1.INTRODUÇÃO
A recente produção de shale gas realizada nos Estados Unidos tornou o país autosuficiente em energia desde 2010 e vem sendo chamada de “revolucão do shale”. Nos Estados Unidos, líderes na produção, a extração do xisto já responde por 12% da necessidade de gás do país, que já se prepara para exportar o produto[1].
O gás não convencional não pode ser extraído através das tecnologias convencionais. Por isso, a extração é mais complexa e menos atrativa economicamente, conceito que varia no tempo e de reservatório para reservatório.
Atualmente, o termo gás não convencional se refere principalmente ao gás de xisto (gas-containing shales ou shale gas). Mas, essencialmente, existem diversas categorias de gás não convencional: alocado em reservatórios a grande profundidade (deep gas) ou em águas profundas (deep water); em formações pouco permeáveis (tight gas); gás de carvão ou CBM (coal bed methane); gás de zonas geopressurizadas (geopressurized zones) e hidratos submarinos e árticos[2] .
Novas tecnologias tornaram o desenvolvimento de reservas não convencionais uma atividade economicamente viável. Com o sucesso do desenvolvimento da exploração e produção do gás não convencional nos Estados Unidos, o mundo inteiro tem se voltado para esta nova fonte de energia, inclusive o Brasil, que, apesar de se apresentar num estágio pouco evoluído no que diz respeito à infraestrutura de transporte de gás, possui, segundo estatísticas, 245 trilhões de pés cúbicos de reservas tecnicamente recuperáveis de Shale Gas[3].
A extensão de cada dificuldade pode variar em cada país, mas o desafio que emerge da extração do gás vem sendo enfrentado em vários lugares e causado efetivo engajamento internacional.
Os governos da América Latina estão dispostos a avaliar e explorar os seus recursos, enquantoos governos na Europa são bem mais hesitantes. Na Região da Ásia, China, Índia e Indonésia são vistas como áreas com grande quantidade de gás de xisto. As Filipinas, Tailândia, Vietnã e Mongólia podem ter reservas comercialmente viáveis, assim como alguns outros países do sul e leste da Ásia. Em toda a Ásia Oriental, a demanda de energia e o desejo de restringir o uso de carvão está impulsionando a procura de gás não convencional. China, Indonésia e Vietnã estão em estágios de avaliação dos seus recursos de gás de xisto e CBM e têm metas ambiciosas para a produção futura. Se forem alcançados estes objetivos, a implicações para os mercados de gás e energia regionais e globais serão profundas[4].
Este artigo, por sua vez, basicamente, identifica, alguns pontos importantes da experiência americana e posteriormente discute as dificuldades enfrentadas no Brasil até o momento.
2. A EXPLORAÇÃO DO SHALE GAS NOS ESTADOS UNIDOS
A cresecente importância do gás natural possui duas raízes. Primeiro, é mais limpo que os dois outros combustíveis fósseis, carvão e petróleo, e pode ser visto como um combustível a caminho de um futuro energético menos poluente. Segundo, a combinação de altos preços de energia e avanços tecnologicos levou à descoberta de novas reservas de gás, onshore e offshore, aumentando em até 35% a quantidade de reservas provadas entre 2000 e 2012[5].
Nos últimos anos, várias publicações tentaram identificar a razão do sucesso do desenvolvimento do gás natural nos Estados Unidos. Com base nesses estudos podem-se definir cinco principais categorias de atributos relacionados à política e regulacão do shale gas nos EUA[6]:
1) Geologia, geografia e informação (dados): nos Estados Unidos, a geologia de muitas bacias é favorável ao shale gas. Mais de 100 anos de experiência na exploração e produção de óleo e gás resultaram numa enorme quantidade de dados geológicos que são livremente acessíveis. Ademais, a topografia nas principais bacias produtoras é favorável a programas intensivos de perfuração e há abundância de água em algumas bacias.
2) Acesso à terra e às reservas de gás: os Estados Unidos são o único país em que o proprietário da terra tem direitos sobre os recursos minerais do subsolo. A propriedade privada dos recursos naturais permite que as empresas interessadas negociem diretamente com os particulares o acesso à terra e às reservas, o que tende a reduzir drasticamente os custos de transação e economizar tempo comparado à necessidade de obtenção de uma licença ou concessão do governo. Ademais, com a propriedade das reservas, as empresas conseguem receber o apoio da sociedade. Como resultado, existe um aval social para operação, especialmente em áreas com longo histórico de exploração de óleo e gás. Conforme estudo realizado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) em 2014, da crescente exploração do shale gas nos Estados Unidos, resultou um deslocamento da produção de gás dentro do território americano. Antes concentrada no Oeste, onde há grande proporção de terras federais, essa produção vem migrando para o Leste e o Sul, onde predominam as terras privadas.
3) Perfuracão rápida: a fim de explorar, desenvolver e produzir uma grande quantidade de shale gas, é necessario perfurar milharesde poços. Na Pensilvânia, 5000 poços foram necessários para produzir uma quantidade de 30 bcm por ano. Essa perfuração rápida requer a existência de alta tecnologia e mão de obra qualificada, capital intensivo e cadeia de suprimentos eficiente. Nos EUA essa disponibilidade se deu através de uma indústria de óleo e gás aberta e competitiva.
4) Incentivos econômicos e outras formas de apoio governamental. A combinação de escassez de gás e preços altos no fim da década de 70 levou o governo americano a introduzir um incentivo ao gás por meio de créditos fiscais. Ao mesmo tempo, o governo lançou um programa de pesquisa de longo prazo para desenvolvimento de tecnologias de exploração de óleo e gás não convencionais, diretamente apoiado pelo Departamento de Energia de Estado. Mais recentemente, o alto preço do gás convencional entre 2004 e 2008 foi o principal motim para a producao do shale gas nos EUA. Posteriormente deu-se uma queda no preço do gás convencional, mas a indústria petroquímica garanta um mercado para o LNG, que é produzido junto com o shale em algumas bacias.
5) Mercado e ambiente regulatório. O Mercado de gás nos EUA tem longa data e é bastante desenvolvido. A rede de gasodutos é extensa e interligada e o acesso a terceiros é obrigatório. A regulação referente à fraturação hidráulica sempre foi relativamente permissiva, especialmente nos Estados em que o shale gas é abundante. Nos Estados Unidos cada Estado legisla sobre questões ambientais e águas. Todos esses fatores contribuíram para os baixos custos das transações e fácil acesso ao mercado.
Poucos países, no entanto, se de fato houver algum, tem o ambiente tão favorável à extração de gás não convencional. Na Europa, ao contrário, existe uma grande resistência pública baseada, sobretudo, em razões de saúde e meio ambiente.
3. AS QUESTÕES DE SAÚDE E MEIO AMBIENTE
Para retirar o gás de xisto, é preciso realizar perfurações profundas e injetar água e produtos químicos que provocam a saída do produto à superfície, quando pode ser recuperado. Porém, há risco de vazamento da água poluída para os lençóis freáticos, de onde vem a água potável e, devido à alta pressão, também há risco de que os produtos cheguem à superfície.
Uma década após o avanço da exploração do shale gas nos EUA, a pressão para reduzir os impactos sociais e ambientais vem crescendo e está longe do fim. Diversas organizações não governamentais vêm questionando os índices de poluição do ar e da água, divulgados por empresas e pelo próprio governo. Na lista de reivindicações, estão ainda pedidos para a criação de padrões mais restritivos para a exploração e a divulgação dos produtos químicos misturados à água e usados na perfuração dos poços no processo chamado de fraturamento hidráulico.
De fato, os baixos custos e a regulação amena contribuíram para o rápido crescimento da produção de shale gas nos Estados Unidos, mas, ao longo do tempo, surgiu a preocupação com os riscos gerados à saúde e ao meio ambiente. Apesar de o gás natural ser considerado mais limpo que o carvão, há preocupacões com o vazamente de metano e outros fluidos na água, bem como dispersão na atmosfera. Há, ainda, preocupações relativas à possibilidade de terremotos induzidos, assim como a disposição da água toxicamente contaminada, que pode conter altos níveis de minerais radioativos, rádio e urânio. A intensa ocorrência de fraturação hidráulica faz com que as águas sejam desviadas do uso da população. Ademais, muitas indústrias de óleo e gás se recusam a tornar públicos os produtos químicos usados no fraturamento[7].
O fraturamento hidráulico foi objeto de regulacão pela Agência de Proteção do Meio Ambiente ( US Environmental Protection Agency), através do “Safe Drinking Water Act” e outros estudos e planejamentos[8]. Apesar da baixa quantidade de fluido de fraturamento lançado no poço, esse fluido chega a conter 750 produtos químicos e outros componentes. Alguns deles são inofensivos, como sal e ácido cítrico, mas outros são extremamente tóxicos, incluindo os BTEX compounds[9], que são considerados contaminantes, segundo “Safe Drinking Water Act” e poluentes para a atmosfera, segundo o 1990 U.S Clean Air Act. 14[10] .
Nos Estados Unidos, legisladores, tanto em nível estadual quanto federal estão empenhados na melhora da regulação do fraturamento hidráulico. Os Estados tem trabalhado para alcancar um equilíbrio entre os beneficios econômicos gerados pelo desenvolvimento do shale gas e os potenciais riscos para saúde e meio ambientes locais. Dentre as sessões legislativas de 2011 e 2012, 29 Estados introduziram 170 projetos e 14 deles aprovaram leis referentes ao óleo e gás não convencional, com assuntos variando desde os processos de fraturamento hidráulico até o dever de publicidade (disclosure) dos produtos químicos usados no fracturing. Dezesseis Estados estabeleram a obrigação de publicidade ate o fim de 2012[11]. O Governo Federal também está incentivando a colaboração entre as agências para melhor coordenar as pesquisas governamentais no assunto.
O estudo dos impactos da exploração do shale gas também tem sido objeto de preocupação na União Européia, que emitiu, em fevereiro de 2014, a Recomendação 2014/70/EU, estabelecendo os princípios mínimos para a exploração e a produção de hidrocarbonetos mediante fraturação hidráulica pelos Estados-Membros, que devem observar a necessidade de preservar e proteger o meio ambiente, a saúde da população e a informação aos cidadãos[12].
Uma "recomendação", no entanto, não é vinculante. Quando a Comissão Europeia publica uma recomendação, permite às instituições conhecer os seus pontos de vista e sugere uma linha de conduta sem, todavia, impor uma obrigação legal aos seus destinatários[13]. Apesar de as recomendações da União Européia não serem aplicadas no Brasil, a Recomendação 2014/70/EU pode ser tomada como paradigma, uma vez que os países europeus são bastante cautelosos em relação à utilização do frauturamento hidráulico.
4. A EXPLORAÇÃO E PRODUÇÃO DO SHALE GAS NO BRASIL
4.1. A 12ª Rodada
A 12ª rodada de licitação de gás natural foi promovida pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) no final de novembro de 2013. Das 72 áreas para exploração de gás natural arrematadas, 54 apresentam alto potencial para a produção do chamado gás não convencional, também conhecido como gás de xisto ou, no termo em inglês, shale gas[14].
No Brasil, a exploração do gás de xisto sofre oposição de entidades dos setores sindical, socioambiental e sanitário. Algumas organizacões se opuseram à realização do leilão, já que não havia ainda regulação sobre o assunto. O Ministério Público Federal de Cascavel/PR ajuizou ação civil pública, distribuída na 1ª Vara Federal de Cascavel/PR[15], objetivando a suspensão dos efeitos decorrentes da 12ª rodada, que ofereceu a exploração de gás de folhelho na modalidade fracking (fraturamento hidráulico), na bacia do rio Paraná. A ação se deu com base em potenciais riscos ao meio ambiente, à saúde humana e à atividade econômica regional, além dos vícios que nulificam o procedimento licitatório. Por força de liminar judicial proferida nos autos da Ação Civil Pública, estão suspensos os efeitos dos contratos de concessão assinados no setor SPAR-CS no dia 15/05/2014 e está suspensa a assinatura dos demais contratos de concessão dos blocos localizados no setor SPAR-CS.
No Brasil, apesar das questões ambientais envolvidas, os órgãos ambientais competentes, o Ministerio do Meio Ambiente, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) e o IBAMA, ainda não disciplinaram oficialmente a questão. A fim de regular a exploração do gás de xisto, a ANP, responsável pela 12ª Rodada de Licitação, na qual se previu a possibilidade de exploração de áreas com disponibilidade de gás natural pelo método não convencional, promoveu consulta e audiência pública, que resultaram na Resolução n. 21/2014, publicada no Diário Oficial da Uniao de 11 de abril de 2014. A Resolução tem por objetivo definir os requisitos a serem cumpridos pelos detentores dos direitos de exploração e produção de Petróleo e Gás Natural, que se utilizarão da técnica do fraturamento hidráulico em reservatório não convencional.
No entanto, o Ministério Público Federal argumentou que existem empreendimentos de tamanha dimensão que exigem análise prévia do impacto ambiental para que a futura licitação não venha a ser tida como ambientalmente inexequível ou cause danos ambientais de difícil reparação. Trata-se de um controle prévio da viabilidade ambiental do que será licitado[16].
Esse estudo de viabilidade prévio à licitação deveria ser realizado pelo ente público licitante, ou sob a sua coordenação, e encontra origem ontológica no próprio dever de licitar, previsto no art. 37, XXI, da Constituição[17]. Nesse sentido, é necessário que haja estudo prévio de viabilidade ambiental, para que também o Poder Público fixe previamente medidas de segurança ambiental e os arrematadores avaliem o real custo do cumprimento do que lhes será exigido. Do contrário, empreendedor desconhecerá as futuras imposições ambientais, já que não estavam previstas no edital de licitação. É o que ocorreu com a tardia Resolução n. 21/2014, editada pela ANP, que, posteriormente à arrematação dos blocos de exploração, estabeleceu, por exemplo, a necessidade de publicar os produtos químicos utilizados no processo (art. 6º, inc. II)[18].
Apesar de a Resolução da ANP ter sido publicada apenas após a licitação, o que de fato traz um grave risco à segurança jurídica e à validade do procedimento, a Resolução n°21/2014 traz, ainda que tardiamente, as diretrizes para o fraturamento hidráulico no Brasil[19]. Conforme a Resolução, o “operador” deverá garantir a proteção dos corpos hídricos e solos da região (art. 4º). A aprovação ficará condicionada à apresentação, com antecedência mínima de 60 dias, de licença ambiental com autorização específica (art. 8º, inciso I), estudos e avaliações de ocorrência naturais e induzidas sísmicas (inciso VI) e declaração de responsável técnico de que os riscos de afetação a qualquer corpo hídrico subterrâneo é reduzido ou tolerável (inciso V), bem como ao fato de que o alcance máximo das fraturas projetadas permaneça a uma distância segura dos corpos hídricos e não seja realizada a uma distância inferior de 200 metros de poços de água utilizados para fins de abastecimento doméstico, público ou industrial, irrigação, dessedentação de animais, entre outros humanos (art. 7º, caput, e §1º).
Ainda segundo a Resolução ANP n° 21, o início da perfuração precisa ser autorizado pela ANP, bem como, em havendo necessidade de alteração do projeto, as modificações devem ser submetidas à aprovação da ANP (art. 9º, §1º). Se já iniciada a perfuração, as alterações devem ser informadas imediatamente (art 9°§2º). Além disso, deverá ser feita simulação das operações de fraturamento, com utilização das melhores práticas de engenharia (art. 12), sendo que o operador somente poderá dar continuidade ao projeto caso seja insignificante a possibilidade de que as fraturas geradas ou que a reativação de eventuais falhas preexistentes se estenda até intervalos não permitidos, tais como Corpos Hídricos Subterrâneos e poços adjacentes (paragrafo unico).
Aprovado o projeto, que deverá garantir a integralidade de todo o ciclo de vida do poço, inclusive após o seu abandono (art. 10), deverão ser realizados testes, previamente à execução da operação de fraturamento hidráulico. Ademais, é de responsabilidade do operador garantir que a força de trabalho tenha treinamento adequado para o desempenho das funções, cientificando-os dos riscos identificados no projeto (art. 24). Em caso de acidentes, que devem ser comunicados imediatamente à ANP (art. 25, §3º), o operador deverá elaborar e garantir o cumprimento do Plano de Emergência, que conterá os procedimentos, treinamentos, recursos e estruturas necessárias para eliminar ou minimizar os cenários (art. 25, caput, e §1º).
Por fim, a validade da aprovação dada para a realização do Fraturamento Hidráulico ficará condicionada à manutenção da validade de todas as licenças ambientais necessárias (art. 28). Determina-se também que o Sistema de Gestão Ambiental deverá conter um plano detalhado de controle, tratamento e disposição de efluentes gerados provenientes das atividades de perfuração e fraturamento hidráulico em reservatório não convencional.
Ademais, a água utilizada para o fraturamento hidráulico deverá ser, preferencialmente, efluente gerado, água imprópria ou de baixa aceitação para o consumo humano ou dessedentação animal, ou água resultante de efluentes industriais ou domésticos, desde que o tratamento a habilite ao uso pretendido (artigo 3º, parágrafo único).
Há ainda a obrigação de o operador publicar em seu sítio eletrônico a relação de produtos químicos, com potencial impacto à saúde humana e ao ambiente utilizado no processo, transportados e armazenados, contemplando suas quantidades e composições (artigo 6º, II).
Algumas questões ainda não foram claramente delineadas no Brasil, como a necessidade de lei, e não apenas de resoluções, para regulamentarem a atividade e o fato de a legislação existente ter sido feita apenas pela Agência Nacional do Petróleoe posteriormente ao procedimento licitatório. Ainda se faz urgente definir questões importantes, como o órgão competente para o licenciamento ambiental e a forma como se dará esse processo.
4.2. Outros desafios
Além disso, há outros desafios específicos da exploração e produção de recursos não convencionais no Brasil. Tais desafios estão associados ao desenvolvimento de uma indústria de bens e serviços (cadeia produtiva), construção de infraestrutura de escoamento, disponibilidade de sondas e unidades de fraturamento de grande porte[20].
Segundo estudo do BNDES, o mercado brasileiro ainda é pequeno quando comparado aos mercados dos países desenvolvidos da Europa e aos Estados Unidos, sobretudo por causa da menor demanda residencial, em função de características climáticas, e do papel das termoelétricas na oferta de eletricidade, apenas complementar a fonte hídrica[21].
No Brasil, a localização das reservas de gás não convencional parece estar mais concentrada nos estados de Mato Grosso, Minas Gerais, Paraná e Bahia, onde, atualmente, a disponibilidade de gasodutos e a capacidade de processamento e de distribuição são nulas ou baixas, excluindo-se a regiãodo recôncavo baiano[22]. Nos Estados Unidos, verifica-se que as principais áreas de exploração estão localizadas em regiões que dispõem de intensa malha de transporte e ademais, o mercado de gás natural é liberalizado, havendo competição entre os agentes dos diferentes segmentos do mercado de gás natural e livre acesso aos gasodutos de transporte[23].
No Brasil, a infraestrutura de transporte e de processamento do gás está concentrada nas mãos da Petrobras. A malha de gasodutos de transporte compõe-se de 9.160 quilômetros de extensão e de 18 unidades de processamento de gás natural, localizados em áreas próximas aos campos produtores. Desde a promulgação da Lei do Gás (11.909/09) e o Decreto que a regulou, foi estipulado o livre acesso à infraestrutura. Os gasodutos de transporte existentes e/ou com licenciamento ambiental possuem um período de exclusividade de dez anos. Após esse período, é facultado a qualquer interessado o uso dos dutos de transporte existentes ou a serem construídos, com exceção dos gasodutos de escoamento, instalações de tratamento ou processamento de gás natural e de terminais de liquefação e regaseificação[24].
A malha de gasodutos de distribuição, hoje está concentrada principalmente em São Paulo e Rio de Janeiro, que juntos, possuem a maior parte da rede de distribuição nacional. A criação de um mercado de gás natural competitivo no Brasil depende da desverticalização. Do ponto de vista regulatório, este é um cenário significantemente ineficiente que sugeriria um controle regulatório, com o estabelecimento de regras isonômicas e claras, evitando a eventual ação de posição dominante. Entretanto, a criação de um mercado competitivo não ocorre de maneira instantânea.
O estudo do BNDES, já mencionado anteriormente, sugere que com relação à carência de infraestrutura de transporte, para que se viabilize sua ampliação e, por conseguinte, a monetização das reservas, é preciso que se estruturem polos industriais demandantes de gásdistribuídos pelo país[25]. Vale destacar que, com a nova Lei do Gás, esapera-se que haja estímulo para que outros atores construam gasodutos de transporte e comercializem o gás.
5. CONCLUSÃO
Apesar do potencial brasileiro, da realização do leilão pela ANP em 2013 e da regulação sobre o fraturamento hidraulico, publicada em 2014, as condições objetivas, incluindo tecnologia, infraestrutura de transporte, mercado consumidor e impactos ambientais, para a exploração e consumo de gás de xisto, ou gás não convencional no Brasil, são bastante diferentes das americanas e recomendam cautela.
É necessário investir em tecnologias, pesquisa e desenvolvimento, dadas as peculiaridades das bacias sedimentares domésticas e a carência de estudos sísmicos. Necessita-se ainda, aprofundar o estudo relativo à disponibilidade no mercado dos equipamentos específicos para a exploração e produção de gás de xisto e, a partir de então, definir as regras próprias de conteúdo local.
Ademais, dada a taxa de declínio mais acentuada e início de produção mais rápido, os campos não convencionais podem requerer também prazos de concessão mais curtos. Considerando-se, ainda, a acelerada taxa de declínio da produção, deve-se pensar sobre a regularidade em que se darão os leilões, visando à manutenção da produção de gás não convencional ativa[26].
Como visto, o Brasil possui características naturais, jurídicas e condições de infraestrutura marcadamente diferentes das dos Estados Unidos. Todas essas questões devem ser estudadas e aprofundadas, a fim de que a exploração e a produção do gás não convencional no Brasil sejam feitas com base na eficiência, rentabilidade e sustentabilidade.
[1] http://www.portugues.rfi.fr/geral/20120719-estados-unidos-se-tornam-autosuficientes-em-gas-gracas-ao-xisto
[2] Boletim do Gás. Superintendência de Comercialização e Movimentação de Petróleo, seus Derivados e Gás Natural. Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombuatíveis. Edição n°14, 2010. p.2
[3] Estudo do Impacto Econômico da Produção de Shale Gas nos Estados Unido. Gabriel Lengruber Carestiato
Projeto de Graduação apresentado ao Curso de Engenharia do Petróleo da Escola Politécnica, Universidade Federal do Rio de Janeiro. http://monografias.poli.ufrj.br/monografias/monopoli10010959.pdf
[4] ANDREWS-SPEED, P.; LEN,C. The legal and commercial determinants of unconventional gas production in East Asia. Journal of World Energy Law and Business, 2014, p.409. V. 7, No. 5; p.409
[5] Ibidem, p. 408
[6] Ibidem, p. 411
[7] ANDREWS-SPEED, P.; LEN,C. The legal and commercial determinants of unconventional gas production in East Asia. Journal of World Energy Law and Business, 2014,. V. 7, No. 5, p.413.
[8] Plan to study the Potential Impacts of Hydraulic Fracturing on Drinking Water Resources. EPA Hydraulic Fracturing Study Plan. United States Environmental Protection Agency, November 2011. Disponível em www.2.epa.gov/sites/production/files/documents/hf_study_plan_110211_final_508.pdf. Data de acesso: 12.12.2014.
[9] Dos compostos tóxicos: Benzeno, Tolueno, Etilbenzeno, Xileno (BTEX)
[10] ANDREWS-SPEED, P.; LEN,C. The legal and commercial determinants of unconventional gas production in East Asia. Journal of World Energy Law and Business, 2014,V. 7, No. 5; p. 413
[11]RECOMENDAÇÃO DA COMISSÃO, de 22 de janeiro de 2014, relativa a princípios mínimos para a exploração e a produção de hidrocarbonetos (designadamente gás de xisto) mediante fraturação hidráulica maciça (2014/70/UE).
Disponível em < http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2014:039:0072:0078:PT:PDF>
[12] Art. I A presente recomendação estabelece os princípios mínimos necessários para apoiar os Estados-Membros que desejem realizar a exploração e a produção de hidrocarbonetos mediante fraturação hidráulica maciça, assegurando simultaneamente a proteção da saúde pública, do clima e do ambiente, assim como a utilização eficiente dos recursos e a informação aos cidadãos.
[13] Disponível em < http://europa.eu/eu-law/decision-making/legal-acts/index_pt.htm>
[14]Disponível em <http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Meio-Ambiente/Apos-leilao-cresce-oposicao-a-producao-de-gas-de-xisto-no-Brasil/3/29715>
[15] Ação Civil Pública n. 5005509-18.2014.404.7005/PR disponível em http://www.prpr.mpf.gov.br/pdfs/2014/cascavel/xisto-531-2014-61-LCAD_1.pdf Data de acesso: 28.10.2015.
[16] Ação Civil Pública n. 5005509-18.2014.404.7005/PR. Disponível em http://www.prpr.mpf.gov.br/pdfs/2014/cascavel/xisto-531-2014-61-LCAD_1.pdf. Data de acesso: 28.10.2015
[17] Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.
[18] Ação Civil Pública n. 5005509-18.2014.404.7005/PR. Disponível em http://www.prpr.mpf.gov.br/pdfs/2014/cascavel/xisto-531-2014-61-LCAD_1.pdf. Data de acesso: 28.10.2015.
[19]RESOLUÇÃO ANP Nº 21, DE 10.4.2014 Disponível em http://nxt.anp.gov.br/NXT/gateway.dll/leg/resolucoes_anp/2014/abril/ranp%2021%20-%202014.xml?fn=document-frameset.htm$f=templates$3.0 . Data de Acesso: 02.02.2014.
[20] DORES, Priscilla Branquinho das, e outros. Gás não convencional: experiência americana e perspectivas para o mercado brasileiro. Petróleo e Gás BNDES Setorial 37, p.48. Disponível em http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/export/sites/default/bndes_pt/Galerias/Arquivos/conhecimento/bnset/set3702.pdf. Data de acesso: 02/12/2014.
[21]Ibidem, p.80
[22] Idem
[23] DORES, Priscilla Branquinho das, e outros. Gás não convencional: experiência americana e perspectivas para o mercado brasileiro. Petroleo e Gas BNDES Setorial 37, p.48. Disponivel em http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/export/sites/default/bndes_pt/Galerias/Arquivos/conhecimento/bnset/set3702.pdf. Data de acesso: 02/12/2014.
[24]TAVARES, Marcos. Os Desafios do Mercado Brasileiro de Gás Natural. Disponível em http://interessenacional.uol.com.br/index.php/edicoes-revista/os-desafios-do-mercado-brasileiro-de-gas-natural/7/. Data de acesso: 02/12/2014.
[25] DORES, Priscilla Branquinho das, e outros. Gás não convencional: experiência americana e perspectivas para o mercado brasileiro. Petroleo e Gas BNDES Setorial 37, p.81. Disponivel em < http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/export/sites/default/bndes_pt/Galerias/Arquivos/conhecimento/bnset/set3702.pdf Data de acesso: 04/12/2014.
[26] Ibidem, p.48.
Procuradora Federal. Formada em Direito pela Faculdade de Direito da UERJ. Pós Graduada em Direito Previdenciário pela Universidade Anhanguera - UNIDERP. Mestre em Direito de Energia e Recursos Naturais (Energy and Natural Resources Law) na Queen Mary Universitity of London
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LINS, Carolina Barreira. Exploração e produção do gás não convencional. Experiência Americana e os desafios para o Brasil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 jan 2015, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42878/exploracao-e-producao-do-gas-nao-convencional-experiencia-americana-e-os-desafios-para-o-brasil. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
Por: BRUNO SERAFIM DE SOUZA
Por: Fábio Gouveia Carneiro
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
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