A família é conhecida tradicionalmente como a célula da sociedade, organização que, dentre inúmeras características, tem se mostrado relevante para o desenvolvimento das potencialidades humanas e para a educação de convívio em grupo.
Sabendo das vantagens da família, os ordenamentos jurídicos nacionais e estrangeiros têm contemplado o dever do Estado em ofertar-lhe a devida proteção, sobretudo quando aquele que sustenta a entidade familiar vem a falecer ou fica impedido de exercer atividade remunerada. Para esses intentos, vários mecanismos são previstos com vistas à concretizaçãodesse programa, mas um é de uma fundamentalidade ímpar: a Previdência Social, que conta com dois benefícios específicos para o amparo dos dependentes do segurado faltante, quais sejam, o auxílio-reclusão e a pensão por morte. Éa este último benefício que nos deteremos, especificamente no que se refere à figura do dependente inválido.
A pensão por morte é devida aos dependentes do segurado que, à data do óbito, encontrava-se em uma das seguintes situações:
a) estava contribuindo para o Regime Geral de Previdência Socialou recebendo outro benefício previdenciário;
b) possuía qualidade de segurado, estando em gozo do período de graça;
c) perdeu a qualidade de segurado, porém já havia cumprido previamente os requisitos necessários para se aposentar pelo RGPS.
Observe-se que não se mencionou a necessidade de um mínimo de contribuições (carência) para a concessão da pensão por morte, bastando que o segurado, no dia do seu falecimento, estivesse enquadrado em uma das três hipóteses acima. Por conta da não exigência desse requisito, é possível que um segurado tenha se empregado pela primeira vez justamente no mês de seu óbito e, ainda assim, seus dependentes façam jus ao benefício previdenciário em questão.
Quanto ao valor do benefício, pode-se dizer que será equivalente aoda aposentadoria que o segurado recebia ou daquela a que teria direito se estivesse aposentado por invalidez na data de seu falecimento. O valor total do benefício previdenciário será rateado igualmente em razão de cada dependente do segurado, totalizando os 100% do salário-de-benefício, conforme artigo 75 da Lei n. 8.213/91.
Ao perder a qualidade de dependente, a quota parte a que fazia jus será revertida em favor dos demais dependentes do segurado. A cessação do benefício ocorre quando o último dependente perde os requisitos que lhe garantiram tal condição.
No tópico anterior, tratou-se dos aspectos gerais da pensão por morte, indicando tal benefício como aquele voltado não ao segurado - aquele que normalmente contribui -, mas aos seus dependentes, que nos termos do art. 16 da Lei n. 8.213/91 são:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente; (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
II - os pais;
III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente; (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011).
Da leitura do dispositivo legal, percebe-se que apenas os filhos e irmãos têm a manutenção do benefício eventualmente deferido condicionada a termo final, que – no caso em apreço – é o atingimento dos 21 anos de idade.
A lei concede, portanto, especial proteção ao filho e ao irmão não emancipado menor de 21 anos, e protege com maior afinco quando tais pessoas são inválidas. Em outros termos, a qualidade de dependente cessa ao filho e ao irmão ao se emancipar ou ao completar 21 anos, salvo se inválido, condição segundo a qual, ainda que maior de 21 anos de idade, restaria mantida a proteção previdenciária na condição de dependente do segurado do RGPS.
Mas haveria condicionante da invalidez à obtenção do benefício da pensão por morte?
Da leitura do art. 16 da Lei n. 8.213/91, não se observa condicionante alguma, havendo apenas alusão a que os filhos e irmãos inválidos são dependentes do segurado.
Por outro lado, analisando sistematicamente a Lei mencionada, e deparando-se com o §1º do art. 17 da Lei n. 8.213/91,ao prescrever que “incumbe ao dependente promover a sua inscrição quando do requerimento do benefício a que estiver habilitado”, já se percebe que a condição de dependente deve ser uma realidade anterior ao fato que motivou o requerimento. Assim, não há como reconhecer a condição de dependente após o falecimento do segurado, até mesmo por força da lógica da natureza. Não há a figura do dependente de ninguém.
Dito isso, ainda remanesce a dúvida quanto ao reconhecimento da qualidade de dependente ao filho ou irmão que, apesar de ostentar a invalidez antes do óbito do segurado, não ostentava essa condição antes da emancipação ou de completar 21 anos de idade, exigência tal que não está expressamente contemplada na Lei n. 8.213/91, mas no Decreto n. 3.048/99, que a regulamenta.
Nesse sentido, verificam-se os termos do art. 108 do referido Decreto, quais sejam:
Art. 108. A pensão por morte somente será devida ao filho e ao irmão cuja invalidez tenha ocorrido antes da emancipação ou de completar a idade de vinte e um anos, desde que reconhecida ou comprovada, pela perícia médica do INSS, a continuidade da invalidez até a data do óbito do segurado. (Redação dada pelo Decreto nº 6.939, de 2009).
Isso ocorre porque a perda da qualidade de dependente dá-se com a completude dos seus 21 anos de idade ou no caso de sua emancipação, não havendo previsão legal para reaquisição dessa qualidade pelo simples fato da invalidez. As hipóteses de emancipação são previstas no Código Civil, em seu art. 5º, in verbis:
Art. 5o A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.
Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade:
I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos;
II - pelo casamento;
III - pelo exercício de emprego público efetivo;
IV - pela colação de grau em curso de ensino superior;
V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia própria.
Dessa maneira, o filho (ou equiparado, conforme Legislação Previdenciária) que contrair matrimônio antes de completar a idade limite de 21 anos de idade perderá o direito à sua quota parte, sendo esta revertida em favor dos demais dependentes, se houver.
Assim, ainda que o filho seja menor de idade do ponto de vista previdenciário, não mais ostentará a condição de dependente caso tenha se emancipado pelo casamento.
Porém, resta saber qual a consequência de o filho, já emancipado, vir a ser considerado inválido antes do óbito de seu genitor. Haveria alguma condição temporal para a ocorrência da invalidez que não fosse o próprio óbito do instituidor? Parece-nos que sim.
A jurisprudência majoritária segue a linha administrativa do INSS no sentido de que não basta que a invalidez seja anterior ao óbito, mas que o filho jamais tivesse perdido a qualidade de dependente. É que a situação deve ser analisada à época do fato gerador. Vejamos um exemplo de julgado neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. NULIDADE DA SENTENÇA. REJEITADA. FILHO MAIOR. PERDA DA QUALIDADE DE DEPENDENTE. NÃO COMPROVAÇÃO DE INVALIDEZ ANTES DO ÓBITO DO INSTITUIDOR E DO ADVENTO DA MAIORIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 16 DA LEI 8213/91. [...] 5. Da análise da documentação acostada aos autos, conclui-se que o autor ao chegar a maioridade não era considerado incapaz e tinha perdido a qualidade de dependente, haja vista que antes do falecimento de seu genitor ocorrido em 08.11. 2001, o autor exercia a função deruralista, vindo a perceber o auxílio-doença por incapacidade laborativa em 16.03.05, ou seja, após a morte de seu pai. 6. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado, o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido (art. 16, I, da Lei 8213/91): 7. Na hipótese, o autor não fez prova de sua invalidez antes do óbito do instituidor da pensão, como também não provou que a invalidez alegada ocorreu antes da maioridade, razão por que não faz jus ao benefício requerido.(TRF5, AC - Apelação Civel – 550624, Relator(a): Desembargador Federal Manoel Erhardt, Primeira Turma, Data da Decisão: 21/03/2013, Data da Publicação: 26/03/2013)
Com as abordagens que se fez acima, defendeu-se a ideia de que a invalidezpossui implicações diretas com o benefício da pensão por morte,e que a condição de inválido do filho ou irmão deve ser não apenas permanente, mas cuja origem deu-se em momento anterior à emancipação ou ao implemento da maioridade previdenciária (21 anos de idade).
Porém, apenas para não deixar a falsa percepção de que o tema é pacífico, esclarecemos que há quem defenda a linha argumentativa contrária, de que não há exigência legal que a incapacidade surja antes da maioridade ou da emancipação, bastando ser anterior e estar presente quando do óbito (CARDOSO, Oscar Valente, 2014). Para essa corrente, se a lei não faz distinção expressa restringindo a concessão, não cabe ao intérprete fazê-lo, sob pena de ofensa ao princípio constitucional da universalidade de cobertura e atendimento da seguridade social. Logo, mostra-se irrelevante se a incapacidade surgiu antes ou depois da maioridade do beneficiário. Bastaria que a invalidez fosse anterior ao óbito para que houvesse a possibilidade de se conceder a pensão.
O tema é polêmico, e esse artigo buscou a simples tarefa de principiar o debate, o qual certamente fará a diferença na resolução dos conflitos de muitos brasileiros em situações de vulnerabilidade social.
ALENCAR, Hermes Arrais. Benefícios Previdenciários. 4. ed. São Paulo: Leud, 2009.
BRASIL. Lei Ordinária nº 8.213 / 1991. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/Leis/L8213cons.htm >. Acesso em: 01 de dez. de 2014.
CARDOSO, Oscar Valente. Dependentes dos segurados do RGPS: alterações da Lei nº 12.470/2011. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 3012, 30 set. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/20088>. Acesso em: 10 dez. 2014.
RAMALHO, Marcos de Queiroz. A pensão por morte no regime geral da previdência social. São Paulo:LTr, 2006.
Procuradora Federal lotada na Procuradoria Federal Especializada do INSS em Juazeiro/BA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PACHECO, Patrícia Wilma Correia. O dependente inválido na pensão por morte Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 dez 2014, 04:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42634/o-dependente-invalido-na-pensao-por-morte. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Maurício Sousa da Silva
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Por: DESIREE EVANGELISTA DA SILVA
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