Resumo: O presente artigo pretende analisar e apontar as principais características e desenvolvimento ao longo da história do remédio constitucional “habeas corpus”, também conhecido como “writ”. Para isso utilizar-se-á ampla gama de conceituação de termos chaves para o tema. Será feita análise de preceitos e institutos fundamentais como habeas corpus, a natureza jurídica do writ, intentando explanar os principais elementos e razões da instituto em questão.
Palavras-chave:Habeas Corpus; Writ; Desenvolvimento Histórico.
Sumário:Introdução; 1. Da evolução histórica do habeas corpus no Brasil; 2. Das principais características do habeas corpus; 3. Conclusão; Referências Bibliográficas.
Introdução
Sendo o remédio constitucional mais conhecido no Direito Brasileiro, o habeas corpus, também conhecido como writ, tem por finalidade assegurar, de maneira célere, o direito de locomoção dos indivíduos.
Nas palavras de Tourinho Filho[1], o habeas corpus consiste em:
“O habeas corpus é remedium juris destinado a tutelar, de maneira rápida e imediata, a liberdade de locomoção. Trata-se de verdadeira garantia constitucional para amparar o direito à liberdade ambulatória”.
O habeas corpus encontra respaldo na Constituição Federal de 1988[2], estando inserido dentro Dos Direitos e Garantias Fundamentais, no artigo 5º, inciso LXXVII, conforme transcreve-se:
“Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes nos País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
LXVIII – conceder-se-á “habeas-Corpus” sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”;
1. Da evolução histórica do habeas corpus no Brasil
Embora haja controvérsia a versão mais aceita é que o habeas corpus tenha sua origem conectada ao Direito Romano, e, nos moldes atuais esteja diretamente atrelado à Carta Magna Inglesa de 1215.
Segundo a seu nascimento associar-se indissoluvelmente ao Direito Romano versa Capez[3]:
“O habeas corpus tem sua origem remota no direito romano, onde todo cidadão podia reclamar a exibição do homem livre detido ilegalmente por meio de uma ação privilegiada, conhecida por interdictum de libero homine exhibendo”.
Corrobora com as explicações acerca das origens do habeas corpus Guimarães[4]:
“O peculiar corpus jurídico britânico, formou-se em concomitância com seu amadurecimento político. Ou, melhor dizendo, ali estabeleceu-se uma dialética entre o poder político e as exigências sociais (numa época em que tal não se cogitava), propiciando a arquitetura de um direito que correspondesse aos anseios de melhoramento. Para isto contou, também, com a instituição do poder judicial, que se estruturou, pouco a pouco, independente e soberano em suas decisões. Estes fatores iriam dar consequência ao agregado de costumes e precedentes judiciais sedimentados no common Law, de onde efetivamente o inglês retirou o habeas corpus”.
Apesar das divergências, a teoria mais aceita é a de que a origem do habeas corpus esteja, de fato, indissociavelmente ligado à Carta Magna Inglesa de 1215.
Sobre os reflexos da origem e aspectos no direito contemporâneo, pondera Franco[5]:
“Sua origem muito explica os vários e interligados aspectos, função e utilidade do devido processo legal em nossos dias. Essa cláusula surgiu como o resultado normativo de disputas políticas na Inglaterra dos séculos XII e XIII e que culminaram com a submissão do Rei João Sem Terra ao poder político-militar dos Barões pela assinatura da Magna Carta de 1215 e cujos termos foram impostos pelos últimos àquele. No Capítulo 39 dessa Carta Política foi inserida a expressão (latina per legem terrae e que foi traduzida para o inglês law of the land) que, de há muito, consagrou-se como due processo of law. Essa inserção, assim como toda a Magna Carta, representou histórica limitação do poder real por força da norma escrita”.
No Brasil, embora não explicitamente previsão, considera-se a Constituição de 1824 como o marco para o habeas corpus, por esta expressar garantias individuais de liberdade.
Sobre a presença do habeas corpus na Constituição de 1824, como sendo a primeiro vez que o remédio constitucional apresenta-se no Direito Brasileiro, assevera Miranda[6]:
“Alguns pensam que o habeas corpus data do Código do Processo (1832); minha opinião é contrária. Entendo que, embora caiba aos autores do Código do Processo a glória de terem compreendido e tratado de desenvolver o pensamento constitucional, todavia o habeas-corpus é instituição constitucional, o habeas-corpus está incluído, está implícito na Constituição, quando ela decretou a independência dos poderes e quando deu ao Poder Judiciário o direito exclusivo de conhecer tudo quanto entende com a inviolabilidade pessoal”.
Corroborando com essa ideia discorre Mossin[7] sobre a presença do remédio constitucional na Carta Magna de 1824, sem que este, no entanto, estivesse devidamente regulamentado:
“Recusarem os juízes, a quem for permitido passar ordens de habeas corpus, concedê-las quando lhes forem regulamente requeridas, nos casos em que podem ser legalmente passadas; retardarem sem motivo a sua concessão, ou deixarem, de propósito, e com conhecimento de causa, de as passar, independente de petição nos casos em que a lei determinar; Recusarem os oficiais de justiça ou demorarem por qualquer modo a intimação de uma ordem de habeas corpus, que lhes tenha sido apresentada, ou a execução das outras diligências necessárias para que esta ordem surta efeito”.
O que embasa a ideia de que a Constituição de 1824[8] é detentora do título de primeira norma brasileira a assegurar o habeas corpus é o teor de seu artigo 179, inciso VIII:
“Art. 179. [...]
VIII. Ninguém poderá ser preso sem culpa formada, excepto nos casos declarados na Lei; e nestes dentro de vinte e quatro horas contadas da entrada na prisão, sendo em Cidades,Villas, ou outras Povoações proximas aos logares da residencia do Juiz; e nos logares remotos dentro de um prazo razoavel, que a Lei marcará, attenta a extensão do territorio, o Juiz por uma Nota, por elle assignada, fará constar ao Réo o motivo da prisão, os nomes do seu accusador, e os das testermunhas, havendo-as”.
O habeas corpus foi, explicitamente previsto, pela primeira vez no ordenamento jurídico brasileiro através do Código Penal de 1830, tendo sido regulado pelo Código Processual Criminal de 1832[9], em seu artigo 340, a seguir transcrito:
“Art. 340. Todo o cidadão que entender, que ele ou outrem sofre uma prisão ou constrangimento ilegal, em sua liberdade, tem direito de pedir uma ordem de habeas corpus em seu favor”.
O writ passou a gozar de proteção constituição com a Carta Magna Brasileira de 1891[10], previsto em seu artigo 82, § 22, que possuía a seguinte redação:
“Art. 82 [...]
§ 22. Dar-se-á o habeas corpus, sempre que o indivíduo sofrer ou se achar em iminente perigo de sofrer violência ou coação por ilegalidade ou abuso de poder”.
Na Constituição de 1934[11]o dispositivo tocante ao writ passou a ter a seguinte redação:
“Art. 113. [...]
23) Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer, ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade, por ilegalidade ou abuso de poder. Nas transgressões disciplinares não cabe o habeas corpus.”
Na Constituição de 1946[12] foi acrescido a ameaça ao direito de locomoção como hipótese permissiva para impetrar habeas corpus:
“Art. 141. [...]
§23 - Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.
Nas transgressões disciplinares, não cabe o habeas corpus”.
2. Das principais características do habeas corpus
Embora tenha seu procedimento ditado pelo atual Código de Processo Penal, dentro do título “Dos recursos em geral”, a doutrina tende majoritariamente a entender o writ como sendo uma verdadeira ação e não apenas um recurso.
Sobre a natureza do habeas corpus discorre Capez[13]:
“Ação penal popular com assento constitucional, voltada à tutela da liberdade ambulatória, sempre que ocorrer qualquer dos casos elencados no art. 648 doCódigo de Processo Penal”.
Importante adendo nos é feito por Grinover, Gomes Filho e Fernandes[14] quanto à natureza do writ:
“Como ação de conhecimento, a ação de habeas corpus pode objetivar um provimento meramente declaratório, como ocorre, v.g., nas hipóteses em que se postula a cessação do constrangimento pelo reconhecimento de uma causa de extinção da punibilidade; constitutivo, quando se pretenda, por exemplo, a anulação de uma sentença transitada em julgado; condenatório, no caso em que, ao lado da declaração de existência do direito à liberdade, se impõe à autoridade que agiu de má-fé ou abuso de poder a condenação nas custas (art. 653 CPP). Anote-se, finalmente, o caráter mandamental peculiar à ação de habeas corpus – também característico do mandado de segurança -, pois, sendo remédio excepcional, que objetiva a tutela urgente de direito fundamental da pessoa, não teria sentido relegar-se a execução para um segundo momento”.
Quanto aos tipos de writs a doutrina majoritária os clássica como podendo ser preventivo ou liberatório.
O writ preventivo é concedido pelo Juiz ou Tribunal quando existe possibilidade real de ameaça ao direito de locomoção, sendo impetrado em caráter de resguardo. O writ liberatório ocorre posteriormente à lesão ao direito de locomoção, quando a mesma já concretizou-se, sendo expedido pelo Juiz ou Tribunal, culminando em um alvará de soltura.
Quanto aos sujeitos do habeas corpus encontram-se o impetrado, que consiste na autoridade coatora do direito de locomoção, o impetrante, aquele que impetra o writ, não sendo exigida capacidade postulatória para tal ato e, sendo cabível o requerimento por terceiro, e, por fim, o paciente, que é a vítima da coação.
As hipóteses de impetração encontram-se dispostas no artigo 647 do Código de Processo Penal[15], consistindo em:
“Art. 647. Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar”.
Com relação ao procedimento, a ação de Habeas Corpus corre pelo rito sumaríssimo, devido à natureza do bem jurídico tutelado.
Conclusão
Diante da necessidade de preservar o Estado Democrático de Direito, o habeas corpus tem a função de assegurar um dos mais consagrados direitos do homem, o direito de ir e vir.
Com sua existência consagrada ao longo de séculos o writ visa inibir ou corrigir ameaça ou lesão ao direito de locomoção do indivíduo, estando desde 1891, constitucionalmente garantido.
Atualmente assegurado pela Carta Magna de 1988 o habeas corpus consiste em uma ação constitucional popular, amplamente conhecido e utilizada, salvaguardando o direito de liberdade, bem jurídico de máxima importância.
Referências bibliográficas
BRASIL. Código de Processo Penal. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm> Acesso em 4 mar. 2015.
BRASIL. Constituição de 1934. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao34.htm > Acesso em 9 mar. 2015.
BRASIL. Constituição de 1946. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao46.htm > Acesso em 9 mar. 2015.
BRASIL. Constituição de 1824. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao24.htm > Acesso em 9 mar. 2015.
BRASIL. Código Processual Criminal de 1832. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LIM/LIM-29-11-1832.htm> Acesso em 7 mar. 2015.
BRASIL. Constituição de 1891. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao91.htm > Acesso em 9 mar. 2015.
BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm> Acesso em 9 mar. 2015.
CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 12. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2005.
FRANCO, A. S.; STOCO, R. (Coord). Código de Processo Penal e sua interpretação jurisprudencial: doutrina e jurisprudência. 2. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004.
GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. Recursos no Processo Penal. 6ª ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
GUIMARÃES, Isaac Sabbá. Habeas Corpus: críticas e perspectivas. – Curitiba: Juruá, 1999, p. 156.
MIRANDA, Pontes de. História e práticas do habeas-corpus: direito constitucional e processual comparado. 2. ed. Rio de Janeiro: J. Konfino, 1951.
MOSSIN, 2002 apud FERREIRA, Luiz César Silva. O deferimento de liminar em habeas corpus. 2002. 121 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Jurídicas) – Faculdade de Direito, Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí, 2002.
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Prática de processo penal. 27. ed. rev. atual. e aum. – São Paulo: Saraiva, 2006.
[1]TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Prática de processo penal. 27. ed. rev. atual. e aum. – São Paulo:Saraiva, 2006. 669.
[2] BRASIL. Constituição Federal. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm> Acesso em 9 mar. 2015.
[3]CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 12. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2005, p. 489.
[4]GUIMARÃES, Isaac Sabbá. Habeas Corpus: críticas e perspectivas. – Curitiba: Juruá, 1999, p. 156.
[5]FRANCO, A. S.; STOCO, R. (Coord). Código de Processo Penal e sua interpretação jurisprudencial:doutrina e jurisprudência. 2. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004, v. 1.p. 240.
[6]MIRANDA, Pontes de. História e práticas do habeas-corpus: direito constitucional e processual comparado. 2. ed. Rio de Janeiro: J. Konfino, 1951.
[7]MOSSIN, 2002 apud FERREIRA, Luiz César Silva. O deferimento de liminar em habeas corpus. 2002. 121 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Jurídicas) – Faculdade de Direito, Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí, 2002. p. 20.
[8] BRASIL. Constituição de 1824. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao24.htm > Acesso em 9 mar. 2015.
[9]BRASIL. Código Processual Criminal de 1832. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LIM/LIM-29-11-1832.htm> Acesso em 7 mar. 2015.
[10] BRASIL. Constituição de 1891. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao91.htm> Acesso em 9 mar. 2015.
[11] BRASIL. Constituição de 1934. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao34.htm > Acesso em 9 mar. 2015.
[12] BRASIL. Constituição de 1946. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao46.htm> Acesso em 9 mar. 2015.
[13]CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 12. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2005, p. 492.
[14]GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. Recursos no Processo Penal. 6ª ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
[15] BRASIL. Código de Processo Penal. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm> Acesso em 4 mar. 2015.
Advogada e pós-graduanda em Direito no Complexo Educacional Damásio de Jesus.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ROSA, Rafaela Miareli. Habeas Corpus Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 mar 2015, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/43585/habeas-corpus. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Nathalia Sousa França
Por: RODRIGO PRESTES POLETTO
Por: LEONARDO RODRIGUES ARRUDA COELHO
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
Precisa estar logado para fazer comentários.