Resumo: O presente trabalho visa demonstrar a importância da teoria do adimplemento substancial no Brasil que, apesar de não ter sido subsumida ao ordenamento pátrio, coloca-se imprescindível à resolução das questões contratuais que emergem nos Tribunais pátrios.
Palavras-chave: adimplemento substancial, boa-fé objetiva, função social do contrato, inadimplemento, contratos.
Sumário: 1. Introdução. 2. Teoria do adimplemento substancial e o princípio da boa-fé objetiva. 2.1. O adimplemento substancial e sua aplicação prática nos Tribunais. 3. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO
Ao se falar em adimplemento, pura e simplesmente, um princípio considerado de grande importância é o da pontualidade, pois se espera que a obrigação seja cumprida de maneira pontual- em todos os seus aspectos. A contrário sensu, o adimplemento substancial não prima por este dogma ao permitir que à prestação possa ser atribuído certo atraso, se este descumprimento tiver baixa relevância.
No entanto, é imperioso ressalvar a sua tímida aplicação nos Tribunais brasileiros, seja por conta da falta de uma legislação específica, ou em razão das polêmicas que podem ser criadas, tendo em vista a manutenção de um contrato que, de certa forma, está inadimplido.
Ocorre que para ser melhor defendida e também aplicada, o ingresso de qualquer nova teoria deve respeitar o sistema jurídico daquele país, pois ao investir em uma ruptura do seu Direito deve fazê-lo de modo a não agredir as normas e princípios vigentes. Deve então estar de acordo e moldado às necessidades culturais e jurídicas deste sistema em que tenta inserir-se, sob pena de não ser recepcionado.
2. TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL E O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA
A primeira vez em que se ouviu falar desta teoria no Brasil foi com o renomado jurista Clóvis do Couto Silva, cujas decisões de vanguarda o fizeram optar pela aplicação do adimplemento substancial em um julgado de 1988.[1]
Para que chegasse ao entendimento em questão o jurista supracitado primeiro entendeu a essencialidade do adimplemento que parte da premissa de que toda a obrigação deve ser cumprida em seus exatos termos. Após esse juízo de valor, passou a enxergar pontos positivos no incumprimento, ou seja, passou a valorar a prejudicialidade deste, se realmente poderia levar ao fim do contrato.
Com isso buscou chegar ao conceito do que seria, para o ordenamento pátrio, o adimplemento substancial. Para tanto, levou em consideração a boa-fé objetiva e seus elementos, bem como o ensinado pela doutrina alienígena e definiu que não poderia ser resolvido o contrato, mas apenas permitido o pedido de perdas e danos ou o adimplemento total, tendo em vista a conduta dos contratantes, um resultado bastante próximo do esperado, tudo isso para não afetar a boa-fé objetiva.[2]
Logo, ao se interpretar as relações jurídicas e as vontades ali declaradas, o essencial é analisar, dentro do princípio da boa-fé e de modo objetivo, se as atitudes das partes correspondem com a intenção inicialmente contratada.
Assim, a teoria do adimplemento substancial no Brasil vai encontrar a sua base no princípio da boa-fé objetiva e na função social do contrato, sendo que se fosse aplicada a resolução contratual de qualquer maneira, estaria este princípio sendo violado.
O artigo 475 do Código Civil não define que inadimplemento daria ensejo ao fim contratual, mostrando aqui cláusula aberta para interpretação dos tribunais. E por este motivo é que muitos doutrinadores vão defender a tese de que a resolução só seria possível se o incumprimento fosse definitivo. Fundamentação esta motivada pela busca do equilíbrio dos contratos, bem como da função econômica e social destes.
Partindo de uma visão tradicionalista o adimplemento se resume ao cumprimento da obrigação principal, extinguindo o negócio jurídico. Com todas as mudanças ocorridas no Direito e em suas concepções, é visível que hoje em dia há o reconhecimento de que existe uma responsabilidade pré e pós-contratual, que alcança ambas as partes da relação negocial.[3]
Basicamente, a teoria do adimplemento substancial vai proibir a parte adimplente de resolver o contrato, bem como de suscitar a exceção do contrato não cumprido, isso por conta da insignificância que o descumprimento vai trazer para a relação jurídica como um todo.
A questão do lapso temporal, do mesmo modo, passa a ter destaque, tendo em vista que mesmo restando a possibilidade de se por fim ao negócio jurídico, não o fazendo a outra parte, cria a expectativa legítima de direito de que o atraso foi aceito e terá ele mais tempo para cumprir sua parte. O que se justifica, tanto pela manutenção do contrato, como pela busca do fim econômico e social decorrente de toda relação contratual.[4]
Ou seja, o direito a por fim nas relações contratuais não pode ser visto como um “instrumento de punição do devedor” por não ter este cumprido a obrigação principal. Este direito é garantido apenas quando o incumprimento for de tamanha proporção que inviabilize o contrato em curso.
Quanto a parte que cumpre sua obrigação, as garantias que a ele são de direito resumem-se na possibilidade de requerer o restante das prestações, se isso ainda for possível, ou, de acordo com o artigo 944 do Código Civil de 2002, indenização a ser paga de acordo com a grandeza e gravidade do dano.
Essa indenização busca de certa maneira equilibrar a relação contratual, na medida em que tenta deixar a parte lesada na situação anterior à celebração do contrato, ou na que estaria se o mesmo fosse realizado corretamente. Evita-se assim, do mesmo modo, o enriquecimento sem causa do inadimplente, que deve pagar pelos danos que causa, se a essencialidade do negócio jurídico celebrado for prejudicada.[5]
3. CONCLUSÃO
O adimplemento substancial, apesar de não ser um instituto agraciado pelo ordenamento pátrio, vem tendo todos os requisitos para a sua aplicação observados, assim como os princípios utilizados para sua regência. E não poderia ser diferente já que não mais há a prevalência pura da autonomia da vontade.
As questões sociais que emergiram com o fim do liberalismo demonstraram que a boa-fé objetiva e a função social do contrato são tão imprescindíveis para as relações contratuais quanto a vontade das partes. Por isso não há como deixar a análise de tal teoria de fora quando, hoje, se tratar de contratos.
Confirmando esse entendimento, há tímidos julgados dos Tribunais brasileiros, corroborando a imprescindibilidade de se analisar não apenas a vontade pura e simples das partes contratantes, mas todos os deveres anexos que decorrem da relação contratual.
REFERÊNCIAS
TORRES, Paula Cunha Menezes. A teoria do adimplemento substancial. Disponível em: http://www.emerj.tjrj.jus.br/paginas/trabalhos_conclusao/2semestre2009/trabalhos_22009/PaulaCunhaMenezesTorres.pdf.
SILVA, Vivien Lys Porto Ferreira da. Adimplemento substancial. Disponível em: http://www.cipedya.com/doc/159782. Acesso em 01 de novembro de 2011
BUSSATTA, Eduardo Luiz. Resolução dos contratos e teoria do adimplemento substancial. 2008. p. 94, 95. (Coleção Agostinho Alvim).
SCHEREIBER, Anderson. In: TARTUCE, Flávio; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novais (coord.). A boa-fé objetiva e o adimplemento substancial. Direito Contratual. Temas atuais. Método, 2007. pag. 144
LINS, Thiago Drummond de Paula. A aplicação da teoria do adimplemento substancial pela jurisprudência brasileira. Jus Navigandi. Teresina, ano 14. N.2336. 2009. Disponível em: http://jus.uol.com.br/revista/texto/13896
NOTAS
[1] TORRES, Paula Cunha Menezes. A teoria do adimplemento substancial. Disponível em: http://www.emerj.tjrj.jus.br/paginas/trabalhos_conclusao/2semestre2009/trabalhos_22009/PaulaCunhaMenezesTorres.pdf.
[2] SILVA, Vivien Lys Porto Ferreira da. Adimplemento substancial. Disponível em: http://www.cipedya.com/doc/159782. Acesso em 01 de novembro de 2011
[3] SCHEREIBER, Anderson. In: TARTUCE, Flávio; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novais (coord.). A boa-fé objetiva e o adimplemento substancial. Direito Contratual. Temas atuais. Método, 2007. pag. 144
[4] LINS, Thiago Drummond de Paula. A aplicação da teoria do adimplemento substancial pela jurisprudência brasileira. Jus Navigandi. Teresina, ano 14. N.2336. 2009. Disponível em: http://jus.uol.com.br/revista/texto/13896
[5] SILVA, Vivien Lys Porto Ferreira da. Adimplemento substancial. Disponível em: http://www.cipedya.com/doc/159782. Acesso em 02 de novembro de 2011
Advogada; Especialista em Direito do Estado pelo Juspodivm, Pos Graduanda em Direito Civil e Empresarial pelo Instituto Damásio Educacional.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CAROL AZEVEDO ARAúJO, . Teoria do adimplementos substancial e sua aplicação no Brasil frente ao princípio da boa-fé objetiva Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 abr 2015, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/44048/teoria-do-adimplementos-substancial-e-sua-aplicacao-no-brasil-frente-ao-principio-da-boa-fe-objetiva. Acesso em: 23 dez 2024.
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