Resumo: O aviso prévio proporcional trata-se de direito do constitucionalmente garantido, porém, durante muito tempo não regulamentado pelo legislador infraconstitucional, que o fez apenas em 2011, quase vinte anos após a promulgação da Constituição Federal brasileira. Com o advento da sua regulamentação surgiram muitas dúvidas sobre a forma com a qual deveria se dar a sua aplicação, sendo publicado, inclusive, notas técnicas pelo Ministério do Trabalho e Emprego. O presente trabalho utiliza pesquisa bibliográfica, jurisprudencial, descritiva, teórica e dedutiva, sendo seu objetivo a análise das novas formas de interpretação que surgiram com advento da regulamentação do aviso prévio proporcional. Dessa forma, conclui-se que a regulamentação do tema foi muito benéfica ao trabalhador e que a doutrina e a jurisprudência, com o passar do tempo, tendem a uniformizar seus entendimentos quanto a aplicação do instituto, como será demonstrado neste trabalho.
Palavras-chave: Aviso prévio. Direito do trabalho. Trabalhador.
1 INTRODUÇÃO
O Aviso prévio é ato unilateral, podendo ocorrer tanto da parte do empregado como do empregador, tem o escopo de projetar o contrato de trabalho juntamente com todos os direitos trabalhistas e deverá ser calculado com base no salário do empregado.
A Constituição Federal prevê o prazo mínimo de trinta dias para o aviso prévio, podendo tal prazo ser ampliado por acordo ou convenção coletiva de trabalho, segundo prevê a Orientação Jurisprudencial nº 367 da SDI-1 do Tribunal Superior do Trabalho.
Podendo ser trabalhado ou indenizado, o aviso prévio sempre integrará o tempo de serviço[1] (art. 487, §1º, CLT) e é direito irrenunciável (Súmula nº 276 do TST). No primeiro caso, o contrato de trabalho terá fim juntamente com o aviso prévio. Já no segundo, há uma ficção jurídica que elastece o contrato de trabalho até 30 (trinta) dias, ou mais (a depender da proporção dos anos trabalhados), como se o empregado tivesse laborado por este período.
A previsão expressa no art. 7º, XXI da Constituição Federal de 1988 assegura “o aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de 30 (trinta) dias, nos termos da lei”. Trata-se de norma constitucional de eficácia contida declaratória de princípios programáticos, uma vez que não tem o condão de produzir todos os seus efeitos, precisando de uma lei integrativa infraconstitucional.
As Normas Constitucionais de Eficácia Contida, embora tenham condições de produzir todos os efeitos, poderá ter sua abrangência reduzida por norma infraconstitucional. Como exemplo, podemos observar que o artigo 5º, inciso XIII, da Constituição de 1988, assegura ser livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendido as qualificações profissionais que a lei estabelecer. É o caso do Estatuto da OAB que exige aprovação em exame de ordem para o bacharel em Direito exercer a advocacia (OLIVEIRA, 2010).
Em face da inércia do Poder legislativo quanto à regulamentação do aviso prévio proporcional foram propostos perante o Supremo Tribunal Federal os Mandados de Injunção nº 943, 1010, 1074 e 1090. Em junho de 2011, o Supremo Tribunal Federal suspendeu os julgamentos dos Mandados de Injunção, após a procedência das ações, para fixar a proporcionalidade do aviso prévio e sanar a omissão legislativa.
O Colendo Tribunal suscitou várias questões, inclusive em relação a que parâmetro utilizar como paradigma de proporcionalidade do aviso, tendo propostas fundamentadas principalmente no direito comparado. A suspensão para análise do tema findou com advertência realizada pelo Ministro Gilmar Mendes dirigida ao Poder Legislativo em relação a essa lacuna legislativa que já contava com mais de vinte anos.
A discussão iniciada pelo Supremo Tribunal Federal acabou por pressionar o Congresso Nacional, que em 11 de outubro de 2011, regulamentou o aviso prévio proporcional por meio da Lei n. 12.506/11, publicada em 13 de outubro de 2011 no Diário Oficial da União.
2 REVISÃO DE LITERATURA
2.1 CONTAGEM DO PRAZO
Quanto a contagem do prazo do aviso prévio proporcional o Ministério do Trabalho Emprego, com a intenção de orientar os operadores de direito e demais servidores da Justiça Trabalhista, expediu o Memorando Circular nº 10/2011.
O primeiro entendimento exposto pelo Ministério do Trabalho no Memo. nº 10/2011 foi que até o primeiro ano trabalhado o empregado contaria com o aviso prévio de 30 (trinta) dias. Após o primeiro ano, para cada ano de contrato seriam acrescidos 3 (três) dias de serviço, sendo limite máximo de 60 (sessenta) dias. Portanto, a duração máxima do aviso prévio seria de 90 (noventa) dias, se não houvesse acordo ou convenção coletiva que aumentasse o aviso relativo ao primeiro ano do contrato.
Parte da doutrina considerava que como a lei não mencionava fração de ano, deveriam ser considerados apenas os anos trabalhados cheios para o computo da proporcionalidade do aviso prévio.
Alguns autores chegam a considerar que a Nota Técnica do Ministério do Trabalho e Emprego é ineficaz, pois extrapola seus limites de competência ao usurpar o papel do legislador. Para Vólia Bomfim (2012, p. 1091) “o executivo não poder de legislar, pois tal competência é do poder legislativo”.
Contudo, a partir da Nota Técnica nº 184 de 07 de maio de 2012, emitida pelo MTE, o entendimento quanto à contagem do prazo foi modificada, a partir da superação do primeiro ano completo trabalhado na mesma empresa, já haverá o computo dos três dias de aviso prévio proporcional, diferentemente do entendimento contido anteriormente.
Logo, se o trabalhador prestou serviços durante 1 (um) ano e 2 (dois) meses terá direito ao acréscimo de três dias ao seu aviso prévio, a contrario sensu do primeiro entendimento do MTE, que só concedia o benefício a partir do segundo ano completo de serviços prestados. Não podendo a progressão ser inferior a 3 (três) dias por cada ano.
Antes mesmo da mudança de entendimento pela Nota Técnica nº 184 do MTE esse posicionamento já vinha sendo adotado majoritariamente pela doutrina. Amauri Nascimento e Túlio Mansoni (2012, p. 10) concordam com o posicionamento acima destacado quando afirmam que:
Em nosso entender, o termo “por ano de serviço” expresso na lei refere-se ao acréscimo dos 3 (três) dias ao fim de cada ano plenamente completado. Dessa forma, devem incluídos no direito do aviso prévio do empregado apenas os anos inteiros decorridos de serviço, ignorando os dias ou meses trabalhados [...] a proporcionalidade foi fixada a partir do módulo anual, não havendo fundamento para uma interpretação que fracione este critério legal.
Seguem esse entendimento, ainda, Aluska Silva e Flaviana Costa, acompanhando a maioria da doutrina sobre o assunto (2012, p. 238):
Desta forma, o trabalhador com mais de 1(um) ano de casa terá direito ao aviso prévio proporcional, se for demitido sem justa causa. Para cada ano trabalhado o funcionário vai ganhar mais 3 dias de aviso prévio, sendo assim o benefício pode chegar até 90 dias para quem trabalhar 20 anos na mesma empresa
É importante ressaltar que apesar de aparentemente pacificado o assunto ainda há vozes no sentindo contrário, como por exemplo, a doutrina de Vólia Bomfim Cassar (2010) que diverge desse entendimento quando afirma que os 3 (três) dias do aviso prévio proporcional serão computados àqueles trabalhadores que tenham a partir de 2 (dois) anos de trabalho, já àqueles com menos tempo que esse período farão jus apenas aos 30 (trinta) dias.
2.2 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE E A IRRETROATIVIDADE DO AVISO PRÉVIO PROPORCIONAL
Não há que se falar em retroatividade da lei 11.506/11 em relação aos contratos findos anteriores a 13 de outubro de 2011, ou seja, a data em que ocorreu sua publicação. Apenas após sua publicação é que poderá se exigir seu cumprimento, sob égide do art. 5º, II da Constituição Federal e do Princípio da Legalidade, fundamento do Estado Democrático de Direito, segundo o qual “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.
Dessa forma entende Vólia Bomfim Cassar, ao afirmar que (2012, p. 1090):
Só é devido o aviso prévio proporcional ao tempo de serviço aos contratos extintos após a data de vigência da Lei nº 12.506/2011, pois as leis não têm efeito retroativo e não podem atingir situações já consumadas antes de sua existência e eficácia.
Em relação à retroatividade da lei, esta não é regra no ordenamento jurídico brasileiro, mas exceção. No presente caso não se aplica a regra irretroatividade, respeitando o ato jurídico perfeito, uma vez que os contratos de trabalhos finalizados anteriormente ao aviso prévio proporcional respeitaram a legalidade de seu tempo (Princípio tempus regit actum), sendo imutáveis em relação aos atos realizados com boa-fé e dentro dos requisitos legais.
2.3 SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
Na suspensão há uma paralisação temporária do contrato de trabalho que é possível, apesar do principio da continuidade do contrato de trabalho, em algumas hipóteses trazidas por lei, “mesmo não havendo prestação de serviço pelo trabalhador, o vínculo empregatício fica mantido” (SANTOS; CORREIA, 2012, p. 204). Não há qualquer pagamento de salário, nem é computado como tempo de serviço.
Um exemplo de suspensão do contrato de trabalho é a aposentadoria por invalidez[2] e o auxílio doença[3], em ambos os casos o empregador não custeia o afastamento do empregado, sendo este ônus da Previdência Social, a partir do décimo sexto dia de afastamento.
Apesar de não haver o pagamento de salários, nem a contraprestação do trabalhador com sua mão de obra, será conservado o vínculo de emprego, e ao cessar as condições de suspensão do contrato, este retornará ao momento da em que foi suspenso.
Nesse caso, indaga-se sobre a contagem do tempo de suspensão para efeitos da contagem dos anos trabalhados no aviso prévio proporcional. Ora, se o contrato de trabalho quando suspenso não será considerado para efeitos de tempo de serviço, logo não há que se considerar este tempo para a contagem do aviso prévio proporcional.
A lei fala, em seu art. 1º, Parágrafo Único, que “serão acrescidos 3 (três) dias por ano de serviço prestado na mesma empresa”, com isso deve ser reputado à contagem o tempo de serviço efetivamente trabalhado, e não o tempo do contrato de trabalho do seu termo inicial ou final como um todo.
3 METODOLOGIA
Para realizar este trabalho foi utilizada a pesquisa bibliográfica, com a intenção de aprofundar os conhecimentos sobre o tema na doutrina e principalmente na jurisprudência analisando as súmulas e orientações jurisprudenciais do Tribunal Superior do Trabalho, bem como a lei, com destaque para a Lei nº 12.506 de 2011.
O referencial teórico traz no seu bojo os tópicos controversos e relevantes sobre o tema que ensejam discussão, e durante o decorrer do trabalho expõe soluções e explica o assunto de maneira detalhada.
4 RESULTADOS
A doutrina já havia pacificado o tema mesmo antes do Ministério do Trabalho e Emprego expor sua última Nota Técnica no qual explica detalhadamente a forma de aplicação do aviso prévio proporcional hoje utilizada. Dessa forma, quanto a aplicação do instituto, apesar das calorosas discussões que foram emanadas a partir da criação tardia da Lei nº 12.506, já restou pacificado sua melhor forma de aplicação.
5 CONCLUSÃO
Dessa forma, a nova lei com o tempo vai se amoldando ao ordenamento jurídico, e as questões que suscitam dúvidas ou polêmicas, aos poucos vão sendo esclarecidas e reguladas pelos tribunais e pela doutrina.
Felizmente, o Poder Legislativo despertou de sua inércia, um tanto quanto habitual, e regulou sobre o tema antes que o Supremo Tribunal Federal o fizesse. Circunstância cada vez mais comum, principalmente em relação a temas polêmicos e que demandam posicionamento político.
Apesar de trazer um texto sucinto, as indagações que surgiram após a criação da Lei nº 12.506, são facilmente esclarecidas com uma interpretação sistemática das principais diretrizes do Direito Trabalhista. De forma que a
Lei do aviso prévio proporciona trouxe um avanço às garantias e à proteção aos direitos do trabalhador.
O Ministério do Trabalho e Emprego ao retificar seu entendimento sobre a aplicação da contagem do prazo beneficiou o trabalhador, uma vez que as relações de trabalho que ultrapassem um ano completo para o mesmo empregador – e não mais a partir do segundo ano como afirmava o Memo. nº 10/2011 do MTE – já terão computados os três dias do aviso prévio proporcional.
REFERÊNCIAS
CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 6. ed. Niterói: Impetus, 2012.
COSTA, Flaviana Surama Delgado da; SILVA, Aluska Suyanne Marques da. Lei 12.506/2011: As novas regras do aviso prévio. ORBIS, vol. 3., n. 1. Disponível em: < http://www.cesrei.com.br/ojs/index.php/orbis/article/viewFile/146/79>. Acesso em: 23 abr 2014.
NASCIMENTO; Amauri Mascaro; MASSONI, Túlio de Oliveira. O aviso prévio proporcional. LTr, vol. 76, n. 1, jan/2012. Disponível em: < http://www.trt7.jus.br/escolajudicial/files/ artigos/aviso%20pr%C3%A9vio%20proporcional.pdf>. Acesso em 23 abr 2014.
OLIVEIRA, Marcelo Henrique Matos. Considerações sobre a eficácia das normas constitucionais programáticas. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2433, 28 fev. 2010. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/14422>. Acesso em: 22 abr. 2014.
SANTOS, Élisson Miessa dos; CORREIA, Henrique. Súmulas e orientações jurisprudenciais do TST organizadas por assunto. Jus Podivm: Salvador, 2012.
[1] Art. 487, §1º da CLT. Não havendo prazo estipulado, parte que, sem justo motivo, quiser rescindir o contrato deverá avisar a outra da sua resolução com antecedência mínima de: (...) §1º - A falta do aviso prévio por parte do empregador dá ao empregado o direito aos salários correspondentes ao prazo do aviso, garantida sempre a integração desse período no seu tempo de serviço.
[2] Súmula nº 160 do TST. Aposentadoria por invalidez. Cancelada a aposentadoria por invalidez, mesmo após 5 anos, o trabalhador terá direito a retornar ao emprego, facultado, porém, ao empregador, indenizá-lo na forma da lei.
[3] Orientação Jurisprudencial nº 375 da SDI-1 do TST. Auxílio-doença. Aposentadoria por invalidez. Suspensão do contrato de trabalho, em virtude da percepção do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez, não impede a fluência da prescrição qüinqüenal, ressalvada a hipótese de absoluta impossibilidade de acesso ao Judiciário.
Advogada e Pós-Graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho e Direito Constitucional.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MELO, Liana Holanda de. A exegese do aviso prévio proporcional a partir da Nota Técnica nº 184 do Ministério do Trabalho e Emprego Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 mar 2015, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/43561/a-exegese-do-aviso-previo-proporcional-a-partir-da-nota-tecnica-no-184-do-ministerio-do-trabalho-e-emprego. Acesso em: 23 dez 2024.
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