Resumo: O presente trabalho destina-se à pesquisa e ao estudo do instituto da união estável, com a finalidade de caracterizá-lo e demonstrar alguns avanços da legislação desde que este novo conceito entrou em vigor, a partir do século XX, trazendo consigo a necessidade de adequação da legislação pátria aos seus aspectos relativos a questões familiares e patrimoniais.
Palavras-chave: união estável – patrimônio – concubinato – família – casamento.
1. INTRODUÇÃO
No Brasil e no mundo, revela-se a recente questão da união estável, seja entre pessoas de sexos diferentes ou do mesmo sexo. Diversas foram as tentativas de se elaborar um conceito e um tratamento para esta nova espécie de entidade familiar, o que recentemente ocorreu. Entretanto, para que isto fosse possível, houve dificuldades como, por exemplo, as antigas legislações conservadoras que não se atualizavam de acordo com este novo conceito e o preconceito da sociedade para com as pessoas que se utilizavam desta espécie de convivência familiar.
O número de pessoas que convivem em união estável é extraordinário e desta união surgem diversos direitos e deveres jurídicos para os companheiros envolvidos, haja vista que se deve observar a união estável sob um ponto de vista familiar, mas também patrimonial. Hodiernamente, as pessoas têm preferido essa opção ao casamento, pois é, de fato, mais simples e mais prática de se executar, entretanto, não se pode olvidar as responsabilidades decorrentes deste importante instituto. Este é o ápice do trabalho em questão: demonstrar as características, obrigações e direitos abarcados pela união estável.
Portanto, para embasar uma pretensão desta proporção, haverá a exposição de fatos e conceitos, legislações e definições de todas as nuances que envolvem o instituto da união estável, especificando-se os motivos que levaram à sua crescente utilização.
2. NOÇÕES ACERCA DA DEFINIÇÃO DE FAMÍLIA
A Constituição Federal de 1988 teve como característica marcante a superação de alguns paradigmas clássicos. Dentre eles, convém destacar que ela passou admitir expressamente três formas distintas de “família” ou de “entidade familiar”. São elas a família casamentária, que é a decorrente do casamento; a família monoparental, que é aquela formada por qualquer dos pais e sua prole; e, por fim, a família decorrente da união estável.
Em 2011, os ministros do Supremo Tribunal Federal passaram, ainda, a reconhecer a união homoafetiva como forma de família, através da ADI 4277/DF e da ADPF 132/RJ. Pode-se dizer que, em verdade, a união homoafetiva é uma espécie de união estável composta por pessoas do mesmo sexo.
A norma constante do art. 1.723 do Código Civil brasileiro, “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”, não obsta que a união de pessoas do mesmo sexo possa ser reconhecida como entidade familiar apta a merecer proteção estatal. Essa foi a conclusão da Corte Suprema ao julgar procedente pedido formulado em duas ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas, respectivamente, pelo Procurador-Geral da República e pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro. Prevaleceu o voto do Ministro Ayres Britto, relator, que deu interpretação conforme a Constituição Federal ao art. 1.723 do Código Civil para dele excluir qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar, entendida esta como sinônimo perfeito de família.
Ademais, a respeito das demais espécies de família mencionadas, Belmiro Pedro Welter assevera:
“portanto, basta a comunidade formada pelo pai e/ou a mãe e um filho biológico ou sociológico para que haja uma família, não havendo qualquer necessidade de os pais serem casados ou conviventes, ou seja, a família não é oriunda do casamento, da união estável ou dos laços sanguíneos, mas também da comunidade de afeto entre pai e/ou mãe e filho”.[1]
Assim sendo, o conceito de família é extremamente importante haja vista seu caráter socioafetivo, tendo, inclusive, como princípios norteadores o da afetividade e o da primazia da preservação da família moderna, bem como os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
3. ASPECTOS IMPORTANTES SOBRE O CASAMENTO
Para se conceituar o casamento, várias são as correntes doutrinárias. Os doutrinadores não-contratualistas utilizam-se de inúmeros e diferenciados argumentos para atacar a natureza contratual do casamento, definido-o ora como um acordo, ora como um negócio complexo, ora, ainda, como um ato-condição.
Entretanto, nos parece correta a acepção que considera o casamento, segundo a vertente do pensamento de que o casamento seria um “contrato especial de direito de família”. Renomados autores, aliás, compartilham a tese da natureza negocial do casamento, como, por exemplo, Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald.
Assim sendo, o reconhecimento da natureza contratual ou negocial do casamento decorreria do seu núcleo: o consentimento. Dessa forma, pode-se afirmar que são requisitos essenciais do casamento o consentimento e a celebração por autoridade materialmente competente.
Ademais, a prova de casamento celebrado no Brasil se dá pela certidão do registro. Por sua vez, o casamento de brasileiros que for celebrado no estrangeiro, perante as respectivas autoridades ou por cônsules brasileiros, deverá ser registrado em 180 dias, contados do retorno de um ou de ambos os cônjuges ao Brasil, no cartório do respectivo domicílio do casal ou, em sua ausência, no 1º Ofício da Capital do Estado em que passarem a residir.
O artigo 1.566 do Código Civil[2] descreve como deveres de ambos os cônjuges a fidelidade recíproca, a vida em comum no domicílio conjugal, a mútua assistência, o sustento, a guarda e educação dos filhos e o respeito e consideração mútuos. Essa lista de deveres não é taxativa, pois quaisquer atitudes que transgridam o respeito e a lealdade devidos ao outro cônjuge poderá se encaixar como descumprimento dos deveres mútuos que deve existir entre eles.
Ademais, vale ressaltar as causas da dissolução da sociedade ou vínculo conjugal, segundo o artigo 1.571 do Código Civil[3], quais sejam: a morte de um dos cônjuges; a nulidade ou anulação do casamento; a separação judicial; e o divórcio. É importante mencionar que a Emenda Constitucional nº 66 de 2010 determinou que o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, sem necessidade de se passar pela fase da separação judicial, como costumava ocorrer antes de sua entrada em vigor.[4]
4. DA UNIÃO ESTÁVEL
Desde o século passado, diversas inovações têm mudado alguns valores inerentes às relações humanas. O período resultante dessas mudanças é o período da tecnologia, da extrema liberdade, do exibicionismo e, com isso, houve também desenvolvimento no conceito da família e do casamento, que foi quando o casamento deixou de ser a única instância legitimadora da convivência amorosa entre duas pessoas e passaram a existir outras formas de união livre.
Com isso, através da influência do Direito francês, o sistema jurídico brasileiro começou a ceder espaço para o “concubinato”, que é uma entidade familiar não matrimonializada, e, com o passar do tempo, passou a nomeá-lo de “companheirismo”, haja vista que a primeira expressão deixava uma interpretação que conduzia à ideia de relação proibida.
Assim, as figuras da “companheira” e da “concubina” são doutrinariamente distintas. Companheira é definida como a mulher que vive em união estável com homem livre para o casamento, ou seja, desimpedido juridicamente. Concubina, por sua vez, é a mulher que, clandestinamente ou não, une-se a homem impedido de se casar, pois já é comprometido.
No início era difícil a aceitação por parte da sociedade dessa nova tendência que viria a ser uma espécie de entidade familiar. A legislação era ultrapassada e reconhecia pouquíssimos direitos para os companheiros que conviviam em união estável, tanto que o Código Civil de 1916 não defendia este instituto, prevendo apenas algumas medidas protetivas dos direitos patrimoniais das pessoas que se encontravam em situações similares (concubinato e companheirismo). Dessa forma, após muitos anos de luta por parte dessas pessoas, o Supremo Tribunal Federal reconheceu, na súmula 380, o direito à partilha do patrimônio comum entre os companheiros em união estável, utilizando-se entretanto, da expressão “concubinos”. Veja-se:
Súmula 380 – Comprovada a existência da sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum.
Por sua vez, o Código Civil atual prevê a união estável em seus artigos 1723 a 1727. Já a Constituição Federal modificou o cenário de atraso em que se encontrava a nossa legislação pátria ao retirar o concubinato puro, que é aquele entre pessoas desimpedidas, da área de abrangência do Direito das Obrigações, para atribuir-lhe dignidade constitucional, alçando este instituto ao patamar do Direito de Família, consoante se depreende da leitura de seu art. 226, § 3º:
Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento.
Dois são os requisitos imprescindíveis para se caracterizar a união estável: a estabilidade da relação e o objetivo de se constituir família. Ademais, as relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.
Assim sendo, este instituto jurídico passou a ser protegido pela legislação pátria e pela Constituição Federal como entidade familiar. Os direitos estão assegurados e a entidade deverá ser respeitada, aplicando-se a ela, nas relações patrimoniais, salvo contrato escrito entre os companheiros, no que couber, as normas do regime da comunhão parcial de bens, o que vem a gerar, portanto, uma maior segurança para os companheiros.
6. CONCLUSÃO
Diante do exposto anteriormente, é notável que o instituto da união estável passou por muitas barreiras e dificuldades para ser reconhecido, finalmente, como entidade familiar. Isso se devia ao fato de os nossos legisladores terem tido o cuidado de adequar calmamente a legislação a esta nova onda de valores que já não previa mais o casamento como única unidade de legitimação de relação amorosa entre as pessoas. Ademais, observou-se que a união estável pode ocorrer entre pessoas de sexos diferentes, bem como entre pessoas do mesmo sexo, o que representa um imenso avanço da nossa legislação e jurisprudência acerca dos fatos que vem ocorrendo na atualidade. Não só avanços tecnológicos, mas também os avanços nas relações entre as pessoas humanas devem ser observados e protegidos pela legislação do país. Para tanto, deve-se utilizar sempre do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade para adequar todas as novas situações e conceitos à forma com que as leis irão tutelá-los.
7. REFERÊNCIAS
DIAS, Maria Berenice; PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de Família e o Novo Código Civil. – 3. ed. – Belo Horizonte: Del Rey, 2003.
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito das Famílias. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil, volume VI: Direito de Família – As famílias em perspectiva constitucional. São Paulo: Saraiva, 2011.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume 6: Direito de Família – De acordo com a Lei 12.874/2013. – 11. ed. – São Paulo: Saraiva, 2014.
MONTEIRO, Washington de Barros; SILVA, Regina Beatriz Tavares da. Curso de Direito Civil, 2: Direito de Família. – 41. ed. – São Paulo: Saraiva, 2011.
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de Família: volume 6. – 28. ed., rev. e atual. por Francisco José Cahali. – São Paulo: Saraiva, 2004.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. – 14. ed. – São Paulo: Atlas S. A., 2014.
WELTER, Belmiro Pedro; MADALENO, Rolf Hanssen. Direitos Fundamentais do Direito de Família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004.
[1] WELTER, Belmiro Pedro. Igualdade entre as Filiações Biológicas e Socioafetivas. São Paulo: RT, 2003, p. 64.
[2] BRASIL. Código Civil. Código Civil Brasileiro. Vade Mecum. Editora Saraiva, 18ª Edição. São Paulo, 2014.
[3] BRASIL. Código Civil. Código Civil Brasileiro. Vade Mecum. Editora Saraiva, 18ª Edição. São Paulo, 2014.
[4] BRASIL. Constituição de 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Vade Mecum. Editora Saraiva, 18ª Edição. São Paulo, 2014.
Advogada. Graduada em Direito pela Universidade Estadual de Montes Claros/MG.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LEAL, Fernanda Rabelo Oliveira. O instituto da união estável no direito brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 31 jan 2015, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/43197/o-instituto-da-uniao-estavel-no-direito-brasileiro. Acesso em: 23 dez 2024.
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