Resumo: O presente artigo científico tem por finalidade fazer uma breve análise sobre a origem e a evolução histórica sobre a Seguridade Social, propiciando o entendimento sobre os valores e institutos da Seguridade Social brasileira.
Palavras-chave: Seguridade Social, Origem e Evolução Histórica.
Abstract: This research paper aims to make a brief analysis of the origin and historical development of Social Security, providing an understanding of the values and institutions of the Brazilian Social Security.
Keywords: Social Security, Origin and Historical Evolution.
Sumário: 1. Introdução. 2. Evolução dos direitos sociais. 3. Os principais marcos evolutivos da proteção social. 4. A proteção social, a evolução dos direitos e garantias individuais e os seus limites. 5. Proteção social no Brasil. 6. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO
A Previdência Social se apresenta como um dos mais importantes direito sociais previstos na Constituição Federal de 1.988.
Para se entender melhor a estrutura da Previdência Social e seus institutos é muito importante que se faça um apanhado histórico, pois o direito evolui com os fatos, se amoldando às realidades de dado momento histórico.
Conforme assevera o autor Aécio Pereira Júnior(01), em sua obra “Evolução histórica da Previdência Social e os direitos fundamentais1”:
(...)a principal virtude de se examinar o curso da evolução histórica da previdência social está na possibilidade de se conhecer melhor os institutos vigentes no presente, a partir de elementos históricos e, igualmente, melhor arquitetar as bases para o futuro, razão pela qual impõe-se perscrutar o passado, a fim de acompanhar o desenrolar dos acontecimentos, aproveitar os acertos dos projetos que culminaram em boas conquistas e, ao mesmo tempo, evitar os equívocos de experiências desastradas.
Nesse mesmo sentido caminha o entendimento de Sérgio Pinto Martins, ao citar a lição de Waldemar Ferreira, asseverando que:
nenhum jurista pode dispensar o contingente do passado a fim de bem compreender as instituições jurídicas dos dias atuais". (02)
Na mesma linha, ensina Wagner Balera (03), in verbis:
O estudo da seguridade social, assentado num tempo determinado – o presente – não inibe o nosso interesse acerca da história constitucional que, embora seja disciplina não-jurídica (no entender de Santi Romano), nos fornece válidos critérios de interpretação da nova ordem constitucional.
Destarte, temos que a evolução da Seguridade Social caminha junto com a evolução dos próprios direitos sociais, sendo certo que nas sociedades modernas, tal como pode ser considerado o Brasil, a proteção a esses direitos ganha status de direitos e garantias fundamentais dos indivíduos, consagrados como verdadeiros direitos subjetivos.
Como senão bastasse a tutela de tais direitos fundamentais têm adquirido o mais alto grau de aplicação, tornando-se cláusulas pétreas, consoante previsto no art. 60, §4º, IV, da Constituição Federal.
Todavia, observando-se o princípio da reserva do possível, a aplicação efetiva dos princípios exigem cada vez mais recursos disponíveis para seu atendimento e, nem sempre, o Estado tem condições materiais e operacionais de concretrizar tais garantias, levando os cidadãos a buscar os seus direitos junto ao Poder Judiciário.
Em suma, será feito um apanhado histórico sobre a concretização dos direitos sociais e sobre a Previdência Social, em especial sobre a evolução histórica do direito pátrio, tendo como parâmetro as diversas constituições brasileiras, com o intuito de se demonstrar o atual grau de satisfação atingido pelo ordenamento pátrio.
2. EVOLUÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS
Com o desenvolvimento da civilização cada dia mais cresceu a preocupação com o bem-estar da sociedade, tendo sido desenvolvidas técnicas de proteção social. Assim, dentro da realidade de cada povo, de acordo com as suas necessidades, o Estado tem buscado satisfazê-las, logicamente que dentro das disponibilidades orçamentárias e materiais.
Nos primórdios, as sociedades primitivas baseavam-se simplesmente no instinto da sobrevivência, mesmo existindo a conjugação de esforços para a melhoria ou facilitação das condições de vida de cada um dos indivíduos formadores do grupo. Nessa linha, salienta Mozart Victor Russomano:
“o pano de fundo da Previdência Social é o sentimento universal de solidariedade entre os homens, ante as pungentes aflições de alguns e generosa sensibilidade de muitos". (04)
Destarte, como assevera Aécio Pereira Júnior, “desde o nascimento da Humanidade já se pode notar a preocupação dos indivíduos em criar mecanismos de proteção contra os infortúnios. Coxtextualizando esse mesmo doutrinador assim asseverou sobre os primeiros regramentos legais garantidores de benefícios sociais senão vejamos:
A doutrina refere-se ao Talmud, ao Código de Hamurabi e ao Código de Manu, como as primeiras ordenações normativas a instituir métodos de proteção contra os infortúnios, sendo que este último "continha disposições, acerca dos empréstimos realizados ao preço dos riscos. Os fenícios, por sua vez, adotaram idênticas normas dos hindus, difundidas mais tarde na Grécia". (01)
Da Grécia para Roma surgiram as associações denominadas de collegia ou sadalitia formadas por pequenos produtores e artesãos livres, igualmente, com caráter mutualista, constituídas de no mínimo três indivíduos que contribuíam periodicamente para um fundo comum, cuja destinação principal estava voltada para os custos dos funerais dos seus associados. (09)
Já na Idade Média desenvolveram-se e espalharam-se as associações de inspiração mutualista, mesmo em ambientes políticos, econômicos e sociais distintos, dentre as quais, vale destacar as guildas de origem germânica.
Tais instituições, embora tenham se proliferado não atingiram um nível de proteção universal, pelo contrário, mesmo quando subvencionados pelo Estado, em regra, limitava-se o seu espectro de cobertura a certos grupos que atuavam em atividades de grande interesse da respectiva sociedade interessada, como marinheiros, mineiros, militares, funcionários dos ministérios etc. Além disso, referidas instituições não tinham acesso e o domínio técnico e jurídico do contrato de seguro, não ofertando, por isso, nenhuma segurança quanto ao atendimento de seus filiados em um momento de intensa necessidade social.
Assim, muito embora os primeiros contratos de seguros privados precedam ao próprio nascimento da assistência social pública, segundo Augusto Venturi, somente muito tempo depois é que se passou a cobrir riscos sociais, quando na Inglaterra, no século XIX, surgiram as primeiras empresas que se dedicaram à instituição de seguros populares destinados à classe trabalhadora. (10)
Surge, neste ínterim, um dos principais marcos evolutivos em termos de proteção social por intervenção do Estado, já que ao caráter mutualista e privado dos sistemas até então vigentes soma-se o de cunho assistencial e público, decorrente da influência manifesta da doutrina Cristã e "como medida de ordem pública que poderia ser ameaçada pela fome e pela miséria de grandes grupos de excluídos". (11)
A Igreja Católica, nesse período, representava o elo entre Deus e os seres humanos e suas instituições, inclusive os Estados, daí a sua notável influência em todos os meandros da sociedade da época, sendo prudente e relevante perpassar o ponto da influência religiosa no que tange a evolução da proteção social, ainda que seja de forma meteórica.
De se notar que a evolução dos direitos sociais caminhava lado a lado com a expansão da própria doutrina Cristã, que firmava seus dogmas, solidificando seus mais altos valores na consciência dos povos do ocidente. Assim, a Igreja Católica não só prestava auxílio espiritual aos povos, como também influenciava de maneira decisiva as manifestações políticas.
Nesse contexto, nasce a história da Proteção Social no mundo ocidental, lembrando-se que, mesmos nos Estados laicos, a assistência social pública aos carentes e indigentes ganhou status jurídico, com a edição de leis, por toda a Europa Ocidental, de cunho nitidamente assistencial no decorrer do século XVII, tendo como precursora a chamada Lei dos Pobres Londrina de 1601 (05), que teve impulso, inclusive, numa das mais graves carestias da história inglesa.
A lei londrina – Poor Relief Act –, instituiu contribuição obrigatória determinando a nomeação, em cada paróquia, de dois ou mais "overseers of the poor" encarregados de recolher fundos de todos os que estivessem em condições de contribuir, destinados: a) viabilizar a obtenção de emprego para as crianças pobres por meio da aprendizagem, que poderia ser obrigatória até os 24 anos para os varões e até 21 anos para as mulheres; b) ao ensinamento do trabalho para os pobres que não tinham nenhuma especialização; c) ao atendimento dos inválidos em geral. (06)
Nesse momento histórico, surgia a primeira disciplina jurídica de proteção social, que atribuiu ao Estado o dever de conduzir a organização e a efetivação dos serviços do programa de assistência social.
Não é por outra razão que Mozart Victor Russomano (07) afirma que:
Essa "oficialização da caridade" – como foi dito, certa vez – tem importância excepcional: colocou o Estado na posição de órgão prestador de assistência àqueles que – por idade, saúde e deficiência congênita ou adquirida – não tenham meios de garantir sua própria subsistência. A assistência oficial e pública, prestada através de órgãos especiais do Estado, é o marco da institucionalização do sistema de seguros privados e do mutualismo em entidades administrativas. [...] Hoje compreende-se que nesse passo estava implícita a investida de nossa época, no sentido de entender os benefícios e serviços da Previdência Social à totalidade dos integrantes da comunidade nacional, a expensas, exclusivamente, do Estado, e não apenas aos associados inscritos nas entidades de Previdência Social. Dessa forma, podemos concluir dizendo: naquele momento distante, no princípio do século XVII, começou, na verdade, a história da Previdência Social.
Somada à influência religiosa, importante destacar que a Estabilização do Estado também foi determinante para a concretização dos direitos sociais. Com a queda do Estado Absolutista, a sociedade ocidental passou a contar com novos atores, que não a nobreza, o clero e o povo. A burguesia surgia como nova classe social, dotada de grande poder econômico, em face de seu grande sucesso decorrente da atividade comercial empreendida e, posteriormente, da atividade industrial. Essa nova composição social exigiu a superação da ordem medieval, culminando, pois, no surgimento dos modernos Estados Nacionais laicos e soberanos.
Diante desse novo panorama, contextualiza Aécio Pereira Júnior(1):
Dessa nova conjectura social, surgem os instrumentos normativos mais próximos do pensamento liberal, dentre os quais, podem ser citados o Petition of Right de 1628, Hábeas Corpus, de 1679, e o Bill of Rights, de 1689, concretizando liberdades negativas em favor dos indivíduos.
Após o período de consolidação do poder econômico da burguesia, adveio a revolução industrial, período em que a sociedade experimentou um desenvolvimento econômico sem precedentes, beneficiando e fortalecendo ainda mais a classe burguesa, que impunha todo seu poder econômico sob a classe trabalhadora.
Diante disso, a classe trabalhadora foi submetida a um regime de exploração sem igual, pois ficava inteiramente à mercê do poder econômico da nova classe dominante, porquanto as concepções liberais da época destinavam ao Estado uma posição inerte, de mero espectador das relações firmadas entre os particulares, sem estabelecer quaisquer limites à autonomia dos indivíduos. (17)
Mesmo com os ideais motivadores da Revolução Francesa identificando uma dívida social da sociedade para com os menos favorecidos, prescrevendo a manutenção dos mecanismos de proteção consubstanciados nos socorros públicos, estava-se ainda no estágio da assistência pública.
Os menos favorecidos não detinham instrumentos jurídicos capazes de promover a melhoria das condições de vida, já que os direitos fundamentais restringiam-se as prestações negativas, as chamadas liberdades públicas. Sem mecanismos eficientes para compelir o Estado ao cumprimento das prestações positivas, ainda que meramente assistenciais, ficavam reféns da idiossincrasia de cada governo.
Os trabalhadores tinham que se acobertar por conta própria, por meio de seguros privados, ou valer-se das associações de classe, sem qualquer ingerência estatal.
Dessa liberdade extrema resultou a ineficiência.
Na realidade, o Estado compreendia que os problemas sociais decorrentes das novas relações econômicas trazidas pela revolução industrial deveriam ser resolvidos pela própria classe trabalhadora e seus empregadores, tendo o liberalismo do século XIX deixado vesgos os dirigentes no que toca aos problemas sociais ligados ao trabalho.
Acontece que, só os trabalhadores com mais altos salários, em regra a minoria, conseguiam arcar com os pagamentos periódicos das contribuições, ficando, portanto, à mercê de sua própria sorte a grande massa de proletariados. Enquanto isso, os recursos dos fundos mutualistas que ainda se sustentavam mitigavam e os infortúnios sociais cresciam em quantidade geometricamente oposta, aumentando cada vez mais a fila dos miseráveis. Os fundos privados mutualistas tornaram-se áridos, sem que pudessem atender as expectativas de proteção desejada e requerida naquele tempo.
A partir disso, o comportamento do Estado começou a mudar, justamente em razão das incomensuráveis consequências políticas causadas pelos problemas sociais originados das draconianas relações e das condições de trabalho vigentes, especialmente em decorrência dos constantes acidentes de trabalho.
O período do liberalismo absoluto cedia tímido espaço ao período intervencionista.
Desta forma, o nascimento do seguro social obrigatório deu-se por força de condições fáticas, especialmente da preocupação dos dirigentes das nações com a condução de suas administrações e não especificamente com os interesses diretos dos proletariados. Isso fica claro quando se verifica o seu surgimento na Alemanha, em 1883, de Bismarck, que lançou o seu plano no intuito de unificar o Estado alemão. (08)
Destarte, a partir daqui é que realmente começa a desenvolver-se a Previdência Social e, por consequente, inicia-se o seu efetivo processo de evolução.
3. OS PRINCIPAIS MARCOS EVOLUTIVOS DA PROTEÇÃO SOCIAL.
No plano mundial, pode-se dividir a evolução da Previdência Social em três momentos marcantes, quais sejam:
a) o plano de previdência aos acidentes do trabalho inaugurado por Otto Von Bismarck, em 1883, até o término da I Grande Guerra Mundial;
b) do tratado de Versalhes até o término da II Guerra Mundial, em 1945; e, finalmente,
c) e, finalmente, o terceiro período, que se estende até o presente momento (09).
O Chanceler Otto Von Bismarck é por muitos considerado o pai da Previdência Social, visto que editou a lei de seguros sociais em 1883. Através dele foram instituídos o seguro doença, o seguro contra acidente do trabalho e, por fim, o seguro invalidez e a velhice. Nas palavras de Bismarck (10):
Consideramos ser de nosso dever imperial pedir de novo ao Reichstag que tome a peito a sorte dos operários. Nós poderíamos encarar com uma satisfação muito mais completa todas as obras que nosso governo pôde até agora realizar, com a ajuda visível de Deus, se pudéssemos ter a certeza de legar à Pátria uma garantia nova e durável, que assegure paz interna e desse aos que sofrem a assistência a que têm direito. É nesse sentido que está sendo preparado um projeto de lei sobre o seguro dos operários contra os acidentes do trabalho. Esse projeto será completo por outro, cujo fim será organizar, de modo uniforme, as caixas de socorro para o caso de moléstia. Porém, também aqueles que a idade, a invalidez tornaram incapazes de prover ao ganho quotidiano, têm direito a maior solicitude do que a que lhe tem, até aqui, dado a sociedade. Achar meios e modos de tornar efetiva esse solicitude é, certamente, tarefa difícil mas, ao mesmo tempo, uma das mais elevadas e um estado fundado sobre bases morais da vida cristã.
Percebe-se da passagem acima a intenção de Bismarck em ampliar o espectro de proteção previdenciária aos trabalhadores, tendo em mente que "por mais caro que pareça o seguro social, resulta menos gravoso que os riscos de uma revolução". (10)
Por sua vez, o período entre o Tratado de Versalhes e o término da II guerra mundial foi caracterizado pelo progressivo aperfeiçoamento dos sistemas previdenciários europeus, cuja influência veio a atingir todos os demais continentes, sobretudo à América Latina. Os seguros sociais obrigatórios desenvolveram-se e espraiaram-se por todos os continentes, no que Celso Barroso Leite e Luiz Paranhos Veloso, denominaram como período de expansão geográfica.
Nessa esteira, houve o início da constitucionalização dos direitos sociais, destacando-se as Constituições do México de 1917 e a Alemã de 1919 – Constituição de Weimar – que alçaram os direitos sociais ao nível constitucional, consagrando-os como normas programáticas. A partir desse ponto, a seguridade social passou a ser entendida como um conjunto de medidas que deveriam agregar, no mínimo, os seguros sociais e a assistência social, que deveriam ser organizadas e coordenadas publicamente, visando atender o desenvolvimento de toda a população, e não só os trabalhadores, haveria o compromisso do Estado democrático com um nível de vida minimamente digno aos seus cidadãos.
Por fim, após a segunda grande guerra, passa-se ao momento em que todos os cidadãos deverão ser amparados em suas necessidades por serviços estatais, seja qual for sua profissão ou condição social, bastando apenas que sejam vítimas de uma necessidade social. É o que se denomina Seguridade Social, que se chegará aos poucos, na medida em que cada povo possa custear conjuntamente todas as necessidades sociais de cada indivíduo, em prol da coletividade.
Podemos citar como instrumentos da evolução a Declaração Americana Dos Direitos e Deveres do Homem (1948), a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), a Carta Social Européia (1961), o Pacto Internacional de Direitos Econômicos Sociais e Culturais (1966) e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969).
Surgiu neste momento a ideia da formação dos Estados do Bem-Estar Social, ao menos até o início da década de 1970, mobilizando grande parte das estruturas dos Estados para uma frente intervencionista, adaptando-se às novas exigências políticas e sociais, nas quais os direitos sociais ganharam muito mais relevo.
Em suma, podemos notar que a Previdência Social iniciou sua evolução num regime privado e facultativo, de caráter mutualista, passando depois pelo regime de securitário obrigatório e, neste momento, busca firmar-se como um sistema de seguridade social, com novas luzes e conceitos, a fim de aumentar os riscos cobertos, melhorar suas prestações, universalizar sua cobertura e, num grau máximo de solidariedade e igualdade material, transferir ao Estado a responsabilidade global pelos custeio das prestações por intermédio de impostos.
4. A PROTEÇÃO SOCIAL, A EVOLUÇÃO DOS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS E OS SEUS LIMITES
Os direitos humanos fundamentais também passaram por um processo de lapidação histórica, sendo que a doutrina moderna tem classificado tais direitos como de primeira, segunda e terceira gerações, baseando-se na ordem cronológica em que passaram a ser constitucionalmente reconhecidos.
Os direitos humanos de primeira geração foram aqueles inicialmente contemplados na Magna Charta de João Sem-terra, de 1215. São os direitos e garantias individuais e políticos clássicos (liberdades públicas), que realçam o princípio da liberdade, cujo desenvolvimento já foi realçado.
Por sua vez, os direitos fundamentais de segunda geração são justamente os direitos sociais, econômicos e culturais, surgidos no início do século, a partir do constitucionalismo social. Por último, os direitos fundamentais de terceira geração abrangem os direitos de solidariedade ou fraternidade, que abarcam o direito a um meio ambiente equilibrado.
Partindo deste ponto, é importante destacar que mesmo após a afirmação dos direitos fundamentais de terceira geração, os cidadãos ainda enfrentam muita dificuldade para a concretização de tais direitos, já que o Estado não possui todos os recursos necessários à satisfação. E aqui cabe lembrar, justamente, a antinomia da concreção dos instrumentos de proteção social, pois quanto mais subdesenvolvido economicamente o Estado mais abundante de necessidades sociais.
Assim, em atenção ao princípio da "reserva do possível", nem sempre o Estado conseguirá suprir todas as necessidades sociais, sendo imperiosa a escolha pela satisfação das mais urgentes e necessárias.
No que pertine à Previdência Social, cumpre destacar que a cobertura aos eventos danosos se dá mediante contrapartida dos segurados e demais financiadores, já que o sistema de seguridade social somente poderá cumprir suas finalidades se estiver calcado em rígido equilíbrio econômico e financeiro.
5. A PROTEÇÃO SOCIAL NO BRASIL
No Brasil a evolução da proteção social seguiu os mesmos passos da Seguridade mundo a fora, culminando com o sistema de seguridade social, como consagrado na Constituição de 1988. Foram mais de três séculos de evolução, pois a primeira manifestação normativa sobre assistência social, veio imprimida na Constituição de 1824, que assim dispôs:
Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Império, pela maneira seguinte.
...
XXXI. A Constituição também garante os soccorros públicos.
A proteção social inserta no bojo da Constituição de 1824, como dito, e reforçada pela lição de Ruy Carlos Machado Alvim "não teve maiores conseqüências práticas, sendo apenas um reflexo do preceito semelhante contido na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1793, a qual, o art. 23, qualificava estes "socorros públicos" como "dívida sagrada" [...]. (11)
Por sua vez, a Constituição Republicana de 1891 apenas inseriu dois artigos nas suas disposições constitucionais acerca da proteção social, descritos nos artigos 5º e 75, a saber:
Art 5º - Incumbe a cada Estado prover, a expensas próprias, as necessidades de seu Governo e administração; a União, porém, prestará socorros ao Estado que, em caso de calamidade pública, os solicitar.
...
Art 75 - A aposentadoria só poderá ser dada aos funcionários públicos em caso de invalidez no serviço da Nação.
Em que pese o texto constitucional ter sido bem modesto, foi no período de vigência da Constituição Republicana que apareceram todos os dispositivos legais que prepararam a evolução dos regimes de previdência social existentes no Brasil.
Primeiro foram criados seguros sociais a diversas categorias de funcionários públicos. Depois foi publicada a Lei n? 4.682, de 24 de janeiro de 1923, chamada "Lei Eloy Chaves", tendo esse último ato legislativo criado as Caixas de Aposentadoria e Pensões dos Ferroviários, que funcionaram, em todo o território nacional, por muitos anos.
Grande parte da doutrina assevera que a Lei Eloy Chaves foi o marco inicial da Previdência Social em nosso país.
Em seguida, ocorreu a criação de outras caixas de previdência em empresas de diversos ramos da atividade econômica. A proliferação desse regime de Caixa por empresas criou pequenos regimes de Previdência que tinham por inconveniente o número mínimo de segurados indispensáveis ao funcionamento em bases securitárias.
Avançando, na década de 1930, passou a vigorar o regime dos Institutos, de contribuição tripartite – Estado, empregador e empregado – pelo qual o custeio vinculava-se, obrigatoriamente, as três fontes. Princípio, que, posteriormente foi erigido em norma constitucional, em 1934. Os recursos do Estado advinham das taxas de importação. O primeiro instituto de previdência de âmbito nacional, com base na atividade econômica, foi o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos, criado em 1933, pelo Decreto n? 22.872, de 29 de junho de 1933.
Com a promulgação da Constituição de 1934 foi consagrado o modelo tripartite de financiamento do sistema de previdência social, com recursos da União, dos empregadores e dos empregadores.
Por sua vez, a Constituição outorgada de 1937, marcadamente autoritária, foi desarmônica com os avanços até então conquistados. Mesmo assim, não deixou de enumerar os riscos sociais cobertos pelo seguro social.
Seguindo movimento mundial influenciado pelo pós-guerra, foi promulgada a Constituição de 1946, que foi a primeira constituição brasileira a trazer a expressão "Previdência Social" em substituição do termo "Seguro Social". Nada de substancialmente novo foi incorporado ao novo texto constitucional, valendo lembrar apenas a imposição aos empregadores de manterem seguro de acidente de trabalho em prol de seus empregados.
Todavia, em que pese a falta de avanços no corpo da Carta Magna de 46, a legislação infraconstitucional muito avançou, tendo sido editada a Lei n? 3.807, de 26 de agosto de 1960, denominada de Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS), que foi o maior marco da universalidade da Previdência Social.
Quanto à Carta de 1967, com a Emenda n? 1, de 1969, pouco inovou, tendo como virtude trazer o sistema de seguro de acidente do trabalho para os auspícios do sistema previdenciário público, nos mesmos moldes de financiamento. Em essência, a matéria previdenciária na Carta de 1967, com a Emenda n? 1, de 1969, não destoa das demais que lhe antecederam, tendo sido previstos os mesmos riscos sociais arrolados desde a Constituição de 1934.
De outro lado, o vigor legislativo infraconstitucional continuava efervescente em matéria de previdência social, dispensando-se a enumeração cansativa das disposições legais pertinentes, bastando ressaltar a constante ampliação do rol de beneficiários e de qualidade das prestações, traçando o caminho para a construção de um sistema de seguridade social, como pretendido pela Constituição de 1988.
Por fim, com a promulgação da Carta Republicana de 1.988, surge a restauração do Estado democrático de direito, rompendo com o autoritarismo do regime militar.
Aliás, nesse ponto, vale transcrever a lapidar manifestação de Luís Roberto Barroso (12), a saber:
Na euforia – saudável euforia – de recuperação das liberdades públicas, a constituinte foi um amplo exercício de participação popular. Neste sentido, é inegável o seu caráter democrático. Mas, paradoxalmente, foi este mesmo caráter democrático que fez com que o texto final expressasse uma vasta mistura de interesses legítimos de trabalhadores e categorias econômicas, cumulados com interesses cartoriais, corporativos, ambições pessoais, etc.
Na realidade, como ensina Wagner Balera, a nova Carta Magna de 1988 instituiu um autêntico Sistema Nacional de Seguridade Social, o qual configura um conjunto normativo integrado de um sem-número de preceitos de diferentes hierarquia e configuração. (13)
Foram consagradas a universalidade de cobertura e do atendimento e a separação das áreas que compõem o sistema de seguridade social, entre previdência, saúde e assistência, revelando uma estrutura modeladora da previdência social brasileira dotada de "especificidades capazes de conformar um sistema próprio..
Mesmo com todas as críticas que o texto constitucional sofreu, é evidente que maiores são seus méritos que os deméritos, já que em momento nenhum nega eficácia aos valores fundamentais conquistados a custa de duras penas ao longo da história da humanidade, protegendo todos os cidadãos contra eventuais abusos e garantindo-lhes, nem que seja o mínimo necessário para preservação de uma vida digna, elevando, inclusive, tais preceitos ao status de cláusulas pétreas (art. 60, §4º, II, da CRFB/88).
6. CONCLUSÃO
Por todo o exposto, notável foi o avanço porque passaram os direitos fundamentais e sociais, como também a Previdência Social.
A evolução da Previdência Social passou por várias fases: primeiro por um regime privado e facultativo, de caráter mutualista; depois pelo regime de securitário obrigatório; e, por fim, a afirmação como um sistema de seguridade social, com novas luzes e conceitos, a fim de aumentar os riscos cobertos, melhorar suas prestações, universalizar sua cobertura e, num grau máximo de solidariedade e igualdade material, transferir ao Estado a responsabilidade global pelos custeio das prestações por intermédio de impostos.
Nessa seara, o direito pátrio não ficou para trás. Depois de toda a evolução constitucional de legislativa, o constituinte de 1988 definiu a Previdência Social como um sistema integrante da do fisiologismo do Estado. Grandes foram as conquistas do povo brasileiro em termos de proteção social no decorrer de sua evolução histórica, pois partiu-se de uma panorama de total falta de garantias, chegando ao estado do bem-estar e da justiça sociais.
Todavia, ainda há espaço para avanços, mormente no que pertine à real concretização de tais direitos, quer seja através da destinação de mais recursos públicos, quer seja através de novos mecanismos legais que garantam a manutenção de tais direitos, evitando-se retrocessos e buscando melhorias no sistema de Previdência Social.
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2 Apud por MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. 16ª ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 28
3 BALERA, Wagner. Sistema de Seguridade Social. 3? ed. São Paulo: Ed. dos Tribunais., 2003, p. 133-160.
05 MARTINEZ, Wladimir Novaes. Novas contribuições na seguridade social: entidades de fins filantrópicos. São Paulo: Ltr, 1997. p. 115-116
06 VENTURI, Augusto. Los fundamentos científicos de la seguridad social. Colección Seguridad Social, n? 12. Madrid: Ministerio do Trabajo y Seguridad Social, 1994. p. 47
7 Idem. p. 5-6
8 ASSIS, Armando de Oliveira. Em busca de uma concepção moderna de "risco social". p. 25
9 RUSSOMANO, Mozart Victor. Curso de Previdência Social. Rio de Janeiro: Forense. 1978, p. 12-13.
10 MORENO, Ruiz. Nuevo derecho de la seguridad social. Apud CASTRO, C. A. P.; LAZZARI, J. B.; Manual de Direito Previdenciário. 4ª ed. São Paulo: LTr, 2003. p. 30
11 Idem. Ibidem. p. 12
12 BARROSO, Luís Roberto. Temas de Direito Constitucional. In: ______. Doze anos da Constituição Brasileira de 1988. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 9
13 Idem. Ibidem. p. 11
Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil. Professor do Curso de Direito das Disciplinas de Direito Financeiro, Direito Tributário e Previdenciário na Fundação Educacional do Vale do Jequitinhonha.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ARANTES, Renato Hallen. A origem e a evolução histórica da Seguridade Social brasileira Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 mar 2015, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/43559/a-origem-e-a-evolucao-historica-da-seguridade-social-brasileira. Acesso em: 23 dez 2024.
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