Resumo: O presente artigo pretende analisar e apontar as principais características e singularidade dos crimes eleitorais. Para isso utilizar-se-á ampla gama de conceituação de termos chaves para o tema. Será feita análise de preceitos e institutos fundamentais como crimes, crimes eleitorais, voto, sufrágio universal, Direito Eleitoral, Democracia, intentando explanar os principais elementos que os constituem e da norma que regulamenta esse tipo de delito.
Palavras-chave:Crimes Eleitorais; Voto; Sufrágio Universal.
Sumário:Introdução; 1. Dos crimes eleitorais; 2. Dos tipos de crimes eleitorais e das penas; 3. Conclusão; Referências Bibliográficas.
Introdução
Sendo consideradas a máxima expressão de uma democracia as eleições representam a capacidade do povo delegar à seus representantes o direito de decidir as diretrizes de um Estado, através do voto.
Neste ponto faz-se vital aclarar o que é a chamada “democracia”, o que nos é feito através da lição de Silva[1]:
“A democracia é um processo de convivência social em que o poder emana do povo, há de ser exercido, direta e indiretamente, pelo povo e em proveito do povo. Diz-se que é um processo de convivência, primeiramente para denotar sua historicidade, depois para realçar que, além de ser uma relação de poder político, é também um modo de vida, em que no relacionamento interpessoal, há de verificar-se o respeito e a tolerância entre os conviventes”.
A garantia à supremacia popular, consubstanciada através do sufrágio universal e do voto, encontra respaldo no artigo 14 da Constituição Federal de 1988[2], conforme observa-se:
“Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: (...)”.
Acerca do significado de sufrágio universal e de voto, conceitua Cândido[3]:
“Sufrágio é o poder ou o direito de se escolher um candidato; o voto é o modo ou instrumento através do qual se escolhe esse candidato [...]. O sufrágio é universal e direto, ou seja, todos os cidadãos qualificados pela Justiça Eleitoral, sem intermediários, têm o direito de escolher os titulares dos mandatos e dos cargos eletivos. Por sua obrigatoriedade do voto se entende a exigência do Estado de que cada um, sob sanção, manifeste sua vontade nas urnas, como dever, além de um direito; e, finalmente, por secreto se compreende que ninguém, fora o eleitor, pode saber quem por ele foi escolhido, punindo-se quem violar esse sigilo”.
Sobre a importância constitucionalmente devotada às eleições e, todos os procedimentos que as envolvem, assim como a imprescindibilidade de que as mesmas sejam indubitavelmente legítimas, versa Jardim[4]:
“O processo eleitoral é o liame que une a eficácia social da República à eficácia legal da Constituição que lhe dá forma jurídica. A soberania popular é a pedra angular da República. O papel da Justiça e do processo eleitoral e, diante da República, este: o de assegurar aos titulares da soberania, que o processo institucional se realizou legítima e validamente, que seus representantes eleitos foram escolhidos legítima e validamente. A ausência desta certeza fere de morte a República”.
Dada a sua incomensurável importância, era de se esperar que agentes inescrupulosos tentassem conduzir, de maneira ilegal e imoral, os resultados de uma eleição, para que estes culminem na obtenção de benefícios próprios e de grupos determinados.
A estes desvios ilegais, que contrariam as normas eleitorais estipulados no ordenamento jurídico interno, que podem dar-se antes, durante ou depois das eleições, dá-se o nome de crime eleitorais.
Para estabelecer normas e procedimentos relacionados às eleições, bem como para tentar obstar tais práticas criminosas, estabelecendo quais ações seriam assim consideradas, desenvolve-se um ramo específico no direito, qual seja, o Direito Eleitoral.
Na tarefa de conceituar, discorre, quanto ao que vem a ser “Direito Eleitoral” Cerqueira[5]:
“Direito Eleitoral é o ramo do Direito (Direito Constitucional) que visa o direito ao sufrágio, a saber, o direito público subjetivo de natureza política que confere ao cidadão a capacidade eleitoral ativa (de eleger outrem – direito de votar - alistabilidade) e capacidade eleitoral passiva ( de ser eleito - elegibilidade), bem como o direito de participar do governo e sujeitar-se à filiação, à organização partidária e aos procedimentos criminais e cíveis (inclusive regras de votação, apuração, etc.) e em especial à preparação, regulamentação, organização e à apuração das eleições”.
Nas palavras de Ribeiro[6] pode-se conceituar Direito Eleitoral da seguinte maneira:
“Direito Eleitoral precisamente dedica-se ao estudo das normas e procedimentos que organizam e disciplinam o funcionamento do poder de sufrágio popular, de modo a que se estabeleça a precisa equação entre a vontade do povo e a atividade governamental”.
A seguir, passa-se a tratar especificamente dos crimes eleitorais.
1. Dos crimes eleitorais
Crimes eleitorais, de maneira sincopada, são as ações, condutas, definidas no Código Eleitoral Brasileira, como ilícitas, por contrariem princípios ou procedimentos que visam garantir a hombridade das eleições.
Vale relembrar o conceito genérico de “crime”, antes que se adentre, especificamente, nos crimes eleitorais, conceito este que, nos é dado por Bastos Júnior[7]:
“Do ponto de vista dos elementos que compõem, o crime é, para uns, fato antijurídico e culpável. Para outros, simplesmente um fato típico e antijurídico, sendo a culpabilidade pressuposto da pena. Outros, ainda, acrescentam à estrutura do crime a punibilidade, mas esta, para a maioria dos autores, é sua consequência, não elemento constitutivo”.
Conceituando especificamente os crimes eleitorais temos a definição dada por Pinto[8]:
“São infrações tipificadas no CE e em leis extravagantes, punidas com multa, detenção ou reclusão, objetivando a preservação da lisura na formação do corpo eleitoral, a normalidade do processo eletivo e a regularidade na indicação dos representantes do povo para o exercício do mandato”.
Corroborando com a tarefa de conceituação, Gomes[9]defineos crimes eleitorais da seguinte maneira:
“São, assim, os crimes eleitorais todas aquelas condutas levadas a efeito durante o processo eleitoral e que, por atingirem ou macularem a liberdade do direito de sufrágio, em sua acepção ampla, ou mesmos os serviços e desenvolvimento das atividades eleitorais, a lei reprimiu, infligindo a seus autores uma pena. Consiste, dessa forma, em condutas delituosas que podem se revelar nas mais diferentes formas, indo desde aquelas que conspurcam a inscrição de eleitorais, a filiação a partidos políticos, o registro de candidatos, a propaganda eleitoral, a votação, até aquelas que violam a apuração dos resultados e diplomação dos eleitos”.
Nos crimes eleitorais temos os Órgãos Eleitorais como sujeitos passivos e, como sujeitos ativos, pessoas físicas.
É prudente afirmarmos, que, no que concerne à classificação dos crimes eleitorais inexiste consenso doutrinário, havendo as mais variadas possíveis classificações, tornando uma tarefa inquestionavelmente árdua e de consequente obtenção de resultados árdua e, de maneira geral, insatisfatória.
O artigo 355 do Código Eleitoral estabelece que os crimes eleitorais são de ação penal pública, conforme vislumbra-se no supracitado dispositivo legal:
“Art. 355. As infrações penais definidas neste Código são de ação pública”.
Aos crimes eleitorais aplicam-se as normas gerais estipuladas pelo Código Penal Brasileiro, conforme disposto no artigo 287 do Código Eleitoral Brasileiro:
“Art. 287. Aplicam-se aos fatos incriminados nesta Lei as regras gerais do Código Penal”.
Fica estipulado no artigo 364 a aplicação, em caráter subsidiário e supletivo, do Código Processual Penal Brasileiro, para o processo e julgamento dos crimes eleitorais:
“Art. 364. No processo e julgamento dos crimes eleitorais e dos comuns que lhes forem conexos, assim como nos recursos e na execução que lhes digam respeito, aplicar-se-á, como subsidiária ou supletiva, o Código de Processo Penal”.
2. Dos tipos de crimes eleitorais e da pena
Conforme disposto no sítio eletrônico “www.brasil. gov.br”, compõe os tipos eleitorais, divididos por áreas maculadas, os seguintes ilíticos:
Crimes relacionados à formação do corpo eleitoral:
- Inscrição fraudulenta de eleitor;
- Induzimento à inscrição de eleitor em infração às normas legais
- Inscrição fraudulenta efetivada pelo juiz;
- Negativa ou retardamento de inscrição eleitoral;
- Retenção de título eleitoral contra a vontade do eleitor.
Crimes sobre formação e funcionamento dos partidos políticos:
- Subscrição de mais de uma ficha de registro de partido;
- Inscrição simultânea em dois ou mais partidos;
- Coleta de assinaturas em mais de uma ficha de registro de partido;
- Utilização de prédios ou serviços de repartições públicas para beneficiar partido ou organização de caráter público.
Crimes de propaganda eleitoral:
- Divulgação de fatos inverídicos;
- Calúnia, difamação e injúria;
- Impedimento do exercício da propaganda;
- Participação de pessoa não detentora de direitos políticos em atividades partidárias e de propaganda eleitoral;
- Pesquisas fraudulentas;
- Irregularidades nos dados publicados em pesquisas eleitorais;
- Realização de propaganda eleitoral no dia da eleição.
Crimes relativos à votação:
- Impedimento ou embaraço ao direito de voto;
- Prisão ou detenção de eleitor, integrante de mesa receptora, fiscal, delegado de partido ou candidato fora das hipóteses legais permitidas;
- Coação ou uso de violência para obter voto em determinado candidato ou abstenção;
- Concentração de eleitores para atrapalhar ou fraudar o voto;
- Fornecimento ao eleitor de cédula oficial já assinalada ou marcada (para o caso de votação em papel, na ausência de urna eletrônica);
- Votação múltipla ou realizada em lugar de outro;
- Votação em seção eleitoral onde o eleitor não está inscrito ou autorizado a votar;
- Violação ao sigilo de voto;
- Transporte de eleitores em desacordo com a legislação eleitoral (somente a Justiça Eleitoral pode realizar o transporte de eleitores).
Crimes relacionados à garantia do resultado legítimo das eleições:
- Omissão na expedição do boletim de apuração;
- Violação do sigilo da urna;
- Crimes atingindo o sistema de tratamento automático de dados;
Crimes sobre a organização e funcionamento de serviços eleitorais:
- Destruição, supressão ou ocultação de urna;
- Fabricação, aquisição, fornecimento, subtração ou guarda de materiais de uso exclusivo da Justiça Eleitoral;
- Retardamento ou não aplicação das decisões, citações ou intimações da Justiça Eleitoral;
- Recusa ou abandono do serviço eleitoral;
- Desobediência a ordens ou instruções da Justiça Eleitoral.
Crimes contra a fé pública eleitoral:
- Alteração do resultado da votação nos mapas ou boletins de apuração;
- Falsificação de documento público para fins eleitorais;
- Falsificação de documento particular para fins eleitorais;
- Falsidade ideológica eleitoral;
- Uso de documento falso para fins eleitorais;
- Obtenção de documento falso para fins eleitorais.
Dos artigos 289 a 354 o Código Eleitoral Brasileiro estipula as penas aplicáveis ao crimes eleitorais, sendo estas, a pena de reclusão, detenção e multa.
Conclusão
Diante da natureza basilar que desempenham no Estado Democrático de Direito e, da democracia em si, os crimes eleitorais maculam a máxima constitucional da soberania popular, ao extirpar a legitimidade de uma eleição.
A existência de uma legislação específica para tratar de tal mácula é fator, sem sombra de dúvida, vital para a lisura das eleições, assegurando a legitimidade e validade da mesma.
O conhecimento das especificidades que cercam os crimes eleitorais é igualmente ferramenta de máxima valia para o combate dos mesmo, visando fazer valer o ditame constitucionalmente de que, é o povo quem deve eleger seus representantes, para que expressem a sua vontade através do Estado.
Referências bibliográficas
BASTOS JÚNIOR, Edmundo José de. Código Penal em Exemplos Práticos. Florianópolis: OAB/SC, 2002.
BRASIL.Constituição Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm> Acesso em: 23 fev. 2015.
CÂNDIDO, Joel José. Direito eleitoral brasileiro. 11. ed. Bauru: Edipro, 2004.
CERQUEIRA, Thales Tácito Luz de Pádua. Direito Eleitoral Brasileiro. Belo Horizonte: Del Rey, 2000.
GOMES, Suzana de Camargo. Crimes Eleitorais. 4ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.
JARDIM, Torquato. Processo e Justiça Eleitoral – Introdução ao sistema eleitoral brasileiro. Revista de informação legislativa. Brasília, jul. – set/93, ano 30, nº. 119.
PINTO, Djalma. Direito eleitoral: improbidade administrativa e responsabilidade fiscal. 4ª ed. São Paulo
: Atlas, 2008.
RIBEIRO, Fávila. Direito Eleitoral. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 24 ed. São Paulo: Malheiros, 2004.
[1] SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 24 ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 136.
[2] BRASIL, Constituição Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm> Acesso em: 23 fev. 2015.
[3] CÂNDIDO, Joel José. Direito eleitoral brasileiro. 11. ed. Bauru: Edipro, 2004.
[4] JARDIM, Torquato. Processo e Justiça Eleitoral – Introdução ao sistema eleitoral brasileiro. Revista de informação legislativa. Brasília, jul. – set/93, ano 30, nº. 119, p. 45-46.
[5] CERQUEIRA, Thales Tácito Luz de Pádua. Direito Eleitoral Brasileiro. Belo Horizonte: Del Rey, 2000.
[6] RIBEIRO, Fávila. Direito Eleitoral. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992.
[7] BASTOS JÚNIOR, Edmundo José de. Código Penal em Exemplos Práticos. Florianópolis: OAB/SC, 2002.
[8] PINTO, Djalma. Direito eleitoral: improbidade administrativa e responsabilidade fiscal. 4ª ed. São Paulo : Atlas, 2008, p. 314
[9] GOMES, Suzana de Camargo. Crimes Eleitorais. 4ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.
Advogada e pós-graduanda em Direito no Complexo Educacional Damásio de Jesus.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ROSA, Rafaela Miareli. Crimes Eleitorais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 12 mar 2015, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/43528/crimes-eleitorais. Acesso em: 23 dez 2024.
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