RESUMO: Este artigo se propõe abordar o poder de polícia administrativa levando-se em consideração os direitos do cidadão fundamentando-se principalmente no princípio da predominância do interesse público sobre o particular, respeitados os limites de atuação, visando a ordem pública e a paz social. Ou seja, cabe a polícia administrativa manter a ordem, vigilância e proteção da sociedade, assegurando os direitos individuais dos cidadãos e auxiliando a execução dos atos e decisões judiciais. Aborda ainda as atividades referentes ao poder de polícia que exige uma organização de recursos tanto materiais quanto humanos. Levando-se em consideração a evolução social, a atividade administrativa que visa promover a ordem pública que passou a adotar deveres de colaboração ativa, essa colaboração visa impor ao cidadão adotar tanto cautelas omissivas quanto não omissivas, pois sem elas colocariam em cheque a integridade de terceiros, dentro da legalidade, pois a lei é o viés necessário para impor deveres e obrigações em nossa sociedade. O presente artigo norteia também o princípio da proporcionalidade, segundo o qual as limitações impostas pelo poder de polícia só seriam válidas se houver adequação, necessidade e compatibilidade com as normas vigentes. Assim verificamos que o poder de polícia possui características preventivas e repressivas, abrangendo o exercício individual ou coletivo garantindo o gozo das necessidades alheias, visando a produção de direitos fundamentais por meio do Estado e da Administração no âmbito subjetivo do cidadão.
Palavras Chaves: Poder de Polícia. Direitos do Cidadão.
BSTRACT: This article is intended to cover the administrative police power taking into consideration the rights of citizens are basing mainly on the principle of dominance of the public interest in the particular subject to the limits of action, aimed at public order and social peace. In other words, it is the administrative police maintain order, surveillance and protection of society by ensuring the individual rights of citizens and aiding in the execution of acts and judgments. It also discusses activities related to the police power that requires a resource organization both material and human. Taking into account the social, administrative activity that aims to promote public policy that started to adopt active collaboration duties, this collaboration aims to impose citizens take precautions so as not omissivas because without them would put into question the integrity of third parties, within the law, because the law is the bias necessary to impose duties and obligations in our society. This article also guides the principle of proportionality, according to which the restrictions imposed by police power would only be valid if suitability, necessity and compatibility with current standards. Thus we have the police power has preventive and repressive features, including the individual or collective exercise ensuring the enjoyment of others' needs, aiming at the production of fundamental rights through the state and Administration on the subjective sphere of the citizen.
Key Words: Police Power. Citizens' Rights.
SUMÁRIO: 1. Introdução 2. Princípios da Administração Pública de Maior Relevância para o Exercício do Poder de Polícia 2.1. Princípios da Supremacia do Interesse Público 2.2. Princípio da Indisponibilidade do Interesse Público 2.3. Princípio da Legalidade 2.4 Princípio da Impessoalidade 2.5 Princípio da Moralidade 2.6 Princípio da Razoabilidade e Proporcionalidade 2.7 Princípio da Autotutela 3. O Poder de Polícia e os Direitos dos Cidadãos 3.1 Conceito do Poder de Polícia 3.2 Sanções aplicáveis e limites ao Poder de Polícia 4. Conclusão 5. Referências.
1. Introdução
Para a administração pública manter ao mesmo tempo a ordem e o bem estar social por meio do poder de polícia devem-se considerar suas prerrogativas (autoexecutoriedade, discricionariedade e coercibilidade) bem como seus princípios norteadores. A “vontade” da administração pública impõe-se ao do particular mesmo que esta não seja sua vontade, em razão de ser a Administração um órgão do Estado fiscalizador das leis. Neste sentido verificamos a importância do poder de polícia para a administração pública, razão pela qual é em virtude deste instituto que a administração consegue organizar e manter a sociedade num estado de cooperação, visando sempre à paz e o desenvolvimento da coletividade.
O meio viável para o particular se opor à decisão tomada pela administração é o Poder Judiciário, conforme garante nossa constituição em seu Artigo 5º, inciso XXXV “A lei não excluirá da apreciação do poder judiciário lesão ou ameaça a direito”. Assim o cidadão estaria respaldado quando lesado em virtude de atos da administração que invadam seus direitos enquanto indivíduo. Ou seja, caso a autoridade extrapole o limite legal ocorrerá o abuso de poder, que poderá ser sanado mediante ação judicial. Seguindo a mesma linha, o ato de polícia, que é ato administrativo, será invalidado pelo poder judiciário, quando praticado com excesso ou desvio de poder.
Segundo o nobre professor Marçal Justen Filho (Curso de direito Administrativo 2006 – vu: 393): “O poder de polícia administrativa é a competência administrativa de disciplinar o exercício da autonomia privada para a realização de direitos fundamentais e da democracia, segundo princípios da legalidade e da proporcionalidade”. Nesse sentido o poder de polícia é a atividade administrativa que limita o exercício dos direitos individuais em beneficio da segurança e bem estar da coletividade. O princípio da proporcionalidade e o princípio da razoabilidade estabelecem limites de atuação do poder de polícia, exigindo o cumprimento de sua finalidade estabelecida em lei. Bem como deve haver proporcionalidade entre a medida adotada pela Administração Pública e o objetivo legal a atingir, havendo ainda proporcionalidade entre o quantum e o alcance da medida aplicada.
Um meio eficaz para combater a arbitrariedade é o bom senso nos atos de polícia. O bom senso em cada atitude do agente é primordial para que a atividade fiscalizatória não ultrapasse os limites impostos. Bom senso também na aplicação da coercitividade. Manter a proporcionalidade entre a infração e o ato coercitivo é meio eficaz de delimitar o alcance do poder. É o caso do emprego da força quando desnecessário. Ou de não empregá-la quando imprescindível. Razão pela qual é necessário que o agente do ato de polícia tenha domínio da Lei.
Nesse diapasão com os limites impostos à discricionariedade, o que se pretende é vedar qualquer manifestação de arbitrariedade por parte do agente do poder de polícia. A intenção não é extinguir os direitos individuais com as medidas administrativas referentes ao poder de polícia, diante da ordem jurídica de Estado Democrático de Direito, pelo qual se aplicará os princípios da necessidade, proporcionalidade, eficácia e razoabilidade. Deve-se ponderar em todo exercício de poder de polícia os princípios administrativos, especialmente, os princípios da necessidade, da proporcionalidade e da eficácia.
2. Princípios da Administração Pública de Maior Relevância para o Exercício do Poder de Polícia
2.1. Princípio da Supremacia do Interesse Público
Os princípios são os pilares que servem de norte para a ciência devidamente imposta. Possuem uma diretriz de maior alcance que uma regra normativa, sendo usada também para o estabelecimento de alguns limites, visando uma melhor compreensão e interpretação da ciência em exame. De acordo com Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo:
Os princípios são as ideias centrais de um sistema, estabelecendo suas diretrizes e conferindo a ele um sentido lógico, harmonioso e racional, o que possibilita uma adequada compreensão de sua estrutura. Os princípios determinam o alcance e o sentido das regras de um dado subsistema do ordenamento jurídico, balizando a interpretação e apropria produção normativa. (ALEXANDRINO e PAULO, 2011, pág.183).
Embora não possuindo previsão explícita, se encontrando apenas de forma implícita no texto da Constituição Federal, o princípio da supremacia do interesse público decorre das instituições adotadas pelo Brasil. Devido ao fato de que a República Federativa do Brasil preza pela democracia e pelo sistema representativo, já se infere que a atuação estatal se paute pelo interesse público. Desse modo, obviamente, a o atuar do Estado é pautado pela subordinação dos interesses privados a seus interesses.
As mais variadas manifestações de exercício do poder de polícia administrativa, que são exercitadas por meio da limitação ou do condicionamento do exercício de atividades privadas, privilegiando o interesse público, são grandes exemplos de prerrogativas de direito público da Administração Pública que derivam de forma direta do princípio da supremacia do interesse público.
Nas palavras de Dirley da Cunha Jr.:
A posição de supremacia é muitas vezes expressada através da afirmação de que vigora a verticalidade nas relações entre Administração e particulares, ao contrário da horizontalidade, típica das relações entre particulares. Isso significa que o Poder Público se encontra em situação de comando e autoridade relativamente aos particulares, como indispensável condição para gerir os interesses públicos postos em confronto. Isso implica o reconhecimento de uma desigualdade jurídica entre a Administração e os administrados. (CUNHA, 2006, pág. 13).
Por fim, cabe ressaltar que apesar da grande importância do princípio em comento, assim como qualquer outro princípio jurídico, não possui caráter absoluto, devendo ser bem analisado quando do surgimento do caso em concreto.
2.2. Princípio da Indisponibilidade do Interesse Público
O princípio em foco representa um princípio implícito que preceitua que o interesse público não pode ser posto à disposição da vontade do administrador, já que na Administração Pública os bens e interesses devem ser protegidos de acordo com a finalidade que a lei lhes atribuiu.
De acordo com os ensinamentos do renomado autor Dirley da Cunha Jr. :
Sendo o interesse público qualificado como próprio da coletividade, este não se encontra à livre disposição de quem quer que seja, por ser insuscetível de apropriação. Os próprios sujeitos da Administração que o representam não têm disponibilidade sobre ele, haja vista que lhes incumbe tão-somente curá-lo, no desempenho de um dever. (CUNHA, pág. 14, 2006).
Interessante observar que o princípio da indisponibilidade garante sua presença em qualquer atuação da Administração Pública, referindo-se também, por consequência, aos atos de poder polícia praticados. Nas palavras da autora Raquel de Carvalho:
Com base na premissa de que a Administração não titulariza os interesses públicos primários, é lugar comum afirmar a indisponibilidade de tais interesses pelo agente encarregado de, na sua gestão, protegê-los. Quem detém apenas poderes instrumentais à consecução de um dado fim não possui, em princípio, a prerrogativa de deles abrir mão, donde resulta a idéia de indisponibilidade do interesse público. ( CARVALHO, pág.72, 2008).
Mister frisar que quando se usa a expressão interesse público , a referência que se faz está atrelada a um sentido amplo, abrangendo por total o patrimônio público e os direitos e interesses a ele atrelado. Portanto, a Administração Pública deve sempre agir pautada com base no comando do princípio em tela.
2.3. Princípio da Legalidade
O princípio em comento está previsto de forma explícita no caput do art. 37 da CF e, em decorrência do princípio da indisponibilidade do interesse público, determina que a atividade administrativa deve ser prestada de acordo com o que prevê a lei, até mesmo nos casos que tratam de atos que envolvam certa margem de discricionariedade.
No que tange a diferenciação do princípio da legalidade no âmbito das relações públicas para o âmbito das relações privadas, preceitua Dirley da Cunha Jr.:
Sabe-se que, no âmbito das relações privadas, vige a idéia de que tudo que não está proibido em lei está permitido. Nas relações públicas, contudo, o princípio da legalidade envolve a ideia de que a Administração Pública só pode atuar quando autorizada ou permitida pela lei. A norma deve autorizar o agir e o não agir dos sujeitos da Administração Pública, pois ela é integralmente subserviente à lei. (CUNHA JR., 2006, pág. 15).
A doutrina discorre como deve ser a atividade do administrador que respeita o princípio da legalidade. Nesse sentido, dispõe Hely Lopes Meirelles:
A legalidade, como princípio de administração, significa que o administrador público está, em toda sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei, e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso. (MEIRELLES, pág.147, 2005).
Cabe asseverar que o princípio da legalidade ao tratar da impossibilidade de a Administração Pública atuar em desconformidade com a lei, não apenas determina que a lei em questão seja a de sentido em estrito, pois cumpre respeitar também a observância dos princípios jurídicos e do ordenamento jurídico como um todo.
Assim, resta claro que toda a atividade da Administração Pública deve se pautar de acordo com o princípio da legalidade, ficando evidente ainda que até mesmo nos casos em que há certa discricionariedade em sua atuação, como na maioria dos casos que envolvem o poder de polícia, deve todo o ato estar lastreado pela legalidade, já que o Estado pode até ter liberdade para a escolha do melhor momento de agir, a sanção ou o meio mais adequado para determinado caso em concreto, mas não pode se afastar dos ditames legais.
2.4. Princípio da Impessoalidade
O princípio da impessoalidade se revela sobre duas vertentes a que determina que a atividade administrativa deve ser desempenhada de forma que atenda a toda a coletividade, e não seja usado apenas para o benefício de certos indivíduos em detrimento de outros, e a que determina que é vedado ao agente público se promover às custas da Administração Pública.
A primeira vertente refere-se à questão da impessoalidade, pois essa acepção mais tradicional entende que o ato administrativo deve ser praticado de acordo com o que a lei determina, e não em conformidade com interesses pessoais. Dessa forma, é notório que sob o prima que relaciona a impessoalidade com a finalidade, tal princípio deve ser observado rigorosamente nos casos em que o poder de polícia se faz presente. Acerca do ponto de vista mais tradicional do princípio da impessoalidade discorrem Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo :
A impessoalidade da atuação administrativa impede, portanto, que o ato administrativo seja praticado visando a interesses do agente ou de terceiros, devendo ater-se à vontade da lei, comando geral e abstrato em essência. Dessa forma, ele impede perseguições ou favorecimentos, discriminações benéficas ou prejudiciais aos administrados. Qualquer ato praticado com objetivo diverso da satisfação do interesse público será nulo por desvio de finalidade. (ALEXANDRINO e PAULO, pág. 194, 2011).
Um exemplo bastante elucidativo de uma conduta do administrador que não atue em conformidade com o princípio da finalidade seria a daquele que sob a alegação de estar agindo em nome do poder de polícia, aplica como sanção a um proprietário de um estabelecimento comercial, que por irregularidade branda e facilmente sanável, ocorra o fechamento de seu comércio, pelo fato de , na verdade, estar o administrador sofrendo com a concorrência do mercado alheio.
É evidente a necessidade da observância do princípio abordado a fim de que seja legítima a atuação administrativa quando da invocação do princípio em questão, somente assim poderá a Administração condicionar o exercício dos direitos individuais aos direitos que se relacionam ao bem estar coletivo.
2.5. Princípio da Moralidade
O princípio em questão invoca a atuação administrativa pautada nos preceitos éticos, probos e da boa-fé. Previsto expressamente no caput do art. 37 da Constituição Federal, determina que deve ser seguido um conjunto de valores de condutas que não se confundem com a legalidade administrativa, já que a norma pode ser legalmente perfeita, mas ser deficiente do ponto de vista moral, se não for lastreada por atitude ética e de boa-fé. Leciona Dirley Da Cunha Jr.:
Deve-se entender por moralidade administrativa um conjunto de valores éticos que fixam um padrão de conduta que deve ser necessariamente observado pelos agentes públicos como condição para uma honesta, proba e íntegra gestão da coisa pública, de modo a impor que estes agentes atuem no desempenho de suas funções com retidão de caráter, decência, lealdade, decoro e boa-fé. (CUNHA JR, pág.16, 2006).
De acordo com os ensinamentos de Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo que a moralidade administrativa não guarda dependência com o viés pessoal. Nesse sentido aduzem que:
A doutrina enfatiza que a moralidade administrativa independe da concepção subjetiva (pessoal) de conduta moral, ética, que o agente público tenha ; importa, sim, a noção objetiva, embora indeterminada, passível de ser extraída do conjunto de normas concernentes à conduta de agentes públicos, existentes no ordenamento jurídico. O vocábulo “ objetivo “ aqui, significa que não se toma como referência um conceito pessoal, subjetivo- referente ao sujeito- de moral , mas um conceito impessoal, geral, anônimo de moral, que pode ser obtido a partir da analise das normas de conduta dos agentes públicos presentes no ordenamento jurídico.
A partir de breve análise do conceito do princípio da moralidade, fica evidente a necessidade de que todo e qualquer ato praticado pela Administração Pública deve guardar estreita relação com a observância do princípio em tela.
2.6. Princípio da Razoabilidade e da Proporcionalidade
Constitui princípio constitucional implícito que direciona o ato do poder público a ser praticado com adequação, necessidade e proporcionalidade no sentido estrito. A adequação consubstancia-se na exigência de que a Administração Pública utilize medidas aptas para alcançar os objetivos perseguidos. A necessidade determina que a Administração Pública adote meios que ocasionem menores limitações aos direitos dos administrados, na tentativa de que sejam evitados excessos. A proporcionalidade em sentido estrito impõe que deve haver um equilíbrio entre o que ocasionou o ato administrativo e a providência tomada pela Administração Pública para atingir os fins almejados.
Importante princípio norteador da atuação estatal, o referido princípio se destaca quando da análise dos limites impostos ao exercício da Administração Pública no que tange ao exercício do poder de polícia. Nesse sentido, tratando do objeto do ato administrativo praticado no exercício do poder de polícia, discorre a autora Maria Sylvia Zanella Di Pietro:
Quanto ao objeto, ou seja, quanto ao meio de ação, a autoridade sofre limitações, mesmo quando a lei lhe dê várias alternativas possíveis. Tem aqui aplicação um princípio de direito administrativo, a saber, o da proporcionalidade dos meios aos fins; isto equivale a dizer que o poder de polícia não deve ir além do necessário para a satisfação do interesse público que visa proteger; a sua finalidade não é destruir os direitos individuais, mas, ao contrário, assegurar o seu exercício, condicionando-o ao bem-estar social; só poderá reduzi-los quando em conflito com interesses maiores da coletividade e na medida estritamente necessária à consecução dos fins estatais.( ZANELLA, pág. 113, 2008).
No mesmo sentido afirmam Marcelo Alexandrino e Vicente Paula:
O postulado da proporcionalidade é importante, sobretudo, no controle dos atos sancionatórios, especialmente nos atos de polícia administrativa. Com efeito, a intensidade e a extensão do ato sancionatório deve corresponder, deve guardar relação de congruência com a lesividade e gravidade da conduta que se tenciona reprimir ou prevenir. A noção é intuitiva: uma infração leve deve receber uma sanção branda; a uma falta grave deve corresponder uma punição severa.( ALEXANDRINO e PAULO, pág. 203, 2011).
Após a análise do princípio da proporcionalidade, resta claro a importância que lhe é conferida quando da prática de ato que envolva o poder de polícia, configurando a sua existência como um grande limitador da atuação do Estado em prol do respeito aos direitos dos cidadãos.
3. O Poder de Polícia e os Direitos dos Cidadãos
3.1. Conceito do Poder de Polícia
O poder de polícia é uma atividade do Estado que consiste em restringir ou limitar direitos individuais em prol do interesse público ou da coletividade. Como ensina a doutrinadora Odete Medauar em sua obra Direito Administrativo Moderno cita Caio Tácito, que conceitua poder de polícia como sendo um:
[...] conjunto de atribuições concedidas à Administração para disciplinar e restringir, em favor do interesse público adequado, direitos e liberdades individuais.
[...] a atividade da Administração Pública que se expressa por meio de atos normativos ou concretos, com fundamento na supremacia geral e, na forma da lei, de condicionar a liberdade e a propriedade dos indivíduos mediante ações fiscalizadoras, preventivas e repressivas, impondo aos administrados comportamentos compatíveis com os interesses sociais sedimentados no sistema normativo. (MEDAUAR, pág. 238, 2000).
Segundo a doutrinadora Fernanda Marinela, o poder de polícia é:
[...] um instrumento conferido ao administrador que lhe permite condicionar, restringir, frenar o exercício da atividade, o uso e gozo de bens e direitos pelos particulares, em nome do interesse da coletividade. (MARINELA, pág.54, 2012).
A Constituição de 1988, dentre outras leis concedem aos cidadãos uma série de direitos, mas para usufruí-lo seu gozo de coadunar com o bem-estar social, como o uso da liberdade e da propriedade, que devem estar compatíveis com o bem comum, não prejudicando os interesses públicos.
Devemos observar também, que o Código Tributário Nacional, ao tratar dos fatos geradores das taxas, em seu artigo 78, conceitua fato gerador do Poder de Polícia como sendo:
Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.
No artigo acima citado, caput, define o poder de polícia como atividade da Administração Pública, no entanto o parágrafo único considera regular o seu exercício quando:
[...] “desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.”
Paralelamente ao acima citado o nobre doutrinador HELY LOPES MEIRELLES, ratifica o Poder de Polícia como:
O mecanismo de frenagem de que dispõe a Administração Pública para conter os abusos do direito individual. Por esse mecanismo, que faz parte de toda a Administração. O Estado detém a atividade dos particulares que se revelar contrária, nociva ou inconveniente ao bem-estar social, ao desenvolvimento e à segurança nacional. (2000, pág. 122)
Portanto, para Meirelles, as ilegalidades praticadas por indivíduos praticadas contra a Administração Pública que geram danos ou prejuízos ao interesse público são considerados abusos da mesma forma.
Na mesma linha TOSCHIO MUKAI( 1999, p. 89) traz o poder de polícia como:
Uma faculdade, inerente à Administração Pública, que esta detém, para disciplinar e restringir as atividades, o uso e gozo de bens e de direitos, bem assim as liberdades dos administrados, em benefício da coletividade.
Para DI PIETRO o Poder de Polícia:
é a atividade do Estado consistente em limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público(2000, pág. 94-95).
Da análise dos diversos doutrinadores não há que se falar em divergência quanto ao conceito de Poder de Polícia, é pacífico na doutrina a restrição dos direitos individuais em prol da coletividade.
3.2. Limites e Sanções Aplicáveis ao Poder de Polícia
Apesar de o ato de polícia ser discricionário, a lei impõe limites quanto à competência, à forma, aos fins ou ao objeto. Medidas que devem ser observadas para a proteção da coletividade bem como do cidadão.
Com relação ao procedimento, forma dos atos administrativos, a Lei que institui o ato versará a respeito do tema, portanto o agente deve agir segundo o princípio da legalidade, devendo-se basear-se pela lei.
Em relação aos fins, dever-se-á observar o interesse público, dessa forma o Poder de Polícia deverá atender a este instituto. O agente que não observar esta prerrogativa consequentemente estará praticando ato lesivo ao cidadão na modalidade desvio de poder, podendo ser acionado tanto na esfera civil, penal e administrativa. A fundamentação do poder de polícia é a predominância do interesse público sobre o particular, assim qualquer benefício em detrimento do interesse público é ato lesivo passível de punição.
Com relação ao objeto é de suprema relevância o princípio da proporcionalidade dos meios aos fins. Neste sentido deve-se considerar que o poder de polícia não ultrapassará o necessário para a concretização do interesse público que visa guarnecer, tem como finalidade resguardar os direitos individuais, levando em consideração o bem-estar social, e só poderá ser restringido, observado os limites, quando conflitantes com interesses de maior relevância da coletividade, margeando apenas o necessário para atingir seus objetivos, sem que lesione o cidadão além do necessário.
Na esfera das sanções do Poder de Polícia podemos observar que esta é muito ampla, sendo que a Administração Pública vem atuando em diversos setores para abranger um maior número de indivíduos e tutelar seus interesses, a saber: trânsito; posturas municipais; economia popular; segurança e ordem pública; saúde e alimentação; valores culturais, estéticos e artísticos etc.
Na Administração Pública o Poder de o Poder de Policia se concretiza por meio de atos preventivos, fiscalizadores e repressivos. Os atos preventivos são os próprios regulamentos administrativos, com a finalidade de unificar ou padronizar comportamentos para facilitar o controle por parte da Administração Pública. Os atos fiscalizadores são as inspeções, vistorias e exames realizados pela Administração para impor o cumprimento de suas próprias normas. E os atos repressivos são os que consistem em aplicação de sanções pelo descumprimento das normas previamente estabelecidas que são impostas aos administrados pelo poder de polícia.
As sanções devem ser previamente instituídas por Lei e podem ser: I – pecuniárias (multas); II – restritivas (interdição de atividade); III – destrutivas (inutilização de gênero alimentício impróprio ao consumo). Por vezes ocorre que o mesmo fato gera pluralidade de ilícitos e de sanções administrativas, quando isso ocorre as sanções deverão ser aplicadas da forma menos danosa ao particular, neste momento deve-se observar também o Princípio da proporcionalidade ou da adequação dos meios aos fins como leciona Hely Lopes Meirelles:
Sacrificar um direito ou uma liberdade do indivíduo sem vantagem para a coletividade invalida o fundamento social do ato de polícia, pela desproporcionalidade da medida ( MEIRELES, pág. 87, 2005).
Neste contexto podemos inferir que o que se busca é a observância da legalidade da sanção aplicada e sua proporcionalidade à infração cometida, para que o cidadão sofra o mínimo necessário.
4. Conclusão
Diante das abordagens trazidas no decorrer da presente pesquisa, pode-se inferir que é de relevância acentuada o exercício do poder de polícia nas atividades da Administração Pública, sendo que é por meio desse poder administrativo que o Estado mantem a ordem social. Nos atos e funções emanados do Poder Público, é notório a presença do poder de polícia, sendo que além de ser um instrumento de fiscalização da Administração sobre os administrados, também possibilita o controle das ações dos agentes públicos, para que não ultrapassem os limites permitidos em lei, o que descaracterizaria o poder de polícia, e configuraria o abuso ou desvio de poder.
O fundamento do poder de policia é o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado. Por meio dele, limitam-se os direitos individuais das pessoas em benefício do interesse coletivo. É exercido pela Administração Pública sobre direitos, bens e atividades que afetem ou possam afetar a coletividade. Assim, o objeto do poder de polícia é todo direito, bem ou atividade individual que possa afetar a coletividade.
Para que o poder de polícia não se torne um artifício para lesar a coletividade nas mãos de seus detentores, impõe-se limites. Limites à forma, à competência, aos fins e ao objeto, com o intuito de manter o original objetivo do poder de polícia, que acima de quaisquer outros objetivos, visa o interesse e o bem-estar público.
A administração pública incumbe-se da tarefa de repelir comportamentos antissociais e cabe a ela promover a cada cidadão uma viva que o possa proporcionar maior satisfação e aproveitamentos, sem que prejudique ou lesione direitos de outros indivíduos. Com limites impostos à discricionariedade pretende-se vedar qualquer manifestação de arbitrariedade por parte do agente administrativo. O interesse da administração não é retirar os direitos individuais com as medidas administrativas referentes ao poder de polícia, observada a ordem jurídica de Estado Democrático de Direito, pelo que se aplicarão os princípios da necessidade, proporcionalidade, eficácia e razoabilidade.
As constes mudanças nas relações sociais entre o Estado e o indivíduo, nos leva a um constante questionamento a respeito da proteção dos direitos fundamentais. Fatores políticos, sociais e econômicos, referenda uma necessária intervenção estatal nas relações de direitos individuais. Assim nos vemos imprensados na falta de normas que coadunam com um novo pensar social, o embasamento teórico com novos conceitos, estudos e pesquisas para trazer aos anseios modernos respostas coerentes com os novos tempos, devemos fazer uma releitura do Estado Democrático de Direito para que seus próprios cidadãos possam exercer sua cidadania.
5. Referências
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CARVALHO, Raquel Melo Urbano de. Curso de Direito Administrativo. Editora Jus Podivrm. Salvador, 2008.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 30. Ed. São Paulo: Malheiros, 2005.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2002.
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Administrativo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2000.
MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 1999. Código Tributário Nacional (CTN). São Paulo: Saraiva, 2006.
MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 4. ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 2000.
FILHO, Marçal Justen. Curso de Direito Administrativo. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
BARROS, A.J.P.; LEHFELD, N.A.S. Fundamentos de metodologia: um guia para a iniciação cientifica. 2. ed. São Paulo: Makron Books, 2000.
CRETELLA JÚNIOR, José. Do poder de polícia. Rio de Janeiro: Forense, 1999.
MAFFINI, Rafael. Direito administrativo. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.
PÁDUA, Elisabete Matallo Marchesini de. Metodologia da pesquisa: abordagem teórico-prática. 10 ed. Campinas, SP: Papirus, 2004.
Advogado.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LUZ, José Aristeu da Silva. O Poder de Polícia e os Direitos dos Cidadãos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 abr 2015, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/44040/o-poder-de-policia-e-os-direitos-dos-cidadaos. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
Por: BRUNO SERAFIM DE SOUZA
Por: Fábio Gouveia Carneiro
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
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