RESUMO: Busca-se, com o presente trabalho uma breve síntese da Alienação parental, qual seja, a implantação de falsas memórias, um comportamento que é desencadeado por um dos genitores com o objetivo de impedir ou limitar de alguma forma o convívio do outro genitor como filho comum após a separação conjugal.
1. INTRODUÇÃO:
A família é a mais importante de todas as instituições, é por meio dela que o individuo adquire as principais respostas para os primeiros obstáculos da vida, é nela que nascem as primeiras fontes e formam as impressões duradouras e também o caráter que por meio dele se determina onde se pode chegar.
Entretanto, uma vez desfeita essa relação, em momentos de crises, pode ocorrer a chamada alienação parental que consiste em programar uma criança para que, depois da separação, odeie um dos pais. Geralmente é praticada por quem possui a guarda do filho. Para isso, a pessoa lança mão de artifícios baixos, como dificultar o contato da criança com o ex-parceiro, falar mal e contar mentiras
Desta feita, a lei 12.318/2010, veio em boa hora, pois foi elaborada para facilitar a intervenção judiciária e atender o Melhor Interesse da Criança ou Adolescente, sua expectativa é contribuir para inibir ou atenuar os processos da Alienação Parental.
Por outro lado, a doutrina defende que essa prática deve ser eliminada antes de se instalar, começando com o esclarecimento, a comunicação, divulgação e advertências, ou se for um caso mais complexo, aplicar as punições previstas na Lei; lembrando, portanto, que sua aplicação deverá ser bem conduzida, pois, estará interferindo em relações cheias de emoções e bastante desgastadas.
2. DA ALIENAÇÃO PARENTAL:
Como dito, a alienação parental foi regulada pela Lei n.° 12.318/2010.
Entretanto, além da previsão legal, a proibição quanto à alienação parental tem fundamento constitucional no princípio da paternidade responsável (art. 226, § 7º da CF/88).
Neste sentido, é o teor do art. 226 §7 da Constituição Federal de 1988:
“Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.”
2.1 CONCEITO
Já a Lei n.° 12.318/2010, em seu art. 2º, assim conceitua a alienação parental:
“Art. 2º Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.”
Desta feita, analisando detidamente os diversos elementos da alienação parental seria:
a) “a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente”:
Aqui, percebe-se que pode ser tanto com relação a crianças (até 12 anos) como adolescentes (de 12 a 18 anos).
b) “promovida ou induzida”:
Esta interferência psicológica tanto pode ser direta, explícita (verbo: promover) como camuflada, instigada, sugerida (verbo: induzir).
c) “por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham o menor sob a sua autoridade, guarda ou vigilância”:
Percebe-se que o fato de que a alienação parental pode ser gerada por outras pessoas que não o pai ou a mãe, como é o caso dos avós, dos tios ou mesmo de uma pessoa que não seja parente biológico mas que tenha autoridade, guarda ou vigilância sob a criança ou adolescente.
Logo, a pessoa que causa a alienação parental não precisa, necessariamente, ter a guarda do menor, podendo apenas deter autoridade ou vigilância sob a criança ou adolescente.
d) “para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este”
Assim, percebe-se que a interferência psicológica exercida tem como objetivo fazer com que a criança ou adolescente repudie seu genitor ou dificultar a criação ou preservação de vínculo afetivo entre o menor e seu genitor.
Atualmente, a situação mais comum observada na prática é a de que a vítima da alienação parental seja o pai. Justamente por isso, a lei utiliza a expressão “genitor”. No entanto, nada impede que a mãe do menor (genitora) seja alvo da alienação parental.
Assim, embora a lei fala claramente em “genitor”, dando a ideia de que a vítima da alienação parental seja o pai biológico da criança ou adolescente, a doutrina, entretanto, defende que, a despeito da literalidade da lei, a vítima da alienação pode ser outras pessoas ligadas ao menor, como os o pai socioafetivo, os avós, os tios, padrinhos, irmãos etc.
Explica Maria Berenice Dias:
“O fato não é novo: usar filhos como instrumento de vingança pelo fim do sonho do amor eterno. Quando da ruptura da vida conjugal, se um dos cônjuges não consegue elaborar adequadamente o luto da separação, o sentimento de rejeição ou a raiva pela traição, surge um enorme desejo de vingança. Desencadeia um processo de destruição, de desmoralização, de descrédito do ex-parceiro perante os filhos. Promove verdadeira “lavagem cerebral” para comprometer a imagem do outro genitor, narrando maliciosamente fatos que não ocorreram ou não aconteceram da forma descrita. O filho é programado para odiar e acaba aceitando como verdadeiras as falsas memórias que lhe são implantadas. Assim afasta-se de quem ama ede quem também o ama.Esta é uma prática que pode ocorrer ainda quando o casal vive sob o mesmo teto. O alienador não é somente a mãe ou quem está com a guarda do filho. O pai pode assim agir, em relação à mãe ou ao seu companheiro. Tal pode ocorrer também frente a avós, tios ou padrinhos e até entre irmãos.
Nesse jogo de manipulações, todas as armas são utilizadas, inclusive - com enorme e irresponsável frequência - a alegação da prática de abuso sexual.”
(Alienação parental: uma nova lei para um velho problema! Disponível em: www.mariaberenice.com.br).
A expressão síndrome da alienação parental (SAP) foi cunhada pelo psiquiatra norte-americano Richard Gardner, em 1985, para a situação em que a mãe ou o pai de uma criança a induz a romper os laços afetivos com o outro genitor, criando fortes sentimentos de ansiedade e temor em relação a ele.
A síndrome da alienação parental (SAP) também é chamada de:
a) Síndrome da implantação das falsas memórias;
b) Síndrome de Medeia;
c) Síndrome dos Órfãos de Pais Vivos;
d) Síndrome da Mãe Maldosa Associada ao Divórcio;
e) Reprogramação da criança ou adolescente;
f) Padrectomia.
2.2 MOTIVOS E FORMAS
A prática revela que os atos de alienação parental normalmente ocorrem porque uma das partes não aceita o fim do relacionamento amoroso. Por conta da raiva, o ex-cônjuge ou a ex-companheira passa a querer se vingar do antigo parceiro e, para tanto, utiliza o filho tentando colocá-lo contra o genitor.
Desse modo, o alienador procura excluir o genitor alienado da vida dos filhos das mais diversas formas, muitas vezes fazendo falsas acusações contra ele e assim implantando falsas percepções, falsas memórias no inconsciente da criança ou do adolescente.
Quando este processo de alienação atinge seu cume, o menor passa a nutrir sentimentos negativos em relação ao genitor alienado, além de guardar memórias e experiências exageradas ou mesmo falsas implantadas pelo genitor alienante que realiza verdadeira “lavagem cerebral” (brainwashing).
Percebe-se, dessa feita, que, além do genitor alienado, a criança ou adolescente que sofre o processo de alienação parental também é vítima desta prática e experimenta diversas consequências nocivas.
Neste sentido, a Lei prevê os seguintes exemplos de atos de alienação parental:
I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade (ex: implantar no filho a falsa ideia de que o pai não o ama);
II - dificultar o exercício da autoridade parental;
III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;
IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;
V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;
VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;
VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.
Entretanto, saliente-se que este elenco legal é exemplificativo, podendo haver outros casos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia.
Desta feita, a prática de ato de alienação parental deve ser perseguida pois, dentre outros: fere direito fundamental da criança ou do adolescente de convivência familiar saudável; prejudica a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar; constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente; e constitui descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda.
2.3 RECONHECIMENTO, PROVIDÊNCIAS E MEDIDAS DA ALIENTAÇÃO PARENTAL EM JUÍZO
Como é cediço, com a criação da Lei de Alienação Parental, o reconhecimento de sua prática deve ser feito necessariamente em juízo.
A parte pode ingressar com uma ação autônoma pedindo este reconhecimento ou poderá formular pedido incidental em outra ação (ex: genitor, no bojo da ação de guarda, formula pedido incidental de reconhecimento de que a mãe da criança está praticando atos de alienação parental).
Porém, impende-se destacar que a Lei faculta ao juiz esta possibilidade, desde que seja de forma incidental em um processo já instaurado, como por exemplo em uma ação de divórcio, durante a instrução, o juiz percebe que a mãe da criança tem praticado atos de alienação parental.
Por outro lado, é importante salientar que a Lei afirma que o reconhecimento de ato de alienação parental pode ocorrer em qualquer momento.
Logo, se o juiz verificar e declarar a existência de indício de ato de alienação parental, o processo terá tramitação prioritária, e, ouvido o Ministério Público, serão determinadas, com urgência, as medidas provisórias necessárias para preservação da integridade psicológica da criança ou do adolescente, inclusive para assegurar sua convivência com genitor ou viabilizar a efetiva reaproximação entre ambos, se for o caso.
Assegurar-se-á à criança ou adolescente e ao genitor garantia mínima de visitação assistida, ressalvados os casos em que há iminente risco de prejuízo à integridade física ou psicológica da criança ou do adolescente, atestado por profissional eventualmente designado pelo juiz para acompanhamento das visitas.
Entretanto, pode, o juiz, se entender necessário, determinar a realização de perícia psicológica ou biopsicossocial. Esse laudo pericial terá base em ampla avaliação psicológica ou biopsicossocial, conforme o caso, compreendendo, inclusive, entrevista pessoal com as partes, exame de documentos dos autos, histórico do relacionamento do casal e da separação, cronologia de incidentes, avaliação da personalidade dos envolvidos e exame da forma como a criança ou adolescente se manifesta acerca de eventual acusação contra genitor.
A perícia será realizada por profissional ou equipe multidisciplinar habilitados, exigido, em qualquer caso, aptidão comprovada por histórico profissional ou acadêmico para diagnosticar atos de alienação parental.
O perito ou equipe multidisciplinar designada para verificar a ocorrência de alienação parental terá prazo de 90 (noventa) dias para apresentação do laudo, prorrogável exclusivamente por autorização judicial baseada em justificativa circunstanciada.
Assim, uma vez constatadas a prática da Alienação parental, as seguintes medidas poderão ser tomadas pelo juiz:
I - advertir o alienador;
II - ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado;
III - estipular multa ao alienador;
IV - determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial;
V - determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão;
VI - determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente;
VII - declarar a suspensão da autoridade parental.
Portanto, o juiz, de acordo com a gravidade do caso, poderá cumular mais de uma das medidas acima expostas. Se ficar caracterizado que o alienador mudou abusivamente de endereço, ou que está inviabilizando ou obstruindo a convivência familiar, o juiz poderá determinar que o alienador fique com a obrigação de levar a criança ou adolescente para a residência do alienado quando das alternâncias dos períodos de convivência familiar.
2.4 - A PRÁTICA DE ALIENAÇÃO PARENTAL CONFIGURA CRIME?
Não. A Lei n.° 12.318/2010 previa a inclusão do parágrafo único ao art. 236 do ECA estabelecendo como crime a conduta de quem apresentasse falso relato às autoridades cujo teor pudesse ensejar restrição à convivência de criança ou adolescente com genitor. Seria a criminalização de um dos atos de alienação parental.
Ocorre que a previsão deste novo tipo penal foi vetada pelo Presidente da República sob as seguintes razões:
“O Estatuto da Criança e do Adolescente já contempla mecanismos de punição suficientes para inibir os efeitos da alienação parental, como a inversão da guarda, multa e até mesmo a suspensão da autoridade parental. Assim, não se mostra necessária a inclusão de sanção de natureza penal, cujos efeitos poderão ser prejudiciais à criança ou ao adolescente, detentores dos direitos que se pretende assegurar com o projeto.”
Desse modo, atualmente, não existe punição criminal específica para atos de alienação parental, podendo, no entanto, a depender do caso concreto, caracterizar algum dos tipos penais já previstos, como é o caso da calúnia.
3. APLICAÇÃO NA JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS PÁTRIOS
O Poder Judiciário não deve ser a primeira opção, mas a questão já chegou aos tribunais, e hoje trata-se de tema recorrente. Observe-se o teor das Ementas recentes dos Tribunais Pátrios acerca do tema:
AÇÃO DECLARATÓRIA DE ALIENAÇÃO PARENTAL C/C PEDIDO DE LIMINAR E REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS PROPOSTA PELA GENITORA. Suscitada a incompetência do juízo da Comarca de balneário camboriú, uma vez que já tramita na Comarca de itajaí ação de regulamentação de visitas intentada pelo genitor. Subsistência. Competência absoluta para o julgamento da causa desta Comarca já definida no agravo de instrumento nº 2012.073470-6 (deste relator). Desaconselhável o trâmite de demandas afins em unidades jurisdicionais diferentes. Possibilidade de decisões conflitantes. Conexão manifesta. Competência regulada pela prevenção. Exegese dos arts. 103, 105 e 106 do código de processo civil. Nulidade absoluta do decisum. Remessa dos autos ao juízo competente. Recurso provido. (TJSC; AI 2012.073763-0; Balneário Camboriú; Terceira Câmara de Direito Civil; Rel. Des. Marcus Túlio Sartorato; Julg. 24/09/2013; DJSC 01/10/2013; Pág. 160)
APELAÇÃO. FAMÍLIA. AÇÃO DE GUARDA COMPARTILHADA C/C ALIENAÇÃO PARENTAL. REALIZAÇÃO DE PERÍCIA TÉCNICA. ENCARGOS. ÔNUS DO VENCIDO. 1. O julgador não se encontra vinculado à tese das partes; o fato de a fundamentação do julgado não coincidir com os interesses defendidos pelos litigantes não implica omissão. 2. Os consectários inerentes à produção da prova técnica requerida, tal como o pagamento dos honorários periciais, devem ser suportados pela parte vencida. Inteligência do art. 20, do CPC. 3. Somente se atribui ao estado o ônus de arcar com a perícia se o litigante for beneficiário da gratuidade de justiça. Precedentes desta corte. 4. O parecer elaborado pela equipe da secretaria psicossocial judiciária mostra-se detalhado, devidamente fundamentado, claro e coeso, não havendo nenhuma evidência que desabone as conclusões a que chegaram os servidores atuantes, preparados para lidar com situações familiares conflituosas. 5. Negou-se provimento ao apelo. (TJDF; Rec 2010.01.1.186416-3; Ac. 713.942; Primeira Turma Cível; Rel. Des. Flavio Rostirola; DJDFTE 25/09/2013; Pág. 102)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. CIVIL. FAMÍLIA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REGIME DE VISITAS. RESTRIÇÃO DE VISITAS DO PAI. QUADRO TANGÍVEL DE ALIENAÇÃO PARENTAL. PROMOÇÃO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA. FAMÍLIA MOSAICO. CONVIVÊNCIA FAMILIAR. CANAIS DE DIÁLOGO. CRESCIMENTO SADIO DO ADOLESCENTE. POSSIBILIDADE DE RESTRIÇÃO DAS VISITAS DO PAI ATÉ A REALIZAÇÃO DO ESTUDO PSICOSSOCIAL. 1. Os requisitos atinentes à antecipação da tutela adquirem colorido particular quando o interesse tutelado envolve a difícil equação relativa à promoção do melhor interesse do adolescente. Desse modo, para fins de ser preservada e tutelada a sua integridade física e psíquica, é possível reputar verossímeis alegações ainda que não haja, até o momento processual da ação principal, provas inequívocas dos indícios de alienação parental. 2. Diante do desenho moderno de famílias mosaico, formadas por núcleo familiar integrado por genitores que já constituíram outros laços familiares, devem os genitores evitar posturas que robusteçam o tom conflituoso, sob pena de tornar ainda mais tensa a criança, a qual se vê cada vez mais vulnerável em razão do tom e da falta de diálogo entre os pais. Os contornos da guarda de um filho não podem refletir desajustes de relacionamentos anteriores desfeitos, devendo ilustrar, ao revés, o empenho e a maturidades do par parental em vista de viabilizar uma realidade saudável para o crescimento do filho. 3. A preservação do melhor interesse da criança dá ensejo à restrição do direito de visitas do genitor, até que, com esteio em elementos de prova a serem produzidos na ação principal, sejam definidas diretrizes para uma melhor convivência da criança, o que recomendará a redução do conflito entre os genitores, bem como a criação de novos canais que viabilizem o crescimento sadio da criança. 4. Ambos os genitores devem empreender esforços no sentido de conservar os laços de afeto do filho, razão pela qual a aplicação de medida de proteção pelo juízo de primeiro grau (determinação de que o adolescente e os genitores passassem a participar de acompanhamento psicológico) reúne sensibilidade e precisão em relação à necessidade de nova postura dos genitores. 5. Agravo de instrumento conhecido a que se nega provimento. (TJDF; Rec 2013.00.2.010788-7; Ac. 709.574; Primeira Turma Cível; Relª Desª Simone Lucindo; DJDFTE 11/09/2013; Pág. 74)
Ademais, é assente a preocupação do Superior Tribunal de Justiça quanto ao tema, inclusive promovendo diversos esclarecimentos em seu site a respeito do tema (http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=103980, consultado em 09/10/2013):
“ESPECIAL
Alienação parental: Judiciário não deve ser a primeira opção, mas a questão já chegou aos tribunais
Ainda uma novidade no Judiciário brasileiro, a alienação parental vem ganhando espaço no direito de família e, se não detectada e tratada com rapidez, pode ter efeitos catastróficos. “Síndrome da Alienação Parental” (SAP) é o termo proposto pelo psicólogo americano Richard Gardner, em 1985, para a situação em que a mãe ou o pai de uma criança a induz a romper os laços afetivos com o outro genitor, criando fortes sentimentos de ansiedade e temor em relação a ele.
Os casos mais comuns de alienação parental estão associados a situações em que a ruptura da vida conjugal gera em um dos pais uma tendência vingativa. Quando ele não consegue aceitar a separação, começa um processo de destruição, vingança, desmoralização e descrédito do ex-cônjuge. Nesse processo vingativo, o filho é utilizado como instrumento da agressividade direcionada ao ex-parceiro.
Apenas em 2010 a alienação parental foi inserida no direito brasileiro, e já chegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) como tema de processos. A Lei 12.318/10 conceitua a alienação parental como “a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este”. Estão exemplificadas no dispositivo atitudes caracterizadoras da alienação parental e, além disso, existe a previsão de punições para seus praticantes.
Características
Nos casos identificados como alienação parental, um dos pais (o genitor alienante) procura excluir o outro (genitor alienado) da vida dos filhos, não o incluindo nas decisões mais importantes sobre a vida das crianças. O alienante também interfere nas visitas que o alienado tem com as crianças, controlando os horários e o impedindo de exceder seu tempo com os filhos. Além disso, ele inclui a criança no conflito entre os genitores, denegrindo a imagem do outro genitor e, às vezes, até fazendo falsas acusações.
“Com maior frequência do que se supõe, reiteradas barreiras são colocadas pelo guardião com relação às visitas. Esses artifícios e manobras vão desde compromissos de última hora, doenças inexistentes, e o pior disso tudo é que ocorre por um egoísmo fruto da animosidade dos ex-cônjuges, com a criança sendo utilizada como instrumento de vingança”, diz Felipe Niemezewsky da Rosa em seu livro “A síndrome de alienação parental nos casos de separações judiciais no direito civil brasileiro”.
Consequências
No centro desse conflito, a criança passa a ter sentimentos negativos em relação ao genitor alienado, além de guardar memórias e experiências exageradas ou mesmo falsas – implantadas pelo genitor alienante em um processo também chamado de “lavagem cerebral” (brainwashing).
Ao mesmo tempo, as crianças estão mais sujeitas a sofrer depressão, ansiedade, ter baixa autoestima e dificuldade para se relacionar posteriormente. “É importante notar que a doutrinação de uma criança através da SAP é uma forma de abuso – abuso emocional –, porque pode razoavelmente conduzir ao enfraquecimento progressivo da ligação psicológica entre a criança e um genitor amoroso. Em muitos casos pode conduzir à destruição total dessa ligação, com alienação por toda a vida”, explica Richard Gardner, criador do termo, em artigo sobre a Síndrome da Alienação Parental publicado na internet, em site mantido por pais, mães, familiares e colaboradores.
Ou seja, os maiores prejuízos não são do genitor alienado, e sim da criança. Os sintomas mais comuns para as crianças alienadas são: ansiedade, medo, insegurança, isolamento, depressão, comportamento hostil, falta de organização, dificuldade na escola, dupla personalidade. Além disso, por conta do comportamento abusivo ao qual a criança está sujeita, há prejuízo também para todos os outros que participam de sua vida afetiva: colegas, professores, familiares.
Papel do Judiciário
Para a especialista Hildeliza Cabral, o Judiciário não deve ser a primeira opção. “Detectada a situação, deve o genitor alienado procurar apoio psicossocial para a vítima e iniciar o acompanhamento psicoterapêutico. Em não conseguindo estabelecer diálogo com o alienante, negando-se ele a participar do processo de reconstrução do relacionamento, deve o alienado requerer ao Juízo da Vara de Família, Infância e Juventude as providências cabíveis”, escreve em artigo sobre os efeitos jurídicos da SAP.
Analdino Rodrigues, presidente da ONG Apase (Associação de Pais e Mães Separados), concorda que o Judiciário só deve ser procurado em último caso, e que os pais devem buscar o entendimento por meio do bom-senso. Só se isso não for possível é que o Judiciário deve ser procurado como mediador. A ONG atua na conscientização e informação sobre temas ligados à guarda de crianças, como alienação parental e guarda compartilhada, e atuou na formulação e aprovação da lei de alienação parental.
Porém, a alienação parental ainda é novidade para os tribunais brasileiros. “Por tratar-se de tema muito atual, ainda não existem muita jurisprudência disponível, justamente por ser assunto em estudo e que ainda enfrenta muitas dificuldades para ser reconhecido no processo”, diz Felipe Rosa.
Entretanto, ainda assim, a Justiça pode ter papel decisivo na resolução dos conflitos: “O Judiciário só necessita de técnicos qualificados (psicólogos e assistentes sociais), especialistas em alienação, para saber a gradação da mesma, ou seja, para saber até que ponto a saúde física e psicológica da criança ou adolescente está comprometida.”
No STJ
O primeiro caso de alienação parental chegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) em um conflito de competência entre os juízos de direito de Paraíba do Sul (RJ) e Goiânia (GO). Diversas ações relacionadas à guarda de duas crianças tramitavam no juízo goiano, residência original delas. O juízo fluminense declarou ser competente para julgar ação ajuizada em Goiânia pela mãe, detentora da guarda das crianças, buscando suspender as visitas do pai (CC 94.723).
A alegação era de que o pai seria violento e que teria abusado sexualmente da filha. Por isso, a mãe “fugiu” para o Rio de Janeiro com o apoio do Provita (Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas). Já na ação de guarda ajuizada pelo pai das crianças, a alegação era de que a mãe sofreria da Síndrome de Alienação Parental – a causa de todas as denúncias da mãe, denegrindo a imagem paterna.
Nenhuma das denúncias contra o pai foi comprovada, ao contrário dos problemas psicológicos da mãe. Foi identificada pela perícia a Síndrome da Alienação Parental na mãe das crianças. Além de implantar memórias falsas, como a de violência e abuso sexual, ela se mudou repentinamente para o estado do Rio de Janeiro depois da sentença que julgou improcedente uma ação que buscava privar o pai do convívio dos filhos.
Sobre a questão da mudança de domicílio, o juízo goiano decidiu pela observância ao artigo 87 do Código de Processo Civil, em detrimento do artigo 147, inciso I, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). De acordo com o primeiro, o processo ficaria em Goiânia, onde foi originalmente proposto. Se observado o segundo, o processo deveria ser julgado em Paraíba do Sul, onde foi fixado o domicílio da mãe.
Para o ministro Aldir Passarinho Junior (aposentado), relator do conflito na Segunda Seção, as ações da mãe contrariavam o princípio do melhor interesse das crianças, pois, mesmo com separação ou divórcio, é importante manter ambiente semelhante àquele a que a criança estava acostumada. Ou seja, a permanência dela na mesma casa e na mesma escola era recomendável.
O ministro considerou correta a aplicação do CPC pelo juízo goiano para resguardar o interesse das crianças, pois o outro entendimento dificultaria o retorno delas ao pai – e também aos outros parentes residentes em Goiânia, inclusive os avós maternos, importantes para elas.
Exceção à regra
No julgamento de embargos de declaração em outro conflito de competência, o ministro Raul Araújo destacou que o caso acima é exceção, devendo ser levada em consideração a peculiaridade do fato. Em outra situação de mudança de domicílio, o ministro considerou correta a aplicação do artigo 147, inciso I, do ECA, e não o CPC (CC 108.689).
O ministro explicou que os julgamentos do STJ que aplicam o artigo 87 do CPC são hipóteses excepcionais, em que é “clara a existência de alienação parental em razão de sucessivas mudanças de endereço da mãe com o único intuito de deslocar artificialmente o feito”. Não seria o que ocorreu no caso, em que as mudanças de endereço se justificavam por ser o companheiro da genitora militar do Exército.
Guarda compartilhada
A guarda compartilhada foi regulamentada pela Lei 11.698/08. Esse tipo de guarda permite que ambos os pais participem da formação do filho, tendo influência nas decisões de sua vida. Nesse caso, os pais compartilham o exercício do poder familiar, ao contrário da guarda unilateral, que enfraquece o exercício desse poder, pois o genitor que não exerce a guarda perde o seu poder, distanciando-se dos filhos e sendo excluído da formação das crianças. Ele, muitas vezes, apenas exerce fiscalização frouxa e, por vezes, inócua.
Para a ministra Nancy Andrighi, “os filhos da separação e do divórcio foram, e ainda continuam sendo, no mais das vezes, órfãos de pai ou mãe vivos, onde até mesmo o termo estabelecido para os dias de convívio demonstra o distanciamento sistemático daquele que não detinha, ou detém, a guarda”. As considerações foram feitas ao analisar um caso de disputa de guarda definitiva (REsp 1.251.000).
De acordo com a ministra, “a guarda compartilhada é o ideal a ser buscado no exercício do poder familiar entre pais separados, mesmo que demandem deles reestruturações, concessões e adequações diversas, para que seus filhos possam usufruir, durante sua formação, do ideal psicológico de duplo referencial.”
A ministra Nancy Andrighi considerou, ao analisar um caso de disputa da guarda definitiva, que não era necessário haver consenso dos pais para a aplicação da guarda compartilhada, pois o foco é o melhor interesse do menor, princípio norteador das relações envolvendo filhos. O entendimento de que é inviável a guarda compartilhada sem consenso fere esse princípio, pois só observa a existência de conflito entre os pais, ignorando o melhor interesse da criança. “Não se busca extirpar as diferenças existentes entre o antigo casal, mas sim, evitar impasses que inviabilizem a guarda compartilhada”, explicou a ministra.
“Com a guarda compartilhada, o ex-casal passa a se relacionar ao menos formalmente, buscando melhores formas de criar e educar os seus filhos”, explica o presidente da Apase. “Logo, a guarda compartilhada é um importantíssimo caminho para inibir a alienação parental”, completa Rodrigues. A ONG também atuou na formulação e aprovação do projeto de lei da guarda compartilhada.
O ideal é que ambos os genitores concordem e se esforcem para que a guarda dê certo. Porém, muitas vezes, a separação ou divórcio acontecem em ambiente de conflito ou distanciamento entre o casal – essas situações são propícias para o desenvolvimento da alienação parental. A guarda compartilhada pode prevenir (ou mesmo remediar) a alienação parental, por estimular a participação de ambos os pais na vida da criança. “
3– CONCLUSÃO
Com base nas reflexões aqui expostas, é possível afirmar que, a alienação parental é um fator desestabilizante que prejudica o desenvolvimento dos filhos sendo esta o extremo da perversidade. Desta feita, ao ser trazida para o campo legal (Lei 12.318/2010) passa a ter um enfoque não só psicológico, mas também jurídico eis que a alienação pode ser constatada também nesse meio com possibilidades de inversão da guarda previamente estabelecida bem como a suspensão da autoridade parental.
4. Referências
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12318.htm
http://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%ADndrome_de_aliena%C3%A7%C3%A3o_parental
http://www.alienacaoparental.com.br/
http://www.conjur.com.br/2013-ago-04/preciso-cuidado-alienacao-parental-nao-seja-banalizada
http://www.conjur.com.br/2013-ago-04/preciso-cuidado-alienacao-parental-nao-seja-banalizada
http://www.jcnet.com.br/Geral/2013/06/alienacao-parental-divide-familias.html
Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco. Pós Graduado em Direito Civil pela UNIDERP/LFG. Pós Graduando em Direito Processual Tributário pela UNIDERP/LFG. Assessor Técnico Judiciário em Gabinete de Desembargador do Tribunal de Justiça de Pernambuco. <br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DUQUE, Felipe Viana de Araujo. Da alienação parental Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 abr 2015, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/43736/da-alienacao-parental. Acesso em: 23 dez 2024.
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