Resumo: O artigo tem por objetivo analisar a constitucionalidade declarada pelo Supremo Tribunal Federal no Habeas Corpus de nº 122.694-SP da restrição à aplicação da prescrição retroativa em data anterior ao oferecimento da denúncia conforme a teoria do garantismo penal. É certo que essa limitação da prescrição retroativa atenta contra um direito fundamental de todo cidadão que é ser julgado dentro de um prazo razoável, servindo aqui a prescrição penal em todas as suas espécies como uma forma de garantia desse direito, apresentando assim a decisão do STF na sua declaração de constitucionalidade um posicionamento antigarantista.
Palavras-Chave: Garantismo Penal; Prescrição; Prescrição Retroativa
Abstract:. The article aims to analyze the constitutionality declared by the Supreme Court in the Habeas Corpus nº 122 694-SP restricting the application of retroactive prescription from a date prior to the offering of the complaint as the theory of criminal garantismo. It is true that this limitation of attentive retroactive prescription against a fundamental right of every citizen who is to be tried within a reasonable time, serving the criminal prescription here in all its species as a way to guarantee this right, thus presenting the Supreme Court decision on its constitutionality statement an antigarantista positioning.
Keywords: Criminal guarantee; Prescription, Prescription retroactive
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1. A LEI Nº 12.234/2010 E O HC 122.964-SP. 2. CONCEITUANDO A TEORIA DO GARANTISMO PENAL. 3. PRESCRIÇÃO RETROATIVA É UMA GARANTIA CONSTITUCIONAL. 4. ANÁLISE DA INCONSTITUCIONALIDADE DA RESTRIÇÃO, À LUZ DA TEORIA GARANTISTA. CONSIDERAÇÕES FINAIS REFERÊNCIAS DAS FONTES CITADAS.
INTRODUÇÃO
Após a pratica de um delito a sociedade espera que o Estado apure o fato, e uma vez identificado o culpado que este seja punido. O decurso de um tempo muito longo entre o fato criminoso e a punição gera uma sensação de impunidade para a sociedade, bem como um longo tempo onde a pessoa é investigada e processada, mesmo que ao final absolvida, já serve como uma espécie de punição. Para tanto apresenta a prescrição penal como uma forma de tutelar e descaso estatal na rápida solução de um processo penal
Com este artigo pretende-se apresentar uma modesta contribuição ao debate da revogação parcial da prescrição retroativa, através, em síntese, da verificação da constitucionalidade da Lei nº 12.234/2010 sob uma análise da teoria do garantismo penal.
Para alcançar o resultado pretendido foram utilizados o método indutivo e a técnica da pesquisa bibliográfica.
1 A LEI Nº 12.234/2010 E O HC 122.964-SP
A prescrição da pretensão retroativa historicamente somente poderia ser aplicada até a data do recebimento da denúncia. Após a reforma da parte geral do Código Penal de 1984, a prescrição retroativa passou a incidir também no lapso temporal anterior ao recebimento da denúncia ou queixa até a data da consumação do crime.[1]
Entendeu por bem o legislador da reforma do Código Penal punir o Estado pela morosidade na investigação de um delito aplicando a prescrição retroativa também no lapso temporal entre o recebimento da denúncia e a consumação de delito.
Na contramão da reforma o Projeto de Lei nº. 1.383/2003, de autoria do Deputado Antônio Carlos Biscaia, que alterou significativamente a prescrição penal no Brasil, passou a tramitar na Câmara dos Deputados em 2 de julho de 2003. O seu objetivo inicial era o de extinguir a chamada prescrição retroativa, uma vez que o texto original estabelecia como termo inicial da prescrição retroativa data imediatamente posterior à da publicação da sentença ou acórdão.[2]
O projeto detinha como a grande fundamentação para a sua aprovação a busca por justiça, em especial os delitos contra a propriedade e de corrupção, onde não raras vezes (pela pena ser relativamente pequena) era corriqueira a prescrição penal.
A prática tem demonstrado, de forma inequívoca, que o instituto da prescrição retroativa, consigne-se, uma iniciativa brasileira que não encontra paralelo em nenhum outro lugar do mundo, tem se revelado um competentíssimo instrumento de impunidade, em especial naqueles crimes perpetrados por mentes preparadas, e que, justamente por isso, provocam grandes prejuízos seja à economia do particular, seja ao erário, ainda dificultando sobremaneira a respectiva apuração.
É sabido que essa casta de crimes (p. ex. o estelionato e o peculato) reclama uma difícil apuração, em regra exigindo que as autoridades se debrucem sobre uma infinidade de documentos, reclamando, ainda, complexos exames periciais, o que acaba redundando, quase sempre, em extinção da punibilidade, mercê da prescrição retroativa, que geralmente atinge justamente o período de investigação extra-processual.
Pior, os grandes ataques ao patrimônio público, como temos visto ultimamente, dificilmente são apurados na gestão do mandatário envolvido, mas quase sempre acabam descortinados por seus sucessores. Assim, nesse tipo de crime específico, quando apurada a ocorrência de desfalque do erário, até quatro anos já se passaram, quando, então, tem início uma intrincada investigação tendente a identificar os protagonistas do ilícito penal, o que pode consumir mais alguns anos, conforme a experiência tem demonstrado.
Outrossim, o instituto em liça é potencial causa geradora de corrupção, podendo incitar autoridades a retardar as investigações, providências, ou decisões, a fim de viabilizar a causa extintiva da punibilidade.[3]
O interessante é que no próximo parágrafo da fundamentação do Projeto de Lei nº 1.383/2003 há um outro argumento que busca a extirpação da prescrição retroativa almejada pelo Deputado Antônio Carlos Biscaia do PT/RJ.
Por último, a pena diminuta de vários crimes, aliado ao grande número de feitos que se acumulam no Poder Judiciário – considerando-se, inclusive, a possibilidade de recursos até os Tribunais Superiores, bem como o entendimento de que as suas decisões confirmatórias da condenação não interrompem o curso do prazo prescricional, tornando tais crimes, na prática, não sujeitos a qualquer punição, o que seguramente ofende o espírito da lei penal.
Desse modo, o dispositivo de lei mencionado tem beneficiário determinado: o grande fraudador ou o criminoso de alto poder aquisitivo, capaz de manipular autoridades e normas processuais, por meio de infindáveis recursos.
Ademais, o instituto da prescrição retroativa, além de estar protagonizando uma odiosa impunidade, cada vez mais tem fomentado homens mal intencionados a enveredarem pelo ataque ao patrimônio público, cônscios deque se eventualmente a trama for descoberta a justiça tardará e, portanto, não terá qualquer efeito prático.[4]
A principal medida que fundamenta o projeto é a busca por impunidade, contudo o próprio autor deixa claro que essa impunidade é também reflexo da ausência de estrutura digna frente a atual demanda do Poder Judiciário.
Seguindo a tramitação regular, o projeto recebeu parecer favorável pela constitucionalidade da Comissão de Constituição e Justiça, sendo que quando da apresentação ao plenário para julgamento houve a propositura de 8 emendas. Contudo a emenda apresentada pelo Deputado Fernando Coruja PPS/SC merece relevância, pois esta que assegurava a existência da prescrição retroativa, contudo limitava a sua aplicação a determinado período na persecução penal (até o recebimento da denúncia ou queixa).[5]
O texto foi encaminhado ao Senado, onde através de emendas a redação original extirpando do mundo jurídico a prescrição retroativa foi aprovado. Diante da alteração no Senado o Projeto retornou a Câmara, onde a emenda recebeu parecer negativo[6] da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, sendo aprovado em definitivo o texto aprovado pelos Deputados.[7]
De toda a regular tramitação do Projeto de Lei nº 1.383/2003 acabou por alterar significativamente a prescrição penal no Brasil, em especial a prescrição retroativa e o prazo prescricional para infrações penais punidas com uma pena menor que um ano.
Com a alteração promovida pela Lei nº 12.234/2010 todo e qualquer crime punido com pena menor de um ano de prisão prescreverá em 3 anos, ressalta-se que até a alteração legislativa o prazo prescricional era de 2 anos. Essa alteração acaba incidindo sobre toda e qualquer espécie de prescrição, seja da pretensão punitiva ou executória.
Contudo a alteração no artigo 110 do Código Penal (que é o objeto de estudo deste artigo) apresenta-se como mais invasiva aos direitos fundamentais do cidadão, visto que não elimina por completo a prescrição retroativa como era o projeto inicial, contudo limita a sua aplicação em data anterior ao oferecimento da denúncia ou da queixa.
A prescrição retroativa apresenta-se também como uma forma de limitação do poder estatal, e a imposição realizada pela Lei nº 12.234/2010 causa um sério retrocesso em um direito fundamental, principalmente porque fundamentada na cessação da impunidade causada pela demora estatal na resolução de uma investigação policial e um processo penal dentro de um tempo razoável.
Em dezembro de 2014 o Supremo Tribunal Federal foi instado a se manifestar sobre a constitucionalidade da redução da aplicação da prescrição da pretensão punitiva na sua forma retroativa em data anterior ao recebimento da denúncia.
Foi requerido pedido de habeas corpus (HC 122.694-SP) pela Defensoria Pública da União para o paciente Bruno Leite Papa, figurando como autoridade coatora o Superior Tribunal Militar que não reconheceu a ocorrência da prescrição e consequentemente a extinção da punibilidade do paciente.
O caso que foi analisado pelo Supremo versava sobre uma condenação na primeira instância da justiça castrense, onde foi imposta a pena de um ano de prisão por furto simples praticado por um militar. Tendo em vista a aplicação da sentença condenatória e o consequente trânsito em julgado, verificando a prescrição em sua modalidade retroativa, restou ultrapassado o prazo prescricional entre da data do fato e do recebimento da denúncia.
Contudo o Superior Tribunal Militar não reconheceu a figura da prescrição penal retroativa[8] sob o argumento da alteração promovida pela Lei nº 12.234/2010, fato este que justificou levar o caso a Corte superior para a verificação da validade e legalidade da decisão e de forma incidental que fosse declarada a inconstitucionalidade da limitação da redução da incidência da prescrição penal.
No dia 10/12/2014 foi realizado o julgamento do HC 122.694-SP, sendo que coube ao Ministro Dias Toffoli a relatoria. Em seu voto o relator apresenta inicialmente um histórico da prescrição retroativa, e também um comparativo deste instituto em outros Estados, e conclui pela constitucionalidade da Lei nº 12.234/10 sob 4 principais argumentos.
Inicialmente o relator apresenta que a função do Direito Penal no Brasil seria a proteção dos bens jurídicos essenciais, e, em especial a convivência harmoniosa da sociedade, servindo ainda a punição do delito como uma função preventiva, seja ela específica (dirigida ao indivíduo que praticou o delito) ou a função preventiva geral (esta dirigida a todos da sociedade).[9]
Outro argumento rechaçado pelo Relator foi que a Lei nº 12.234/2010 ofenderia o princípio da dignidade da pessoa humana, pois segundo o seu voto a redução da aplicação da prescrição penal retroativa detém a função social de buscar uma maior efetividade da norma penal, cumprindo assim a finalidade do próprio Direito Penal.
Nesse contexto, assegurar-se a efetividade da execução de uma pena legalmente prevista e regularmente imposta, em processo no qual tenham sido respeitadas, dentre outras, as garantias constitucionais do juiz natural, do devido processo legal, da presunção de inocência, do contraditório e da ampla defesa, mediante sua imunização contra os efeitos retroativos da prescrição da pretensão punitiva entre a data do fato e o recebimento da denúncia ou queixa, não importa em violação à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF) e seu consectário, o princípio da humanidade das penas, cujo principal escopo é vedar a imposição de penas cruéis, degradantes, de trabalhos forçados, de caráter perpétuo ou de morte (art. 5º, XLVII, CF) e assegurar ao preso o respeito à sua integridade física e moral (art. 5º, XLIX, CF).[10]
Segundo o entendimento do Ministro Relator a restrição da prescrição da punitiva na sua forma retroativa em data anterior ao oferecimento da denúncia é adequado, e mais, é necessário e proporcional pois tem como fim almejado a busca de efetividade na norma penal, contribuindo com a cessação da impunidade.
Interessante argumento apresenta o Relator quando aponta que a redução da abrangência da prescrição retroativa ofende com menor intensidade o direito a liberdade do cidadão, e por conta disso apresenta-se correta a limitação perpetrada pelo legislador ordinário[11], contudo não aventa a alteração que também promoveu a mesma lei em análise (Lei nº 12.234/2010) quando ampliou de 2 para 3 anos o prazo prescricional para crimes que sejam punidos com pena menor que um ano.
Justifica ainda a sua posição sob o argumento de que frente ao avanço da criminalidade o Estado não possui meios para investigar tantos delitos (sem contabilizar a cifra negra[12]) justificando assim pautado na razoabilidade a limitação da atuação da prescrição retroativa durante a fase inquisitiva/administrativa do jus puniendi.
O Tribunal por maioria de votos denegou a ordem de habeas corpus e, por conseqüência, declarou a constitucionalidade da limitação da prescrição retroativa antes do recebimento da denúncia. Cumpre-se salientar que a decisão não foi unânime, pois o Ministro Marco Aurélio de Melo entendeu que uma falácia do Estado em não possuir estrutura para investigar um delito no prazo prescricional, não pode servir de argumento para restringir a aplicação da prescrição penal.
2 CONCEITUANDO A TEORIA DO GARANTISMO PENAL
Importante neste momento do estudo procurarmos conceituar o significado da teoria do garantismo penal defendida pelo Professor Luigi Ferrajoli, notadamente como herança do iluminismo, e baluarte da proteção das garantias do cidadão, em especial a liberdade.
A tarefa poderia ser fácil, principalmente frente à leitura do livro intitulado Direito e Razão, onde Ferrajoli apresenta e explica a teoria. E na falta de um conceito de Garantismo Penal, o autor traz três significados distintos.
De acordo com o primeiro significado:
“Garantismo” designa um modelo normativo de direito: precisamente, no que diz respeito ao direito penal, o modelo de “estrita legalidade” SG, próprio do Estado de direito, que sob o plano epistemológico se caracteriza como um sistema cognitivo ou de poder mínimo, sob o plano político se caracteriza como uma técnica de tutela idônea a minimizar a violência e maximizar a liberdade e, sob o plano jurídico, como um sistema de vínculos impostos à função punitiva do Estado em garantia dos direitos dos cidadãos. É consequentemente, “garantista” todo sistema penal que se conforma normativamente com tal modelo e que o satisfaz efetivamente.[13]
Assim, o Garantismo Penal é a segurança dos cidadãos que, em um Estado democrático de direito, onde o poder obrigatoriamente deriva do ordenamento jurídico, principalmente da Constituição, atua como um mecanismo para minimizar o poder punitivo e garantir, ao máximo, a liberdade dos cidadãos.
Ao analisarmos o segundo significado, este ocorre sob o enfoque da teoria do direito e crítica ao direito.
“Garantismo” designa uma teoria jurídica da “validade” e da “efetividade” como categorias distintas não só entre si, mas, também, pela “existência” ou “vigor” das normas. Neste sentido, a palavra garantismo exprime uma aproximação teórica que mantém separados o “ser” e o “dever ser” no direito; e, aliás, põe como questão teórica central, a divergência existente nos ordenamentos complexos entre modelos normativos (tendentemente garantistas) e práticas operacionais (tendente antigarantistas), interpretando-a com a antinomia – dentro de certos limites fisiológica e fora destes patológica – que subsiste entre validade (e não efetividade) dos primeiros e efetividade (e invalidade) das segundas.[14]
Esse significado é na realidade uma visão crítica do ordenamento que, na teoria poderá ter conotação garantista, mas na prática poderia adotar força diversa. Explicando este significado de garantismo proposto por Ferrajoli, Sergio Cademartori assinala que o garantismo detém indiscutivelmente contornos próprios, apesar de poder ser enquadrável no positivismo. A diferença entre normas “válidas”, “vigentes” e “eficazes” é denominada pelo próprio Ferrajoli como “juspositivismo dogmático”.[15]
Para o terceiro significado de garantismo penal, Ferrajoli traz a base, frente à filosofia do direito e crítica da política.
“Garantismo” designa uma filosófica política que requer do direito e do Estado o ônus da justificação externa com base nos bens e nos interesses dos quais a tutela ou a garantia constituem a finalidade. Neste último sentido, o garantismo pressupõe a doutrina laica da separação entre direito e moral, entre validade e justiça, entre ponto de vista interno e ponto de vista externo na valoração do ordenamento, ou mesmo entre o “ser” e o “dever ser” do direito. Equivale à assunção, para os fins da legitimação e da perda da legitimação ético-política do direito e do Estado, do ponto de vista exclusivamente externo.[16]
Diferentemente dos significados antes abordados, este terceiro significado não traz uma visão interna da teoria, mas sim obrigatoriamente externa. Continua a teoria em seu tom crítico, contudo sob outro aspecto de análise, mas agora através de uma perspectiva externa, ou seja, não analisada sob o ponto de vista normativo, ou do conflito entre normas, apresenta-se como uma crítica filosófica, laica, pautada na finalidade da teoria garantista.
Uma vez apresentados os significados elaborados acima, poderemos compor um quarto e único conceito da teoria do garantismo penal como uma política criminal onde prevalece a mínima intervenção do Estado no sistema normativo punitivo, pautado na validade da norma e na sua efetividade – de forma distinta e também, entre si – atuando como uma filosofia política externa que impõe ao Estado e ao direito, o ônus de buscar a finalidade da norma penal.
Serve então a teoria do garantismo penal, como um freio ideológico para a atuação indiscriminada do estado na liberdade do cidadão, devendo utilizar o seu poder punitivo como ultima ratio. Uma dessas limitações que sofre o poder punitivo estatal está na forma como o Direito é corporificado em nosso sistema normativo.
3 PRESCRIÇÃO RETROATIVA É UMA GARANTIA CONSTITUCIONAL
Os direitos fundamentais sob a ótica da teoria do garantismo penal, mais especificadamente os direitos de liberdade, correspondem na verdade a uma garantia primeiramente em relação ao Estado (que se materializam através de proibições e de obrigações positivas). A enunciação de um direito fundamental impõe um conjunto de proibições ao Estado, inclusive, proibições que não possuem conteúdo predeterminado e nem mesmo determinável a priori.[17]
Uma reformulação da fundação teórica das categorias dos direitos fundamentais exigiria não apenas a sua originária distinção dos outros direitos subjetivos, mas, também, a sua decomposição analítica, voltada a identificar, a redefinir e a distinguir as diversas figuras colhidas nela. Também a categoria dos direitos fundamentais é um recipiente no qual tomaram lugar figuras ligadas pelo seu nexo com a igualdade e com os valores das pessoas, mas, de resto, em tudo heterogêneas: do direito à vida ao de liberdade pessoal; dos diversos direitos de liberdade – de opinião, de expressão, de imprensa, de culto, de reunião, de associação, de circulação e de greve – à inviolabilidade do domicílio e sigilo de correspondência; dos direitos políticos aos direitos civis da capacidade jurídica e da capacidade de agir; dos direitos sociais individuais – ato trabalho, à subsistência, à saúde, à casa, à instrução e a um adequado salário – até aos direitos sociais coletivos, como direito à paz, ao ambiente, à informação e à autodeterminação.[18]
Ferrajoli pontua ainda que os direitos fundamentais, em contraposição a outras situações jurídicas, exigem a criação de garantias necessárias à satisfação do igual valor das pessoas.[19]
Tudo isso torna ainda mais insensata a associação entre direitos fundamentais e outra figuras de direitos ou prerrogativas, sugerida pelas mais que globais categorias dos “direitos subjetivos” e “situações jurídicas”. A radical diferença entre estrutura dos direitos fundamentais em relação a todas as situações jurídicas de poder e dever faz, ao invés, dos primeiros o campo do não poder, onde tomam forma e se desenvolvem as identidades, as carências e os valores – pessoais e sociais – que por sua tramitação exigem igual tutela e satisfação. Mas o faz, outrossim, como se verá, o campo dos contra-poderes, ou seja, dos instrumentos de tutela, de autonomia e de conflito – individual ou coletivo - atribuídos a sujeitos mais frágeis e privados de poderes contra o jogo, de outro modo, livre e desenfreado dos poderes públicos e privados e das conexas desigualdades.[20]
Para a teoria do garantismo penal, direitos fundamentais servem na verdade como um suporte e garantia dos demais direitos previstos para os cidadãos, servem como um instrumento com os quais o direito assegura certo número de liberdades e prerrogativas, que são precisados, definidos ou instituídos pelo próprio Direito.[21]
Uma vez esclarecido o que vem a ser um direito fundamental, é imperioso reforçar que nos casos de crimes imprescritíveis[22] elaborados pelo próprio Poder Constituinte Originário acabou conferindo um status jurídico qualificado à prescrição (conduzindo-a a um patamar de jusfundamentalidade, de garantia constitucional).
É possível afirmar isto porque nestes dispositivos constitucionais, houve a especial preocupação de que identificar as hipóteses específicas que afastariam a regra geral de prescritibilidade dos delitos já que, nestas situações excepcionais, a constituição afirma a imprescritibilidade do jus puniendi. Trata-se, pois, inegavelmente, de uma garantia de todo cidadão.
Portanto, o direito à prescrição foi reconhecido como um dos direitos fundamentais, fazendo parte do rol das chamadas cláusulas pétreas. Sendo assim, nem o “Poder Constituinte Reformador ou Derivado”, poderá validamente deliberar sobre proposta de emenda constitucional tendente a abolir o direito à prescrição (artigo 60, parágrafo quarto, inciso IV, da Constituição da República Federativa do Brasil).[23]
Verifica-se assim, que, a prescrição apresenta-se como uma garantia constitucional, e com a entrada em vigor da Lei nº 12.234/2010, o legislador pretendeu que o magistrado não mais aplique a modalidade de prescrição da pretensão punitiva na forma retroativa, em períodos anteriores ao recebimento da denúncia ou queixa, agravando sobremaneira a situação de um acusado.
A doutrina penal de cunho garantista vem tecendo severas críticas a esta mudança legislativa. Na verdade, esta lei não está em harmonia com os postulados do Estado Democrático de Direito e do Direito Penal Constitucional. Ao vedar a possibilidade de reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva retroativa em termo anterior ao do recebimento da denúncia ou queixa, restou configurado um verdadeiro retrocesso legislativo. Além disso, a nova disposição penal é incompatível com o princípio constitucional da duração razoável do processo.[24]
Seja por uma leitura do Direito Penal sob o enfoque da teoria do garantismo como defende Ferrajoli, seja ainda por uma leitura constitucional de todo o sistema penal, a Lei nº 12.234/2010 viola, defende-se aqui, vários princípios e garantias fundamentais previstos na Carta Cidadã.
A aplicação da teoria garantista fornece elementos fundantes ao Estado democrático de Direito, ademais, serve também como prova de evolução de um Estado frente ao Estado absolutista. Pois bem, a limitação, ou supressão de direitos e garantias fundamentais do cidadão em um Estado de Direito é contra ao proposto por este Estado.
4 ANÁLISE DA INCONSTITUCIONALIDADE DA RESTRIÇÃO, À LUZ DA TEORIA GARANTISTA
A Constituição brasileira desempenha papel fundamental na busca pela proteção dos direitos fundamentais, ressaltando que além da sua previsão expressa, o entendimento destes direitos como cláusulas pétreas, garante a sua inalterabilidade.
A partir deste norte e entendendo que a prescrição penal figura como uma garantia constitucional a sua alteração, ainda que parcial, pode vir a ser caracterizada como inconstitucional.
Para o estudo da teoria garantista, Ferrajoli apresenta 10 axiomas, chamando de sistema de garantias (SG). No entanto, não há nenhum axioma que expresse, de maneira específica, o dever de que processo judicial tramite em um prazo razoável (o problema dramático da relação entre tempo e processo penal).
Por conseguinte, não é possível afirmar que a teoria garantista exige a adoção de prescrição penal na sua modalidade retroativa. No entanto, é possível construir que sua limitação representa um óbice de índole constitucional.
Esta construção é possível a partir da análise específica de cinco axiomas do Sistema de Garantias do modelo de Ferrajoli, quais sejam: Nullum crimen sine lege (A2); Nulla lex(poenalis) sine necessitate (A3); Nulla culpa sine judicio (A7); Nulla accusatio sine probatione (A9); Nulla probatio sine defensione (A10).
Defende-se aqui que, do conjunto da obra do jurista italiano, pode-se extrair subsídios para sustentar a existência de cinco violações substantivas decorrentes desta inovação legislativa. Parâmetros de aferição de constitucionalidade substantiva que serão analisados adiante.
Assim sendo, o garantismo constitui uma teoria com suficiente aptidão instrumental para avaliar as ações governamentais num confronto com seus postulados, que partem da idéia de Estado de Direito. Por esses pressupostos, a eficácia da ação político-econômica como critério de legitimação, próprio de uma social-democracia de massas com opinião pública meramente aclamativa, aparece como uma inversão de toda a tradição teórico-democrática, que propõe, acima da vontade de maiorias eventuais, o respeito aos valores fundantes da convivência social, plasmados nas Declarações de Direitos.[25]
Em um Estado de Direito, acima do respeito à posição da maioria, devemos subsunção à Constituição. Ainda que fundamentada no combate a impunidade, o que é louvável, não pode a Lei nº 12.234/2010 atentar contra os direitos fundamentais do cidadão.
4.1 Proibição de ofensa ao princípio da legalidade (Nullum crimen sine lege “válida”)
Quando se trata de direito penal, seja na exigência de cumprimento de uma norma incriminadora ou na aplicação de norma despenalizadora deve-se reverência ao princípio da legalidade, caracterizando assim o que está previsto apresentado no axioma A2 da Teoria Garantista defendida por Ferrajoli.
A norma penal deve obrigatoriamente cumprir o devido processo legislativo constitucional para ser tida como válida e, portanto, dessa validade extrair sua força vigente.
No Brasil, a capacidade legiferante em matéria penal é reservada ao Congresso Nacional por força do artigo 22, inciso I da Constituição Federal “Compete privativamente à União legislar sobre: I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho”.
Contudo não basta que uma lei penal seja elaborada pelo Poder Legislativo Federal e siga todos os trâmites necessários para a sua elaboração. Necessita que a mesma tenha respeitado a todas as condições de validade substancial, ou seja, que seu conteúdo e significado estejam em plena consonância com os direitos fundamentais, sob pena de apesar de estar em vigor ser tida como uma lei inválida.[26]
Verifica-se aqui que não basta uma vigência formal, mas sim a norma penal necessita também de validade material para que seja considerada constitucional.[27]
Esta limitação do Poder Estatal não se restringe ao Poder Executivo, como pode transparecer num primeiro momento, mas vincula as demais funções estatais, principalmente o Poder Legislativo, que não possui (mais) um cheque em branco; o Poder Legislativo, na concepção garantista, também está limitado/balizado em seu conteúdo por fronteiras materiais, não podendo se afastar do contido materialmente na Constituição. E, os vínculos no Estado Democrático de Direito, de viés garantista, são de tal forma substanciais/materiais que impedem a preponderância da concepção de democracia vinculada à vontade da maioria, em franca opressão à minoria, articulando a esfera do indecidível. Isto é, nem mesmo por maioria se pode violar/negar os Direitos Fundamentais dos indivíduos.[28]
Em que pese haver um clamor público contra impunidade, tal qual fundamentou a restrição parcial da prescrição retroativa, o Poder Legislativo não pode se desvincular do dever constitucional de estrita observância dos Direitos Fundamentais.
A Lei nº 12.234/2010, apesar de ser uma lei vigente, não detém validade material pois reduz de sobremaneira a aplicabilidade da prescrição retroativa que, como vimos, figura como uma garantia do cidadão ante o poder punitivo Estatal.
Alexandre Morais da Rosa explica que “os direitos fundamentais são indisponíveis, inalienáveis, imprescritíveis, invioláveis, intransigíveis e personalíssimos.”[29], isto abre a possibilidade de se afirmar que não poderia haver uma redução da prescrição, ainda mais pelo legislador ordinário, pois a legislação para ter validade necessita de coerência com as normas superiores.[30]
Os Direitos Fundamentais formam a esfera do indecidível. O paradigma da democracia constitucional não é outro senão o da sujeição do Direito ao direito gerado por essa dissociação entre “vigência” e “validade”, entre “mera legalidade” e “estrita legalidade”, entre “forma” e “substância”, entre “legitimação formal” e “legitimação substancial”. Os Direitos Fundamentais funcionam, como parâmetro de (des)legitimação dos Estados. Ademais, esses Direitos Fundamentais estão garantidos por uma rigidez absoluta que impede que eventuais maiorias os modifiquem, naquilo que a Teoria Constitucional preconiza como cláusulas pétreas (CR/88), art. 60, §4º, IV), como tais, invioláveis.[31]
Assim quando o Constituinte Originário tratou expressamente dos delitos imprescritíveis, trouxe a prescrição penal para a esfera do indecidível não podendo haver alteração no sentido de supressão, ainda que parcial, por clara redução de aplicação dos Direitos Fundamentais. Destaca-se que a utilização do argumento decorrente da incapacidade do Estado de cumprir sua função, não pode ser aceito como fundamentação apta a reduzir o espaço de proteção do direito fundamental à prescrição.
4.2 Proibição de restrição irrazoável (Nulla lex(poenalis) sine necessitate)
Em um Estado de Direito todas as obrigações estão determinadas através de lei, sendo que para que haja uma espécie de liberdade da obrigação de agir conforme a norma determina é necessário a existência de outra norma revogando a anterior.
Pois bem, o Estado em matéria de prescrição penal até o dia 05 de maio de 2010 detinha a obrigação de investigar e oferecer a peça acusatória dentro de um prazo prescricional razoável, contabilizado de acordo com a pena in concreto. Com a vigência da Lei nº 12.234/2010, a polícia judiciária e o titular da ação penal passou a gozar de um prazo muito maior para a investigação e oferecimento da acusação.
Com a supressão da prescrição retroativa em data anterior ao oferecimento da denúncia pode-se verificar que houve um retrocesso no âmbito de proteção do cidadão, pois a garantia fundamental de ser investigado passou por uma dilatação do conhecido “prazo razoável”.
Trata-se, na verdade, de odioso e equivocado retrocesso imposto pelo legislador infraconstitucional com esse diploma legal, afrontando, além dos princípios da proporcionalidade (proibição de excesso) e da própria culpabilidade, a garantia constitucional da razoável duração do processo, conforme demonstraremos adiante. A irrazoável demora na investigação do processo, enfim, da persecutio criminis atinge diretamente a dignidade da pessoa humana (que não pode ficar ad eterno sob suspeita ou investigação estatal). Como efeito, a aplicação da pena depois de decorrido um longo período de tempo encontrará, com certeza, um acusado completamente modificado, distante, diferente daquele que praticou a infração penal; é como se fosse outro homem que estaria sendo julgado, e não aquele que cometeu a infração penal. Não se pode olvidar que em um Estado Constitucional Democrático de Direito a lei penal não vige somente para punir o infrator, mas igualmente para proteger o cidadão contra os abusos frequentemente praticados pelo Estado, constituindo uma espécie de Carta Magna do cidadão investigado, contra abusos do poder repressivo estatal.[32]
Neste ponto do estudo pode-se apontar que a restrição irrazoável da aplicação da prescrição retroativa em datas anteriores ao oferecimento da denúncia ofende ao axioma Nulla lex (poenalis) sine necessitate (A3), sendo aplicável aqui segundo Luigi Ferrajoli, os princípios da necessidade e da humanidade das penas[33].
Com relação do princípio da necessidade, o direito penal não pode ser utilizado de acordo com a vontade volátil do legislador, devendo ser exercido somente quando for estritamente necessário e útil para a sociedade. Aqui é que a regovação parcial da prescrição retroativa, sem uma fundamentação válida e justa, restringe a garantia fundamental à prescrição retroativa.
Eduardo Reale Ferrari e Heidi Rosa Florêncio ressaltam a utilização da lei penal sem a sua efetiva necessidade deve ser rechaçada: “Mais uma vez observa-se que o legislador se vale inadequadamente de leis paliativas e quiçá eleitoreiras para dar uma satisfação ao clamor público ante a sensação de impunidade veiculada pela mídia.”[34]
Através do princípio da necessidade do direito penal, a alteração da prescrição somente deveria ser utilizada caso fosse o único meio, ou ainda, o menos gravoso para atingir a busca da eficácia dos objetivos pretendidos (combate à impunidade), e como vimos acima, esta não ocorreu.[35]
Ademais, Ferrajoli afirma que a partir do momento em que o próprio Estado rompe a limitação fundamental e passa a matar, torturar, humilhar o cidadão, e, com isso, acaba desrespeitando os direitos fundamentais dos cidadãos, ele perde totalmente qualquer legitimidade. Desta forma, o Estado despe-se da condição de estado (garantidor de Direitos) e se equipara à condição de delinquente.[36]
A possibilidade de se estar diante da supressão de direitos fundamentais causa uma grave instabilidade na segurança jurídica do cidadão, ainda que concentrando os estudos na parcial redução da prescrição retroativa, pois o indivíduo fica desguarnecido.
Necessário que o cidadão possa ter a garantia dos seus direitos e assim correr o risco da insegurança jurídica, não havendo mais confiança nas instituições sociais e estatais, e inclue-se aqui o próprio Direito.[37]
O retrocesso causado pela Lei nº 12.234/2010 ofende de sobremaneira o princípio da necessidade e da dignidade da pessoa humana o que é inviável em um Estado de Direito.
Se tomarmos a idéia da proibição de retrocesso em um sentido amplo, constata-se, desde logo, que a nossa ordem jurídica, ainda que não sob este rótulo, também já consagrou a noção, pelo menos em algumas dimensões. Como efeito, desde logo se verifica que a já mencionada garantia constitucional dos direitos adquiridos, dos atos jurídicos perfeitos e da coisa julgada, assim como as demais limitações constitucionais de atos retroativos ou mesmo as garantias contra restrições legislativas dos direitos fundamentais já dão conta de o quanto a questão – também entre nós – já foi objeto de previsão no direito positivo, na doutrina e na jurisprudência. Da mesma forma, a proteção contra a ação do poder constituinte reformador, notadamente no concernente aos limites materiais à reforma, igualmente não deixa de constituir uma relevante manifestação em favor da manutenção de determinados conteúdos da Constituição, notadamente de todos aqueles que integram o cerne material da ordem constitucional ou – para os que ainda teimam em refutar a existência de limites implícitos – pelo menos daqueles dispositivos (e respectivos conteúdos normativos) expressamente tidos como insuprimíveis (inclusive tendencialmente), pelo nosso Constituinte[...][38]
Os princípios da necessidade e da humanidade da pena devem ser analisados conjuntamente, pois um complementa o outro uma vez que a finalidade da pena e do direito penal é a busca da paz social, devendo o axioma Nulla lex (poenalis) sine necessitate (A3), servir, juntamente com os princípios acima como uma forma de minimização do poder repressivo do estado, inviabilizando assim uma restrição irrazoável.[39]
4.3 Ofensa à razoável duração do processo (nulla culpa sine judicio).
Em que pese Ferrajoli não tratar a duração do jus puniendi como um axioma expresso, apresenta o argumento de que a demora na prestação jurisdicional penal e sua execução tardia consistem em uma ameaça radical ao papel garantista da justiça penal, comprometendo-lhe a eficiência e direcionando-a a formas de direito penal máximo e autoritário.[40]
O axioma Nulla culpa sine judicio (A7) reflete a ideia de que não há que se falar em culpa ou responsabilidade penal sem que seja analisado o caso através de um processo, em outras palavras, afigura-se impossível a imposição de penalidade somente com o inquérito policial.
Desta forma, observa-se que a Lei nº. 12.234/2010 possibilita que a investigação de uma infração penal perdure por um tempo irrazoável, servindo o inquérito como uma espécie de punição ao investigado.
A simples investigação, e não somente o processo judicial em si, já limita os direitos de liberdade garantidos constitucionalmente, motivo que também justifica a delimitação temporal dos prazos de cada fase da persecução penal.[41]
No lapso temporal estabelecido entre a instauração de um inquérito policial e o desencadeamento da jurisdição penal propriamente dita, o Estado intervém e reduz os direitos e liberdades fundamentais do indivíduo.
Portanto, todos os mecanismos restritivos devem ser contidos e limitados de forma que a restrição aos direitos fundamentais obedeçam ao postulado da razoabilidade.[42]
Mateus Alves Araújo, a partir das lições de Gabriel Pastor, apresenta a discussão acima:
[...] el proceso en sí es un acto de coerción o bien un conjunto de actos de coacción o de actos cuya realización es asegurada por medidas de coerción, que siempre intervienen en los derechos fundamentales de las personas, entonces su duración misma debe estar establecida por la ley con precisión.[43] [44]
Pode-se apresentar aqui algumas imposições limitadoras que a instauração do inquérito policial impõe ao investigado. Sua dignidade fica abalada, tendo em vista que nos dias atuais, proliferam em nosso meio jornalístico, programas policialescos que generalizam e utilizam a informação de caráter policial como verdadeiros “linchamentos midiáticos”[45]. Durante a investigação, o direito de defesa do indiciado é limitado, ficando a disposição da investigação recebendo a conotação de culpado sem qualquer direito de defesa durante esta fase.
A perpetuação do processo penal, além do tempo necessário para assegurar seus direitos fundamentais, se converte na principal violação de todas e de cada uma das diversas garantias que o réu possui.[46]
A primeira garantia que cai por terra é a da Jurisdicionalidade insculpida na máxima latina do nulla poena, nulla culpa sine iudicio. Isso porque o processo se transforma em pena prévia à sentença, através da estigmatização, da angústia prolongada, da restrição de bens e, em muitos casos, através de verdadeiras penas privativas de liberdade aplicadas antecipadamente (prisões cautelares). É o que Carnelutti define como a misure di soffrenza spirituale ou di umiliazione. O mais grave é que o custo da pena-processo não é meramente econômico, mas o social e psicológico.[47]
O Estado deve garantir a liberdade do cidadão em um Estado de Direito, em consonância com o sistema de garantias, conferindo especial proteção no que tange à duração do processo em um prazo razoável, sendo inclusive um direito fundamental reconhecido.
Os direitos fundamentais acima expressados, analisados conjuntamente com o princípio do devido processo legal e do amplo acesso à justiça (ambos de igual envergadura constitucional), todos estabelecidos no artigo 5º da Constituição e alinhados ainda ao artigo 37[48] da Constituição Federal que apresenta os princípios básicos da atividade pública, em especial o princípio da eficiência, demonstram a necessidade de resguardar o cidadão do poder punitivo estatal, atuando o Estado de forma mais eficiente possível, e dentro de um prazo razoável.
Estas garantias já existiam muito antes da ordem constitucional passar a prever, expressamente, que o processo (administrativo e judicial) deve tramitar em um tempo razoável[49], e apresenta-se agora como uma garantia constitucional expressa em nosso ordenamento.
O dever de eficiência do Poder Judiciário constitui uma tarefa de presteza e rendimento funcional, isso significa que o Poder Judiciário deve desenvolver mecanismos hábeis para que a prestação jurisdicional seja entregue da forma mais célere possível, desde que observadas os direitos fundamentais do acusado durante o processo.[50]
Não se busca, com o direito fundamental a um processo penal célere, que tenhamos um procedimento penal “a jato”, contudo, devemos rechaçar uma investigação penal realizada por um período desproporcionalmente longo, e diante da alteração promovida pela Lei nº 12.234/2010 uma pessoa poderá ser investigada por 20 anos e somente depois ser iniciado um procedimento penal ainda válido.
Por igual, o axioma A9 Nulla accusatio sine probatione, apresentado por Ferrajoli, também serve para viabilizar uma crítica à validade da alteração legislativa promovida pela Lei nº 12.234/2010 frente à teoria do garantismo penal a exclusão de aplicação da prescrição retroativa em data anterior ao oferecimento da denúncia.
O presente axioma estabelece que não pode haver acusação sem provas. A questão central que será aqui defendida é que a dilação exacerbada do prazo de uma investigação penal contamina (e até mesmo prejudica) a prova, servindo o tempo excessivo como uma punição prévia ao investigado.
Ao ampliar o tempo de investigação de forma assimétrica, tem-se ainda a possibilidade de violação de outro princípio de índole constitucional, qual seja, o estado de inocência. Isto é assim, pois a demora e o prolongamento excessivo do processo penal vão, paulatinamente, sepultando a credibilidade em torno da versão do acusado. Existe uma relação inversa e proporcional entre a estigmatização e a presunção de inocência, na medida em que o tempo implementa aquela e enfraquece esta.[51]
Ferrajoli apresenta também que a prova colhida sob o sistema inquisitivo (utilizado em investigações penais, haja vista que ausente o contraditório e mitigado ao mínimo a ampla defesa) não reflete a teoria garantista:
A verdade almejada e perseguida pelo processo inquisitório, sendo concebida como absoluta e substancial, e consequentemente única, não pode ser de parte, e não admite, portanto, a legitimidade de pontos de vista contrastantes cujo conflito deve ser arbitrado por um juiz terceiro. Disso deriva que o sistema inquisitório não só exige, mas exclui o controle desde baixo, em especial o controle do imputado. Segredo, escritura, e sobretudo ausência de contraditório e de defesa são os corolários da sua epistemologia eminentemente substancial, que remete a obtenção da verdade unicamente à capacidade e ao poder de investigação do juiz-postulante. À concepção monista da verdade corresponde o caráter monista e monológico da atividade processual, cujo protagonista é o juiz, que é ao mesmo tempo acusador e exige demais a colaboração do imputado. Entende-se que sobre essa base não há sentido em falar de ônus da prova a cargo da acusação, mas, no máximo, de necessidade da prova: exigida, pretendida – ou totalmente extorquida – do próprio acusado.[52]
Deixar com que a prova colhida sob o sistema inquisitivo perdure como verdade contra o investigado, por um tempo excessivo e desproporcional, fere o axioma em análise, figurando a supressão da prescrição retroativa em data anterior ao oferecimento da denúncia como uma expressão do direito penal máximo e do eficientismo penal[53].
Ademais não se pode concluir que se há um tempo maior para a produção de prova para a acusação, também haveria um tempo maior para a produção da prova para a defesa. Tal situação não se verifica pois a defesa, durante o procedimento investigatório de caráter inquisitivo, tem seu poder de produção de prova limitado, conforme preceitua o artigo 14, do Código de Processo Penal[54].
O tempo, e ainda mais, o tempo exacerbado e desproporcional de duração de uma investigação policial, trás um grave prejuízo ao cidadão servindo o tempo como uma sanção prévia sem qualquer processo judicial ou direito de defesa amplamente assegurado.
O outro axioma garantista que vai ao encontro de uma investigação por um prazo desproporcional é o A10 Nulla probatio sine defensione, segundo o qual não deve haver prova sem que a mesma seja produzida em contraditório, ou seja, mediante o crivo e atuação da defesa. A sua análise deve ser feita juntamente com o axioma anterior.
Sobre a necessidade de validade do exercício de defesa na produção da prova – e aqui temos que ver no aspecto também da prova produzida no inquérito policial – Ferrajoli assim apresenta:
Ainda mais importante é a segunda condição, relativa à esfera de intervenção do imputado e de seu defensor. O pensamento iluminista, coerente com a opção acusatória, reivindicou a presença de um e de outro a todas as atividades probatórias. VOLTAIRE protestou contra a possibilidade de que o confronto entre o imputado e as testemunhas fosse entregue à discricionariedade do juiz em vez de ser obrigatório. FILANGIERI sustentou que ao imputado “deveria ser permitido fazer assistir-se por um ou mais advogados em todos os passos do processo”. BENTHAM propugnou a presença do defensor no interrogatório não só do imputado, mas também na oitiva das testemunhas. E o mesmo fez PAGANO, que desejou que as testemunhas de acusação “serão interrogadas ex integro na presença do réu” e sublinhou “o quanto ajuda a conhecer a verdade tal contradição”.[55]
Para esse axioma, imperioso que a defesa esteja presente quando da produção da prova. Ocorre que este direito não é assegurado na fase da investigação policial, com exceção à possibilidade de, no depoimento do indiciado, estar presente o seu advogado. Imperioso lembrar que a ausência de advogado no depoimento perante a autoridade policial não é causa de nulidade, sendo que a legislação trata a mesma como mera faculdade confiada ao indiciado.
Já com relação a todas as demais provas produzidas no inquérito policial, não se reconhece o direito a que a defesa acompanhe sua produção, pois como já referenciado acima, o inquérito policial não é conduzido à luz do contraditório e, portanto, opera em flagrante limitação ao princípio da ampla defesa.
O direito de defesa e o próprio contraditório, também são afetados, na medida em que a prolongação excessiva do processo gera graves dificuldades para o exercício eficaz da resistência processual, bem como implica um sobre-custo financeiro para o acusado, não apenas com os gastos em honorários advocatícios, mas também pelo empobrecimento gerado pela estigmatização social. Não há que olvidar a eventual indisponibilidade patrimonial do réu, que por si só é gravíssima, mas que se for conjugada com uma prisão cautelar, conduz a inexorável bancarrota do imputado e de seus familiares. A prisão (mesmo cautelar) não apenas gera pobreza, senão que a exporta, a ponto de a “intranscendência da pena” não passar de romantismo do direito penal.[56]
O legislador, ao alterar a aplicação da prescrição retroativa, sob o pífio argumento de combate à impunidade, acaba por ampliar em demasia o prazo para a realização de uma investigação policial e a propositura da competente acusação, o que se apresenta, e conflita com o direito penal mínimo, como uma atitude de um Estado absoluto, agindo em contradição ao sistema de garantias instituído pela Constituição brasileira.
Ferrajoli explica essa afirmação, expondo:
A primeira regra de todo o pacto constitucional sobre a convivência civil não é precisamente que sobre tudo se deva decidir por maioria, mas que nem tudo se pode decidir (ou não decidir), nem mesmo pela maioria. Nenhuma maioria pode decidir a supressão (e não decidir a proteção) de uma minoria ou de um só cidadão. Sob esse aspecto o Estado de Direito, entendido como sistema de limites substanciais impostos legalmente aos poderes públicos para a garantia dos direitos fundamentais, se contrapõe ao Estado absoluto, seja ele autocrático ou democrático. [57]
Em um Estado de Direito (como o nosso) não se pode conceber que uma pessoa fique presa por um prazo acima do razoável, ou, de acordo com o estudo em tela, seja investigada por um prazo irrazoável, já que não é permitido ao legislador, mesmo escolhido pela vontade da maioria, que legisle no sentido de esvaziar os direitos e garantias individuais, pois estes são a base da relação de convivência firmada entre o Estado e os cidadãos.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante dos argumentos apresentados acima, podemos concluir que a alteração promovida pela Lei nº 12.234/2010 que acabou por restringir a prescrição da pretensão punitiva em sua modalidade retroativa em data anterior ao oferecimento da denúncia é inconstitucional.
Data máxima venia não agiu com o costumeiro acerto o órgão máximo do Poder Judiciário ao declarar a constitucionalidade da Lei nº 12.234/2010. Com razão o voto divergente do Ministro Marco Aurélio de Melo.
Não pode haver uma restrição a um direito fundamental do cidadão, sob o argumento que é razoável e proporcional frente a ineficiência do Estado em investigar os delitos ao tempo determinado em lei, sob pena de configurar a prescrição penal.
Com a Lei nº 12.234/2010 foi legalizada a morosidade administrativa. Ao invés de estruturar melhor a polícia, bem como todo o aparato estatal para a solução correta e rápida dos delitos, o legislador ordinário, e agora, com a chancela do Supremo, direitos e garantias fundamentais do cidadão são restringidos.
A busca da efetividade da legislação penal, bem como o fiel cumprimento da finalidade do Direito Penal não pode ser buscado ao custo de restrição de direitos e garantias fundamentais, e sim ao seu fiel e irrestrito respeito, em primeiro lugar por parte do legislador ordinário, e acima de tudo, pelo Supremo Tribunal Federal.
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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[1] FAYET JÚNIOR, Ney. PICCOLI, Fernando. Da prescrição penal retroativa: análise crítica das alterações trazidas pela Lei 12.234 de 2010. In: FAYET JÚNIOR (coord.). Prescrição Penal: temas atuais e controvertidos: doutrina e jurisprudência. p. 153
[2] FAYET JÚNIOR, Ney. PICCOLI, Fernando. Da prescrição penal retroativa: análise crítica das alterações trazidas pela Lei 12.234 de 2010. In: FAYET JÚNIOR (coord.). Prescrição Penal: temas atuais e controvertidos: doutrina e jurisprudência. p. 154
[3] PL 1.383/2003, disponível em:
http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=A77F8D5FE5EEA5DE371D1BF13332D
36A.proposicoesWeb1?codteor=144916&filename=PL+1383/2003. Acesso em: 08 de agosto de 2014. p. 2
[4] PL 1.383/2003, disponível em:
http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=A77F8D5FE5EEA5DE371D1BF1333
2D36A.proposicoesWeb1?codteor=144916&filename=PL+1383/2003. Acesso em: 08 de agosto de 2014. p. 2 e 3
[5] Emenda apresentada por Fernando Coruja. Disponível em (http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=439837&filename=EMP+4/2007+%3D%3E+PL+1383/2003). Acesso em 08 de setembro de 2014. A redação original do Projeto de Lei desloca o termo inicial da contagem do prazo prescricional da data do fato para o data da publicação da sentença transita em julgado. A inovação faz com que o Estado, a despeito de sua ineficiência para o julgamento dos réus que processa, retire o benefício da prescrição da defesa, apoderando-se dela como dono do tempo do réu. Atualmente, por exemplo, há previsão de 20 anos para que o Estado profira decisão sobre um crime cuja pena máxima seja de 12 anos. A despeito da longevidade, este tempo não tem sido suficiente para que o Judiciário dê uma resposta ao caso sub judice. Com a aprovação do Projeto de Lei, este mesmo Estado se serviria de uma fórmula para mascarar sua ineficiência, elastecendo o prazo prescricional e, desta forma, garantiria, a prolação da sentença em tempo legal. Entretanto, este artifício não garante a agilização do procedimento, o que faz o Código Penal perca um dos seus objetivos: o caráter pedagógico pela contemporaneidade da pena aplicada. O escopo desta emenda serve à amenização deste critério de contagem para a prescrição, considerando o seu termo inicial como o dia da denúncia ou queixa, a fim de que se garanta ao réu a segurança jurídica devida. Neste sentido, peço aos nobres pares o apoio na aprovação da presente emenda.
[6] O parecer da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania foi elaborado pelo Deputado Eduardo Cunha: Caso o Poder Judiciário passe vinte anos para julgar um caso, não poderia reconhecer a prescrição ocorrida durante o processo, porque o parágrafo primeiro estaria vedando. Então haveria uma espécie de suspensão do prazo prescricional durante o processo penal. A identidade dos fatos previstos no caput e no parágrafo primeiro, proposto pelo Senado, faz a Emenda injurídica; e a suspensão do prazo prescricional, em situações em que o Estado deveria e poderia agir, além de inconstitucional e antijurídica quando analisada a prazos longos, deve ser rejeitada, no mérito, quando aos prazos curtos.
[7] FAYET JÚNIOR, Ney. PICCOLI, Fernando. Da prescrição penal retroativa: análise crítica das alterações trazidas pela Lei 12.234 de 2010. In: FAYET JÚNIOR (coord.). Prescrição Penal: temas atuais e controvertidos: doutrina e jurisprudência. p. 155
[8] Apelação nº 0000036-63.2012.7.02.0102/SP FURTO. PRESCRIÇÃO. NÃO OBSERVÂNCIA. LEI N° 12.234/2010. AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVA COMPROVADAS. MATÉRIA FÁTICA SUFICIENTE A
AMPARAR UM ÉDITO CONDENATÓRIO.
1. Em se tratando de ilícito cometido posterior à edição da Lei n° 12.234, de 5 de maio de 2010, que alterou o Código Penal comum para suprimir a data do fato como termo a quo para a contagem do lapso prescricional, não há como esta Corte aplicar analogicamente, como vinha sendo feito, a antiga redação do dispositivo para confirmar uma eventual prescrição.
2. No contexto apurado, comete o delito de furto o militar que, sub-repticiamente, subtrai a motocicleta de companheiro de farda, estacionada em área sob Administração Militar, e vem a colidi-la em via pública, somente sendo descoberto após a intervenção de terceiros. Decisão unânime.
[12] Por cifra negra podemos entender como o grande número de delitos que são praticados, porém nunca chegam ao conhecimento da autoridade policial, ou dos órgãos da Administração Pública. Apresenta-se assim os números de ocorrências que chegam ao conhecimento das autoridades somente uma parcela dos delitos que a sociedade é vítima.
[13] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2010, p. 785-786.
[14] Idem, p. 786.
[15] CADEMARTORI, Sergio. Estado de Direito e Legitimidade: Uma abordagem garantista. 2006, p. 103.
[16] FERRAJOLI, op.cit., p. 787.
[17] CADEMARTORI, Sergio. Estado de Direito e Legitimidade: Uma abordagem garantista. p. 109
[18] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2010, p. 842
[19] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2010, p. 836
[20] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2010, p. 839
[21] CADEMARTORI, Sergio. Estado de Direito e Legitimidade: Uma abordagem garantista. p. 111
[22] Como crimes imprescritíveis só temos correspondência no sistema penal brasileiro o crime de racismo e o de ação de grupos armados contra a ordem constitucional e o Estado Democrático.
[23] SIENA, David Pimentel Barbosa de. Direito fundamental à prescrição e inconstitucionalidade da Lei nº 12.234/2010. Disponível em: <http://jus.com. br/artigos/20456/direito-fundamental-a-prescricao-e-inconstitucionalidade-da-lei-no-12-234-2010#ixzz2iTVNeqzx> Acesso em: 15 de dezembro de 2013. p. 1
[24] SIENA, David Pimentel Barbosa de. Direito fundamental à prescrição e inconstitucionalidade da Lei nº 12.234/2010. p. 1
[25] CADEMARTORI, Sergio. Estado de Direito e Legitimidade: Uma abordagem garantista. 2006, p. 234.
[26] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2010, p. 806
[27] ROSA, Alexandre Morais da; Garantismo Jurídico e Controle de Constitucionalidade Material: Aportes Hermenêuticos. Editora Lumen Juris. Rio de Janeiro: 2011. p. 4
[28] ROSA, Alexandre Morais da; Garantismo Jurídico e Controle de Constitucionalidade Material: Aportes Hermenêuticos. p. 6
[29] ROSA, Alexandre Morais da; Garantismo Jurídico e Controle de Constitucionalidade Material: Aportes Hermenêuticos. p. 11
[30] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2010, p. 808.
[31] ROSA, Alexandre Morais da; Garantismo Jurídico e Controle de Constitucionalidade Material: Aportes Hermenêuticos. p. 12
[32] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal : parte geral. p. 898
[33] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2010, p. 355.
[34] Ferrari, Eduardo Reale; FLORÊNCIO, Heidi Rosa. A extinção da prescrição retroativa e a ilusão penal. p. 3
[35] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal : parte geral. p. 903
[36] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2010, p. 364.
[37] SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos Direitos Fundamentais: uma teoria geral dos Direitos Fundamentais na perspectiva constitucional. 12. ed. ver. atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2015.p. 452
[38] SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos Direitos Fundamentais: uma teoria geral dos Direitos Fundamentais na perspectiva constitucional. p. 453 e 454
[39] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2010, p. 364.
[40] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2010, p. 518.
[41] PASTOR, Gabriel. Acerca del derecho fundamental al plazo razonable de duración del proceso penal. apud ARAÚJO, Mateus Alves. Base Teórica do direito ao processo em um prazo razoável. Disponível em: <http://ww3.lfg.com.br/artigos/Blog/BASE_TEORICA _DO_DIREITO_AO_PROCESSO_EM_UM_PRAZO_RAZOAVEL_Mateus
AlvesAraujo.pdf> Acesso em: 05 de março de 2014. p. 5
[42] PASTOR, Gabriel. Acerca del derecho fundamental al plazo razonable de duración del proceso penal. apud ARAÚJO, Mateus Alves. Base Teórica do direito ao processo em um prazo razoável. p. 7
[43] PASTOR, Gabriel. Acerca del derecho fundamental al plazo razonable de duración del proceso penal. apud ARAÚJO, Mateus Alves. Base Teórica do direito ao processo em um prazo razoável.p. 7
[44] Tradução: [...] o processo em si é um ato de coerção, ou melhor, um conjunto de atos de coerção ou de atos cuja realização seja assegurada por medidas de coação, que sempre intervêm nos direitos fundamentais das pessoas, então sua duração mesma deve estar estabelecida pela lei com precisão.
[45] Lembramos aqui o caso conhecido da Escola Base em São Paulo. Os diretores e donos da Escola Base foram investigados por um suposto abuso de menor que repercutiu nacionalmente, e após as investigações (semanas depois) ficou comprovado que não houve crime algum, mas a escola veio a falência tendo em vista a exposição prejudicial que os seus proprietários sofreram.
[46] LOPES JÚNIOR, Aury. O tempo como pena processual: em busca do direito de ser julgado em um prazo razoável. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=458. Acesso em 19 de fevereiro de 2014.p. 1
[47] LOPES JÚNIOR, Aury. O tempo como pena processual: em busca do direito de ser julgado em um prazo razoável. p. 1
[48] Art. 37 da Constituição Federal. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
[49] Ar. 5º da Constituição Federal, inciso LXXVIII. A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.
[50] ARAÚJO, Mateus Alves. Base Teórica do direito ao processo em um prazo razoável. p. 3
[51] LOPES JÚNIOR, Aury. O tempo como pena processual: em busca do direito de ser julgado em um prazo razoável. p. 1
[52] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2010, p. 562.
[53] Sobre eficientismo penal, temos como a utilização do direito penal como uma forma de acautelar o meio social após a prática de um delito de grande repercussão, servindo como uma forma de resposta legislativa à população, que várias vezes é feita de modo ilegal e inconstitucional.
[54] Artigo 14 do Código de Processo Penal. O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo da autoridade.
[55] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2010, p. 566.
[56] LOPES JÚNIOR, Aury. O tempo como pena processual: em busca do direito de ser julgado em um prazo razoável. p. 1
[57] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2010, p. 792.
Mestre em Ciências Jurídicas pela UNIVALI, Professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Universidade Regional de Blumenau - FURB, e Professor de Direito Penal e Direito Processual Penal do Morgado Concursos.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NOVELLI, Rodrigo Fernando. HC nº 122.694 - SP e a Lei nº 12.234/2010: uma análise garantista Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 mar 2015, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/43572/hc-no-122-694-sp-e-a-lei-no-12-234-2010-uma-analise-garantista. Acesso em: 23 dez 2024.
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