RESUMO: O presente artigo tem por objeto demonstrar alguns aspectos constitucionais da popularmente conhecida “Lei Geral da Copa”, a Lei n° 12.663/12. Para tanto, serão desmistificados os setenta e um artigos nela dispostos, exemplificando as consequências atuais provenientes da Lei 12.663/12, e ainda, acerca das que dela possam advir, dado o caráter sui generis da referida. Para que se comprovem tais afirmações, serão abordados todos os princípios constitucionais relevantes ao tema, como a soberania nacional, a cidadania, o valor social do trabalho e a livre iniciativa, fazendo-se uma análise sincrética sobre os mesmos e aplicando-os no contexto da Lei n° 12.663/12. Ultrapassado tal óbice, será feito um panorama acerca das consequências advindas da promulgação da Lei n° 12.663/12 face ao ordenamento jurídico pátrio, serão expostas questões como abertura de precedentes para a criação de normas semelhantes, desvirtuamento da Legitimidade Democrática pela flexibilização dos princípios fundamentais, além do perigo de criação de um eventual Estado de Exceção Permanente, decorrente da suspensão parcial de determinados ordenamentos jurídicos de maneira recorrente. Diante de todo o narrado, temos que a “Lei Geral da Copa”, Lei n° 12.663/12, possui inúmeras características e peculiaridades que a tornam, de certo modo, diferente de qualquer outra lei federal já recepcionada por nossa legislação em tempos atuais, e sendo assim, evidente resta que a mesma é um marco na esfera jurídica, ocasionando árduos debates quanto a sua utilidade ou ineficácia. Evidentemente que o presente texto não exaure o tema, além de que, certamente, o futuro levará o Congresso Nacional a tomar entendimentos e posturas divergentes da ocorrida quando da aprovação da Lei n° 12.663/12, dado que, indubitavelmente, irão se deparar com diplomas legais concernentes a temas que envolvam natureza jurídica semelhante.
Palavras-chave: Lei Geral da Copa, Constituição, Lei n° 12.663/12.
Sumário: 1- Introdução, 2- Da Natureza Jurídica da Lei Geral da Copa, 2.1- Das Garantias Governamentais, 2.2- Dos Direitos e Princípios Fundamentais, 2.3- Da Soberania, 2.4- Da Cidadania, 2.5- Do Valor Social do Trabalho e Livre Iniciativa, 3-. Da Efetividade da Lei, 3.1- Da eficácia da Lei n° 12.663/12 em Face da Flexiblização dos Princípios Fundamentais, 3.2- Da Repercussão Jurídica Diversa da Lei n° 12.663/12 Face os Objetivos Inicialmente Propostos por seus Autores, 3.3- Da Reformulação Abstrata do Conceito de Legitimidade Democrática para Criação de Normas sui generis, 3.4- Do Possível Precedente Normativo para a Implantação Usual do Estado de Exceção. 4- Considerações Finais, 4- Bibliografia Consultada.
1 INTRODUÇÃO
A escolha do tema se deu a partir das inúmeras divergências constitucionais que se depreendem de tal lei, divergências estas que vêm inquietando doutrinadores e juristas desde sua publicação, justamente dado o caráter sui generis da referida, diferente de qualquer outra norma de nosso ordenamento jurídico.
Assim, sendo o Brasil conhecido como “país do futebol”, é importante não se fechar os olhos para uma legislação especial que regulará nosso cotidiano por certo período, além de organizar os mega eventos que estão por vir.
Desta feita, cumpre a presente não apenas desmistificar os setenta e um artigos nela dispostos, tendo também o intuito de fomentar um debate teleológico acerca dos mesmos, exemplificando as consequências atuais provenientes da Lei 12.663/12, argumentando, ainda, acerca das que dela possam advir.
Apesar da admiração de alguns a tal norma, no decorrer da presente corriqueiramente se verá citações de antipatia ao texto legal, seja com base jurídica, seja como mera crítica ao estado político e econômico que vivemos.
Tais declarações são justamente advindas de seu caráter estranho às normativas comuns brasileiras, porém, importante se faz a explanação de tais arguições, a fim de que se estimule o conhecimento e o intelecto.
Serão abordadas e comentadas as 11 (onze) garantias prestadas à FIFA pelo governo do Brasil, a fim de que fosse possível sediar a “Copa das Confederações 2013” e a “Copa do Mundo 2014” principais megaeventos abordados na Lei n° 12.663/12.
Posteriormente, serão exemplificadas as evoluções históricas das Leis Gerais da Copa pelo mundo, para que após, conhecedores da natureza jurídica e das evoluções históricas das Leis Gerais da Copa, se exponham os conceitos de alguns direitos e princípios fundamentais de nossa legislação, tratando sobre alguns princípios constitucionais já consolidados em nosso ordenamento jurídico, tais como a soberania nacional, a cidadania, o valor social do trabalho e a livre iniciativa.
Após, será tratado o panorama das normas da “Lei Geral da Copa”, Lei 12.663/12, pormenorizando todas as diretrizes julgadas relevantes ao tema, sendo abordadas a proteção e exploração dos direitos comerciais durante o período de vigência da lei, tratando da responsabilidade civil do Brasil perante a FIFA, as modalidades de venda de ingressos para os megaeventos, às condições de acesso e permanência nos locais de competição inclusive do direito à manifestação e da venda de bebidas alcoólicas, exemplificando, ainda, as disposições permanentes da Lei, que versa acerca dos prêmios e previdência especial aos jogadores das copas anteriores e, por fim, das disposições finais da mesma, salientando aspectos importantes como a isenção de custas e emolumentos para a FIFA.
Ainda, será tratado acerca da efetividade e cidadania da Lei n° 12.662/12, exemplificando os princípios constitucionais tutelados pela referida lei, e ainda, sendo feita uma análise sincrética sobre a flexibilização da aplicação dos referidos princípios em alguns dos dispositivos da “Lei Geral da Copa”.
Ultrapassado esse óbice, serão discutidas e debatidas eventuais consequências advindas da promulgação da Lei n° 12.663/12 face ao ordenamento jurídico pátrio, expondo questões como abertura de precedentes para a criação de normas semelhantes, com o consequente desvirtuamento da Legitimidade Democrática pela flexibilização dos princípios fundamentais, além do perigo de criação de um eventual Estado de Exceção Permanente, decorrente da suspensão parcial de determinados ordenamentos jurídicos de maneira recorrente.
2 DA NATUREZA JURÍDICA DA LEI GERAL DA COPA.
Inicialmente, cumpre salientar que a Copa do Mundo de 2014 é um evento privado, organizado pela FIFA - Federação Internacional de Futebol Associado - que é uma pessoa jurídica de direito privado, com sede na Suíça.
E da mesma maneira que o desporto acaba refletindo em emoções muito além as físicas e sensoriais, o Direito não é apenas um apanhado de normas jurídicas e legislações esparsas. Além destas, que provém da vontade dos deputados e senadores das duas casas legislativas, há também a indubitável participação dos costumes, normas de conduta, jurisprudência e princípios gerais do Direito.
Como será visto à frente, “as inovações legislativas realizadas através da Lei Geral da Copa abrangem uma plêiade enorme de assuntos. A complexidade da norma enseja discussões desde o Direito Internacional Público ao Direito Constitucional, do Direito Comercial ao Direito do Consumidor.”[1], portanto, os aspectos aqui abordados não irão esgotar todos os temas provenientes da referida lei, mas apenas abrir uma porta para que se possam investiga-los.
A Lei Geral da Copa foi criada com o intuito de amoldar a legislação pátria a fim de que se pudesse realizar a Copa do Mundo de Futebol no Brasil. Autuada sob o n° 12.663/12 e estruturada em 71 artigos, a referida lei busca cumprir todo o exigido pela FIFA, modificando determinadas normas de nosso ordenamento jurídico que pudessem, por ventura, causar algum estorvo durante a realização do mesmo. Desta feita, a Lei Geral da Copa nada mais faz do que padronizar nossos ditames legais na forma já adotada pela FIFA em outros eventos internacionais.
Se as referidas mudanças são apropriadas ou quiçá cobiçadas para o futuro, é uma questão passível de análise, vez que as concepções divergem, dando ênfase, ainda, há alguns pontos específicos, passiveis de controvérsias.
2.1 DAS GARANTIAS GOVERNAMENTAIS:
Desde a época em que nossa nação se candidatou a ser sede da Copa do Mundo de 2014, mais especificamente em 15 de junho de 2007, nossos governantes se comprometeram com 11 (onze) garantias para que se viabilizasse a realização do evento no Brasil.
Essas garantias nada mais são do que um conjunto de regras especiais voltadas para a organização do esporte e do evento em si, solicitando à União a edição de legislação própria, que possibilitem a aplicação de tais garantias no território brasileiro.
As garantias prestadas pelo governo brasileiro são as seguintes: “1- Vistos de entrada e saída para turistas estrangeiros, 2- Permissões de trabalho para estrangeiros, 3- Direitos Alfandegários e Impostos, 4- Isenção Geral de Impostos (para a FIFA), 5- Segurança e Proteção dos estrangeiros, 6- Bancos e Câmbio, 7- Procedimentos de Imigração, Alfândega e Check-in, 8- Proteção e Exploração dos Direitos Comerciais (para a FIFA), 9- Hinos e Bandeiras nacionais, 10- Indenização, 11 – Telecomunicações e Tecnologia da Informação.” [2]
Como se vê, desde o compromisso com as onze garantias acima expostas, ocorrido em 2007, o Brasil veio buscando efetivar tais medidas, que foram quase que inteiramente solucionadas com a promulgação da Lei Geral da Copa, em 2012 e a realização da mesma, em 2014.
2.2 DOS DIREITOS E PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS
Com a promulgação da CRFB, tornou-se claro que sua pretensão era resguardar os cidadãos, para que não fossem novamente usurpados de seus direitos legítimos, como ocorrera anteriormente com o regime ditatorial imposto pelos militares.
A força da CRFB, bem como do povo, se deu exemplificada no decorrer da constituição. José Afonso da Silva[3] define os princípios fundamentais como "prerrogativas e instituições que o Direito Positivo concretiza em garantia de uma convivência digna, livre e igual de todas as pessoas".
Assim, entende-se que os princípios fundamentais nada mais são do que os pilares base da legislação, alicerçando o ordenamento jurídico brasileiro, além de serem um instrumento de proteção ao cidadão frente ao poder da União.
Os princípios fundamentais estão intimamente ligados ao povo, como bem se vê, povo este que não pode fortalecer-se em uma sociedade composta tão somente de regras e normas, sendo necessários os “princípios jurídicos” que muitas vezes os completam.
Assim, toda e qualquer lei criada deverá se adequar ao disposto pelos princípios, criando assim uma espécie de pirâmide, onde a constituição e seus princípios estão no cume, seguidos pelos demais ordenamentos jurídicos. Como a Lei Geral da Copa é uma Lei Ordinária, a mesma está submetida a todos os princípios fundamentais decorrentes da constituição.
Como já dito, há inúmeras divergências quanto à obediência da Lei Geral da Copa a alguns princípios basilares, assim, necessário se faz um conceito de alguns deles, a fim de que o posicionamento se torne mais preciso.
A soberania é o primeiro princípio a ser abordado, devido à sua magnitude. Pode se afirmar sem medo que é quiçá o mais importante de todo o ordenamento jurídico.
Para Silvano Andrade do Bomfim aput Léon Duguit[4], soberania é o “direito de uma vontade que não se determina jamais a não ser por ela mesma”.
Desse modo, entende-se a soberania como sinônimo de superioridade, e assim, o princípio da soberania como norma para demonstrar que não ocorrerá a submissão do ente federado perante a outrem. Obviamente que o conceito de soberania é relativo, vez que atualmente, por força da globalização, não há de se falar que algum país independente e autossuficiente.
Pode-se dizer que a soberania desvincula o Brasil do que não lhe é necessário, embora, como dito, esteja imposta subliminarmente nas relações internacionais por força do desenvolvimento econômico.
Assim, embora o princípio da soberania esteja correlato às questões econômicas, há de se ver que a não subordinação aos demais entes federativos está implícita e indubitável.
O conceito de cidadania é algo muito amplo e variável, possuindo uma abrangência enorme que muitas vezes a desvirtuam. TAVARES[5] disserta muito bem sobre o tema ao afirmar que “assim como ocorre com a dignidade da pessoa humana, a cidadania invoca conceito vago, embora seja pauta inafastável em qualquer Estado democrático”.
Assim, ainda que grande parte dos doutrinadores tenha como cidadania a aptidão para exercer os direitos políticos, temos que a cidadania, atualmente, deixou de lado o conceito clássico oitentista e deu lugar a algo totalmente novo.
O conceito de cidadania já não mais decorre do exercício dos direitos políticos, mas sim de uma essência que já vem normatizada desde 1948, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, abrangendo toda e qualquer pessoa, independente da sua nacionalidade. Assim, cidadania se trata de fazer valer seus direitos individuais, democráticos e sociais não deixando-se submeter ao setor econômico dominante, participando, mesmo que individualmente, das decisões de caráter coletivo.
2.5 DO VALOR SOCIAL DO TRABALHO E DA LIVRE INICIATIVA
O trabalho é um fator essencial para o desenvolvimento do ser humano, pois é através dele que o cidadão garante a sua subsistência, além de incentivar o crescimento do país, melhorando assim a sua própria qualidade de vida. O trabalho está na essência do homem.
Livre iniciativa é a liberdade que todo cidadão tem de exercer efetivamente qualquer que seja a modalidade de trabalho, desde que seja de modo lícito, é a livre espontaneidade de o cidadão buscar seu sustento em qualquer que seja o ramo, sustentando assim a imaginação e a crescente busca por novidades. Se não fosse assim, nosso país seria como uma colônia de formigas, cada qual com sua função designada desde o nascimento, sem possibilidade de mudança.
3. DA EFETITIVADE DA LEI
Diante de todo o narrado, entende-se que a “Lei Geral da Copa”, Lei n° 12.663/12, possui inúmeras características e peculiaridades que a tornam, de certo modo, diferente de qualquer outra lei federal já recepcionada por nossa legislação em tempos atuais.
Temos, ainda, uma presunção de constitucionalidade da referida lei, advinda da aprovação pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal.
Outrossim, como já narrado anteriormente, fora julgada improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 4976 perante o STF, o que garante sua constitucionalidade.
Ocorre que, justamente por sua distinção com a legislação pátria habitual, acaba a referida lei por fomentar inúmeras dúvidas quanto à viabilidade da sua implantação, vez que o “diferente” nem sempre é bem visto culturalmente, e nesse caso, também juridicamente.
Portanto, o entendimento majoritário de que a publicação da Lei 12.663/12 visava efetivar o cumprimento das onze “garantias governamentais” já expostas anteriormente.
Na mesma conjectura, a intenção da união em sujeitar-se ao cumprimento de preceitos advindos de um órgão privado não deveria ser capaz de afastar uma proteção constitucional já adquirida e intensamente preservada ao longo dos anos, ainda que, como dito, tal não fosse a finalidade do legislador.
3.1 DA EFICÁCIA DA LEI n° 12.663/12 EM FACE DA FLEXIBLIZAÇÃO DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS
Dada à improcedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 4976 promovida em face da Lei 12.663/12, temos reformulação da aplicação dos princípios fundamentais, flexibilizando a imposição dos mesmos, com o fim de garantir benefícios posteriores que, em tese, seriam mais benéficos.
Da mesma feita, tal julgado consequentemente traz uma sutil mudança quanto ao conceito de Legitimidade Democrática por parte dos representantes públicos.
Tal mudança se refere justamente à intenção do legislador de que, ainda que haja o descontentamento de grande parte da população quanto à aplicação das normas dispostas, a limitação se faz necessária para que a lei atinja a sua eficácia plena, garantindo seus desdobramentos futuros.
A nova flexibilização promovida pela Lei n° 12.663/12 pode ser comparada com ao provérbio “a melhor defesa é o ataque”, onde, exemplificadamente, os princípios constitucionais são limitados, por certo período, para que se haja a majoração dos mesmos futuramente.
É o caso do Valor Social do Trabalho e da Livre iniciativa, que momentaneamente ficará adstrito, porém futuramente será compensado pelos benefícios econômicos indiretos, como a geração de empregos, o aumento do consumo e o turismo incremental.
Não por acaso, a referida flexibilização tem em sua base outro princípio, o da igualdade, onde além de serem os iguais tratados igualmente, os desiguais, no caso a FIFA, devem ser tratados desigualmente, desigualdade essa que nem sempre acarretará em inferioridade de direitos.
Assim, tem-se o entendimento de que eventuais limites impostos pela Lei 12.663/12 aos princípios fundamentais anteriormente expostos buscam tão somente dar efetividade a um projeto que, em tese, trará mais benefícios do que malefícios, ainda que fuja dos ditames da Legitimidade Democrática convencional.
Ocorre que, essa nova maneira de legislar com discrímen pode acarretar em diversas consequências, conforme será abordado a seguir.
3.2 DA REPERCUSSÃO JURÍDICA DIVERSA DA LEI N° 12.663/12 FACE OS OBJETIVOS INICIALMENTE PROPOSTOS POR SEUS AUTORES.
Por todo o narrado, evidente resta que a Lei n° 12.663/12 é um marco na esfera jurídica, ocasionando árduos debates quanto à sua utilidade ou ineficácia. E sendo um marco, traz consigo consequências advindas de sua existência.
Como dito repetidas vezes, jamais será possível agradar “Gregos e Troianos”, devido à imensa diferença social que cerca a União, a FIFA e o povo, sendo o mais correto que se haja um consenso de ideias, de um lado o respeito ao cidadão do país sede, e de outro, os interesse privados.
A criação da Lei 12.663/12 vem por traçar um panorama não antes visto, possibilitando a flexibilização da legislação pátria já consolidada, trazendo uma sutil mudança, mas que abarca, na teoria, uma nova maneira de pensar do legislador.
3.3 DA reformulação abstrata do conceito de legitimidade democrática PARA CRIAÇÃO DE NORMAS SUI GENERIS
Porém, tal modificação legislativa pode acarretar em desfechos que não seriam os intencionados. Um deles é reformulação do conceito de Legitimidade Democrática.
Nesse contesto, a atual limitação subjetiva de alguns princípios imposta pela Lei n° 12.663/12 pode acarretar na intenção de criação de outras normas que não tragam os supostos benefícios desta, desvirtuando sua intenção principal.
É cediço que a “Copa do Mundo 2014” foi um evento grandioso ao país e desproporcional a qualquer outro deste século, tanto que trouxe consigo a flexibilização dos princípios que nunca antes fora vista. Ocorre que tal flexibilização pode abrir precedentes para a criação de outras leis que busquem privilégios análogos aos da Lei n° 12.663/12.
Tomando como exemplo do referido desvirtuamento, temos a recente sanção, na Bahia, da Lei Estadual n° 12.959/14 que libera a venda de bebidas alcoólicas nos estádios do referido estado.
Assim, diante da declaração de improcedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 4976 pelo STF, ainda que a mesma não tenha adentrado ao mérito principiológico ora em questão, reluta-se quanto ao futuro da legislação brasileira, especialmente quanto à segurança jurídica e a submissão das Leis Ordinárias para com a Constituição.
3.4- do POSSÍVEL precedente normativo para a implantação usual do estado de exceção
De outro lado, além do possível precedente para normas sui generis, temos como consequência da Lei n° 12.663/12 outra questão importante, qual seja a manutenção temporal Estado de Exceção, de forma permanente.
Com o advento da Lei n° 12.663/12 fora criada uma espécie de “Estado de Exceção” temporário, vez que a referida afasta a aplicação de algumas normas vigentes no país, no âmbito dos megaeventos descritos na “Lei Geral da Copa”.
Entende-se que o Estado de Exceção nada mais é do que suspender temporariamente uma norma, a fim de que se aplique outra, com o objetivo de resguardar a ordem. No ordenamento jurídico brasileiro exemplos de Estado de Exceção são o “Estado de Sítio” e o “Estado de Defesa”, sendo os referidos ressalvas ao princípio da Não Intervenção.
Sendo tal o conceito de Estado de Exceção, a Lei n° 12.663/12 configurar-se-ia como tal, vez que suspende a eficácia de inúmeros dispositivos legais, provenientes justamente de sua característica sui generis.
Ocorre que, como consequência, corre-se o risco da implantação subjetiva de um Estado de Exceção Permanente, com a limitação temporal de inúmeros princípios e valores fundamentais, sendo tais medidas não voltadas à ordem pública, mas sim a preservação dos interesses de entes privados.
Por todo o exposto, se mostra necessária cautela quanto às consequências que poderão surgir da Lei n° 12.663/12, vez que é uma lei estranha a qualquer outra norma da legislação Brasileira vigente.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A composição do saber jurídico mostra-se sempre viável, desta feita, importante se faz o conhecimento acerca das disposições contidas na Lei Geral da Copa, Lei n° 12.663/12.
Essa afirmação se dá com base não somente pelo consequente enfoque na referida legislação com a proximidade da “Copa do Mundo 2014”, mas também para que se cresça intelectualmente quanto às características de algo que cerca a nação brasileira desde o século XIX, sem contar, obviamente, quanto aos conhecimentos adquiridos pela exposição dos inúmeros ditames legais e dos mais variados ramos do direito, que foram ora expostos.
A escolha do tema se deu a partir das inúmeras divergências constitucionais que se depreendem de tal lei, divergências estas que vêm inquietando doutrinadores e juristas desde sua publicação, justamente dado o caráter sui generis da referida, diferente de qualquer outra norma de nosso ordenamento jurídico.
Assim como o Direito não é apenas um apanhado de normas jurídicas e legislações esparsas, o “desporto” acaba refletindo em emoções muito além as físicas e sensoriais, vez que, assim como o Direito, tem participação costumes e cultura da sociedade, se fazendo necessário o conhecimento da legislação a ele referente, o que abrange, por consequência, a Lei n° 12.663/12.
Diante de todo o narrado, subentende-se que a “Lei Geral da Copa”, Lei n° 12.663/12, possui inúmeras características e peculiaridades que a tornam, de certo modo, diferente de qualquer outra lei federal já recepcionada por nossa legislação em tempos atuais, e sendo assim, evidente resta que a mesma é um marco na esfera jurídica, ocasionando árduos debates quanto a sua utilidade ou ineficácia.
É cediço que os megaeventos dispostos na Lei n° 12.663/12 terão abrangência desproporcional a qualquer outro deste século, tanto que trouxe consigo a flexibilização dos princípios fundamentais que nunca antes fora o ordenamento jurídico pátrio, o que acarreta consequências advindas de sua existência.
A criação da Lei 12.663/12 vem por traçar um panorama não antes visto, possibilitando a flexibilização da legislação pátria já consolidada, trazendo uma sutil mudança, mas que abarca, na teoria, uma nova maneira de pensar do legislador.
Não há dúvida de que a Lei n° 12.663/12, passada pelo crivo de sua constitucionalidade, submete-se aos Princípios Constitucionais vigentes da Soberania, Cidadania e do Valor Social do Trabalho e da Livre Iniciativa, porém, possibilitando a flexibilização de imposição dos referidos.
Ocorre que tal flexibilização pode abrir precedentes para a criação de outras leis que busquem privilégios análogos aos da Lei n° 12.663/12, sendo que vigência da referida lei poderá ter repercussão jurídica diversa, dais quais objetivaram seus autores quando da sua criação.
Desta feita, resta imprescindível que, a partir de sua vigência, se mantenha um minucioso controle de constitucionalidade, garantindo a ordem jurídica nacional e a legitimidade democrática.
Evidentemente o presente artigo não exaure o tema, além de que, certamente, o futuro levará o Congresso Nacional a tomar entendimentos e posturas divergentes da ocorrida quando da aprovação da Lei n° 12.663/12, dado que, indubitavelmente, irão se deparar com diplomas legais concernentes a temas que envolvam natureza jurídica semelhante.
Desta feita, se confirmam as hipóteses levantadas de que a Lei n° 12.663/12, passada pelo crivo de sua constitucionalidade, submete-se aos Princípios Constitucionais vigentes da Soberania, Cidadania e do Valor Social do Trabalho e da Livre Iniciativa. E de que a vigência da Lei n° 12.663/12, poderá ter repercussão jurídica diversa, daqueles objetivos inicialmente propostos por seus autores.
5 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:
CAMARGOS, Wladimyr Vinycius de Moraes; SANTORO, Luiz Felipe Guimarães. Lei geral da copa comentada. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2013.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 16. Ed. São Paulo: Malheiros Editores. 1997.
BOMFIM, Silvano Andrade do. LEI GERAL DA COPA, SOBERANIA NACIONAL E A CONSTITUIÇÃO. Revista Brasileira de Direito Constitucional. São Paulo: 2012.
TAVARES, André Ramos. Tratado de Direito Constitucional. Saraiva: São Paulo. 2ª Ed., 2012.
[1] CAMARGOS, Wladimyr Vinycius de Moraes; SANTORO, Luiz Felipe Guimarães. Lei geral da copa comentada. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2013. p. 21.
[2] CAMARGOS, Wladimyr Vinycius de Moraes; SANTORO, Luiz Felipe Guimarães. Lei geral da copa comentada. p.18.
[3] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 16. Ed. São Paulo: Malheiros Editores. 1997. p. 176.
[4] BOMFIM, Silvano Andrade do. LEI GERAL DA COPA, SOBERANIA NACIONAL E A CONSTITUIÇÃO. Revista Brasileira de Direito Constitucional. São Paulo: 2012. p. 02.
[5] TAVARES, André Ramos. Tratado de Direito Constitucional. Saraiva: São Paulo. 2ª Ed., 2012, p. 645.
Graduado em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI (2014). Possui especialização em nível de pós-graduação lato sensu em Direito Empresarial e dos Negócios (2016). É advogado e sócio no escritório Oenning Advocacia & Consultoria, com sede na cidade de Balneário Camboriú – SC.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: OENNING, Christian Eising. Aspectos constitucionais acerca da Lei n° 12.663/12 ("Lei Geral da Copa") Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 jul 2015, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/44750/aspectos-constitucionais-acerca-da-lei-n-12-663-12-quot-lei-geral-da-copa-quot. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Ronaldo Henrique Alves Ribeiro
Por: Marjorie Santana de Melo
Por: Leonardo Hajime Issoe
Por: STJ - Superior Tribunal de Justiça BRASIL
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