Resumo: O artigo aborda os princípios como elementos nucleares do Direito Ambiental, bem como avalia os aspectos mais relevantes dos seus princípios estruturantes.
Palavras-chave: Direito Ambiental. Princípios.
Sumário: 1) Introdução; 2) Princípios da prevenção e da precaução; 3) Princípio da responsabilização; 4) Princípio do poluidor-pagador; 5) Referências.
1. Introdução
A fruição de um meio ambiente saudável e ecologicamente equilibrado foi erigida em direito fundamental pela ordem jurídica vigente, sendo a Constituição Federal de 1988 expressa ao considerar o meio ambiente um bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida.
Nessa esteira, tem-se o Direito Ambiental como o ramo do Direito que se ocupa dos princípios e normas atinentes às questões e aos problemas ambientais e sua relação com o ser humano, tendo por finalidade a proteção do meio ambiente e a melhoria das condições de vida no planeta.
Paulo Affonso Leme Machado[1] define o Direito Ambiental como
“um Direito sistematizador, que faz a articulação da legislação, da doutrina e da jurisprudência concernentes aos elementos que integram o ambiente. Procura evitar o isolamento dos temas ambientais e sua abordagem antagônica. Não se trata mais de construir um Direito das águas, um Direito da atmosfera, um Direito do solo, um Direito florestal, um Direito da fauna ou um Direito da biodiversidade. O Direito Ambiental não ignora o que cada matéria tem de específico, mas busca interligar estes temas com a argamassa da identidade dos instrumentos jurídicos de prevenção e de reparação, de informação, de monitoramento e de participação”.
Já para Paulo de Bessa Antunes[2]:
“o Direito Ambiental pode ser definido como um direito que se desdobra em três vertentes fundamentais, que são constituídos pelo direito ao meio ambiente, direito sobre o meio ambiente e direito do meio ambiente. Tais vertentes existem, na medida em que o Direito Ambiental é um direito humano fundamental que cumpre a função de integrar os direitos à saudável qualidade de vida, ao desenvolvimento econômico e a proteção dos recursos naturais. Mais do que um Direito autônomo, o Direito Ambiental é uma concepção de aplicação da ordem jurídica que penetra, transversalmente, em todos os ramos do Direito. O Direito Ambiental, portanto, tem uma dimensão humana, uma dimensão ecológica e uma dimensão econômica que se devem harmonizar sob o conceito de desenvolvimento sustentado”.
Para que uma disciplina jurídica ganhe corpo e forma, contudo, mostra-se imprescindível a existência de um conjunto de normas e princípios específicos a informá-la, consubstanciando os alicerces sobre os quais se desenvolvem todos os demais instrumentos relacionados àquele microssistema jurídico. Trata-se aqui das proposições básicas, fundamentais, que condicionam todas as estruturas subseqüentes. Constituem os princípios, deste modo, os mandamentos nucleares de um sistema, irradiando-se sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência[3].
Nessa esteira, tem os doutrinadores se debruçado na identificação dos princípios ou mandamentos básicos que fundamentam o desenvolvimento do Direito Ambiental e que dão consistência às suas concepções. Nesta tarefa, embora não se verifique unanimidade entre os autores, tem-se identificado princípios integrantes de um núcleo essencial, que guardam estreita correlação em si e garantem certa base e caracterização àquele ramo do Direito.
2. Princípios da prevenção e da precaução
Para Édis Milaré, o princípio da prevenção é basilar no Direito Ambiental, concernindo à prioridade que deve ser dada às medidas que evitem o nascimento de atentados ao ambiente, de modo a reduzir ou eliminar as causas de ações suscetíveis de alterar a sua qualidade[4].
Prevenir significa agir antecipadamente e, em se tratando de Direito Ambiental, os objetivos são fundamentalmente preventivos. A degradação ambiental, como regra, é irreversível e irreparável, não obstante seja compensável em certos casos. Como reparar o desaparecimento de uma espécie? Ou como purificar um lençol freático contaminado por agrotóxicos?
A degradação ambiental, deste modo, deve ser evitada antes de sua concretização e não apenas combatida ou minimizada. O princípio da prevenção determina que, em vez de contabilizar os danos e tentar repará-los, deve-se evitar sua ocorrência, antes de terem efetivamente acontecido.
No princípio da prevenção, previne-se porque se sabe quais as conseqüências de se iniciar determinado ato, prosseguir com ele ou suprimi-lo. Atua-se no sentido de inibir o risco de dano potencial, ou seja, procura-se evitar que uma atividade sabidamente perigosa venha a produzir os efeitos indesejáveis. Ganha relevo, aqui, a necessidade de prever, prevenir e evitar na origem as transformações prejudiciais à saúde humana e ao meio ambiente[5].
Por sua vez, necessariamente associado ao princípio da prevenção, apresenta-se o chamado princípio da precaução, reforçando a ideia de prudência ou cautela ambiental. Tem-se, aqui, a noção de que não devem ser produzidas quaisquer intervenções ambientais antes da efetiva verificação de que as mesmas não gerarão prejuízo ao meio ambiente.
Para Cristiane Derani, o princípio da precaução “se resume na busca do afastamento, no tempo e espaço, do perigo, na busca também da proteção contra o próprio risco e na análise do potencial danos oriundos do conjunto de atividades”[6].
Com base neste princípio, sempre que houver perigo da ocorrência de um dano grave ou irreversível, a ausência de certeza científica absoluta não deverá ser utilizada como razão para se adiar a adoção de medidas eficazes, a fim de impedir a degradação ambiental[7]. Em outras palavras, não devem ser produzidas intervenções no meio ambiente antes de ter a certeza de que estas não serão para ele adversas, militando a incerteza científica, neste caso, em favor do meio ambiente.
Comparando o princípio da prevenção com o da precaução, tem-se que o primeiro atua no sentido de inibir o risco de um dano em potencial (atividades sabidamente perigosas), enquanto a precaução atua para inibir possíveis danos ao meio ambiente antes de um nexo causal ter sido estabelecido com evidência científica absoluta. Em caso de certeza dos riscos ambientais, estes devem ser prevenidos, como preconiza o princípio da prevenção. Em caso de dúvida ou de incerteza, privilegia-se a intenção de não se correr riscos, até porque a precaução é tomada mesmo sem saber se existem ou não esses riscos[8].
Destaque-se que ambos os princípios reforçam a regra de que as agressões ao ambiente, uma vez consumadas, são normalmente de reparação difícil, incerta e custosa, demandando, deste modo, remédios antecipatórios contra o dano ambiental, seja em relação à prevenção, seja em relação à precaução quanto aos riscos advindos de consequências ainda não conhecidas.
3. Princípio da responsabilização
Pelo princípio da responsabilidade, não se pode admitir que a sociedade arque com prejuízos e custos da recuperação de um ato lesivo ao meio ambiente ocasionado por um poluidor identificado, devendo, por conseguinte, haver o repasse dos custos àqueles responsáveis pelo dano.
Com efeito, por mais eficazes que se apresentem os mecanismos de precaução e prevenção, os danos ao meio ambiente, por vezes, não podem ser evitados, surgindo, assim, a discussão jurídica de suas formas repressivas. De nada adiantariam ações preventivas se eventuais responsáveis por possíveis danos não fossem compelidos a executar seus deveres ou responder por suas ações.
No Brasil, a responsabilização dos causadores de danos ambientais é matéria prevista na Constituição Federal que, em seu art. 225, § 3º, determina que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.
Por essa regra, verifica-se que é possível que um mesmo fato imputável a um ente seja, a um só tempo, sancionado penal, civil e administrativamente, ressaltando, ainda, a especial atenção destinada à reparação dos danos causados, buscando a recomposição daquilo que foi destruído, quando possível.
Na lição de Paulo de Bessa Antunes[9]:
A responsabilização por danos ao meio ambiente deve ser implementada levando-se em conta os fatores de singularidade dos bens ambientais atingidos, da impossibilidade ética de se quantificar o preço da vida e, sobretudo, que a responsabilidade ambiental deve ter um sentido pedagógico tanto para o poluidor como para a própria sociedade, de forma que todos possamos aprender a respeitar ao meio ambiente. Princípio da responsabilidade é o princípio pelo qual o poluidor deve responder por suas ações ou omissões em prejuízo do meio ambiente, de maneira a mais ampla possível, de forma que se possa repristinar a situação ambiental degradada e que a penalização aplicada tenha efeitos pedagógicos e impedindo-se que os custos recaiam sobre a sociedade.
Repise-se que a responsabilidade por dano ambiental deve funcionar como um sistema de retaguarda ou auxiliar e só ser acionada nos casos em que a lesão já ocorreu e os outros mecanismos de tutela ambiental não responderam à imputação do agente[10]. Uma vez ocorrido o dano ambiental, este é de difícil reparação, recuperação, ou mesmo indenização, funcionando o sistema de responsabilidade como uma necessária resposta da sociedade àqueles que atuam degradando o meio ambiente[11].
Esta prática efetiva da responsabilização pelo dano ambiental, portanto, mostra-se premente, buscando inserir no instituto funções operativas importantes, como a preventiva e desestimuladora de atividades danosas, a pedagógica, entre outras, além de meios eficientes de reparação do dano ambiental.
4. Princípio do poluidor-pagador
Para Édis Milaré[12], o princípio do poluidor-pagador “assenta-se na vocação redistributiva do direito ambiental e se inspira na teoria econômica de que os custos sociais externos que acompanham o processo produtivo deve ser internalizados, vale dizer, que os agentes econômicos devem levá-los em conta ao elaborar os custos de produção e consequentemente, assumi-los”.
O princípio do poluidor pagador, deste modo, apresenta o objetivo de que o agente poluidor internalize todo o custo ambiental decorrente da prática de atividades danosas ao meio ambiente, o que inclui não apenas os custos de reparação do meio ambiente, mas igualmente os custos de produção, os custos de prevenção, de reconstrução, de repressão, bem como quaisquer custos relacionados à utilização de recursos ambientais pelo particular.
Destaque-se, neste ponto, que toda atividade produtiva ou de exploração dos recursos gera impactos ambientais, devendo-se afastar o ônus econômico que recai sobre a coletividade e volta-lo para a atividade econômica que efetivamente utiliza os recursos ambientes em proveito próprio. Busca-se, deste modo, “fazer com que os agentes que originaram as externalidades assumam os custos impostos a outros agentes, produtores e / ou consumidores"[13].
Tal princípio restou consagrado na própria Declaração do RIO/92, ao declarar que as autoridades nacionais devem promover a internacionalização dos custos ambientais e o uso de instrumentos econômicos, tendo em vista a abordagem segundo a qual o poluidor deve, em princípio, arcar com o custo da poluição, com a devida atenção ao interesse público e sem provocar distorções no comércio e nos investimentos internacionais.
O princípio do poluidor-pagador, deste modo, leva em conta que os recursos ambientais são escassos e constituem direito de toda a coletividade, razão pela qual sua produção e consumo geram, por si só, reflexos à sociedade, seja em relação à degradação do meio ambiente, seja em relação à escassez dos referidos recursos. Nessa esteira, aquele que explora os seus recursos deve arcar com os custos de sua utilização e recuperar integralmente o que degradou, tendo em vista que o benefício individual decorrente da exploração dos recursos não pode ser suportado indistintamente por toda a coletividade.
Para Paulo de Bessa Antunes[14], “o elemento que diferencia o Principio do Poluidor Pagador da responsabilidade tradicional é que ele busca afastar o ônus do custo econômico das costas da coletividade e dirigi-lo diretamente ao utilizador dos recursos ambientais”.
Trata-se, portanto, de princípio basilar para o desenvolvimento econômico sustentável, ensejando não apenas a responsabilidade pela prevenção e reparação de possíveis danos ambientais, mas igualmente demandando a adoção de mecanismos de internalização do custo ambiental na cadeia produtiva, com o objetivo de conciliar o desenvolvimento econômico com um meio ambiente ecologicamente equilibrado.
5. Referências
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2002.
BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcellos (coord). Dano ambiental: prevenção, reparação e repressão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993.
DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. 2 ed. São Paulo: Max Limonad, 2001.
LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2002.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.
MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: doutrina – prática – jurisprudência – glossário. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.
RODRIGUES, Marcelo Abelha. Instituições de direito ambiental. Vol. 1 (parte geral). 1. ed. São Paulo: Max Limonad, 2002.
[1] MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, pp. 129-130.
[2] ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2002, p. 10.
[3] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, pp. 841-842.
[4] MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: doutrina – prática – jurisprudência – glossário. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 118.
[5] MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 71.
[6] DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. 2 ed. São Paulo: Max Limonad, 2001, p. 170.
[7] LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 46.
[8] Neste sentido, MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 62; e RODRIGUES, Marcelo Abelha. Instituições de direito ambiental. Vol. 1 (parte geral). 1. ed. São Paulo: Max Limonad, 2002, p. 150.
[9] ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2002, pp. 39-40.
[10] LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 67.
[11] Hoje também muito se discute, em associação, o princípio da responsabilização em uma dimensão mais econômica, através do princípio poluidor pagador, ou seja, a inserção de imputação de custos ambientais relacionada às atividades dos produtores, levando-se em conta, para tanto, a redução dos recursos naturais (LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, pp. 55-58; RODRIGUES, Marcelo Abelha. Instituições de direito ambiental. Vol. 1 (parte geral). 1. ed. São Paulo: Max Limonad, 2002, p. 137 e ss.)
[12] MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: doutrina – prática – jurisprudência – glossário. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 116.
[13] BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcellos (coord). Dano ambiental: prevenção, reparação e repressão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 227.
[14] ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2002, p. 42.
Procurador Federal. Pós-graduado na área de licitaçoes e contratos administrativos.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NETO, João Eudes Leite Soares. Breves notas acerca dos princípios estruturantes do Direito Ambiental Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 dez 2014, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42759/breves-notas-acerca-dos-principios-estruturantes-do-direito-ambiental. Acesso em: 23 dez 2024.
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