1. INTRODUÇÃO
É comum o pedido do exequente de fixação de honorários advocatícios de execução, invocando entendimento do Supremo Tribunal Federal, de que são cabíveis honorários advocatícios em sede de execução quando o pagamento é feito por meio de Requisição de Pequeno Valor - RPV.
No entanto, como se verá, controvérsia surge quando a execução é promovida mediante mera concordância com os cálculos apresentados pelo devedor, uma vez que neste caso não se pode dizer que o executado deu causa ao processo executivo.
2. EXECUÇÃO DEFLAGRADA POR CÁLCULO CONFECCIONADO PELO DEVEDOR. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM SEDE DE EXECUÇÃO.
Em sede de execução de sentença contra a Fazenda Pública, é questão pacífica que a fixação de honorários advocatícios somente é devida em caso de oposição de embargos à execução ou em caso de quantia a ser satisfeita mediante requisição de pequeno valor, por força da Lei nº 9.494/97 e sua combinação com o artigo 100 da Constituição Federal.
Isso porque o Pleno do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 420.816, Relator para o acórdão o Ministro Sepúlveda Pertence, DJ de 10.12.06, declarou a constitucionalidade do artigo 1º-D da Lei 9.494/97, na redação dada pela MP 2.180-35/01, que dispensa o pagamento de honorários advocatícios nas execuções não embargadas contra a Fazenda Pública, excepcionando, todavia, a hipótese de pagamento de obrigações definidas em lei como de pequeno valor. Eis a ementa da decisão:
“I. Recurso extraordinário: alínea "b": devolução de toda a questão de constitucionalidade da lei, sem limitação aos pontos aventados na decisão recorrida. Precedente (RE 298.694, Pl. 6.8.2003, Pertence, DJ 23.04.2004). II. Controle incidente de inconstitucionalidade e o papel do Supremo Tribunal Federal. Ainda que não seja essencial à solução do caso concreto, não pode o Tribunal - dado o seu papel de ‘guarda da Constituição’ - se furtar a enfrentar o problema de constitucionalidade suscitado incidentemente (v.g. SE 5.206-AgR; MS 20.505). III. Medida provisória: requisitos de relevância e urgência: questão relativa à execução mediante precatório, disciplinada pelo artigo 100 e parágrafos da Constituição: caracterização de situação relevante de urgência legislativa. IV. Fazenda Pública: execução não embargada: honorários de advogado: constitucionalidade declarada pelo Supremo Tribunal, com interpretação conforme ao art. 1º-D da L. 9.494/97, na redação que lhe foi dada pela MPr 2.180-35/2001, de modo a reduzir-lhe a aplicação à hipótese de execução por quantia certa contra a Fazenda Pública (C. Pr. Civil, art. 730), excluídos os casos de pagamento de obrigações definidos em lei como de pequeno valor (CF/88, art. 100, § 3º)” Sem grifos no original.
No mesmo sentido, os seguintes acórdãos:
“EMENTA Agravo regimental no recurso extraordinário. Processual. Fazenda Pública. Execução não embargada. Artigo 1º-D da Lei nº 9.494/97 (MP nº 2.180-35/2001). Constitucionalidade. Ação coletiva. Matéria infraconstitucional. Precedentes. 1. No julgamento do RE nº 420.816, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade da MP nº 2.180-35/01, dando interpretação conforme ao art. 1º-D da Lei nº 9.494/97, reduzindo sua aplicação às hipóteses de execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, excluídos os casos de pagamento de obrigações definidas em lei como de pequeno valor. 2. O Plenário desta Corte, em sessão realizada por meio eletrônico, no exame do RE nº 599.903/RS, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, concluiu pela ausência da repercussão geral da questão relativa à fixação de honorários advocatícios nas execuções de ações coletivas, uma vez que essa discussão está adstrita ao plano infraconstitucional. 3. Agravo regimental não provido.” (RE 584.047-AgR, Primeira Turma, Relator o Ministro Dias Toffoli, DJ de 28.05.12)
“EMENTA: CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. ART. 1º-D DA LEI 9.494/97. CONSTITUCIONALIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. EXECUÇÕES NÃO EMBARGADAS PELA FAZENDA PÚBLICA. AÇÕES COLETIVAS. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. NÃO INCIDÊNCIA DA SÚMULA 283 DO STF. CONTROVÉRSIA INFRACONSTITUCIONAL. I - As ora agravantes teriam de suscitar, em embargos de declaração opostos do acórdão objeto do recurso extraordinário, a questão do cabimento de honorários advocatícios em execução de sentença proveniente de ações coletivas. Ausente, portanto, o indispensável prequestionamento. II - O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 420.816/PR, conheceu do recurso e declarou a constitucionalidade da Medida Provisória 2.180-35/2001, com interpretação conforme, de modo a reduzir-lhe a aplicação à hipótese de execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, excluídos os casos de pagamento de obrigação definidos em lei como de pequeno valor. III - A questão de mérito foi decidida conforme o recurso extraordinário interposto pela União, ora agravada, não podendo a matéria ser inovada em agravo regimental. IV - A Súmula 283 do STF refere-se aos fundamentos do acórdão recorrido e, dessa forma, não se aplica à decisão proferida pelo STJ que não foi objeto de recurso extraordinário. V - O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 599.903-RG/RS, assentou ser infraconstitucional a questão referente ao cabimento da cobrança de honorários advocatícios nas execuções contra a Fazenda Pública decorrentes de ações coletivas. VI - Agravo improvido.” (RE 468.138-AgR, Primeira Turma, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJ de 23.04.10)
“EMENTA: EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. SENTENÇA ORIUNDA DE AÇÃO COLETIVA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. São indevidos honorários advocatícios quando a execução não tiver sido embargada. Exceção quanto às obrigações de pequeno valor. Nos termos da jurisprudência da Corte, essa orientação também se aplica aos títulos executivos emanados de ações coletivas. A demonstração de existência de repercussão geral passou a ser exigida, nos termos da jurisprudência desta Corte, nos recursos extraordinários interpostos de acórdãos publicados a partir de 3 de maio de 2007, data da entrada em vigor da Emenda Regimental 21/07 ao RISTF (cf. QO AI 664567). Inaplicabilidade ao caso, uma vez que a intimação do acórdão recorrido se deu antes do marco inicial fixado pela Corte. Agravo regimental a que se nega provimento.” (RE 435.757-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Joaquim Barbosa, DJ de 05.02.10)
Contudo, tratando-se de execução em que a conta de liquidação foi apresentada pelo devedor, tal entendimento tem de ser mitigado.
Isso porque, se é o devedor quem toma a iniciativa da liquidação, reconhecendo os valores devidos, não se pode afirmar que ele deu causa ao processo de execução e, portanto, não pode sofrer o ônus da sucumbência.
É importante deixar claro que, segundo o Código de Processo Civil, o ônus de apresentar os cálculos é da parte autora:
Art. 614. Cumpre ao credor, ao requerer a execução, pedir a citação do devedor e instruir a petição inicial:
(...);
II - com o demonstrativo do débito atualizado até a data da propositura da ação, quando se tratar de execução por quantia certa; (Redação dada pela Lei nº 8.953, de 13.12.1994)
Veja-se, portanto, que o procedimento adotado muitas vezes pela administração pública de apresentar os cálculos de liquidação, para concordância ou não da parte autora, é uma faculdade do executado, objetivando agilizar o procedimento de execução, prezando pela rápida expedição dos precatórios e RPVs e liquidação dos débitos, inclusive evitando que a discussão seja prolongada em sede de Embargos.
Assim, descabida a condenação do ente público ao pagamento de honorários na execução em tais casos, pois a Administração Pública adotou todas as medidas que estavam a seu alcance para facilitar a execução, alcançando ao credor o seu direito no menor espaço de tempo possível, não podendo ser penalizada com o pagamento de valor maior, pela simples observância de um procedimento legal (expedição de RPV).
Sob esse aspecto, válido frisar que, conforme já sedimentado, o que deve ser observado para a definição do cabimento de honorários advocatícios é o princípio da causalidade, ou seja, deverá arcar com as verbas de advogado quem deu causa à lide, conceito intimamente relacionado à “evitabilidade do litígio”.
Nos casos em que a Administração Pública apresenta os cálculos e adota todas as medidas necessárias para liquidar seu débito, sua conduta se equivale a um pagamento voluntário, não sendo possível, consequentemente, se dizer que deu causa ao processo de execução.
Não é por outro motivo que a jurisprudência do TRF da 4ª Região é firme no sentido de que, em tal hipótese, caso não sejam opostos embargos à execução, não são devidos honorários:
PREVIDENCIÁRIO. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. INICIATIVA DO DEVEDOR. CONCORDÂNCIA DO CREDOR. NÃO CABIMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. Segundo o entendimento sufragado pelo STF: a) são devidos honorários advocatícios nas execuções propostas contra a Fazenda Pública, de qualquer valor, iniciadas antes da edição da MP n. 2.180-35/2001, mesmo quando não opostos embargos; b) são devidos honorários nas execuções contra a Fazenda Pública, ainda que não embargadas e iniciadas após a edição da MP n. 2.180-35/2001, nos casos em que o pagamento deva ser feito via requisição de pequeno valor (débitos inferiores a sessenta salários mínimos); c) não são devidos honorários nas execuções propostas contra a Fazenda Pública, quando não embargadas e iniciadas posteriormente à edição da MP n. 2.180-35/2001, nos casos em que o pagamento deva ser feito via precatório (débitos superiores a sessenta salários mínimos).
2. Todavia, não são devidos honorários advocatícios na execução quando é o devedor quem toma a iniciativa de liquidar, havendo mera concordância do credor com os cálculos apresentados. Precedentes da Corte.
(TRF4, AC 2005.71.04.006024-1, Quinta Turma, Relator João Batista Lazzari, D.E. 29/06/2009.)
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NA EXECUÇÃO. INICIATIVA DO DEVEDOR. MERA CONCORDÂNCIA DO CREDOR. Não são devidos honorários advocatícios na execução quando quem toma a iniciativa de liquidar é o próprio devedor, restringindo-se a atividade do credor à mera concordância com a memória de cálculo apresentada. (TRF4, AG 2008.04.00.014895-6, Quinta Turma, Relator Rômulo Pizzolatti, D.E. 17/11/2008)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. ARQUIVAMENTO COM BAIXA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. VALOR INFERIOR A SESSENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. PAGAMENTO ESPONTÂNEO. 1. No caso em exame, o próprio Juiz, ao apreciar os embargos e o agravo retido, afirmou a desnecessidade de sentença, dizendo que o caso seria de mera baixa uma vez que em rigor sequer processo de execução haveria. Diante de tal quadro, deve ser conhecido o agravo, pelas peculiaridades do caso em apreço. 2. Na hipótese a incidência de honorários não se justifica, ainda que o valor do débito seja inferior a sessenta salários mínimos, uma vez que o próprio devedor compareceu aos autos para informar que estava providenciando a revisão da renda mensal do benefício do segurado, nos termos do título judicial. 3. Se o devedor espontaneamente comparece nos autos para reconhecer seu débito, não há razão para que incidam honorários de execução, os quais pressupõe omissão de sua parte e, mais do que isso, necessidade de propositura de execução por parte do credor. (TRF4, AG 2006.04.00.033242-4, Turma Suplementar, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 14/03/2007)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE SENTENÇA "POR INICIATIVA DO OBRIGADO" (ART. 570/CPC). HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. - Não há falar em fixação de honorários advocatícios no processo de execução, quando in casu sequer existiu, pois a obrigação constante do título judicial foi espontaneamente cumprida pelo devedor, em que pese o pedido de citação da parte credora. Não houve, pois, resistência de sua parte, fato este que seria o gerador da incidência do princípio da causalidade, segundo o qual deve responder pelos ônus processuais aquele que der causa ao ajuizamento da demanda. (TRF4, AG 2003.04.01.035386-1, Quinta Turma, Relator Celso Kipper, DJ 23/06/2004)
Tal entendimento é irretocável, pois os honorários advocatícios fixados na execução visam remunerar o trabalho do advogado nessa fase processual. Afastada a necessidade de este profissional adotar medidas para a satisfação do crédito de seu cliente, não há motivo para agraciá-lo com novos honorários,
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme visto, nas hipóteses de execução promovida mediante mera concordância com os cálculos apresentados pelo devedor, não deve haver a imposição de honorários advocatícios.
Isso porque, em tais casos, não há a instauração de verdadeira execução por iniciativa do credor, o que afasta a causalidade para a fixação da verba honorária.
Com efeito, havendo cumprimento espontâneo da obrigação pelo devedor, inexiste propriamente um processo de execução, não havendo justificativa para a condenação da Fazenda Pública ao pagamento de tal verba.
Procuradora Federal desde novembro 2007. Chefe de Divisão de Gerenciamento da Dívida Ativa da Coordenação-Geral de Cobrança e Recuperação de Créditos da Procuradoria-Geral Federal de 2009 a 2010. Ex-Procuradora do Estado do Rio Grande do Sul. Especialista em Direto Público.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RIZZI, Ângela Onzi. (Im)possibilidade de fixação de honorários na execução promovida mediante mera concordância com os cálculos apresentados pelo devedor Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 dez 2014, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42780/im-possibilidade-de-fixacao-de-honorarios-na-execucao-promovida-mediante-mera-concordancia-com-os-calculos-apresentados-pelo-devedor. Acesso em: 23 dez 2024.
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