Resumo: Lei 12.651/2012 revogou o regime de proteção generalizado dado às restingas pela Resolução CONAMA n° 303/2002. As áreas de restinga no Estado da Bahia possuem um regime protetivo próprio e generalizado com base no art. 215, IV, da Constituição Estadual da Bahia e art. 89, inciso IV e paragrafo único, da Lei Estadual nº 10.431/2006. Manutenção da proteção das áreas de restinga, independentemente da localização e da função que desempenhem.
Palavras-Chave: Restinga no Estado da Bahia. Regime protetivo próprio e generalizado. Revogação parcial da Resolução CONAMA n° 303/2002
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por objetivo tecer uma análise a cerca da supressão de competência direta do CONAMA para dispor sobre as áreas de preservação permanente e a previsão na legislação do Estado da Bahia de um regime protetivo próprio e generalizado conferido às áreas de restinga.
O estudo mostrará que mesmo após a revogação do regime de proteção generalizado dado às restingas, previsto na Resolução CONAMA n° 303/2002, pela Lei 12.651/2012, observa-se que as disposições constantes na Constituição e legislação infraconstitucional do Estado do Bahia permitem manter incólume a proteção as áreas de restinga ali existentes, independentemente da localização e da função que desempenhem.
DESENVOLVIMENTO
A Resolução CONAMA n° 303/2002, dispõe sobre parâmetros, definições e limites de Áreas de Preservação Permanente em especial. Em seu art. 3° instituiu áreas de preservação permanente, destacando-se aqui a previsão de que são áreas de preservação permanente, as áreas de restingas localizadas em faixa mínima de 300 metros, medidos a partir da linha de preamar máxima
Contudo, a Lei 12.651/2012, suprimiu a competência direta do CONAMA para dispor sobre as áreas de preservação permanente, na medida em que, o seu art. 6° retirou o permissivo legal de se declarar novas áreas de preservação permanente por ato do Poder Público, restringindo a ato aos Chefe do Poder Executivo, nos termos do Parecer n° 271/2014/CONJUR-MMA/CGU/AGU/jpfs, regularmente aprovado pelo Consultor Jurídico do Ministério do Meio Ambiente.
Desse modo, tem-se que as novas disposições trazidas pela Lei 12.651/2012 implicaram na revogação do regime de proteção generalizado dado às restingas (qualquer restinga existente na faixa de 300 metros contados da preamar máxima, independentemente de terem a função de estabilizar mangue ou fixar dunas) que tinha como fundamento a Resolução CONAMA n° 303/2002.
Há que se destacar que o regime protetivo dados às restingas pela citada Resolução CONAMA n° 303/2002 levou em consideração as responsabilidades assumidas pelo Brasil por força da Convenção da Biodiversidade, de 1992, da Convenção Ramsar, de 1971 e da Convenção de Washington, de 1940, bem como os compromissos derivados da Declaração do Rio de Janeiro, de 1992 e que as Áreas de Preservação Permanente e outros espaços territoriais especialmente protegidos, como instrumentos de relevante interesse ambiental, integram o desenvolvimento sustentável, objetivo das presentes e futuras gerações, como se extrai de seu preâmbulo.
Nesse contexto, cumpre destacar que o referido Parecer n° 271/2014/CONJUR-MMA/CGU/AGU/jpfs, ao ressaltar o interesse ambiental em se manter protegida as restingas em faixa de 300 metros da linha de preamar máxima e a segurança jurídica em torno da temática, indicou a necessidade de se sugerir a elaboração de decreto presidencial para recepcionar a proteção das restingas conforme adotado pela Resolução CONAMA n° 303/2002.
Contudo, apesar da Lei 12.651/2012 ter revogado o regime de proteção das restingas que tinha como base a Resolução CONAMA n° 303/2002, em especial as áreas de restingas localizadas em faixa mínima de 300 metros, medidos a partir da linha de preamar máxima, observa-se que as áreas de restinga, independentemente de terem a função de estabilizar mangue ou fixar dunas, são áreas de preservação permanente em face da previsão constante no art. 215, IV, da Constituição Estadual da Bahia e art. 89, inciso IV e paragrafo único da Lei Estadual nº 10.431/2006 que dispõe sobre a Política de Meio Ambiente e de Proteção à Biodiversidade do Estado da Bahia .
Quanto à legislação citada, cumpre transcrevê-la, in verbis:
‘Art. 215 - São áreas de preservação permanente, como definidas em lei:
I - os manguezais;
II - as áreas estuarinas;
III - os recifes de corais;
IV - as dunas e restingas;
Lei 10.431/2006 do Estado da Bahia
Art. 89 - Sem prejuízo do disposto na legislação federal pertinente, são considerados de preservação permanente, na forma do disposto no artigo 215 da Constituição do Estado da Bahia, os seguintes bens e espaços:
IV - as dunas e restingas, sendo que a sua ocupação parcial depende de estudos específicos a serem aprovados por órgão competente;’
Parágrafo único. As áreas e bens naturais de que trata este artigo, que não se incluam entre aqueles definidos como Área de Preservação Permanente pela legislação federal, terão seu uso, hipóteses de supressão de vegetação e demais restrições definidos por esta Lei e suas normas regulamentares.” (grifos nossos)
Não se pode esquecer que os Estados-membros organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem (CF, art. 25), submetendo-se, no entanto, quanto ao exercício dessa prerrogativa institucional (essencialmente limitada em sua extensão), aos condicionamentos normativos impostos pela CF, pois é nessa que reside o núcleo de emanação (e de restrição) que informa e dá substância ao poder constituinte decorrente que a Lei Fundamental da República confere a essas unidades regionais da Federação.
Nesse contexto, perfeitamente possível a previsão de áreas de preservação permanente nas constituições estaduais, em consonância com a tutela conferida ao meio ambiente por nossa Carta Magna, enquanto bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, que deve ser defendida e preservada para as presentes e futuras gerações.
Assim, tem-se que a Constituição do Estado da Bahia e a Lei 10.431/2006 ao deixarem de fazer referência à vegetação que exerce a função de fixar dunas ou estabilizar manguezais, trouxe hipótese diversa do Código Florestal em que a mens legis é proteger as áreas de restingas, independetemente da função que a vegetação ali originalmente existente possuiu ou que a atualmente existente possua.
Ademais, esta opção feita pelo Estado da Bahia revela-se compatível com a importância das restingas e deve servir de exemplo para todos Entes da Federação. No que tange à proteção de restinga, cabe destacar o voto do Ministro Herman Benjamin:
“Que a proteção de Restinga é prioridade nacional, disso o legislador não deixa dúvida. Preocupação que se avulta em época de mudanças climáticas, mormente porque esse tipo de ecossistema, sobretudo o de planície, e os Manguezais estarão na linha de frente da defesa do litoral contra o aumento do nível do mar, exigindo do Estado medidas públicas e privadas de adaptação, com o desiderato de reduzir seus impactos negativos nas cidades brasileiras costeiras” (grifei)
De outro lado, não se pode falar que o Novo Código Florestal, lei federal n° 12.651/2012, possa preencher a norma constitucional estadual, pois as normas constitucionais de eficácia limitada, ao dependerem da emissão de uma normatividade futura, que integrem a sua eficácia e lhe confiram capacidade de execução, só pode ocorrer dentro do mesmo sistema normativo, in casu, no âmbito estadual.
Isto porque, viola o princípio federativo e a autonomia dos entes federados admitir que a União, através do Congresso Nacional, possa integrar norma de eficácia limitada prevista na Constituição Estadual.
Ademais, não se pode falar em interpretação sistemática para fins de pretender que a lei federal que trouxe o novo código florestal tenha o condão de regulamentar o art. 215 da Constituição do Estado da Bahia, vez que o método sistemático de interpretação deve considerar o sistema em que se insere a norma.
Outrossim, nota-se que a previsão de área de preservação permanente da restinga enquanto fixadora de dunas ou estabilizadoras de mangues existia no Código Florestal anterior (Lei 4771/1965) e que Lei Estadual n°10.431/2006 fez claramente uma opção em não restringir a proteção dada às restingas.
Por fim, cumpre destacar que a própria Lei 10.431/2006 ressalta a possibilidade da legislação estadual definir áreas de preservação permanente não previstas na legislação federal, como se depreende do disposto no paragrafo único do seu art. 89.
Ademais, não se pode esquecer que sob a ótica da máxima eficácia dos direitos fundamentais, sempre deve se dar prevalência à norma mais protetiva ao meio ambiente, sendo que na eventual hipótese de contradições entre normas editadas por dois ou mais entes da federação deverá predominar a norma que se apresentar mais benéfica à preservação do meio ambiente.
CONCLUSÃO
Diante de todas as considerações aqui trazidas, pode-se concluir que as áreas de restinga no Estado da Bahia possuem um regime protetivo próprio e generalizado, que não se vincula às restingas com a função de estabilizar mangue ou fixar dunas, nos termos do disposto no art. 215, IV, da Constituição Estadual da Bahia combinado com o art. 89, IV e paragrafo único, da Lei Estadual nº 10.431/2006.
Desse modo, após a revogação do regime de proteção generalizado dado às restingas (qualquer restinga existente na faixa de 300 metros contados da preamar máxima, pela Resolução CONAMA n° 303/2002) observa-se que as disposições constantes na Constituição e legislação infraconstitucional do Estado do Bahia permitem manter incólume a proteção as áreas de restinga ali existentes, independentemente da localização e da função que desempenhem.
Procuradora Federal. Especialista em Direito Público pela Unifacs-Universidade Salvador.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BARRETO, Caroline Menezes. Proteção da Restinga no Estado da Bahia - Área de preservação Permanente independentemente da função de estabilizar mangue e fixar dunas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 dez 2014, 04:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42549/protecao-da-restinga-no-estado-da-bahia-area-de-preservacao-permanente-independentemente-da-funcao-de-estabilizar-mangue-e-fixar-dunas. Acesso em: 23 dez 2024.
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