Assim como na maioria dos países, no Brasil, o assistencialismo antecede a criação da previdência social, como consequência da transição do estado absolutista ao social, passando pelo liberal, até, com o advento da Constituição Federal de 1988, chegar à seguridade social, sistema tripartite que engloba a assistência social, a previdência social e a saúde pública.
Nos estados liberais, a proteção estatal dava-se, em especial, por meio de acanhadas medidas assistencialistas aos mais necessitados, que consistiam mais em liberalidades governamentais do que como direito subjetivo do povo.
Entretanto, com o surgimento do estado providência, as aludidas medidas passaram de meras liberalidades estatais à categoria de dever governamental, pois o Poder Público passou a comprometer-se a prestá-las a quem delas necessitasse.
Na Constituição Federal de 1988, a assistência social vem disciplinada nos artigos 203 e 204.
Exemplo de importante tentativa de incrementar as medidas assistencialistas foi a Emenda Constitucional nº 42/2003, que facultou aos estados e ao Distrito Federal vincular a programa de apoio à inclusão e promoção social até 0,5% de sua receita tributária líquida, vedada a aplicação de tais recursos no pagamento de despesas com pessoal, serviço da dívida ou outra despesa corrente não vinculada diretamente aos investimentos e ações apoiados.
Importa lembrar que as medidas assistencialistas devem ser aplicadas adequadamente pelo Estado, de acordo com os recursos públicos disponíveis e as necessidades sociais do momento, sob pena de prejuízo ao interesse público primário, em caso de acanhamento ou excesso na atuação do Poder Público, como bem adverte Frederico Amado.[1]
Com efeito, quando os benefícios e serviços assistenciais não são suficientes para fazer face às necessidades básicas dos carentes, é sinal de que se fazem imperiosas as reformas nas políticas públicas, dado que a crescente legião de desfavorecidos sem dignidade humana colocará em risco a paz social.
Por outro lado, o pagamento prolongado e excessivo de prestações assistenciais poderá levar à acomodação dos beneficiários, que, recebendo recursos sem qualquer contraprestação à sociedade, poderão não sentir necessidade de se integrar ao mercado de trabalho.
É preciso bom senso na instituição, revisão e efetivação das políticas assistenciais, para não se pecar pelo excesso ou pela negligência governamental.[2]
Frederico Amado assim conceitua a assistência social:
É possível definir a assistência social como as medidas públicas (dever estatal) ou privadas a serem prestadas a quem delas precisar, para o atendimento das necessidades humanas essenciais, de índole não contributiva direta, normalmente funcionando como um complemento ao regime de previdência social, quando este não puder ser aplicado ou se mostrar insuficiente para a consecução da dignidade humana.[3]
Para J. Franklin Alves Felipe:
Ao lado do seguro social previdenciário, o Estado presta também assistência social em certas circunstâncias (velhice, doença etc.), em caráter normalmente geral e de forma voluntária, posto que não retribui, nesses casos, contribuições recebidas.[4]
De acordo com o previsto no artigo 1º da Lei nº 8.742/93, que dispõe sobre a Organização da Assistência Social, daí ser mais conhecida como LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social:
Art. 1º A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas.
Do exposto, infere-se que, no Brasil, um dos traços característicos da assistência social é o seu caráter não contributivo, assim como sua função de suprir necessidades básicas das pessoas mais necessitadas, como alimentação, moradia básica e vestuário.
Em princípio, apenas farão jus às medidas assistencialistas as pessoas não cobertas por um regime previdenciário ou assistidas pela família, uma vez que estas já gozam de proteção. Nessa senda, há de se ressaltar que a responsabilidade pelo sustento das pessoas é, inicialmente, do círculo familiar e apenas supletivamente pelo Estado, tal como prescrevem os artigos 229 e 230 da Constituição Federal de 1988.
No que tange aos objetivos da assistência social,consoante previsão constitucional dos incisos I, II, III, IV e V, do artigo 203 da Constituição Federal de 1988:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;
II - o amparo às crianças e adolescentes carentes;
III - a promoção da integração ao mercado de trabalho;
IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária;
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
Ressalte-se que os incisos I e II do artigo 2º da Lei nº 8.742/93, inseridos pela Lei nº 12.435/11, ainda indicam como objetivos da assistência social: a vigilância socioassistencial, que visa analisar territorialmente a capacidade protetiva das famílias e, no seu seio, a ocorrência de vulnerabilidades, de ameaças, vitimizações, e danos, bem como a defesa de direitos, que visa garantir o pleno acesso aos direitos no conjunto das provisões socioassistenciais.
Quanto aos princípios informadores, conforme os incisos I, II, III, IV e V, do artigo 4º da Lei 8.742/93, eis os princípios que devem nortear a assistência social:
Art. 4º A assistência social rege-se pelos seguintes princípios:
I - supremacia do atendimento às necessidades sociais sobre as exigências de rentabilidade econômica;
II - universalização dos direitos sociais, a fim de tornar o destinatário da ação assistencial alcançável pelas demais políticas públicas;
III - respeito à dignidade do cidadão, à sua autonomia e ao seu direito a benefícios e serviços de qualidade, bem como à convivência familiar e comunitária, vedando-se qualquer comprovação vexatória de necessidade;
IV - igualdade de direitos no acesso ao atendimento, sem discriminação de qualquer natureza, garantindo-se equivalência às populações urbanas e rurais;
V - divulgação ampla dos benefícios, serviços, programas e projetos assistenciais, bem como dos recursos oferecidos pelo Poder Público e dos critérios para sua concessão.
De sua análise, constata-se que os princípios informadores da assistência social brasileira revelam seu espírito, tendo em vista que este subsistema da seguridade social intenta contemplar as necessidades básicas daqueles em situação de vulnerabilidade social, buscando reparar ou conservar sua dignidade, e não obter rentabilidade econômica, já que as prestações assistenciais independem de contribuição por parte de seus beneficiários.
Além disso, como corolário do Princípio da Universalidade da Cobertura e do Atendimento, busca o assistencialismo pátrio a inclusão social dos necessitados, por meio do alcance dos direitos socais, o que poderá ser atingido através da publicidade das medidas a serem prestadas.
Saliente-se a vedação à exposição a qualquer situação vexatória do cidadão, a fim de comprovar sua necessidade, devendo ser preservada sua dignidade, assim como coibida qualquer discriminação negativa no atendimento das populações urbanas e rurais.
Por fim, no que se fere aos tipos de medidas assistencialistas, no escólio de Marcelo Leonardo Tavares, tais prestações são divididas em benefícios (pecuniários) e serviços (não pecuniários).[5]
Os serviços assistenciais são definidos, no artigo 23 da Lei nº 8.742/93, como atividades continuadas que visem à melhoria de vida da população e cujas ações, voltadas para as necessidades básicas, observem os objetivos, princípios e diretrizes da lei.
Com o advento da Lei nº 11.258/05, por exemplo, foi prevista a criação, nos serviços de assistência social, de programas de amparo às crianças e adolescentes em situação de risco pessoal e social, e às pessoas que vivem na rua.
Dentre os benefícios pecuniários de assistência social, o principal corresponde ao pagamento de um salário mínimo à pessoa idosa ou deficiente, que não tiver como prover o próprio sustento ou tê-lo provido por sua família: o benefício da prestação continuada – BPC[6].
Referências Bibliográficas
AMADO, Frederico. Direito e Processo Previdenciário Sistematizado. 3. ed. Salvador: Jus Podivm, 2012.
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 19. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2014.
TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito Previdenciário: regime geral de previdência social e regras constitucionais dos regimes próprios de previdência social. 15. ed. rev. e atual. Niterói: Impetus. 2014.
[1] AMADO, Frederico.Direito e Processo Previdenciário Sistematizado. 3. ed. Salvador: Jus Podivm, 2012. p. 49
[2] Idem.
[3] Ibidem, p. 49 e 50
[4] FELIPE apud TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito Previdenciário: regime geral de previdência social e regras constitucionais dos regimes próprios de previdência social.15. ed. rev. atual. Niterói: Impetus. 2014. p. 16
[5] TAVARES, Marcelo Leonardo. ob. cit. p. 17
[6] Conquanto o benefício de prestação continuada seja o benefício assistencial por excelência, existem ainda na lei os benefícios eventuais, quais sejam, auxílios funeral e natalidade, que já foram benefícios previdenciários, mas agora encontram-se vinculados à assistência social.
Procuradora Federal desde 2009, atualmente em exercício na Procuradoria Federal da Paraíba. Atuou na Procuradoria Federal Especializada do IBAMA (2009-2011) do INSS (2012 - 2014), ambas em Santarém-PA .
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ANDRADE, Juliana Lopes de Sousa. Breve análise acerca da Assistência Social no Brasil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 dez 2014, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42704/breve-analise-acerca-da-assistencia-social-no-brasil. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Maurício Sousa da Silva
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