Resumo: O presente artigo pretende analisar e apontar os elementos constitutivos de um dos institutos civis com maior visibilidade na atualidade, a responsabilidade civil contratual. Apresentando conceitos chaves que permitem o entendimento satisfatório da temática. A apresentação de pareceres doutrinários buscará a elucidação dos elementos focais e caracterizadores da responsabilidade civil contratual. Discorrer-se-á sobre as situações que tornam o agente da ação ou omissão que causa dano inimputável ou com imputação reduzida.
Palavras-chave: Responsabilidade civil; Contratos; Reparação.
Sumário: Introdução; 1. Da responsabilidade civil contratual; 2. Das excludentes da responsabilidade civil; Conclusão; Referências Bibliográficas.
Introdução
Na esfera jurídica o verbete “responsabilidade” pode ser entendido como o nascimento da obrigação de reparação pela produção de dano causado a um terceiro, por conduta omissiva ou comissiva.
Sobre a temática versa Gagliano e Pamplona Filho[1]:
“Para o Direito, nada mais é, portanto, que uma obrigação derivada – um dever jurídico sucessivo – de assumir as consequências jurídicas de um fato, consequências essas que podem variar (reparação dos danos e/ou punição pessoal do agente lesionante) de acordo com os interesses lesados”.
Ainda na tarefa de conceituar juridicamente “responsabilidade” valemo-nos da lição de Stoco[2]:
“Como gênero, implica sempre exame de conduta voluntária violadora de um dever jurídico. Sob tal premissa, a responsabilidade pode ser de muitas naturezas, embora ontologicamente o conceito seja o mesmo”.
No que concerne à responsabilidade civil especificamente, tema do presente artigo acadêmico, discorre Cavalieri[3]:
“Na precisa lição do professor Ricardo Pereira Lyra, ‘o dever jurídico pode surgir da lei ou da vontade dos indivíduos. Neste último caso, os indivíduos criam para si deveres jurídicos, contraindo obrigações em negócios jurídicos, que são contratos e as manifestações unilaterais de vontade.
Se a transgressão se refere a um dever gerado em negócio jurídico, há um ilícito negocial comumente chamado ilícito contratual, por isso que mais frequentemente os deveres jurídicos têm como fonte os contratos.
Se a transgressão pertine a um dever jurídico imposto pela lei, o ilícito é extracontratual, por isso que gerado fora dos contratos, mais precisamente fora dos negócios jurídicos.
Ilícito extracontratual é, assim, a transgressão de um dever jurídico imposto pela lei, enquanto o ilícito contratual é violação de dever jurídico criado pelas partes no contrato’”.
Pelo já exposto podemos constatar que, no Direito civil brasileiro, a responsabilidade divide-se, principalmente, em duas categorias: responsabilidade civil contratual e responsabilidade civil extracontratual.
A primeira guarda relação com a violação de uma obrigação de um negócio jurídico previamente acordado entre as partes.
LecionaGagliano e Pamplona Filho[4] sobre a responsabilidade civil contratual:
“A vítima e o autor do dano já tenham-se aproximado anteriormente e se vinculado para o cumprimento de uma ou mais prestações, sendo a culpa contratual a violação de um dever de adimplir, que constitui justamente o objeto do negócio jurídico”.
Já a última consiste na violação de uma obrigação imposta por um dever geral do direito ou pela própria lei, inexistindo, portanto, acordo pré-estabelecido entre aquele que lesa e aquele que sofre o dano, consistindo na inobservância da diretriz geral de não lesar terceiros.
Sobre a responsabilidade civil extracontratual versa Lopes[5]:
“A responsabilidade extracontratual, por seu turno, refere-se à prática de um ato ilícito que origine dano a outrem, sem que possua, contudo, qualquer vínculo contratual entre as partes, e, uma vez que compete à parte lesada comprovar, além do dano, a culpa e o nexo de causalidade entre ambos, existe uma dificuldade para comprovação da mesma”.
No presente artigo nos ateremos à responsabilidade civil contratual, a qual passamos a dissertar.
1. Da responsabilidade civil contratual
Como já exposto a responsabilidade civil contratual é aquela na qual, a priori do dano causado, já existia um vínculo jurídico consolidado entre as partes, através de um contrato.
Sua existência encontra-se estabelecida no Código Civil de 2002, em seu artigo 389:
“Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”.
Nesse mesmo diapasão apontam, os já citados, Gagliano e Pamplona Filho[6]:
“Com efeito, para caracterizar a responsabilidade civil contratual, faz-se mister que a vítima e o autor do dano já tenham se aproximado anteriormente e se vinculado para o cumprimento de uma ou mais prestações, sendo a culpa contratual a violação de um dever de adimplir, que constitui justamente o objeto do negócio jurídico, ao passo que, na culpa aquiliana, viola-se um dever necessariamente negativo, ou seja, a obrigação de não causar dano a ninguém”.
Necessário faz-se, para fins elucidativos, conceituar o termo “contrato”, cerne da caracterização da responsabilidade civil aqui discutida.
Nas palavras de Diniz[7]:
“Contrato é o acordo de duas ou mais vontades, na conformidade da ordem jurídica, destinado a estabelecer uma regulamentação de interesses entre as partes, com escopo de adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial”.
Presente o contrato, responsável por externar no ordenamento jurídico as vontades acordadas entre as partes, é necessário que haja o descumprimento das obrigações estabelecidas para que nasça a responsabilidade civil.
E para que haja a gênese da responsabilidade civil são necessários que alguns pressupostos façam-se presentes.
Os pressupostos consubstanciadores da obrigação de reparo decorrente da responsabilidade civil são a ação ou omissão do agente e sua culpabilidade, o dano e o nexo causal.
Sobre o ato ou omissão do agente afirma Stoco[8]:
“O elemento primário de todo ilícito é uma conduta humana e voluntária no mundo exterior.
Esse ilícito, como atentando a um bem juridicamente protegido, interessa à ordem normativa do Direito justamente porque produz um dano. Não há responsabilidade sem um resultado danoso.
Mas a lesão a bem jurídico cuja existência se verificará no plano normativo da culpa, está condicionada à existência, no plano naturalístico da conduta, de uma ação ou omissão que constitui a base do resultado lesivo.
Não há responsabilidade civil sem determinado comportamento humano contrário à ordem jurídica.
Ação e omissão constituem, por isso mesmo, tal como no crime, o primeiro momento da responsabilidade civil”.
Em semelhante linha discorre Rodrigues[9]:
“A indenização pode derivar de uma ação ou omissão individual do agente, sempre que, agindo ou se omitindo, infringe um dever legal, contratual, ou social, isto é, se praticado com abuso de direito”.
Dessa feita, podemos concluir que, o primeiro dos pressupostos para a responsabilização civil é através de conduta comissiva ou omissa que dá origem ao dano.
Acerca da culpabilidade do agente comenta Diniz[10]:
“A responsabilidade contratual funda-se na culpa, entendida em sentido amplo, de modo que a inexecução culposa da obrigação se verifica que pelo seu descumprimento intencional, havendo vontade consciente do devedor de não cumprir a prestação devida, com o intuito de prejudicar o credor (dolo), quer pelo inadimplemento do dever jurídico, sem a consciência da violação, sem a intenção deliberada de causar dano ao direito alheio, havendo apenas um procedimento negligente, imprudente ou omisso (culpa), prejudicial ao credor. Sendo a culpa, nesse sentido amplo, que abrange o dolo e a culpa em sentido estrito, o principal fundamento da responsabilidade contratual, o dever de indenizar apenas surgirá quando o inadimplemento for causado por ato imputável ao devedor. Daí a necessidade de se apreciar o comportamento do obrigado, a fim de se verificar, para a exata fixação de sua responsabilidade, se houve dolo, negligência, imperícia ou imprudência de sua parte”.
O segundo pressuposto é o dano em si. Consiste na lesão ao direito de terceiro, podendo ser patrimonial ou extrapatrimonial, através do inadimplemento contratual.
Sobre dano explana Bittar[11]:
“(...) o dano é o prejuízo ressarcível experimentado pelo lesado, traduzindo-se, se patrimonial, pela diminuição patrimonial sofrida por alguém em razão de ação deflagrada pelo agente, mas pode atingir elementos de cunho pecuniário e moral. O dano pode referir-se a pessoa ou aos bens de terceiro (inclusive de direitos), nos dois sentidos enunciados, patrimonial e moral – e em ambos – mas, especialmente nessa última hipótese, deve ser determinado consoante critério objetivo (...)”.
Pertinentemente contribui para a definição de “dano” Venosa[12]:
“(...) consiste no prejuízo sofrido pelo agente.
Pode ser individual ou coletivo, moral ou material, ou melhor, econômico e não econômico”.
De tal forma, conclui-se que dano é aquilo que diminui ou deteriora por completo um bem patrimonial ou extrapatrimonial juridicamente salvaguardado.
Por fim, o último elemento a ser analisado é o nexo causal, que, de maneira sincopada, consiste no elo de ligação entre a ação ou omissão do agente, culminando no dano patrimonial ou extrapatrimonial de terceiro.
Sobre a natureza do nexo causal discorre Gomes[13]:
“(...) para o ilícito ser fonte da obrigação de indenizar, é preciso uma relação de causa e efeito entre o fato e o dano. A essa relação chama-se nexo causal”.
Em mesma linha de raciocínio versa Lopes[14]:
“Uma das condições essências à responsabilidade civil é a presença de um nexo causal entre o fato ilícito e o dano por ele produzido. É uma noção aparentemente fácil e limpa de dificuldade. Mas se trata de mera aparência, porquanto a noção de causa é uma noção que se reveste de um aspecto profundamente filosófico, além das dificuldades de ordem prática, quando os elementos causais, os fatores de produção de um prejuízo, se multiplicam no tempo e no espaço”.
Assim, concluiu-se que, o nexo causal é o elemento lógico capaz de ligar a conduta ilícita do agente ao dano, econômico ou não econômico, sentido por terceiro, que permite a responsabilização pela reparação.
2. Das excludentes da responsabilidade civil
Algumas situações permitem que, apesar de haver conduta do agente, dano e nexo causal, impera a isenção da responsabilidade civil. Passamos a tratar de tais situações.
“Admite-se como causa de isenção de responsabilidade o que se chama de culpa exclusiva da vítima. Com isso, na realidade, se alude a ato ou fato exclusivo da vítima, pela qual fica eliminada a causalidade em relação ao terceiro interveniente no ato danoso. É fácil de ver a vantagem que resulta de tal concepção, mais ampla que a da simples culpa, mediante um simples exemplo. Não responde, decerto, uma empresa de carris urbanos, pela morte do indivíduo que se atira voluntariamente sob um bonde (...).”
“Portanto, concluindo quanto a esta parte, poder-se-ia dizer que o fato de terceiro, pra excluir integralmente a responsabilidade do agente causador do dano, há que se vestir de características semelhantes às do caso fortuito, sendo imprevisível e irresistível. Nessa hipótese, não havendo relação de causalidade, não há responsabilidade pela reparação”.
“Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.
Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não eram possíveis evitar ou impedir”.
Considerações finais
Neste artigo, vimos que, a responsabilidade civil contratual tem sua origem atrelada ao inadimplemento de disposições previamente acordadas pelas partes.
Analisamos os pressupostos intrínsecos à responsabilidade civil de modo geral e com enfoque em sua aplicação na modalidade contratual.
Após discorrermos sobre elementos centrais, conceitos e disposições em textos legais vimos as hipóteses que isentam o agente da responsabilidade civil, mostrando que, embora seja instituto de força ímpar, o mesmo não é inquestionável.
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[1]GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: (abrangendo o Código de 1916 e o novo Código Civil). 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva 2003. 3 v, p. 3.
[2] STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial. 2. ed. ver. e amp. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p.48.
[3] CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 6ª ed., revista, aumentada. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 38
[4]GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: (abrangendo o Código de 1916 e o novo Código Civil). 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva 2003. 3 v, p. 19.
[5] LOPES, Lissandra de Ávila. A responsabilidade pós-contratual no direito civil. In: Revista Eletrônica do Curso de Direito da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Rio Grande do Sul, v.1, n. 3, pp. 44-45, nov. 2006. Disponível em: <http://cascavel.ufsm.br/revistas/ojs2.2.2/index.php/revistadireito/article/viewFile/6782/pdf>. Acesso em: 24jul. 2014.
[6]GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: (abrangendo o Código de 1916 e o novo Código Civil). 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva 2003. 3 v, p. 19-20.
[7] DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. Vol. III. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p.24.
[8] STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial. 3ª ed. rev. e amp.. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1997, p. 54.
[9] RODRIGUES, Rodrigo. Direito civil. Vol. IV. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 1983, p.4
[10]DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 23. ed. reformulada. São Paulo: Saraiva, 2009. v.7, p. 246.
[11] BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade civil nas atividades nucleares. Tese apresentada ao curso de livre-docência para o Departamento de Direito Civil da Faculdade de Direito da USP, 1982, p. 64.
[12]VENOSA, Sílvio de Salvo. Novo código civil: texto comparado, código civil de 2002, código civil de 1916. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 33.
[13] GOMES, Orlando. Obrigações. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p.273.
[14]SERPA LOPES, Miguel Maria de. Curso de direito civil: fontes contratuais das obrigações e responsabilidade civil. v. 5; 5ª ed., rev. e atual. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001, p. 218.
[15]AGUIAR DIAS, José de. Da responsabilidade civil. 9ª ed., revista e atualizada. Rio de Janeiro: Forense, 1994, v. 2, p. 693.
[16]RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil. v. 4;19ª ed.; São Paulo: Saraiva, 2002, p. 173.
Advogada (graduada na Faculdade Municipal de Direito de Franca e pós-graduanda em Contratos pelo INAGE - USP Ribeirão Preto/SP).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PAIM, Eline Luque Teixeira. Responsabilidade civil contratual Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 mar 2015, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/43565/responsabilidade-civil-contratual. Acesso em: 23 dez 2024.
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