Resumo: Este trabalho objetiva analisar a publicidade dos atos administrativos e o sigilo no âmbito da Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL.
Palavra-chave: Publicidade. Transparência. Acesso à informação. Sigilo. ANATEL. Lei de Acesso à Informação.
Sumário: 1. Introdução. 2. A publicidade dos atos administrativos e o sigilo no âmbito da Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL.3. Conclusão.4. Referências Bibliográficas.
1. INTRODUÇÃO
O Estado tem o dever de assegurar a transparência das atividades administrativas. A transparência,o direito de acesso a informações e dados públicos e o direito de participar de processos decisórios são considerados como um direito fundamental do cidadão.
O princípio da publicidade foi inserido no rol de direitos fundamentais (art. 5º, XXXIII e LX) e a Administração Pública ficou vinculada a sua observância (art. 37).
Os incisos XXXIII, e XXXIV, do art. 5º, da Constituição Federal asseguram o direito de informação, de petição e de obtenção de certidão:
Art. 5º [...]
XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;
XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:
a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder;
b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal;
O inciso LX, por sua vez, consagra o princípio da publicidade como direito fundamental e confere-lhe estatura constitucional:
LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem;
No que concerne ao Princípio da Publicidade, José dos Santos Carvalho Filho afirma que este princípio indica que os atos da Administração devem merecer a mais ampla divulgação possível entre os administrados, e isso porque constitui fundamento do princípio propiciar-lhes a possibilidade de controlar a legitimidade da conduta dos agentes administrativos. Só com a transparência dessa conduta é que poderão os indivíduos aquilatar a legalidade ou não dos atos e o grau de eficiência de que se revestem[1].
Sobre o referido princípio, Marçal Justen Filho explicita o seguinte:
O princípio da publicidade significa vedação a atividades ou atos sigilosos (ressalvadas as hipóteses em que o sigilo seja indispensável, como é evidente). O exercício do poder deve ser acessível ao conhecimento de toda a comunidade e, especialmente, daqueles que serão afetos pelo ato decisório. A publicidade se afirma como instrumento de transparência e verificação de lisura dos atos praticados[2].
Nesse contexto, o direito fundamental à informação emerge como corolário do princípio democrático, em consonância com o principio da publicidade dos atos administrativos.
A norma constitucional, de forma expressa, dispõe sobre o tratamento excepcional nos casos em que o sigilo da informação seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado. No entanto, os direitos aqui mencionados só podem ser restringidos em situações específicas, com base em norma democraticamente estabelecida, considerando que, na democracia, a publicidade é a regra e o sigilo, uma exceção publicamente regulada.
Como o sigilo é exceção, não se pode dar à parte final do inciso XXXIII uma interpretação ampliativa.A regra no Estado de Direito é a publicidade ampla de documentos, certidões e processos.Desse modo, a atribuição de tratamento sigiloso depende de ato motivado da autoridade administrativa.
Se tais direitos forem negados, estará configurada a ofensa a direitos de ordem constitucional, sendo cabível a utilização de instrumentos constitucionais, como o mandado de segurança (art. 5º, LXIX, CF) e o habeas data(art. 5º, LXXII, CF), para que seja restaurada a legalidade.
Todos os entes da Administração Pública devem observar esses preceitos constitucionais.
Com vistas a garantir a efetividade dessas normas constitucionais, foi promulgada a Lei nº 12.527, de 18.11.2011, intitulada de Lei de Acesso à Informação, que passou a regular o direito à informação e o direito de acesso a registros e informações nos órgãos públicos. Ela é aplicável aos órgãos públicos integrantes da Administração Direta e Indireta (autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista) e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
O intuito principal da lei é conferir transparência ao Estado brasileiro, pois sem informação, o cidadão não pode exercer plenamente a participação política nem resguardar seus direitos.
A transparência, contudo, não pode ser absoluta. Como já dito, a própria Constituição Federal, em seu art. 5º, XXXIII, parte final, faz a ressalva para os casos em que o sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado. Por essa razão, a Lei de Acesso à Informação também trata da restrição do acesso à informação.
Seu artigo 23 lista em que casos a informação será considerada como imprescindível à segurança da sociedade ou do Estado. O dispositivo engloba as informações cuja divulgação ou acesso irrestrito possa pôr em risco a defesa e a soberania nacionais ou a integridade do território nacional, e prejudicar ou causar risco a planos ou operações estratégicos das Forças Armadas. Nessas hipóteses, as informações deverão ser classificadas como ultrassecreta, secreta ou reservada.
De acordo com a lei, os prazos máximos de restrição de acesso à informação são fixados de acordo com a classificação fornecida pela Administração, podendo variar de 5 até 50 anos (considerando a possibilidade de prorrogação prevista no art. 35, inciso III), dependendo do caso concreto.
Transcorrido o prazo de classificação ou consumado o evento que defina o seu termo final, a informação tornar-se-á, automaticamente, de acesso público. Como se nota, os casos de sigilo previstos na Lei de Acesso à Informação (pendentes de classificação em reservado, secreto e ultrassecreto) são temporários e não permanentes.
A referida lei também estabelece que é dever do Estado controlar o acesso e a divulgação de informações sigilosas produzidas por seus órgãos e entidades, assegurando a sua proteção (arts. 25 e 26). Assim, ela disciplina as medidas que devem ser tomadas para garantir a proteção e o controle das informações e documentos.
Os procedimentos e providências a serem seguidos para a classificação, tratamento, processamento e tramitação da informação e documentos foram regulamentados através do Decreto nº 7.724/2012 e do Decreto nº 7.845/2012.
Entretanto, além das hipóteses de sigilo previstas na Lei de Acesso à Informação, existem inúmeras outras hipóteses legais de sigilo, previstas em legislações esparsas, como, por exemplo, o segredo de justiça e o segredo industrial.Algumas hipóteses de sigilo são disciplinadas, ainda, em leis que estabelecem a criação, organização e funcionamento de órgãos específicos, como no caso da ABIN (Agência Brasileira de Inteligência).
Dessa forma, é necessário avaliar como se dará o sigilo documental nesses casos, em que há norma legal que restringe a publicidade, observados os preceitos constitucionais.
Portanto, este trabalho se propõe a analisar a publicidade e o sigilo documental no âmbito da Agência Nacional de telecomunicações – ANATEL.
2. A PUBLICIDADE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS E O SIGILO DOCUMENTAL NO ÂMBITO DA AGÊNCIA NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES.
A Agência Nacional de Telecomunicações - ANATEL foi criada pela Lei Geral de Telecomunicações – LGT(Lei nº 9.472/1997),com fundamento no art. 21, inciso XI, da Constituição Federal, tendo a função de organizar a exploração dos serviços de telecomunicações.
A lei criou a ANATEL como órgão regulador do sistema de telecomunicações, submetida a regime autárquico especial e vinculada ao Ministério das Comunicações, caracterizada por independência administrativa, ausência de subordinação, mandato fixo e estabilidade de seus dirigentes, bem como autonomia financeira.
No tocante à publicidade dos atos administrativos e ao sigilo documental, a Lei nº 9.472/1997 (LGT) traz expressa disposição no sentido de que a atividade da Agência será juridicamente condicionada pelos princípios de Direito Administrativo, especialmente o da publicidade (art. 38).
Contudo, há ressalva expressa quanto aos documentos e atos cuja divulgação possa violar a segurança do país, segredo protegido ou a intimidade de alguém, além de garantir o tratamento confidencial das informações técnicas, operacionais, econômico-financeiras e contábeis que solicitar às prestadoras de serviço de telecomunicações. Este é o teor do artigo 39, verbis:
Art. 39. Ressalvados os documentos e os autos cuja divulgação possa violar a segurança do País, segredo protegido ou a intimidade de alguém, todos os demais permanecerão abertos à consulta do público, sem formalidades, na Biblioteca.
Parágrafo único. A Agência deverá garantir o tratamento confidencial das informações técnicas, operacionais, econômico-financeiras e contábeis que solicitar às empresas prestadoras dos serviços de telecomunicações, nos termos do regulamento. (grifamos)
Como se observa, a LGT contém dispositivo específico que trata do acesso à informação do âmbito da ANATEL. O dispositivo veda a divulgação de documentos que possam violar a segurança do país, o segredo protegido ou a intimidade de alguém, o que está em perfeita consonância com os preceitos constitucionais.
Quanto à primeira hipótese de sigilo (informações que possam violar a segurança do país), a lei não fixa prazo para sua manutenção, diferentemente do que ocorre na Lei de Acesso à Informação.
No tocante ao tratamento das informações pessoais, deve ser respeitada a intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas.
Os assuntos cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado não devem ser divulgados. Algumas matérias tratadas pela ANATEL envolvem este tipo de sigilo. A título ilustrativo, é possível citar o inciso I do § 1º do art. 158 da LGT, que dispõe sobre a atribuição, distribuição e destinação de radiofrequências para fins exclusivamente militares.
A manutenção do sigilo deste tipo de informação é imprescindível à segurança da sociedade e do Estado. Portanto, em algumas situações, será necessária a imposição de sigilo, no âmbito do setor de telecomunicações, por interesse público fundado na segurança do Estado.
É importante examinar qual o tratamento que deve ser dado a informações sigilosas no âmbito da ANATEL, considerando, especialmente, o advento da Lei de Acesso à Informação.
A informação sigilosa, nos termos da Lei de Acesso à Informação, é aquela submetida temporariamente à restrição de acesso público em razão de sua imprescindibilidade para a segurança da sociedade e do Estado. Entretanto, no tocante a sua aplicação, especialmente em relação ao prazo de restrição de acesso, a própria Lei de Acesso à Informação trouxe algumas ressalvas, como, por exemplo, no § 1º do art. 7º e no art. 22. Vejamos o teor dos dispositivos mencionados:
Art. 7º O acesso à informação de que trata esta Lei compreende, entre outros, os direitos de obter:
(...)
§ 1º O acesso à informação previsto no caput não compreende as informações referentes a projetos de pesquisa e desenvolvimento científicos ou tecnológicos cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.
(...)
Art. 22. O disposto nesta Lei não exclui as demais hipóteses legais de sigilo e de segredo de justiça nem as hipóteses de segredo industrial decorrentes da exploração direta de atividade econômica pelo Estado ou por pessoa física ou entidade privada que tenha qualquer vínculo com o poder público.
Como se observa, a art. 22 da referida lei determina que o disposto na lei (Lei de Acesso À Informação) não exclui as demais hipóteses legais de sigilo e de segredo de justiça nem as hipóteses de segredo industrial decorrentes da exploração direta de atividade econômica pelo Estado ou por pessoa física ou entidade privada que tenha qualquer vínculo com o poder público.
Dessa forma, verifica-se que a Lei de Acesso à Informação disciplina algumas hipóteses legais de sigilo (as hipóteses previstas no inciso XXXIII do art. 5º, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal), não exaurindo por completo a matéria, já que existem outras hipóteses legais de sigilo que devem ser observadas, por exemplo, o segredo de justiça, o segredo industrial, o sigilo fiscal e o sigilo bancário.
É preciso, pois, verificar em qual fundamento ou norma deve a informação ser classificada como sigilosa. Com isso, será possível definir o tratamento a ser dado à informação no âmbito do órgão público.
Se a informação for sigilosa, deve a autoridade classifica-la como tal, por meio de um ato administrativo motivado, que indique, de forma expressa, o fundamento legal da restrição de acesso.
O tratamento da informação deverá ocorrer de acordo com o fundamento legal utilizado. Isso quer dizer queo tratamento, o processamento, e a tramitação das informações devem observar as regras constantes no instrumento legal que deu embasamento legal para a restrição do acesso.
A Lei nº 12.527/2011 e os Decretos nºs 7.724/2012 e 7.845/2012, por exemplo, estabelecem algumas providências a serem seguidas para a classificação, tratamento, processamento, tramitação das informações e documentos que devem ser enquadrados como sigilosos. Esse rito inclui, entre outras coisas, a definição de prazos, a concessão de credenciais de segurança, a reavaliação da informação classificada (reclassificação/desclassificação), medidas específicas de expedição, tramitação, comunicação, preservação, guarda e reprodução dos documentos.
Quanto ao art. 23 da Lei de Acesso à Informação, que trata daclassificação como sigilosos de matérias imprescindíveis à segurança da sociedade ou do Estado, o legislador previu uma série de atos e providências a serem adotadas, ficando a cargo dos servidores de cada órgão público cumpri-las.
Em relação às demais hipóteses legais de sigilo, não há na legislação uma conduta detalhada imposta ao administrador/servidor público. Em todo caso, o sigilo dessas informações deve ser preservado, ainda que não existam normas regulamentadoras que estabeleçam quais medidas devem ser adotadas para atender ao comando legal.
Assim, conclui-se que, em relação às demais hipóteses legais de sigilo (art. 22 da Lei nº 12527/2011), pode o órgão público disciplinar internamente quais providências deve adotar para preservação do sigilo, sendo possível, até mesmo, a adoção das medidas previstas na Lei nº Lei 12527/2011 e seus Decretos, de modo a unificar os tratamentos e facilitar a operacionalização do tratamento da informação.
Ocorre que tanto a LGT (Lei nº 9.472/1997) como a Lei nº 12.527/2011 tratam do sigilo em questões relacionadas com a segurança do país. Entretanto, a LGT não fixa prazo para a manutenção do sigilo nem estabelece a competência para sua atribuição, bem como não trata dos procedimentos e providências a serem observados para o tratamento, processamento e tramitação das informações e documentos sigilosos.
Desse modo, é necessário estabelecer qual lei será utilizada, no âmbito da ANATEL,no tocante a questões relacionadas com a segurança do país.
A solução poderá ser encontrada através da aplicação dos princípios da especialidade, razoabilidade e proporcionalidade, bem como pelo uso de técnica de ponderação.
Acerca da compatibilização das leis, a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB afirma que, não se destinando à vigência temporária, as leis são promulgadas para ter vigência até que outra as modifique ou revogue[3]. A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior. O § 2º do art. 2º da LINDB estabelece, ainda, que a lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.
No caso em análise, não há que se falar em revogação, uma vez que a Lei nº 12.527/2011 em nenhuma de suas normas revoga, quer expressamente quer tacitamente, a LGT ou as demais leis que tratam das demais hipóteses legais de sigilo. Pelo contrário, a própria LAI, em seu art. 22, estabelece que o disposto na lei não exclui as demais hipóteses legais de sigilo. Ou seja, a disposição do referido artigo mantem a aplicação das leis que regem as demais hipóteses legais de sigilo.
É evidente que a Lei de Acesso à Informação não regulou as demais hipóteses legais de sigilo. Com efeito, a própria lei prevê a manutenção das leis que regem as demais hipóteses legais de sigilo.
A LGT, ao estabelecer que é dever da Agência garantir o sigilo de documentos e autos cuja divulgação possa violar a segurança do País, em seu artigo 39, disciplina o assunto no âmbito da ANATEL.
Como o objetivo da LGT é dispor sobre a organização dos serviços de telecomunicações, bem como o funcionamento e outros aspectos institucionais da ANATEL, o artigo 39 a LGT deve ser interpretado da seguinte forma: compete a ANATEL garantir o sigilo de documentos e informações relacionadas com o Setor de Telecomunicações, cuja divulgação possa violar a segurança do País, segredo protegido ou a intimidade de alguém.
Como o controle do sigilo envolve informações e documentos relacionados com o setor de telecomunicações, a matéria deve ser regida pela LGT, e não pela Lei de Acesso à Informação.Aplica-se aqui, pois, o princípio da especialidade, garantindo-se o sigilo sem a fixação de prazo, como autorizado pelo art. 39 da LGT.
O princípio da especialidade revela que a norma especial afasta a incidência da norma geral. Lex specialis derogat legi generali. A norma se diz especial quando contiver os elementos de outra (geral) e acrescentar pormenores.
A LGT é especial porque dispõe sobre a organização dos serviços de telecomunicações e o funcionamento da ANATEL, englobando a questão da confidencialidade dos documentos e autos que possam pôr em risco a segurança do país.
A título exemplificativo, o sigilo das frequências destinadas a fins exclusivamente militares, em razão da sua imprescindibilidade à segurança da sociedade e do Estado, está garantido por meio do art. 22 da Lei de Acesso à Informação, que conserva a existência das demais hipóteses legais de sigilo e do srt. 39 da Lei nº 9.472/97. As faixas de frequências destinadas ao uso das Forças Armadas para fins exclusivamente militares devem permanecer protegidas do acesso público por tempo indeterminado.
Fábio Condeixa, em seu artigo intitulado “Comentários à Lei de Acesso à Informação” trata das ressalvas constantes da LAI da seguinte forma[4]:
Cabem considerações específicas quanto ao sigilo dos atos da ABIN e ao uso de meios e técnicas sigilosos na atividade de inteligência. A Lei Federal nº. 9.883/1999, que cria a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) e institui o Sistema Brasileiro de Inteligência (SISBIN) dispõe o seguinte:
(...)
A ABIN, por ser órgão de inteligência de Estado, goza de um estatuto diferenciado em relação aos outros órgãos e entidades da Administração e o sigilo de seus atos encontra guarida na parte final do inciso XXXIII do art. 5º, da CRFB. Não é preciso dizer que, para a ABIN, o princípio da excepcionalidade do sigilo não se aplica. Sua atividade é por natureza sigilosa. Isso não quer dizer que a ABIN esteja livre da prestação de contas ou de qualquer tipo de divulgação de informações.
(...)
A LAI dispõe que devem ser classificadas informações cuja divulgação possa comprometer atividades de inteligência, mas essa disposição tem de ser lida cum grano salis, pois o sigilo de certas informações não pode ficar sujeito aos prazos do art. 24. Nesses casos, deve-se aplicar o princípio da especialidade, garantindo-se o sigilo a despeito de classificação, como autorizado pelo art. 9º, §2º, da Lei do SISBIN. Além disso, valem aqui as considerações feitas acima no tocante aos planos estratégicos do Estado e o art. 7º, § 1º, da LAI. Tais informações, entretanto, não ficam livres de controle democrático, pois a própria Lei 9.883 prevê a criação de uma comissão mista do Congresso Nacional para fiscalizar a atividade de inteligência, com poderes para requerer todas as informações que reputar necessárias (art. 6º da Lei 9.883).
Não pretendo, contudo, afirmar nenhuma das informações em poder da ABIN seja passível de classificação: ao contrário, muitas o serão, mas somente aquelas cujo sigilo possa ser submetido aos prazos do art. 24 da LAI (5, 15 e 25 anos, este último prorrogável por igual período). Seu art. 23, VIII, prevê a possibilidade de classificação de informações cuja divulgação possa “comprometer atividades de inteligência, bem como de investigação ou fiscalização em andamento, relacionadas com a prevenção ou repressão de infrações”. Cotejando-se as disposições da LAI com as da Lei do SISBIN, conclui-se que o regramento da LAI aplica-se a investigações específicas, casos concretos, ao passo que a Lei do SISBIN parece referir-se ao funcionamento da atividade. Desse modo, uma investigação conduzida pela ABIN, no tocante aos seus meios, deverá ser sigilosa independentemente de classificação, isto é, por prazo indefinido; já as informações sobre resultado das investigações – as informações obtidas e as conclusões tiradas – devem ser classificadas nos graus reservado, secreto ou ultrassecreto, devendo ser disponibilizadas ao público após o decurso do respectivo prazo de restrição de acesso.
O mesmo raciocínio pode ser aplicado à ANATEL que é o órgão regulador das telecomunicações e que possui estatuto diferenciado em relação aos outros órgãos e entidades da Administração. O sigilo de seus atos encontra guarida na parte final do inciso XXXIII do art. 5º, da CF/88.
Vale destacar que se trata de ato peculiar e excepcionalíssimo, e que a atividade da Agência é, em regra, pautada pela transparência.
Como já explicitado anteriormente, a regra da transparência não pode ser absoluta, tanto que há uma ressalva expressa na Constituição Federal, no sentido de que o sigilo seja mantido quando for imprescindível à segurança da sociedade e do Estado. Desta forma, as informações sigilosas devem ser salvaguardadas pelo tempo necessário, a fim de evitar um prejuízo bem maior.
A técnica de ponderação é um meio de conciliação de princípios em tensão, em que cada um deles é aplicado em extensões diferentes, de acordo com sua relevância, de forma a melhor atender ao bom senso e à justiça, num dado caso concreto.
Verificado conflito entre princípios aplicáveis a uma situação concreta, deve haver a conciliação entre eles. Eles serão aplicados em extensões diferentes, de acordo com a respectiva relevância no caso. Um dos princípios prevalecerá sobre o outro, a partir de uma ponderação de interesses exigida no caso concreto. Um dos princípios é relativizado momentaneamente.
Segundo Daniel Sarmento[5], o intérprete deve verificar o peso genérico de cada princípio em conflito, observando assim, os efeitos e consequências práticas no respectivo ordenamento jurídico. Após, o intérprete deve buscar o peso específico.
No caso em exame, deve ser feita uma ponderação entre o princípio da transparência e a necessidade de se manter o sigilo em caso onde há evidente risco de violação da segurança do Estado.
A interpretação da Lei nº 12.527/2011 e da LGT, especialmente no tocante aos dispositivos constitucionais, não pode prescindir da compreensão da realidade das atividades e funções estatais, impondo-se a ponderação entre os valores envolvidos.
No âmbito do Setor de telecomunicações, em hipóteses excepcionalíssimas e plenamente justificadas, o sigilo sem fixação de prazo se impõe, diante do risco de violação à segurança do Estado e de evidente prejuízo ao interesse público. De modo excepcional, o sigilo prevalece sobre o princípio da transparência.Tal proteção decorre diretamente da Constituição Federal de 1988 e da LGT.
Deste modo, com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, e numa interpretação conforme a Constituição, quanto ao sigilo das informações, no âmbito do setor de telecomunicações, imprescindíveis à segurança do Estado, o sigilo documental deve ser regido pela LGT e não pela Lei de Acesso à Informação.
3. CONCLUSÃO.
A LGT contém dispositivo específico que trata do acesso à informação do âmbito da ANATEL (art. 39). O dispositivo veda a divulgação de documentos que possam violar a segurança do país, o segredo protegido ou a intimidade de alguém, o que está em perfeita consonância com os preceitos constitucionais.
Quanto à primeira hipótese de sigilo (informações que possam violar a segurança do país), a lei não fixa prazo para sua manutenção, diferentemente do que ocorre na Lei de Acesso à Informação.
Em relação ao segredo protegido, a ANATEL deve observar as demais hipóteses legais de sigilo.
No tocante ao tratamento das informações pessoais, deve ser respeitada a intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas.
Quanto ao sigilo das informações imprescindíveis à segurança do Estado no âmbito do Setor de Telecomunicações, o controle do sigilo deve ser regido pela LGT, tendo em vista que aANATEL é o órgão regulador das telecomunicações. Esta restrição de acessos encontra guarida na parte final do inciso XXXIII do art. 5º, da CF/88.
A interpretação da lei, especialmente no tocante aos dispositivos constitucionais, não pode prescindir da compreensão da realidade das atividades e funções estatais, impondo-se a ponderação entre os valores envolvidos.
No âmbito do Setor de telecomunicações, em situações excepcionalíssimas e plenamente justificadas, o sigilo sem fixação de prazo se impõe, diante do risco de violação à segurança do Estado e de evidente prejuízo ao interesse público. De modo excepcional, o sigilo prevalece sobre o princípio da transparência.
Deste modo, com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, e numa interpretação conforme a Constituição, quanto ao sigilo das informaçõesimprescindíveis à segurança do Estado no âmbito do setor de telecomunicações, o sigilo deve ser regido pela LGT e não pela Lei de Acesso à Informação.
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 27ª ed. São Paulo: Ed. Atlas S.A., 2014.
CONDEIXA, Fábio. Comentários à Lei de Acesso à Informação. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3199, 4 abr. 2012. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/21436>. Acesso em: 18.dez.2014.
JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
SARMENTO, Daniel. A ponderação de Interesses na Constituição Federal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002.
[1]CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 27ª ed. São Paulo: Ed. Atlas S.A., 2014, p. 26.
[2] JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 246.
[3] Art.2º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.
[4]CONDEIXA, Fábio. Comentários à Lei de Acesso à Informação. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3199, 4 abr. 2012. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/21436>. Acesso em: 19dez. 2014.
[5]SARMENTO, Daniel. A ponderação de Interesses na Constituição Federal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p 103-104.
Procuradora Federal em Brasília-DF.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TEIXEIRA, Danielle Felix. A publicidade dos atos administrativos e o sigilo documental no âmbito da Agência Nacional de Telecomunicações - ANATEL Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 dez 2014, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42779/a-publicidade-dos-atos-administrativos-e-o-sigilo-documental-no-ambito-da-agencia-nacional-de-telecomunicacoes-anatel. Acesso em: 23 dez 2024.
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