SUMÁRIO: I.INTRODUÇÃO II. ATOS ADMINISTRATIVOS DISCRICIONÁRIOS E VINCULADOS III. PRINCÍPIO DA MOTIVAÇÃO IV. TEORIA DOS MOTIVOS DETERMINANTES V. CONCLUSÃO.
I. INTRODUÇÃO
No Estado Democrático e Social de Direto, o neoconstitucionalismo assume papel de destaque. A Constituição Federal perde o seu caráter retórico e ganha eficácia normativa. A norma jurídica enquanto gênero passa a abranger as espécies norma-princípio e norma-regra. A Carta Magna surge como premissa jurídico-metodológica de interpretação e aplicação de todo o ordenamento jurídico.
Nesse contexto, a preciso conceito de Seabra Fagundes de que “administrar é aplicar a lei de ofício” apresenta contornos diferenciados. O princípio da legalidade administrativa se elastece. Não apenas a lei em sentido estrito dita o agir do administrador público. A Constituição Federal e os atos infralegais igualmente fixam balizas à atuação administrativa.
II. ATOS ADMINISTRATIVOS DISCRICIONÁRIOS E VINCULADOS
Ao desincumbir-se de suas relevantes funções públicas, a Administração desenvolve suas atividadesquer por meio de atos administrativos vinculados, quer por meio de atos administrativos discricionários.
Nos vinculados, todos os requisitos administrativos já estão predefinidos em lei, de forma que cabe ao administrador apenas verificar a presença ou a ausência de tais requisitos para a prática de atos. Diferentemente, não obstante também encontre limites legais, nos discricionários, o administrador público, objetivando adotar a solução adequada à multifacetada realidade dos fatos, vale-se de critérios de oportunidade e conveniência para levar a cabo seus atos.
De mais a mais, a moderna doutrina administrativista não mais reconhece a existência de atos puramente vinculados ou puramente discricionários. O que se teria, em boa verdade, é uma mescla de poderes vinculados e discricionários, com preponderância ora de um, ora de outro, a depender da demanda que se apresente ao administrador público.
Assim, em que pesem as diferenças entre tais poderes, o certo é que todo e qualquer ato administrativo, pelo simples fato de ser ato administrativo, possui a seguinte estrutura, conforme lição de Celso Antônio Bandeira de Mello: elementos (conteúdo e forma), pressupostos de existência (objeto e pertinência à função administrativa) e pressupostos de validade (sujeito, motivo, finalidade, causa e formalização).
III. PRINCÍPIO DA MOTIVAÇÃO
De início, consigne-se que a necessidade de motivação dos atos administrativos representa exigência do princípio republicano (artigo 1º, caput e parágrafo único, CF), do princípio da moralidade administrativa (artigo 37, caput, CF) e encontra previsão expressa no artigo 93, IX, CF.
Afora isso, dada a sua importância, a Lei Federal nº 9.784/99 alçou a motivação à categoria de princípio do processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, assim como definiu regras pertinentes, nos seguintes moldes:
Art. 2º A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
[...]
Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando:
I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;
[...]
VIII - importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo.
Sobre o tema, imprescindível trazer à baila os ensinamentos de Celso Antônio Bandeira de Mello sobre o princípio da motivação e o motivo enquanto pressuposto de validade do ato administrativo, in verbis:
“Dito princípio implica para a Administração o dever de justificar seus atos, apontando-lhes os fundamentos de direito e de fato, assim como a correlação lógica entre os eventos e situações que deu por existentes e a providência tomada, nos casos em que este último aclaramento seja necessário para aferir-se a consonância da conduta administrativa com a lei que lhe serviu de arrimo.
[...]
Além disso,em todo e qualquer caso, se o agente se embasar na ocorrência de um dado motivo, a validade do ato dependerá da existência do motivo que houver sido enunciado. Isto é, se o motivo que invocou for inexistente, o ato será inválido. É esta vinculação do administrador ao motivo que houver alegado que se conhece doutrinariamente como ‘teoria dos motivos determinantes’, à qual se fará referência a breve trecho.”
No mesmo sentido, Hely Lopes Meirelles já reconhecia a importância do motivo para a validade do ato administrativo:
“Motivo – o motivo ou causa é a situação de direito ou de fato que determina ou autoriza a realização do ato administrativo. O motivo, como elemento integrante da perfeição do ato, pode vir expresso em lei como pode ser deixado ao critério do administrador. No primeiro caso será um elemento vinculado; no segundo, discricionário, quanto à sua existência e valoração.
[...]
Portanto, na atuação vinculada ou na discricionária, o agente da Administração, ao praticar o ato, fica na obrigação de justificar a existência do motivo, sem o que o ato será inválido, ou, pelo menos, invalidável, por ausência da motivação.”
IV. TEORIA DOS MOTIVOS DETERMINANTES
No que toca especificamente ao tema, Celso Antônio Bandeira de Mello discorre, nos seguintes termos:
“De acordo com esta teoria, os motivos que determinaram a vontade do agente, isto é, os fatos que serviram de suporte à sua decisão, integram a validade do ato. Sendo assim, a invocação de ‘motivos de fato’ falsos, inexistentes ou incorretamente qualificados vicia o ato mesmo quando, conforme já se disse, a lei não haja estabelecido, antecipadamente, os motivos que ensejariam a prática do ato. Uma vez enunciados pelo agente os motivos em que se calçou, ainda quando a lei não haja expressamente imposto a obrigação de enunciá-los, o ato só será válido se estes realmente ocorreram e o justificavam.”
Dessa forma, ao teor do que preceitua a teoria dos motivos determinantes, bem como em face do que dispõe o princípio da motivação do ato administrativo, uma vez declinados motivos de fatos, ou seja, aspectos fáticos que teriam ensejado a prática do ato administrativo, a validade de tal ato fica condicionada à demonstração de tais motivos, de tais fatos, de sorte que, ao revés, a demonstração da falsidade, da inexistência ou da qualificação equivocada de tais fatos implica a invalidade desse mesmo ato.
Espera-se da Administração Pública, quer nas relações firmadas com os administrados, quer nas relações firmadas com seus próprios servidores, a adoção de condutas razoáveis. Com efeito, posturas ilógicas, contraditórias e surpreendentes, representam violação ao princípio da segurança jurídica e da boa-fé.
Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello:
“Enuncia-se com este princípio que a Administracão, ao atuar no exercício de discrição, terá de obedecer a critérios aceitáveis do ponto de vista racional, em sintonia com o senso normal de pessoas equilibradas e respeitosas das finalidades que presidam a outorga da competência exercida. Vale dizer: pretende-se colocar em claro que não serão apenas inconvenientes, mas também ilegítimas – e, portanto, jurisdicionalmente invalidáveis -, as condutas desarrazoadas, bizarras, incoerentes ou praticadas com desconsideração às situações e circunstancias que seriam atendidas por quem tivesse atributos normais de prudência, sensatez e disposição de acatamento às finalidades da lei atributiva da discrição manejada.”
V. CONCLUSÃO
Como explicitado, a conduta do administrador se revela no mundo dos fatos por intermédio da prática de atos administrativos. Tanto os atos administrativos vinculados quanto os atos administrativos discricionários ou ainda, os modernamente denominados atos mistos, devem se manter balizados por toda pirâmide normativa.
Nessa linha, todo e qualquer ato administrativodeve preservar os seus elementos (conteúdo e forma), pressupostos de existência (objeto e pertinência à função administrativa) e pressupostos de validade (sujeito, motivo, finalidade, causa e formalização).
Dentre os pressupostos de validade, destacamos na presente análise o motivo, alçado a verdadeiro princípio: o princípio da motivação. Não sem razão, tendo em vista que os contornos desse princípio podem ser facilmente extraídos doprincípio republicano (artigo 1º, caput e parágrafo único, CF) e do princípio da moralidade administrativa (artigo 37, caput, CF).
Concluímos que, uma vez declinado pelo administrador os motivos que calcaram a prática do ato administrativo, ainda que a lei não tenha, in casum, imposto essa exigência, o ato só terá validade se os motivos realmente ocorreram e o justificaram. Com efeito,o administrado pode e deve legitimamente esperar da Administração Públicaa adoção de condutas razoáveis e coerentes em homenagem aos princípio da segurança jurídica e da boa-fé.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Elementos de direito administrativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1986.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2007
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo brasileiro.18.ed. São Paulo: Malheiros, 1993.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2007.
PROCURADORA FEDERAL. ESPECIALISTA EM DIREITO CONSTITUCIONAL PELA UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA. ESPECIALISTA EM CI ÊNCIAS PENAIS PELA UNISUL<br>CURSANDO LLM EM DIREITO EMPRESARIAL. <br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MACHADO, Ivja Neves Rabelo. Breves apontamentos sobre a teoria dos motivos determinantes Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 20 dez 2014, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42474/breves-apontamentos-sobre-a-teoria-dos-motivos-determinantes. Acesso em: 23 dez 2024.
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