RESUMO: O presente trabalho aborda a possibilidade de retorno ao trabalho do beneficiário da aposentadoria especial, analisando a constitucionalidade da restrição contida no artigo 57,§8º, Lei nº 8.213/91.
Palavras-chave: Aposentadoria Especial. Retorno ao Trabalho. Artigo 57,§8º, da Lei nº 8.213/91. Constitucionalidade.
INTRODUÇÃO
A Lei nº 9.032/95 trouxe sensíveis mudanças à disciplina da aposentadoria especial.Uma delas foi a inserção do §6º no artigo 57, proibindoaquele que está em gozo de aposentadoria especialde retornar ao trabalho, ou continuar trabalhando, em atividade prejudicial à saúde.
Com a Lei nº 9.732/98, essa restrição passou para o §8º do artigo 57 que explicitou a penalidade cabível no caso de descumprimento da ordem nele contida, qual seja, o cancelamento do benefício.
O tema é polêmico, já tendo havido pronunciamento do Poder Judiciário afastando a aplicação desse dispositivo, por entender que ele é inconstitucional. A questão chegou ao Supremo Tribunal Federal que, em recente decisão, reconheceu a repercussão geral da matéria.
Diante dessas divergências é que desenvolvemos o nosso estudo, apresentando os argumentos contra e favoráveis à constitucionalidade do artigo 57, §8º, da Lei nº 8.213/91, assim como nossa posição acerca do assunto.
DESENVOLVIMENTO
O legislador, partindo do pressuposto de que a exposição do segurado a agentes nocivos compromete mais cedo sua capacidade para o trabalho, houve por bem autorizar a concessão de aposentadoria com uma contagem de tempo diferenciada.
Assim, a aposentadoria especial surgiu com a Lei nº 3.807/60 como espécie de aposentadoria por tempo de serviço, sendo concedida ao segurado com, no mínimo, 50 anos de idade, 15 anos de contribuição e 15, 20 ou 25 anos de tempo de serviço em atividades penosas, insalubres ou perigosas.
Na Constituição Federal de 1988, a aposentadoria especial foi inicialmente prevista no artigo 202, II:
“Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a média dos trinta e seis últimos salários de contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários de contribuição de modo a preservar seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidas em lei;
(...)”
Com a EC nº 20/98, a matéria passou a ser tratada no §1º, do artigo 201[1]:
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
(...)
§ 1º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidos em lei complementar. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)”
Nos termos do artigo 15 da Emenda 20,até que a lei complementar a que se refere o art. 201, § 1º seja publicada, permanece em vigor o disposto nos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 que tratam da aposentadoria especial e que assim estabelecem:
“Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 1º A aposentadoria especial, observado o disposto no art. 33 desta Lei, consistirá numa renda mensal equivalente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 2º A data de início do benefício será fixada da mesma forma que a da aposentadoria por idade, conforme o disposto no art. 49.
§ 3º A concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o Instituto Nacional do Seguro Social–INSS, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 4º O segurado deverá comprovar, além do tempo de trabalho, exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 5º O tempo de trabalho exercido sob condições especiais que sejam ou venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será somado, após a respectiva conversão ao tempo de trabalho exercido em atividade comum, segundo critérios estabelecidos pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, para efeito de concessão de qualquer benefício. (Incluído pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 6º O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. (Redação dada pela Lei nº 9.732, de 11.12.98) (Vide Lei nº 9.732, de 11.12.98)
§ 7º O acréscimo de que trata o parágrafo anterior incide exclusivamente sobre a remuneração do segurado sujeito às condições especiais referidas no caput. (Incluído pela Lei nº 9.732, de 11.12.98)
§ 8º Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 9.732, de 11.12.98)
Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
§ 1º A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho nos termos da legislação trabalhista. (Redação dada pela Lei nº 9.732, de 11.12.98)
§ 2º Do laudo técnico referido no parágrafo anterior deverão constar informação sobre a existência de tecnologia de proteção coletiva ou individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. (Redação dada pela Lei nº 9.732, de 11.12.98)
§ 3º A empresa que não mantiver laudo técnico atualizado com referência aos agentes nocivos existentes no ambiente de trabalho de seus trabalhadores ou que emitir documento de comprovação de efetiva exposição em desacordo com o respectivo laudo estará sujeita à penalidade prevista no art. 133 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 9.528, de 1997)
§ 4º A empresa deverá elaborar e manter atualizado perfil profissiográfico abrangendo as atividades desenvolvidas pelo trabalhador e fornecer a este, quando da rescisão do contrato de trabalho, cópia autêntica desse documento.(Incluído pela Lei nº 9.528, de 1997)
A aposentadoria especial, como se pode ver, é benefício de natureza extraordinária, que visa a compensar o trabalho do segurado em condições adversas à sua saúde. Seu evento determinante, portanto, é o trabalho realizado em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física do segurado.
A concessão da aposentadoria especial não impedeo aposentado de continuar trabalhando ou de retornar ao mercado de trabalho posteriormente. Entretanto, de acordo com a legislação vigente, essa atividade posterior à concessão do benefício não pode ser considerada especial.
Inicialmente, o § 6º do artigo 57 da Lei nº8.213/91, incluído pela Lei nº 9.032/95, dispunha sobre o assunto da seguinte forma: “É vedado ao segurado aposentado, nos termos deste artigo, continuar no exercício de atividade ou operações que o sujeitem aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta lei.”
Ou seja, após obter a aposentadoria especial, o segurado estava proibido de exercer atividade prejudicial à sua saúde. Entretanto, a lei não falava qual a sanção para o descumprimento dessa ordem - se o benefício seria cancelado ou se apenas suspenso - o que veio a constar expressamente no ordenamento após a Lei nº 9.732/98 que deu nova redação ao artigo 57, § 6º[2], da Lei de Benefícios e incluiu o §8º:
“Art. 57 (...)
§ 8º Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 9.732, de 11.12.98)”
O artigo 46, por sua vez, dispõe:
“Art. 46. O aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno.”
Assim, tornou-se expressa a determinação para cancelar a aposentadoria especial no caso do segurado continuar a exercer a atividade na qual se aposentou ou até mesmose passar a exercer outra atividade na qual esteja habitual e permanentemente exposto aos agentes nocivos previstos na legislação.
Trata-se de mandamento coerente com a razão de ser da aposentadoria especial, mas que tem sua constitucionalidade questionada por muitos. Há, inclusive, pronunciamentos da jurisprudência reconhecendo sua inconstitucionalidade.
Os críticos do artigo 57, § 8º alegam que o artigo 201, § 1º, da Carta Magna de 1988, não estabelecequalquer condição ou restrição ao gozo daaposentadoria especial e que a restrição imposta pelo legislador ordinário implicaafronta ao princípioconstitucional que garante o livre exercício dequalquer trabalho, ofício ou profissão (art. 5º, XIII,da Constituição Federal de 1988). Defendem, ainda, afronta ao artigo 7º, XXXIII, da Carta Maior, que apenas proíbe o trabalho penoso e insalubre aos menores de dezoito anos.
Não vemos qualquer inconstitucionalidade no dispositivo em questão.
A vedação contida no § 8º apenas impede o exercício de atividade considerada especial pela legislação, podendo o aposentado trabalhar em qualquer outra atividade e, inclusive, na mesma atividade ou profissão em que se aposentou, desde que não esteja exposto a agentes nocivos à sua saúde.
O beneficiário da aposentadoria especial é livre para exercer qualquer trabalho, exceto as atividades que, aos olhos da legislação previdenciária, comprometem a sua saúde.
Seria um contrassenso permitir que a pessoa se aposente mais cedo porque ficou exposta de maneira habitual e permanente a agentes nocivos à saúde e, ao mesmo tempo, autorizarque ela continue a desempenhar essas mesmas atividades.
Ora, a Constituição permitiu que o segurado se aposentasse prematuramente nos casos de trabalho exposto a condições desfavoráveis à sua saúde justamente para que ele pudesse se afastar antes do trabalho e, com isso, ter preservadasua integridade física. Se ele retorna ou continua a exercer atividade que é prejudicial a sua saúde, o privilégio que lhe concedeu a Carta Maior deixa de ser justificável, tornando-se vantagem descabida em relação aos demais segurados que exercem atividades comuns e que somente poderão se aposentar após 30 ou 35 anos de tempo de contribuição ou com 60 ou 65 anos de idade, conforme se trate de mulher ou homem.
Inexiste, portanto, qualquer ofensa ao princípio daliberdade de trabalho, ofício ou profissão. A lei não obriga o segurado a se aposentar quando tiver completado 15, 20 ou 25 anos de atividade especial. Ela lhe dá uma opção de se aposentar mais cedo. Quem vai escolher se continua trabalhando ou se se aposenta é o segurado e se ele optar por usufruir a aposentadoria, estará proibido de voltar a exercer, apenas e tão somente, atividades que a lei considera nocivas à sua saúde e que, inclusive, já lhe garantiu o direito a uma aposentadoria mais benéfica[3].
O artigo 57, § 8º, da Lei de Benefícios também não viola o artigo 7º, XXXIII, da CF/88. Trata-se de dispositivo que existe para orientar o legislador ordinário na disciplina do trabalho dos menores de 18 anos de idade e que nenhuma relação tem com a aposentadoria especial. Por conseguinte, ele não impede o cancelamento do benefício.
Também não há que se falar em incompatibilidade da proibição contida no § 8º do artigo 57, com o artigo 201, §1º, da Constituição. Ao contrário, é nele que o dispositivo ordinário encontra seu fundamento. Afinal, foi a Constituição que autorizou o tratamento diferenciado aos casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, deixando ao legislador ordinário o encargo de fixar os critérios para o gozo desse benefício.
Não é demais lembrar, ainda, que o artigo 15 da Emenda Constitucional nº 20/98 determinou expressamente a aplicação dos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213 - já com a redação dada pela Lei nº 9.732/98 -enquanto não publicada a lei complementar mencionada pelo §1º do artigo 201.
O TRF da 4ª região reconheceu a inconstitucionalidade do § 8º do artigo 57, no julgamento da Arguição de Inconstitucionalidade 5001401-77.2012.404.0000:
“PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. ARGUIÇÃO DE INCONSTUCIONALIDADE. § 8º DO ARTIGO 57 DA LEI Nº 8.213/91. APOSENTADORIA ESPECIAL. VEDAÇÃO DE PERCEPÇÃO POR TRABALHADOR QUE CONTINUA NA ATIVA, DESEMPENHANDO ATIVIDADE EM CONDIÇÕES ESPECIAIS.
1. Comprovado o exercício de atividade especial por mais de 25 anos, o segurado faz jus à concessão da aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 e § 1º da Lei 8.213, de 24-07-1991, observado, ainda, o disposto no art. 18, I, 'd' c/c 29, II, da LB, a contar da data do requerimento administrativo.
2. O § 8º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 veda a percepção de aposentadoria especial por parte do trabalhador que continuar exercendo atividade especial.
3. A restrição à continuidade do desempenho da atividade por parte do trabalhador que obtém aposentadoria especial cerceia, sem que haja autorização constitucional para tanto (pois a constituição somente permite restrição relacionada à qualificação profissional), o desempenho de atividade profissional, e veda o acesso à previdência social ao segurado que implementou os requisitos estabelecidos na legislação de regência.
3. A regra em questão não possui caráter protetivo, pois não veda o trabalho especial, ou mesmo sua continuidade, impedindo apenas o pagamento da aposentadoria. Nada obsta que o segurado permaneça trabalhando em atividades que impliquem exposição a agentes nocivos sem requerer aposentadoria especial; ou que aguarde para se aposentar por tempo de contribuição, a fim de poder cumular o benefício com a remuneração da atividade, caso mantenha o vínculo; como nada impede que se aposentando sem a consideração do tempo especial, peça, quando do afastamento definitivo do trabalho, a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial. A regra, portanto, não tem por escopo a proteção do trabalhador, ostentando mero caráter fiscal e cerceando de forma indevida o desempenho de atividade profissional.
4. A interpretação conforme a constituição não tem cabimento quando conduz a entendimento que contrarie sentido expresso da lei.
5. Reconhecimento da inconstitucionalidade do § 8º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91.
(Arguição de Inconstitucionalidade 5001401-77.2012.404.0000. Corte Especial, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira. Sessão de 24.05.2012)
Merece destaque, porém, o voto divergente do eminente Desembargador Federal Rômulo Pizzolatti:
“(...)
Estabelece o §8º do artigo 57 da Lei nº 8.213, de 1991, acrescentado pela Lei nº 9.732, de 1998, que o segurado que obtiver aposentadoria especial, por haver trabalhado sujeito a condições especiais que lhe prejudicaram a saúde ou a integridade física, durante 15, 20 ou 25 anos, conforme o caso, fica sujeito à regra do art. 46 da mesma lei. Essa última regra determina que o aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno.
Por seu turno, o relator entende que o §8º do art. 57 da Lei nº 8.213, de 1991, é inconstitucional, em confronto com o §1º do art. 201 da Constituição, porque esse dispositivo constitucional não estabelece qualquer condicionante ao gozo de aposentadoria especial. Diz ainda que tal entendimento é reforçado pelo disposto no art. 5º, caput e XIII da Constituição, e, enfim, argumenta que
A restrição à continuidade do desempenho da atividade por parte do trabalhador que obtém aposentadoria especial cerceia, sem que haja autorização constitucional para tanto (pois a constituição somente permite restrição relacionada à qualificação profissional), o desempenho de atividade profissional, e veda o acesso à previdência social ao segurado que implementou os requisitos estabelecidos na legislação de regência.
O argumento, todavia, prova demais. Por ele, até mesmo o aposentado por invalidez poderia voltar a exercer atividade remunerada sem prejuízo de sua aposentadoria, porque a Constituição também quanto a esse caso não autoriza nenhuma restrição. E, de fato, muitos segurados, aposentados por invalidez, retornam à atividade remunerada e, quando cassado o benefício pelo INSS, batem às portas deste tribunal, alegando, inocentemente, que ficaram invalidados apenas para a antiga atividade, mas não para outras.
Ora, o legislador infraconstitucional ao disciplinar a Constituição está automaticamente estabelecendo restrições. É impossível regulamentar sem restringir. Ao estabelecer, v. g., que, em determinado caso, o segurado tem direito à aposentadoria especial aos 25 anos, o legislador está disciplinando a Constituição - e também, na óptica do segurado, restringindo a Constituição, porque ele desejaria, nesse mesmo caso, aposentar-se com 15 ou até menos anos de serviço. Outro exemplo: a Constituição não autoriza o legislador a estabelecer prazo para impetração do mandado de segurança, mas desde a Lei nº 191, de 1936 (art. 3º), o legislador o restringiu a 120 dias, e o próprio STF, ao enfrentar a questão, nunca deixou de proclamar a constitucionalidade dessa restrição (cf. RMS nº 21.362-DF, rel. Min. Celso de Mello, RTJ 141/478). Por isso mesmo, o que importa verificar não é se a Constituição autorizou esta ou aquela restrição, mas se a disciplina estabelecida pelo legislador infraconstitucional, não sendo expressamente vedada pela Constituição, mostra-se razoável.
Estando o dispositivo acoimado de inconstitucional (§8º do art. 57 da Lei nº 8.213, de 1991), entrelaçado com o art. 46 da mesma lei, o qual estabelece o cancelamento da aposentadoria por invalidez do aposentado que retorna à atividade, será útil examinar, primeiramente, se essa restrição é constitucional, embora tampouco autorizada pela Constituição. A Quinta Turma deste tribunal, em diversos julgados, entendeu que não, que a restrição é razoável, pelo simples motivo de que, ao retornar à atividade remunerada, o aposentado demonstrou que se reabilitou de fato para o trabalho, ainda que persista a deficiência que justificou o benefício por incapacidade. Confira-se:
(...)
No caso da aposentadoria especial, também os fatos do mundo real, embora diversos, justificam a disciplina normativa que - este ponto deve ser enfatizado - não restringe a concessão em si do benefício, mas quer sim desestimular (proibir não pode) que o trabalhador agraciado com aposentadoria especial continue a submeter-se aos riscos decorrentes do efeito cumulativo de condições ambientais de trabalho nocivas à sua saúde.
De fato, ao conceder a aposentadoria especial, por haver o segurado trabalhado durante 15, 20 ou 25 sob condições deletérias à sua saúde ou integridade física, o legislador presume, e não sem razão, que o trabalhador já prejudicou suficientemente a sua saúde, embora não seja tecnicamente inválido, e por isso tem direito de aposentar-se. Se assim não fosse, não teria o menor sentido a legislação previdenciária estabelecer, v.g., que mineiros de subsolo podem se aposentar com apenas 15 anos de serviço, quando os trabalhadores em geral se aposentam com 35 anos de serviço.
(...)”
O Supremo Tribunal Federal,em decisão recente, reconheceu a repercussão geral da matéria no Recurso Extraordinário 788.092 interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social:
“EMENTA DIREITO PREVIDENCIÁRIO E CONSTITUCIONAL. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 57, § 8º, DA LEI Nº 8.213/91. DISCUSSÃO ACERCA DA POSSIBILIDADE DE PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO DA APOSENTADORIA ESPECIAL INDEPENDENTEMENTE DO AFASTAMENTO DO BENEFICIÁRIO DAS ATIVIDADES LABORAIS NOCIVAS À SAÚDE. MATÉRIA PASSÍVEL DE REPETIÇÃO EM INÚMEROS PROCESSOS, COM REPERCUSSÃO NA ESFERA DE INTERESSE DE BENEFICIÁRIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. PRESENÇA DE REPERCUSSÃO GERAL.”
(RE 788092 RG, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, julgado em 27/03/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-225 DIVULG 14-11-2014 PUBLIC 17-11-2014)
Resta-nos aguardar o pronunciamento da nossa Corte Suprema, com a esperança de que prevaleça a tese da constitucionalidade do artigo 57, §8º, da Lei nº 8.213/91.
CONCLUSÃO
O beneficiário da aposentadoria especial, requerida e concedida após 28 de abril de 1995, que continuarexercendo atividade que o exponha a agentes nocivos elencados na legislação previdenciária, ou a ela retornar,terá seu benefício cancelado, nos termos do artigo 57, §8º da Lei nº 8.213/91.
Trata-se de norma compatível com a Constituição, não havendo qualquer inconstitucionalidade na restrição imposta pelo legislador ordinário.
REFERÊNCIAS
ALENCAR, Hermes Arrais. Benefícios Previdenciários. 4 ª ed. Ver. E atual. Com obediência às leis especiais e gerais. São Paulo: Liv. E Ed. Universitária de Direito, 2009;
CASTRO, Carlos Alberto Pereira; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 16ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.
MARTINS, Sergio Pinto. Direto da Seguridade Social. 34 ª ed. São Paulo: Atlas, 2014.
MARTINEZ, Wladimir Novaes. Curso de Direito Previdenciário. 6ª ed. São Paulo: LTr, 2014.
[1] Atualmente, o dispositivo trata, ainda, da aposentadoria diferenciada para os portadores de deficiência:
“§ 1º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar.” (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)
[2] § 6º O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. (Redação dada pela Lei nº 9.732, de 11.12.98) (Vide Lei nº 9.732, de 11.12.98)
[3] Além do tempo reduzido, a renda mensal da aposentadoria especial é calculada sem a incidência do fator previdenciário.
Procuradora Federal, graduada em 2001 pela Faculdade de Direito da PUC Campinas e pós-graduada em Direito Tributário também pela PUC Campinas no ano de 2009.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FERREIRA, Flavia Malavazzi. A aposentadoria especial e o retorno do aposentado ao trabalho Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42537/a-aposentadoria-especial-e-o-retorno-do-aposentado-ao-trabalho. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Maurício Sousa da Silva
Por: Maurício Sousa da Silva
Por: Maurício Sousa da Silva
Por: DESIREE EVANGELISTA DA SILVA
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