RESUMO:O objetivo deste trabalho é demonstrar, de forma sucinta, a necessidade que o processo seja efetivo, sendo o artigo 461 do Código de Processo Civil expressão dessa busca, na medida que prioriza a tutela específica, municiando o julgador de poder de escolha da medida executiva mais adequada ao caso concreto, o que nem sempre é a multa pecuniária, em que pese seja esta, na prática, a mais utilizada.
PALAVRAS-CHAVE: efetividade - prestação jurisdicional –obrigação de fazer, não fazer e dar coisa distinta de dinheiro - tutela específica - atipicidade dos meios executivos – proporcionalidade – razoabilidade –medidas coercitivas - multa pecuniária.
ABSTRACT: The aim of this paper is to demonstrate, succinctly, the necessity that the process is effective, since article 461 of the Code of Civil Procedure that seeks expression, as it prioritizes the specific protection, supplies the power to judge the choice of measure executive more appropriate to the case, which is not always amonetary fine, despite thisbeing, in practice, themostused.
KEYWORDS:effectiveness - adjudication - an obligation to do, and do not give something other thanmoney - specificprotection - atypicality media executives - proportionality - reasonableness - coercive measures - a monetary fine.
1 APONTAMENTOS ACERCA DA EFETIVIDADE PROCESSUAL
O objetivo primordial da ordem jurídica, como se sabe, é harmonizar conflitos, estabelecer a “paz social”, criar condições e normas que realizem a vida em sociedade da maneira mais pacificadora possível.
A doutrina tem dividido os escopos da jurisdição em três tipos: sociais, jurídicos e políticos. Os sociais referem-se à educação para uma vida em sociedade e concretização da justiça social; os jurídicos relacionam-se com a materialização das normas jurídicas; e os políticos tratam exatamente da paz social, fundamento maior de todo o sistema jurisdicional.
Com o advento do “Estado de bem estar social”, o Estado trouxe para si algumas responsabilidades, dentre elas aquela relacionada exatamente à harmonização de conflitos, com o fim de ensejar a máxima pacificação social com o mínimo desgaste[1]. Criou, então, as jurisdições voluntária e obrigatória e o processo como forma de instrumentalizar esses escopos, realizando o direito material negado no caso concreto.
O processo, então, como elemento da ordem jurídica, deve ser visto como instrumento desta, uma das maneiras que a jurisdição dispõe de concretizar seus escopos.
De acordo com os ensinamentos de Ada Pelegrini Grinover, citando Carnelutti:
“ (...) o direito objetivo não tem condições para disciplinar sempre todos os conflitos de interesses, sendo necessário o processo, muitas vezes, para a complementação dos comandos da lei. O comando contido nesta é incompleto, é como se fosse um arco que a sentença completa, transformando-o em círculo. (...) O processo teria, então, o escopo de compor a lide (ou seja, de editar a regra que soluciona o conflito trazido a julgamento)”.[2]
Do exposto, exsurge uma primeira conceituação do processo como instrumento da jurisdição, apto a harmonizar conflitos, concretizando o direito material e, consequentemente, contribuindo para a Justiça social. O processo teria, então, os mesmos escopos da jurisdição, posto que elemento desta, sendo prevalecenteo desígnio de fazer imperar, dentro de uma ordem jurídica, o direito positivado.
Humberto Theodoro Júnior concede ao processo três funções distintas, quais sejam:
“1ª) a de verificar a efetiva situação jurídica das partes (processo de cognição);
2ª) a de realizar efetivamente a situação jurídica apurada (processo de execução); e
3ª) a de estabelecer as condições necessárias para que se possa, num ou noutro caso, pretender a prestação jurisdicional (condições da ação)”[3]
Ocorre que, somente haverá, pelo processo, a consecução dos escopos jurisdicionais na medida em que aquele se mostre efetivo a cumprir com tais finalidades. Nas palavras de Alexandre Freitas Câmara, “por efetividade entende-se a aptidão de um instrumento para alcançar seus objetivos”[4]. É necessário, portanto, que o processo não tenha apenas objetivos formais, sem qualquer ação prática.
Utilizamo-nos das palavras de Cândido Rangel Dinamarco, que leciona que:
“a efetividade do processo, entendida como se propõe, significa a sua almejada aptidão a eliminar insatisfações, com justiça e fazendo cumprir o direito, além de valer como meio de educação geral para o exercício e respeito aos direitos da sociedade e assegurar-lhes a liberdade”[5]
Neste ínterim, faz-se imprescindível demonstrar quais os preceitos a serem observados quando da análise de sua verdadeira utilidade enquanto instrumento a serviço da paz social.
Essencial ressaltar que o processo apenas poderá ser considerado efetivo quando buscar realizar, em concreto, uma ordem jurídica justa. Com essa afirmação queremos dizer que não basta o cumprimento “cego” da lei para admitir a efetividade processual. É necessário que haja o alcance da justiça nos casos concretos levados à esfera judicial, posto ser o processo, acima de tudo, “um poderoso instrumento ético destinado a servir à sociedade e ao Estado”[6].
Isto posto, passemos à análise dos critérios de aferição da efetividade processual.
Em primeiro lugar, é fundamental que tenhamos um processo essencialmente formal, no sentido de que seja regido por normas que garantam a necessária legalidade e imparcialidade no exercício da jurisdição. Ressalte-se que um processo formal não implica na observância de formalismos exacerbados, posto que estes, muitas vezes (senão todas) levam exatamente à não consecução de uma ordem jurídica justa, mas à primazia daqueles que melhor saibam trabalhar as leis processuais.
Um processo efetivo também deve possuir uma duração razoável. É evidente que um procedimento que se arrasta por anos a fio não é capaz de dar ao merecedor do direito a tempestiva prestação de sua pretensão.
Há a necessidade, ademais, de garantir o acesso de todos aqueles que se vêm diante de uma situação de negativa de direito material à justiça processual. E a concessão dos benefícios da justiça gratuita, com a possibilidade de ingresso em juízo pelos indivíduos sem condições de arcar com as custas processuais sem prejuízo de seu sustento ou de sua família tem sido meio eficiente para garantir o mencionado acesso. Uma ordem jurídica justa não pode contemplar diferenças de tratamento em razão da inferior capacidade econômica de uma das partes.
As formas de desenvolvimento processual também devem ser observadas para que tenhamos um processo efetivo. Os princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório, do juiz natural, dentre outros, foram formulados exatamente com este fim. O processo deve ser igual para todos, não se admitindo, em qualquer hipótese, a disparidade de armas perante o juízo.
Discorrendo acerca do princípio do devido processo legal, o eminente processualista baiano Fredie Didier Jr.[7], o divide em devido processo legal formal e devido processo legal substancial, afirmando, com tal divisão, ser o princípio em análise a pedra de toque de todo o sistema processual. Afirma o estudioso que o devido processo legal formal consiste, basicamente, na observância das normas processuais em vigor.
O devido processo legal substancial englobaria, dentre outros, os princípios da efetividade e da proporcionalidade, requisitando, no caso concreto, a utilização de meios executivos razoáveis, adequados e capazes de alcançar a satisfação integral de qualquer direito material.
Não se há de falar em processo efetivoquando as decisões dele emanadas não se mostram úteis no caso concreto. Existe, pois, a necessidade de criação de “instrumentos de tutela adequados, na medida do possível, a todos os direitos e posições jurídicas de vantagem contemplados no ordenamento”[8].O mencionado processualista Fredie Didier conceitua tal critério como princípio da pertinência e afirma:
“Por fim, o princípio da pertinência ou aptidão, segundo o qual se deve averiguar se a medida empregada representa o meio certo para levar a cabo um fim almejado; há que se adequar o meio ao fim que se busca alcançar (...)”[9]
É de todo sabido que tutela justa não é apenas a que reconhece o direito material ao litigante que seja dele merecedor, mas sim que efetivamente permita a fruição daquele pelo vencedor da lide, “em condições mais próximas possíveis daquelas que teria, caso não tivesse ocorrido a crise jurídica que teve que ser debelada no Poder Judiciário.”[10]
Uma sentença (ou uma decisão) deve dar ao vencedor da lide tudo e essencialmente tudo que ele necessite para a recomposição do seu direito negado no caso concreto.De nada adianta considerar uma parte como vencedora da lide se a realização do seu direito se tornou impossível. O juiz, então, ao analisar o caso que se encontra diante de si deve procurar garantir a utilidade do processo desde o seu inicio.
Interessante transcrever, mais uma vez, os ensinamentos de Fredie Didier Júnior:
“’é necessário que o vencedor, aquele em favor de quem esse direito material foi reconhecido, encontre no ordenamento meios idôneos que lhe permitam ter efetivo acesso ao bem da vida que buscava. É por isso que o sistema deve prever meios eficazes e idôneos de efetivação das decisões judiciais”.[11]
O processo civil contemporâneo anseia pela busca de uma tutela jurisdicional efetiva, não mais sendo suficiente ao vencedor somente o reconhecimento do seu direito e a substituição do bem da vida almejado por equivalente em pecúnia. O que se busca – e deve ser assegurado – é o cumprimento in natura da prestação devida.
Nessa ótica, o artigo 461 do Código de Processo Civil merece especial atenção, e dele passaremos a tratar a seguir.
2 A PRIMAZIA DA TUTELA ESPECÍFICA NAS OBRIGAÇÕES DE FAZER, NÃO FAZER E ENTREGAR COISA DISTINTA DE DINHEIRO
Expressão da busca pela efetividade é o artigo 461 do Código de Processo Civil (CPC), que está assim redigido:
Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.
§ 1o A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.
§ 2o A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa (art. 287).
§ 3o Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada.
§ 4o O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.
§ 5o Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.
§ 6o O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva.
Tal dispositivo legal disciplina a “tutela específica” que, nos dizeres de Cássio Scarpinella Bueno, deve ser entendida como “a maior coincidência possível entre o resultado da tutela jurisdicional pedida e o cumprimento da obrigação caso não houvesse ocorrido a lesão de direito no plano material”[12].
No mesmo sentido, Luiz Guilherme Marinoni define a tutela na forma específica como:
“a tutela ideal do direito material, já que confere à parte lesada o bem ou o direito em si, e não o seu equivalente. É apenas mediante a tutela específica que o ordenamento jurídico pode assegurar a prestação devida àquele que possui a expectativa de receber um bem.”[13]
A tutela específica se difere da tutela pelo equivalente em pecúnia, que não entrega ao vencedor a prestação devida, mas quantia em dinheiro a ela equivalente.
Considerando que o processo civil prima atualmente, repita-se, pela efetividade, nada mais lógico que ao autor seja concedido o mesmo resultado que lhe traria o cumprimento espontâneo da obrigação no plano do direito material ou o resultado práticoequivalente ao do adimplemento, ficando, pois, em segundo plano a tutela por equivalente em pecúnia.
Portanto, a conversão por perdas e danos, nas obrigações de fazer, de não fazer e de entrega de coisa distinta de dinheiro (por força do artigo 461-A do CPC), somente ocorrerá se assim o autor desejar ou se impossível o cumprimento da obrigação.
Importante observar que o referido dispositivo se aplica a qualquer dever de fazer, de não fazer e de entrega de coisa distinta de dinheiro (este último por força do artigo 461-A do CPC), seja legal ou contratual, seja a obrigação fungível ou infungível, determinada ou determinável, de modo que é possível se assegurar o cumprimento específico em qualquer dessas modalidades, ficando atualmente superada qualquer discussão acerca da possibilidade ou não de atuação do Judiciário sobre a vontade do obrigado para convencê-lo a adimplir o pactuado.
Tamanha é a preocupação com a efetividade processual e consequentemente com a concretização do direito material por meio de tutela específicaque o artigo 461 do CPC, mais precisamente no seu parágrafo quinto, afasta, por completo, para as obrigações de fazer e não fazer (e entrega de coisa distinta de dinheiro, repita-se, por conta do artigo 461-A do CPC), a tipicidade dos meios executivos, permitindo ao magistrado escolher a melhor técnica executiva para concretização da sua decisão.
Da atipicidade dos meios executivos trataremos no tópico seguinte.
3 A ATIPICIDADE DOS MEIOS EXECUTIVOS
O Código de Processo Civil, em sua versão original, era evidentemente influenciado pelo modelo de Estado Liberal, onde eram valorizadas a propriedade e a liberdade individual dos cidadãos, de modo que preconizava uma Jurisdição inerte, não provocativa, com os magistrados engessados aos limites previstos no pedido e nos meios processuais – principalmente executórios – dispostos expressamente em lei.
Dessa forma, a execução das decisões judiciais, bem como de títulos extrajudiciais estava pautada no princípio da “tipicidade dos meios executivos”, de forma que, nas palavras de Marcelo Abelha Rodrigues:
“o juiz não cabe a escolha do meio executivo, senão porque lhe compete apenas e tão-somente cumprir as regras previstas da tutela processual executiva que estão delimitadas no “didático e exaustivo manual de instruções previamente estabelecido pelo legislador processual. Não havia espaço para “invenções” ou “criações” ou até “escolhas” por parte do juiz do meio executivo a ser utilizado na atividade executiva.””[14].
Com a mudança de paradigma e adventodo Estado Social, fora afastado o dogma da intangibilidade da vontade humana, de modo que aquele passou a desempenhar um papel ativo, “participativo e atuante de forma a privilegiar o respeito a credibilidade à jurisdição, no sentido de que o Estado deve dar a efetiva prestação da tutela jurisdicional”[15]
Ao encontro do novo enfoque do Estado, com a necessidade de o processo ser realmente efetivo,o CPC,com a Reforma Legislativa de 1994 (Lei 8.952/1994), passou a adotar, expressamente, o princípio da atipicidade dos meios executivos.
De fato, o parágrafo quinto do artigo 461 do CPC[16]estabelece um rol meramente exemplificativo dos meios executivos que o magistrado pode adotar, diante do caso concreto, para efetivação da decisão judicial.
Trata-se do “poder geral de efetivação” ou “cláusula geral executiva”[17], com ampliação dos poderes executivos dos magistrados, permitindo-lhes a utilização do meio mais adequado - seja ele de coerção direta, seja de coerção indireta - para efetivação do direito material posto, independentemente de previsão legal.
Nesse sentido, elucida Marcelo Abelha Rodrigues:
“a tendência na tutela executiva hoje é que o juiz seja um verdadeiro protagonista da tutela jurisdicional, atuando sempre em busca da solução justa, o que implica satisfazer o exeqüente sem que isso represente o arraso completo do executado.”[18]
Vê-se, pois, que a tendência legislativa é de valorização da execução específica, independentemente de ser a obrigação fungível ou infungível, municiando o magistrado de poderes para buscar o resultado prático a que corresponde o direito subjetivo do autor, utilizando-se, de preferência, meios de coerção indiretos, ou seja, aqueles que atuem na vontade do devedor como forma de compeli-lo a cumprir a ordem judicial.
4 OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE COMO MEIOS DE CONTROLE DO PODER GERAL DE EFETIVAÇÃO
Diante da superação da tipicidade dos meios executivos, cujo controle emanava da observância irrestrita da própria lei, com a consagração da atipicidade dos meios executivos, onde há permissão para o juiz escolher a melhor técnica executiva para atuar a norma concreta, independentemente de previsão legal, necessário sejam traçados os limites na opção pelo meio executivo a ser adotado no caso concreto.
De fato, a escolha do meio executivo pelo magistrado não é, em absoluto, discricionária.
Em primeiro lugar, como toda decisão judicial, a adoção de meio coercitivo deve ser fundamentada e previamente conhecida pelas partes, sob pena de nulidade.
Ademais, a deve ela se pautar nos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da execução menos gravosa ao devedor.
O princípio da razoabilidade impõe que o aplicador da norma, em sua atividade, observe o caso concreto, as circunstâncias fáticas que o permeia.
Sobre essa base, a doutrina normalmente apresenta a razoabilidade sob três acepções, ou seja, a razoabilidade é vista como equidade, como congruência e como equivalência.
A razoabilidade como equidade implica na necessidade de harmonização da norma ao caso concreto, levando-se em consideração as conseqüências ordinárias do ato, e atentando-se para que estas estejam dentro do direito, do ideal de justiça.
Nesse sentido, Humberto Ávila conclui que:
“a razoabilidade serve de instrumento metodológico para demonstrar que a incidência da norma é condição necessária mas não suficiente para sua aplicação. Para ser aplicável, o caso concreto deve adequar-se à generalização da norma geral. A razoabilidade atua na interpretação das regras gerais como decorrência do princípio da justiça.”[19]
Enquanto congruência pressupõe a análise do contexto histórico em que a norma foi criada e a realidade vivida no momento da sua aplicação
Por fim, a razoabilidade como equivalência significa que o aplicador deve dimensionar o critério com a medida adotada. O magistrado teria de fazer, nesse caso, a seguinte pergunta: o critério adotado é equivalente à medida pretendida?
Já o princípio da proporcionalidade almeja, em ultimo plano, a contenção de arbítrios e abusos no exercício do poder. Para ele, é imprescindível que o meio adotado seja proporcional ao fim pretendido.
A proporcionalidade está pautada no trinômio adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.
Na adequação analisa-se a capacidade da medida utilizada em produzir o resultado almejado. Isso exige que o julgador se utilize de um meio cuja eficácia possa contribuir para a promoção gradual do fim.
Pela necessidade, questiona-se se o meio utilizado realmente era o extremamente necessário para atingir o objetivo. Ela impõe, nesse sentido, que a medida empregada seja a menos gravosa possível para que se chegue ao fim desejado.
A proporcionalidade em sentido estrito, por sua vez, implica na análise do custo-benefício da medida adotada. Assim, devem os benefícios a serem auferidos com ela serem superiores aos prejuízos que causará.
Vê-se que a proporcionalidade em sentido lato enseja um jogo de ponderação, um verdadeiro exercício indispensável de sopesar valores.
Observe-se também que tanto o princípio da razoabilidade quanto o da proporcionalidade tem como finalidade a aplicação da medida que mais se adequa ao caso concreto, tendo em vista os valores e interesses que devem ser preservados na busca da solução ideal.
O princípio da execução menos gravosa, esculpido no artigo 620 do Código de Processo Civil preconiza que: “quando, por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor.”
Em outras palavras, o meio idôneo será aquele que não resulte em prejuízos excessivos e desarrazoáveis ao demandado.
Por isso, na adoção da medida executiva que será aplicada ao caso concreto, deve o magistrado avaliar os interesses que estão em jogo, prevendo as conseqüências que a sua decisão irá causar. Em outras palavras, deve se utilizar do bom senso na sua atividade, com a estrita observância dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, sem que sua decisão venha a espezinhar os devedores.
5. CRÍTICA AO USO EXACERBADO DA MULTA PECUNIÁRIA COMO TÉCNICA EXECUTIVA NAS OBRIGAÇÕES DE FAZER, NÃO FAZER E ENTREGA DE COISA DISTINTA DE DINHEIRO
A multa coercitiva é, sem sombra de dúvidas, a medida mais utilizada e difundida para darcumprimento à tutela especifica.
Tanto é que o parágrafo sexto do artigo 461 do CPC se refere a tal meio coercitivo de forma expressa, dando amplos poderes ao magistrado de majorá-la, diminuí-la, alterar a sua periodicidade, de acordo com as peculiaridades do caso concreto.
Na prática, verifica-se que quase a totalidade das sentenças que impõem uma obrigação de fazer, não fazer ou entregar coisa distinta de dinheiro fixa a multa – normalmente diária – como meio coercitivo para cumprimento do seu dispositivo.
Ocorre que a multa pode não ser a medida mais adequada para que seja garantida a efetividade, essa entendida, como já visto, como a concretização do direito material em tempo hábil.
A medida coercitiva deve configurar ameaça ao réu suficiente a demovê-lo da intenção de transgredir e, simultaneamente, atender a máxima efetividade da tutela jurisdicional, sem impor sacrifício por demais oneroso ao vencido.
A medida deve incutir coação psicológica ao devedor, de forma a estimulá-lo ao rápido cumprimento da obrigação. “Não é providência que se destine a penalizar o réu: o sacrifício que se lhe impõe não é castigo nem visa a sua educação; está instrumentalmente vinculado à perspectiva de cumprimento.”[20]
A escolha de determinada medida de coação, nas palavras de Luiz Guilherme Marinoni, deve ser vista como:
“o resultado da aplicação das sub-regras da proporcionalidade, quais sejam: I) adequação, II) necessidade e III) proporcionalidade em sentido estrito. Adequação é, em termos rápidos, a legitimidade do meio pensado para atingir a tutela. A necessidade se desdobra nas idéias de meio idôneo e da menor restrição possível. O meio idôneo é pensado em termos de eficácia, pois é aquele que tem aptidão para proporcionar concretamente a tutela. Porém, esse meio idôneo deve ser aquele que cause a menor restrição possível à esfera jurídica do réu.”[21]
No caso de dano ambiental, por exemplo, a fixação de multa para que uma suposta empresa seja compelida a parar de jogar detritos tóxicos em um determinado rio não cessará de imediato os prejuízos à natureza e à sociedade como um todo, já que eventualmente a fábrica poderá vir a não cumprir de imediato o dispositivo sentencial, pois lhe foi dada a opção, em ultimo caso, de retardar o adimplemento, com o pagamento da multa.
No citado exemplo, questiona-se se não seria mais efetivo seria que o magistrado, na sentença, fixasse prazo para cumprimento da obrigação, sob pena de cessação temporária das atividades da empresa, por exemplo. O argumento de que a fixação de tal medida executiva poderá ir de encontro ao “princípio da execução menos gravosa”, previsto no artigo 620 do CPC, não pode, ser utilizado no presente caso. Ora, o vencido já teve todo o tempo do trâmite processual – que infelizmente não é pouco – para analisar e prever o possível risco de uma sentença a ele contrária, já lhe fora estabelecido prazo para cumprimento voluntário do comando judicial, bem como com a decisão já tinha conhecimento da medida coercitiva a ser aplicada em caso de inadimplemento (já que esta deve estar expressa na sentença), de modo que não será, em absoluto, “surpreendido” em eventual interdição.
Ademais, no presente caso, estamos diante de manutenção - e mesmo agravamento - de prejuízos ambientais, possivelmente irreversíveis, com o retardo do cumprimento do comando judicial pelo demandado, o que afeta diretamente toda a sociedade, de modo que não será desproporcional e desarrazoada a opção pelo aludido gravame como meio coercitivo para forçar o vencedor a observar, prontamente, a sentença.
Deve-se atentar, também, no momento da prolatação da sentença e conseqüente fixação do meio executivo, o poder financeiro do devedor, já que a multa coercitiva pode não despertar o receio do descumprimento, já que sempre será pagável e o retardo no adimplemento pode vir a ser favorável àquele.
Nesse sentido, preconiza Carreira Alvim:
“... dependendo do proveito que lhe proporcione a própria inércia, pode o réu preferir pagar a multa diária a cumprir o preceito. Assim, se o juiz ordena, liminarmente, o fechamento de uma casa noturna bem situada (onde, por exemplo, se “lava” dinheiro), pode o seu proprietário preferir pagar a multa diária a cumprir o preceito, que é mudar o seu negócio para outro lugar.”[22]
Ou mesmo o contrário. A multa poder ser mostrar como meio ineficaz por não ter o devedor patrimônio suficiente para seu pagamento, de modo que tanto poderá ser descumprida a obrigação de fazer, não fazer ou entrega de coisa distinta de dinheiro, como a execução do valor da multa será vazia.
Em crítica à utilização inadequada da multa como medida coercitiva, Fredie Didier Junior chama a atenção, com propriedade, ao seguinte:
“... muita vez, o magistrado impõe a multa para efetivação de obrigações de pequeno valor ou em face de um demandado que não tem condições financeiras de suportá-la. Num e noutro caso a utilização da multa coercitiva não é recomendável.
Se a obrigação é de pequeno valor, a multa coercitiva pode transformar-se no principal objetivo do demandante, que passa a “torcer”para que a outra parte não cumpra a decisão. É freqüente a situação, normalmente em Juizados Esoeciais Cíveis, em que o autor, objetivando ver restabelecido o fornecimento de energia elétrica de sua residência, obtém decisão liminar favorável, com imposição de multa diária, que, após certo tempo, se transforma em vultosa quantia, totalmente desproporcional com o valor patrimonial da obrigação que se buscava efetivar – situação que redundará em enriquecimento injustificado do demandante.
Se o demandado é pessoa sem condições econômicas de suportar a multa, a coerção torna-se inócua.”[23]
Se não bastasse, o réu pode ser conhecido pelo descumprimento de comando judicial, de modo que a multa em nada lhe coagirá ao adimplemento.
Outrossim, pela própria natureza da obrigação e necessidade de urgente cumprimento da decisão, sob pena de prejuízos ainda maiores, não convém a fixação de multa. Podemos citar como exemplos a obrigação de servir merenda escolar, de fornecimento de medicamentos e autorização para realização de cirurgia por convênio médico.
Carreira Alvim apresenta os seguintes casos em que a cominação de multa é incompatível com a obrigação:
“Assim, se o juiz concede uma medida liminar antecipatória, para que um acidentado seja internado num hospital que se recusa a fazê-lo, deve adotar providencias para que a internação se faça incontinenti, pois, em tal situação, a fixação de prazo com a cominação de multa revela-se incompatível com a obrigação. Da mesma forma, se o juiz determina, em liminar, a inscrição de um candidato num concurso que será realizado no dia seguinte, não há como fixar prazo para cumprimento do preceito, com a cominação de multa, porque a medida restará ineficaz com a realização do certame. Por fim, no âmbito da defesa do consumidor, nenhum juiz, ao deferir uma liminar para retirada de um produto estragado do comércio, pensaria em fixar prazo com multa diária para o cumprimento da ordem.”[24]
Nesses casos, a própria sentença poderá se valer, por exemplo, de um meio executivo sub-rogatório tão logo constatado o seu descumprimento, em detrimento da fixação da multa.
A jurisprudência tente a ser favorável à utilização de outros meios coercitivos que não a multa quando essa não se mostra suficiente para tornar efetiva a tutela. Vejamos duas ementas de acórdãos proferidos pelo Superior Tribunal de Justiça, bastante elucidativos:
"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS PELO ESTADO. DESCUMPRIMENTO DA DECISÃO JUDICIAL DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. BLOQUEIO DE VERBAS PÚBLICAS. MEDIDA EXECUTIVA. POSSIBILIDADE, IN CASU. PEQUENO VALOR. ART. 461, § 5.º, DO CPC. ROL EXEMPLIFICATIVO DE MEDIDAS. PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL À SAÚDE, À VIDA E À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. PRIMAZIA SOBRE PRINCÍPIOS DE DIREITO FINANCEIRO E ADMINISTRATIVO. NOVEL ENTENDIMENTO DA E. PRIMEIRA TURMA.
1. Recurso especial que encerra questão referente à possibilidade de o julgador determinar, em ação que tenha por objeto a obrigação de fornecer medicamentos a portador INSUFICIÊNCIA RESPIRATÓRIA GRAVÍSSIMA, medidas executivas assecuratórias ao cumprimento de decisão judicial antecipatória dos efeitos da tutela proferida em desfavor de ente estatal, que resultem no bloqueio ou seqüestro de verbas deste depositadas em conta corrente.
2. Depreende-se do art. 461, §5.º do CPC, que o legislador, ao possibilitar ao juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas assecuratórias como a "imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial", não o fez de forma taxativa, mas sim exemplificativa, pelo que, in casu, o seqüestro ou bloqueio da verba necessária à aquisição dos medicamentos objetos da tutela deferida, providência excepcional adotada em face da urgência e imprescindibilidade da prestação dos mesmos, revela-se medida legítima, válida e razoável.
3. Deveras, é lícito ao julgador, à vista das circunstâncias do caso concreto, aferir o modo mais adequado para tornar efetiva a tutela, tendo em vista o fim da norma e a impossibilidade de previsão legal de todas as hipóteses fáticas. Máxime diante de situação fática, na qual a desídia do ente estatal, frente ao comando judicial emitido, pode resultar em grave lesão à saúde ou mesmo por em risco a vida do demandante.
4. Os direitos fundamentais à vida e à saúde são direitos subjetivos inalienáveis, constitucionalmente consagrados, cujo primado, em um Estado Democrático de Direito como o nosso, que reserva especial proteção à dignidade da pessoa humana, há de superar quaisquer espécies de restrições legais. Não obstante o fundamento constitucional, in casu, merece destaque a Lei Estadual n.º 9.908/93, do Estado do Rio Grande do Sul, que assim dispõe em seu art. 1.º:
'Art. 1.º. O Estado deve fornecer, de forma gratuita, medicamentos excepcionais para pessoas que não puderem prover as despesas com os referidos medicamentos, sem privarem-se dos recurso indispensáveis ao próprio sustento e de sua família.
Parágrafo único. Consideram-se medicamentos excepcionais aqueles que devem ser usados com freqüência e de forma permanente, sendo indispensáveis à vida do paciente'.
5. A Constituição não é ornamental, não se resume a um museu de princípios, não é meramente um ideário; reclama efetividade real de suas normas. Destarte, na aplicação das normas constitucionais, a exegese deve partir dos princípios fundamentais, para os princípios setoriais. E, sob esse ângulo, merece destaque o princípio fundante da República que destina especial proteção a dignidade da pessoa humana.
6. Outrossim, a tutela jurisdicional para ser efetiva deve dar ao lesado resultado prático equivalente ao que obteria se a prestação fosse cumprida voluntariamente. O meio de coerção tem validade quando capaz de subjugar a recalcitrância do devedor. O Poder Judiciário não deve compactuar com o proceder do Estado, que condenado pela urgência dasituação a entregar medicamentos imprescindíveis proteção da saúde e da vida de cidadão necessitado, revela-se indiferente à tutela judicial deferida e aos valores fundamentais por
ele eclipsados.
7. In casu, a decisão ora hostilizada pelo recorrente importa na disponibilização em seu favor da quantia de R$ 538,00 (quinhentos e trinta e oito reais), que além de não comprometer as finanças do Estado do Rio Grande do Sul, revela-se indispensável à proteção da saúde do autor da demanda que originou a presente controvérsia, mercê de consistir em medida de apoio da decisão judicial em caráter de sub-rogação.
8. Por fim, sob o ângulo analógico, as quantias de pequeno valor podem ser pagas independentemente de precatório e a fortiori serem, também, entregues, por ato de império do Poder Judiciário.
9. Recurso especial provido"
(STJ, REsp 811.552/RS, Rel. Min. Luiz Fux, DJU de 29.05.2006 - destacamos).
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO (ARTIGO 522, DO CPC) INTERPOSTO EM FACE DE DECISÃO INTERLOCUTÓRIA PROFERIDA EM SEDE DE MANDADO DE SEGURANÇA. DECISÃO AGRAVADA QUE DETERMINOU A APLICAÇÃO DE MULTA COMINATÓRIA (ASTREINTES ) POR DESCUMPRIMENTO DE COMANDO JUDICIAL QUE ESTIPULAVA PRAZO PARA APRESENTAÇÃO DE CÓPIA DAS FICHAS FINANCEIRAS DOS SERVIDORES PÚBLICOS A FIM DE VIABILIZAR A APURAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE DESCONTOS INDEVIDOS NOS VENCIMENTOS. IMPOSIÇÃO DE MULTA COMINATÓRIA. RAZOABILIDADE. AUSÊNCIA. BUSCA E APREENSÃO DOS DOCUMENTOS. POSSIBILIDADE. INTUITO RECALCITRANTE. INEXISTÊNCIA.
1. A imposição de multa pecuniária, em desfavor da Fazenda Pública, pelo descumprimento da ordem de apresentação dos documentos requisitados pela autoridade judicial revela-se desarrazoada em virtude da possibilidade de expedição de mandado de busca e apreensão, à luz dos artigos 461, § 5º, e 461-A, § 2º, do CPC, notadamente quando não configurado o intuito recalcitrante do devedor.
2. Com efeito, o Código de Processo Civil autoriza o juiz, de ofício ou a requerimento, a determinar medidas necessárias para assegurar a efetivação da tutela específica pretendida nas ações que tenham objeto o cumprimento de obrigações de fazer ou não fazer (fungíveis ou infungíveis) ou de entregar coisa, bem como para garantir a obtenção do resultado prático equivalente (artigos 461 e 461-A).
3. Nesse segmento, os §§ 4º e 5º, do artigo 461, do CPC, enumeram, exemplificativamente, as medidas que podem ser adotadas pelo juiz, quais sejam: (i) imposição de multa diária ao réu, in limine ou quando da prolação da sentença, desde que fixado prazo razoável para cumprimento do preceito; (ii) busca e apreensão da coisa; (iii) remoção de pessoas e coisas; (iv) desfazimento de obras; (v) impedimento de atividade nociva; e (vi) requisição de força policial.
4. A Lei 10.444/2002 alterou a redação do § 5º, do aludido dispositivo legal, que passou a dispor que:
"Art. 461. (...)
§ 5º. Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial."
5. Destarte, o CodexProcessual, entre outras medidas coercitivas, atribuiu ao juiz a faculdade de impor multa cominatória (astreinte) em desfavor do devedor (ainda que se trate da Fazenda Pública), tendo por escopo inibir o descumprimento das obrigações de fazer ou não fazer (fungíveis ou infungíveis) ou de entregar coisa, sendo certo que a aludida pena pecuniária incide a partir da ciência do obrigado e da sua recalcitrância (Precedentes do STJ: REsp 1.162.239/PR, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 26.08.2010, DJe08.09.2010; AgRg no REsp 1.176.638/RS, Rel. Ministro Haroldo Rodrigues (Desembargador Convocado do TJ/CE), Sexta Turma, julgado em 17.08.2010, DJe 20.09.2010; AgRg no Ag 1.247.323/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em08.06.2010, DJe 01.07.2010; e REsp 987.280/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 16.04.2009, DJe 20.05.2009).
6. Outrossim, "é possível a aplicação de multa coercitiva para constranger ao cumprimento de decisões interlocutórias, sentenças e acórdãos, sempre que neles se impor a observância de um fazer ou de um não fazer", revelando-se evidente seu descabimento "para constranger alguém a fazer ou não fazer algo fática ou juridicamente impossível" (Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero,in"Código de Processo Civil - Comentado Artigo por Artigo", 2ª ed., Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 2010, pág. 428).
7. Nada obstante, forçoso destacar que o artigo 461-A, do CPC(incluído pela Lei 10.444/2002), no que concerne à obrigação de entregar coisa, determina que, não cumprida a obrigação no prazo fixado pelo juiz, expedir-se-á, em favor do credor, mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel (§ 2º).
8. In casu, cuida-se de multa cominatória imposta pelo juízo singular, em sede de mandado de segurança, uma vez vislumbrado o descumprimento, pela Fazenda Nacional, da ordem judicial de que fossem apresentadas cópias das fichas financeiras dos servidores públicos federais (substituídos processuais) "para apuração de desconto feito nos seus vencimentos, embora houvesse determinação judicial vedando tal desconto" .
9. Consectariamente, a possibilidade de expedição de mandado de busca e apreensão dos documentos requisitados pela autoridade judicial (artigos 461, § 5º, e 461-A, § 2º, do CPC) torna desarrazoada a fixação de multa pecuniária pelo descumprimento da ordem de apresentação, máxime quando existente pedido de dilação de prazo formulado pela Fazenda Pública, o que afasta a caracterização de seu suposto intuito recalcitrante.
10. Recurso especial provido a fim de excluir a multa pecuniária(astreintes) cominada pelo Juízo Singular em desfavor da Fazenda Pública.
(STJ, REsp 1.069. 441/PE, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 14/12/2010 – negritos nossos)
Araken de Assim, em sua obra Cumprimento da Sentença, acentua exemplo de Eduardo Talamini de designação de fiscal ou interveniente como meio executivo para se assegurar o cumprimento das decisões do CADE tomadas para reprimir abuso do poder econômico. Nesse caso, a adoção de tal medida “torna-se possível eliminar o emprego de produtos poluidores na produção de alguma empresa, controlar emanações sonoras em horários predeterminados, sem afetar a existência da empresa”.[25]
Sob esse aspecto, ousamos adiscordar do posicionamento do professor Humberto Theodoro Junior que defende que “a mais enérgica medida para agir sobre o ânimo do devedor, é sem dúvidas, a sanção pecuniária, a multa.”[26]
A fixação do meio coercitivo mais eficaz ao caso concreto ficará a cargo do magistrado, que analisará as circunstâncias fáticas, com a estrita observância do princípio da proporcionalidade e da razoablidade, bem como do artigo 620 do CPC.
A utilização de medida de coação diversa da multa não pode ser visto como sucessor à essa, ou seja, somente empregada caso aquela tenha se mostrado insuficiente para coagir o devedor ao cumprimento da decisão judicial.
A efetividade, repita-se, não está ligada somente a entrega da prestação, tal como devida, ao credor, mas seja essa entregue de modo e tempo hábil para satisfação daquele.[27]
O vencedor na ação busca o efetivo cumprimento do direito material de forma célere que lhe garanta a efetiva reparação, cessando eventuais prejuízos e/ou não lhe causando maiores danos.
De nada adianta a aplicação de multa como meio coercitivo quando essa não tem força suficiente para estimular o devedor ao rápido cumprimento da obrigação. O caso concreto, sem sombra de dúvidas, que irá revelar o meio mais adequado a ser adotado, sem haver qualquer prevalência da multa em relação a outras medidas executivas.
6. CONCLUSÃO
O processo, como elemento da ordem jurídica deve ser entendido como instrumento desta, sendo, assim, uma das maneiras que a jurisdição dispõe de concretizar seus escopos sociais, jurídicos e políticos.
A consecução dos escopos jurisdicionais pelo processo somente irá ocorrer quando esse mostre efetivo a harmonizar conflitos, concretizando o direito material.
Não se há de falar em processo efetivo quando as decisões dele emanadas não se mostram úteis no caso concreto, que não permita, em tempo hábil, a fruição do direito material pelo vencedor da lide.
O artigo 461 do CPC disciplina a tutela específica para as obrigações de fazer e não fazer (estendida a sua aplicação às obrigações de dar coisa distinta de dinheiro por força do artigo 461-A do CPC).
Considerando que o processo civil preza pela efetividade, nada mais lógico que ao autor seja concedido o mesmo resultado que lhe traria o cumprimento espontâneo da obrigação no plano do direito material ou o resultado prático equivalente ao do adimplemento, ficando, pois, em segundo plano a tutela por equivalente em pecúnia
O CPC, com a Reforma Legislativa de 1994 (Lei 8.952/1994),com o estopo de priorizar a tutela específica, passou a adotar expressamente o princípio da atipicidade dos meios executivos, já que o parágrafo 5º do seu artigo 461 apresenta um rol meramente exemplificativo das medidas que o magistrado pode utilizar, diante do caso concreto, para efetivação da decisão judicial, sejam aquelas de coerção direta ou de coerção indireta.
Não há discricionariedade na opção do meio executivo pelo magistrado. Sua decisão deve ser fundamentada e se pautar nos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da execução menos gravosa ao devedor.
A multa coercitiva é a medida executiva mais utilizada e difundida para dar cumprimento à tutela especifica.
Entretanto, a multa pode não ser a medida mais adequada para que seja garantida a efetividade, essa entendida como a concretização do direito material em tempo hábil, seja pelas condições econômicas do devedor, seja pela própria natureza da obrigação e necessidade de seu urgente cumprimento.
Quando a multa não tem força suficiente para estimular o devedor ao rápido cumprimento da obrigação, deve ser afastada e utilizada outra medida executiva mais eficaz. O caso concreto irá revelar o meio mais adequado a ser adotado.
REFERÊNCIAS
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20da%20presta%C3%A7%C3%A3o%20jurisdicional.mht. Acesso em: 01 fevereiro 2011.
[1] CINTRA, Antonio Carlos de Araujo, GRINOVER, Ada Pellegrini, DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 18 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 19.
[2] Idem, p. 39.
[3] JÚNIOR, Humberto Theodoro. Curso de Direito Processual Civil. Volume I. 39 ed. Rio de Janeiro:Forense, 2003, p. 42.
[4] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual. Vol. I. 14 ed revista e atualizada. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2006, p. 224.
[5]DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 12ª ed., São Paulo: Malheiros Editores, 2005, p. 331.
[6] op. cit., p. 45.
[7] JUNIOR, Fredie Didier. Curso de Direito Processual Civil. Teoria do Processo e Processo de Conhecimento. 11 ed. Salvador:Jus Podivm, 2009, p. 32 e SS.
[8] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual. Vol. I. 14 ed revista e atualizada. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2006, p. 224.
[9] JR., Fredie Didier. Curso de Direito Processual Civil. Teoria do Processo e Processo de Conhecimento. 11 ed. Salvador: Jus Podivm, 2009, p. 38.
[10] RODRIGUES, Marcelo Abelha. O devido processo legal e a execução civil. In: Execução civil – Estudos em homenagem ao Professor Humberto Theodoro Júnior. Coordenação: Ernane Fidélis dos Santos... (et al). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. Material da 1ª aula da disciplina Cumprimento das decisões e processo de execução, ministrada no curso de especialização televirtual em Direito Processual Civil – UNIDERP/IBDP/REDE LFG.
[11] JÚNIOR, Fredie Didier. Curso de Direito Processual Civil. Execução. 2ª ed. Salvador:Jus Podivm, 2010, p. 406.
[12]ApudLUCON, Paulo Henrique dos Santos. Sentença e liquidação no CPC: Lei 11.232/2005. Material da 6ª aula da disciplina Cumprimento das Decisões e Processo de Execução, ministrada no curso de pós-graduação lato sensu televirtual em Direito Processual Civil – UNIDERP/IBDP/REDE LFG.
[13] MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos, 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p.285.
[14] RODRIGUES, Marcelo Abelha. Atividade Jurisdicional Executiva. 1ª ed., p. 14-36, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. Material da 1ª aula da disciplina Cumprimento das decisões e processo de execução, ministrada no curso de especialização televirtual em Direito Processual Civil – UNIDERP/IBDP/REDE LFG.
[15] RODRIGUES, MARCELO Abelha. Atividade Jurisdicional Executiva. 1ª ed., p. 14-36, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. Material da 1ª aula da disciplina Cumprimento das decisões e processo de execução, ministrada no curso de especialização televirtual em Direito Processual Civil – UNIDERP/IBDP/REDE LFG.
[16]O§ 5o do artigo 461 do CPC está assim disposto: Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.
[17]JÚNIOR, Fredie Didier. Curso de Direito Processual Civil. Execução. 2ª ed. Salvador:Jus Podivm, 2010, p. 48.
[18]RODRIGUES, MARCELO Abelha. Atividade Jurisdicional Executiva. 1ª ed., p. 14-36, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. Material da 1ª aula da disciplina Cumprimento das decisões e processo de execução, ministrada no curso de especialização televirtual em Direito Processual Civil – UNIDERP/IBDP/REDE LFG.
[19]ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios – da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 2a ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2000.
[20]CASTRO, Flávia da Cunha. Tutela Jurisdicional Efetiva: Artigo 461, § 5º, do código de processo civil e contemptofcourt. Disponível em: http://bdjur.stj.gov.br/xmlui/bitstream/handle/2011/18853/Tutela_jurisdicional_efetiva.pdf?sequence=2. Acesso em: 01 fevereiro 2011.
[21]MARINONI, Luiz Guilherme. As Novas Sentenças e os Novos Poderes do Juiz para a prestação da Tutela Jurisdicional EfetivaIn: Leituras Complementares de Processo Civil. Organizador: Fredie Didier Jr.5ª ed. Salvador: Jus Podivm, 2007.
[22]ALVIM, José Eduardo Carreira. Tutela específica das obrigações de fazer, não fazer e entregar coisa. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 161.
[23]JÚNIOR, Fredie Didier. Curso de Direito Processual Civil. Execução. 2ª ed. Salvador:Jus Podivm, 2010p. 459.
[24] ob. cit. p. 160.
[25]ASSIM, Araken de. Cumprimento da Sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 230.
[26]JÚNIOR, Humberto Theodoro. Tutela Específica das Obrigações de Fazer e Não Fazer. Disponível em:http://jus.uol.com.br/revista/texto/2904%5Bcapturado/tutela-especifica-das-obrigacoes-de-fazer-e-nao-fazer. Acesso em: 01 fevereiro 2011.
[27] Nesse sentido, Fredie Didier Junior (ob. cit, p. 436) chama a atenção que “trata-se de noção já assente na doutrina a que todo o jurisdicionado tem direito fundamental de obter do Poder Judiciário uma prestação jurisdicional efetiva, adequada e tempestiva, seja em decorrência do devido processo legal (art. 5º, LIV, CF), seja em decorrência do princípio da inafastabilidade da atividade jurisdicional (art. 5º, XXXV, CF).”
Procuradora Federal formada pela Universidade Federal da Bahia e especialista em Direito Processual Civil Lato Sensu pela Universidade Anhanguera - Uniderp, em convênio com a Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BACELLAR, Sheila Beyer. A busca da efetividade do processo: a multa pecuniária nem sempre como a técnica coercitiva mais adequada Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 dez 2014, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42623/a-busca-da-efetividade-do-processo-a-multa-pecuniaria-nem-sempre-como-a-tecnica-coercitiva-mais-adequada. Acesso em: 23 dez 2024.
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