnicos, que não têm o alcance e a complexidade do EIA-RIMA.
2. Em se tratando de obra em zona costeira, a lei presume a existência de possibilidade de dano ao meio ambiente e exige o respectivo estudo de impacto ambiental.
3. Agravo de instrumento ao qual se dá parcial provimento”.
(AG 2002.01.00.010801-2/BA, Rel. Desembargadora Federal Maria Isabel Gallotti Rodrigues, Sexta Turma,DJ p.216 de 19/05/2003) (destaquei)
Outros Tribunais Regionais Federais, também já tiveram a oportunidade de se pronunciar nesse mesmo sentido, senão vejamos:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. SUSPENSÃO DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL. NECESSIDADE DE APRESENTAÇÃO DE EIA/RIMA.
Tratando-se de empreendimento a ser construído em zona costeira, exigível, nos termos do art. 6°, §2° da Lei n° 7.661/88, a apresentação de EIA/RIMA para o licenciamento ambiental. (TRF 4ª Região - AGRAVO DE INSTRUMENTO n° 5015587-42.2011.404.0000 - Data da Decisão: 23/11/2011 - Orgão Julgador: TERCEIRA TURMA) (grifo nosso)
“CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MEIO AMBIENTE. BEM DA UNIÃO. ZONA COSTEIRA. CONSTRUÇÃO IURREGULAR.
(...)
A construção do deck de madeira sobre a areia da praia de Itaipu foi realizada sem o devido estudo de impacto ambiental, sem autorização dos órgãos ambientais e sem a realização prévia de EIA/RIMA, infringindo, assim, o art. 225, § 1º, IV e VII da CF/88 e o art. 10 da Lei 7.661/81, assim como a construção de um avarandado próximo ao Museu de Arqueologia de Itaipu, sem o devido licenciamento para sua construção, configura efetiva lesão ao patrimônio cultural, na medida em que prejudica o aspecto estético do bem tombado.
(...)
[TRF 2ª Região - AC 200351020031062- Desembargador Federal FERNANDO MARQUES- QUINTA TURMA ESPECIALIZADA - E-DJF2R - Data::19/11/2010 - Página:150] (destaquei)
CONCLUSÃO
Diante de todas as considerações aqui trazidas, pode-se concluir que toda e qualquer atividade ou empreendimento localizado na Zona Costeira deve se sujeitar a um procedimento licenciatório, não se podendo admitir a dispensa ou inexigibilidade de licenciamento ambiental para as atividades e construções desenvolvidas nessas áreas.
Desse modo, tem-se que os Estados da federação devem editar suas leis e regulamentos atentos à necessidade de prévio licenciamento, em consonância com a disposição da Lei 7.661/1988.
Tal entendimento é reforçado por todo um arcabouço normativo que tem como origem a Constituição Federal, que atribui à Zona Costeira a qualidade de Patrimônio Nacional dispondo que a sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais, nos termos do §4°, do seu art. 225, além do entendimento jurisprudencial que assevera que o Estudo de Impacto Ambiental é obrigatório para todos os empreendimentos localizados na Zona Costeira.
Procuradora Federal. Especialista em Direito Público pela Unifacs-Universidade Salvador.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BARRETO, Caroline Menezes. Imprescindibilidade do Licenciamento ambiental na Zona Costeira Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 20 dez 2014, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42469/imprescindibilidade-do-licenciamento-ambiental-na-zona-costeira. Acesso em: 23 dez 2024.
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