Resumo: O presente artigo discorre acerca dos títulos de crédito, importante mecanismo do Direito Cambiário, que possibilitou estabilidade nas relações econômicas a partir da regulamentação das relações relativas a valores e mercadorias. A noção de crédito e o desenvolvimento de garantias para o futuro recebimento numerário efetivaram a facilidade para que pudessem ser efetivadas transações comerciais. A pesquisa compactada no artigo discorre sobre a evolução histórica, a conceituação e um pequeno esboço da teoria dos títulos de crédito. Para que, por derradeiro, possamos analisar um dos títulos, a letra de câmbio, demonstrando a sua aplicação no ordenamento jurídico brasileiro. O artigo fará a utilização de importantes civilistas da contemporaneidade, do Código Civil e da minuciosa análise da legislação especial que regulamenta o Título de Crédito escolhido.
Palavras-Chave: Direito Cambiário; Títulos de Crédito; letra de câmbio.
INTRODUÇÃO
Título de crédito, consoante a definição do ilustre Cesare Vivante, “é o documento necessário para o exercício do direito, literal e autônomo, nele mencionado”. Este conceito é aceito pela unanimidade da doutrina de Direito Comercial (COELHO, 2011), pois abarca os elementos principais da matéria cambial. Além disso, coincide com o conceito adotado no art. 887 do Código Civil: "o título de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei." Nestes conceitos estão circunscritos referências aos princípios básicos da disciplina do documento, quais sejam: cartularidade, literalidade e autonomia, de forma que se possa apresentar a teoria geral do direito cambiário.
Existem diversas espécies de títulos de crédito no Brasil, todos eles regulados por legislação específica. As modalidades mais importantes que garantem a grande maioria das operações de crédito no mercado brasileiro são: letra de câmbio, nota promissória, cheque e duplicata. A matéria será desenvolvida com enfoque na Letra de Câmbio, o mais antigo e importante título de crédito.
1. CARACTERÍSTICAS DOS TÍTULOS DE CRÉDITO
As “Disposições Gerais” do Código Civil reproduzem a definição clássica de Vivante, dispondo o art. 887 que o título de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei.
No art. 903, como que reforçando a afirmação contida no artigo supracitado, o Código estabelece que os títulos de crédito regem-se pelo disposto neste Código, salvo disposição diversa em lei especial. Desta forma, o título de crédito só produzirá efeitos se preenchidos os requisitos contidos em lei especial e, não dispondo a lei especial sobre determinada questão, aplicar-se-á o Código Civil. Portanto, uma coisa exclui a outra. Prevalece na hipótese a disposição da lei especial. Só quando esta nada dispor sobre a questão é que prevalece a disposição do Código Civil.
Trabalhando ainda aspectos conceituais, torna-se imprescindível abordar os elementos do crédito, destacando a confiança e o tempo. O crédito irá se fundar de uma relação de confiança entre dois sujeitos, um credor e um devedor, assegurando uma promessa de pagamento. Assim como a temporalidade, tendo em vista que o sentido do crédito será o pagamento futuro combinado.
Todos eles absorvem o elemento crédito que equivalem tanto à confiança quanto ao tempo. O credor acredita, confia, no devedor e lhe dá tempo para liquidar a obrigação decorrente. Não havendo esses dois requisitos, confiança e tempo, não haverá crédito. Sem crédito não há que se falar em título de crédito. Como veremos a seguir:
Os dois elementos (confiança e tempo) não existem separados no crédito. Se não confio no devedor, esse não tem crédito. De outra forma, se confio no devedor, mas não lhe dou tempo para liquidar a obrigação, também não há crédito. Logo, os dois elementos devem estar juntos para que exista crédito (COSTA, Willie Duarte; p. 25)
O título sendo um documento irá reportar a um fato, sendo assim será a prova de uma relação jurídica, especificamente de uma relação de crédito. O documento é a prova de que uma ou mais pessoas são credoras de um ou mais devedores, a partir de obrigações creditícias.
Por mais que os títulos de crédito não sejam os únicos documentos representativos de direito e obrigações, como apólices de seguros, livros mercantis ou sentenças judiciais, estes se distinguem dos demais documentos disciplinados pelo direito por três aspectos. Os títulos de crédito dizem respeito unicamente a relações creditícias, eles não documentam nenhuma outra obrigação. Além disso, facilmente pode haver a cobrança de crédito em juízo, a lei processual o define como título executivo extrajudicial (CPC, art. 585, I), a executividade possibilita que o credor possa promover a execução judicial do seu direito sem a necessidade de ação de conhecimento, que normalmente é morosa E por fim, ostenta o atributo de negociabilidade, a partir de sua disciplina jurídica é possível que haja uma mais fácil circulação de crédito, a negociação do direito nele mencionado. Nesse sentido a fundamental diferença entre o regime cambiário e os outros documentos do regime civil está relacionada a facilidade do credor encontrar terceiros interessados em antecipar-lhe o valor da obrigação em troca da titularidade do crédito.
2. PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DOS TÍTULOS DE CRÉDITO
Do conceito de título de crédito de Viviante, podem ser depreendidos três princípios que informam o regime jurídico-cambial, que são fatores essenciais de caracterização do mesmo: cartularidade, literalidade e autonomia.
A cartularidade representa a materialização do título de crédito em forma de cártula, que será o documento em que se lançaram os atos cambiários constitutivos de crédito. Como foi exposto o título de crédito é o instrumento necessário para o exercício do direito, literal e autônomo, nele existente, assim somente quem exibe a cártula original pode pretender a satisfação de uma pretensão de uma prestação relativamente ao título ao direito documentado pelo título. O princípio da cartularidadegarante que o sujeito que postula a satisfação do direito é mesmo seu titular. O princípio é excepcionado, em parte, em relação às duplicatas
Conforme o princípio da literalidade a existência do título de crédito é regulada pelo seu conteúdo, assim somente produzirão efeitos jurídico-cambiais os atos lançados no próprio título de crédito, qualquer outra obrigação documentada em instrumentos apartados, mesmo que válidos e eficazes entre os sujeitos diretamente envolvidos, não produzirão efeitos perante o portador do título.
SegundoOliveira, o princípio da literalidade pode ser resumido a partir de um duplo ponto de vista:
Em primeiro lugar, segundo esses princípios, o título, para valer como tal, deve se adequar à forma legal, isto é, deve conter todos os requisitos exigidos por lei. Em segundo lugar, significa que vale o que está no título, mas só aquilo, isto é, a determinação da existência, conteúdo, e limites do direito que está exclusivamente no conteúdo do título(OLIVEIRA, Jorge Alcibiades Perrone de; p. 24).
A partir da literalidade, é garantido ao devedor que até a data do vencimento não lhe será exigido obrigação cambiária em valor superior ao que está literalmente expresso documentalmente. Doutro modo, o credor tem a garantia de que o devedor, na data aprazada, lhe pagará a efetiva quantia expressa no título de crédito, sob pena de incorrer em juros, multa, honorários advocatícios, etc.
Assim como no princípio da cartularidade, a literalidade não se aplica inteiramente a disciplina da duplicata.
O princípio da autonomia das obrigações documentadas no título de crédito é o mais importante princípio do direito cambial. Conforme esse princípio, quando um título documenta mais de uma obrigação, a eventual invalidade de qualquer delas não prejudica as demais. Assim caso haja vícios que comprometam a validade de uma relação jurídica, documentada em título de crédito, estes não se estenderão às demais relações abrangidas no mesmo documento.
Para Fabio Ulhoa o princípio da autonomia das obrigações cambiais compreende dois subprincípios: abstração e inoponibilidade das exceções pessoais aos terceiros de boa-fé. Conforme o subprincípio da abstração, o título de crédito ao ser posto em circulação passa a estar desvinculado da relação fundamental que lhe originou. Nota-se que a abstração somente se verifica quando o título circula, ou seja, só quando ele é transferido para terceiros de boa-fé há o desligamento entre o documento cambial e a relação em que teve origem. Dessa forma, há a impossibilidade de o devedor exonerar-se de suas obrigações cambiárias, perante terceiros de boa-fé, em razão de irregularidades, vícios ou nulidades de qualquer ordem que contaminem a relação fundamental.
E o subprincío das exceções pessoais aos terceiros de boa-fé garante que o executado em virtude de um título de crédito não pode alegar, em seus embargos, matérias de defesa estranha à sua relação direta com o exequente, somente se comprovar a má-fé dele. Ou seja, são inoponíveis aos terceiros de boa-fé. O conhecimento, pelo terceiro, da existência de fato oponível ao credor anterior do título já é suficiente para caracterizar a má-fé.
3. CLASSIFICAÇÃO DOS TÍTULOS DE CRÉDITO
Os títulos de crédito podem ser classificados segundo quatro critérios: quanto ao modelo, quanto à estrutura, quanto à estrutura, quanto às hipóteses de emissão, quanto à circulação.
Com relação ao modelo, os títulos de crédito podem ser vinculados ou livres. Vinculados são aqueles títulos que só produzem efeitos cambiais quando atendem ao padrão exigido por lei, como por exemplo, os cheques e as duplicatas. E os livres são os títulos que não possuem padrão de utilização obrigatória, desde atendidos os requisitos legais, pertencem a essa categoria a letra de câmbio e a nota promissória.
Quanto à estrutura, os títulos de crédito podem ser ordem de pagamento ou promessa de pagamento. A ordem de pagamento compreende os títulos que, quando de sua emissão, envolvem três situações jurídicas distintas, a do sacador, a do sacado e a do beneficiário. O sacador ordena que o sacado pague ao beneficiário determinada importância em determinada data. Atentemo-nos para o fato de que não é o sacador (que emite o título) que entrega o valor ao beneficiário, mas sim o sacado. Cheque, duplicata e nota de crédito são exemplos. Por promessa de pagamento entendem-se os títulos que, quando de sua emissão, envolvem duas situações jurídicas: o promitente e o beneficiário. O promitente promete entregar ao beneficiário, em certa data, determinada importância. Veja que, nessa classe de títulos de crédito, quem entrega a importância ao beneficiário é o próprio promitente (que emitiu o título).
Quanto à sua natureza, os títulos de crédito podem ser: causais e não causais ou abstratos. Os causais estão vinculados à sua origem, só nascem a partir de situações especificas, e como tais são considerados imperfeitos ou impróprios. São considerados títulos de crédito uma vez que podem circular mediante endosso. São exemplos a cédulas de crédito, duplicata mercantil, warrant. Os não causais ou abstratos são considerados os mais perfeitos dos títulos de crédito, uma vez que não se indaga a sua origem. São dessa categoria o cheque e a nota promissória.
Quanto à circulação, os títulos de crédito podem ser: ao portador, nominativos à ordem ou ainda nominativos não à ordem. A diferença entre elas reside no ato que opera a circulação do crédito. Nos títulos ao portador não se revela o nome do credor. A circulação se opera pela tradição manual do título, ou seja, basta a entrega da cártula, para que se transfira a titularidade do antigo para o novo credor. Já o nominativo à ordem são os emitidos em favor de pessoa determinada, transferindo-se por endosso. Nos nominativos não a ordem também há identificação do credor, mas circula por cessão civil de crédito.
4. TÍTULO DE CRÉDITO NO CÓDIGO CIVIL DE 2002
No Código Civil de 2002, dos artigos 887 ao 926, estão as normas sobre os títulos de crédito, todavia estas só serão aplicadas quando forem compatíveis com as disposições constantes de lei especial ou estas forem inexistentes, conforme o artigo 903 do Código Civil. As normas presentes no código civil não afastam, tampouco revogam a incidência da Lei Uniforme de Genebra, da Lei do Cheque, da Lei das Duplicatas, do Decreto Lei número 1.103/1902 3 e dos demais diplomas legislativos que disciplinam algum título particular. A princípio somente quando a lei criar um novo título de crédito e não o disciplina completamente terá aplicação as previsões do Código Civil.
No artigo 887 do Código Civil está expresso o conceito de título de crédito como “documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido”, bem como é imposto o formalismo para a eficácia do título no regime cambial, impondo-se o princípio da legalidade, conforme parte final do mesmo artigo: “somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei”.
Já no artigo 888/CC a lei direciona a norma inerente ao formalismo típico do regime cambial, impondo que “a omissão de qualquer requisito legal, que tire ao escrito a sua validade como título de crédito, não implica a invalidade do negócio jurídico que lhe deu origem”. É importante salientar que referido artigo nos faz refletir sobre a autonomia do título de crédito em relação ao negócio jurídico fundamental, que lhe deu origem.
O artigo seguinte, 889/CC, traz os requisitos essências dos títulos de crédito, quais sejam: data da emissão, a indicação precisa dos direitos que confere e a assinatura do emitente. Também são importantes as regras inseridas por tal artigo no que diz respeito à data e ao vencimento do título, pois quando no título não houver indicação da data de vencimento, tem-se que o título é “à vista”, e se não indicado no título o lugar de emissão e de pagamento, irá se considerar como lugar de emissão o domicílio do emitente.
Outro artigo importante é o 891/CC, pois possibilita a existência de título não completamente preenchido ao tempo da emissão, sendo que, ocorrendo tal hipótese, o mesmo deve ser preenchido de acordo com o que foi ajustado entre as partes, sendo que eventual descumprimento, quando do preenchimento do título incompleto, do ajustado entre as partes originais não constitui motivo de oposição ao 3º portador do título, salvo se esse adquiriu o título agindo de má-fé.
5. LETRA DE CÂMBIO
Examinaremos a seguir a letra de câmbio, fazendo referência apenas aos seus aspectos específicos. Deste modo, o estudo desse título faz-se de modo simultâneo com o dos preceitos gerais atinentes à composição do crédito cambiário. Considerando as especificidades de cada título, esses preceitos gerais destinam-se à nota promissória, ao cheque, às duplicadas e a outros títulos de créditos.
A letra de câmbio é disciplinada pelo Decreto nº 2.044 de 1908, nas partes não derrogadas; no Decreto nº 57.663 de 1966, que introduziu no Direito brasileiro a Lei Uniforme da Convenção de Genebra de 07 de junho de 1930, constante do Anexo I, excetuados alguns artigos do Anexo II. Tanto a lei brasileira nº 2.044, como a Lei Uniforme tratam da Letra de Câmbio e da Nota promissória, chamados de títulos cambiários ou cambiais, que embora sejam títulos distintos, possuem muitos princípios em comum.
Assim como o cheque e a duplicata mercantil, a letra de câmbio é uma ordem de pagamento. Uma pessoa dá a ordem de pagamento, determinando que certa quantia seja paga para outra pessoa. Podem ser identificados os “intervenientes” ou participantes da Letra. Em primeiro lugar, tem-se a o sacador, que é aquele que dá a ordem de pagamento, que determina que certa quantia seja paga por uma pessoa a outra, é quem cria a letra. Em segundo lugar, observamos a pessoa a quem a ordem é dirigida, o sacado, que deverá, dentro de condições estabelecidas, realizar o pagamento ordenado. Por fim, temos a situação jurídica do tomador ou beneficiário da ordem de pagamento, é a pessoa a quem a letra, originalmente, deve ser paga. Simplificando: há o sacador que emite a letra de câmbio, entregando-a ao tomador (credor), para que este receba do sacado (devedor). Essas três situações jurídicas surgem com a prática de um ato cambial denominado “saque”.
Podemos conceituar a letra de câmbio como sendo o saque de uma pessoa contra outra, em favor de terceiro. É uma ordem de pagamento, à vista ou à prazo, que o sacador dirige ao sacado, seu devedor, para que, em certa época, este pague certa quantia em dinheiro, devida a uma terceira, que se denomina tomador. Quando à prazo, o sacado deve aceitá-la, firmando nela sua assinatura de reconhecimento: é o “aceite”. Nessa ocasião, o sacado se vincula na relação jurídico-material, obrigando-se ao pagamento.
Como dito anteriormente, a relação se estabelece entre três pessoas: o sacador, o sacado e o tomador. No entanto, a lei faculta que uma mesma pessoa ocupe mais de uma dessas situações. Nada impede que a letra de câmbio possa ser sacada em benefício do próprio sacador ou o sacador seja a mesma pessoa do sacado, conforme estabelece o artigo 3º da Lei Uniforme.
A letra de câmbio, devido ao seu caráter formal, requer determinados requisitos essenciais, indispensáveis à produção, pelo instrumento, dos efeitos cambiais previstos por lei. Na falta de algum desses requisitos não se pode aplicar a disciplina do regime jurídico-cambial, ou seja, a letra de câmbio deixará de ser uma letra de câmbio. Assim, ela deve trazer: I. denominação “letra de câmbio” no seu contexto; II. a quantia que deve ser paga, por extenso; III. o nome da pessoa que deve pagá-la, o sacado; IV. O nome da pessoa que deve ser paga (tomador); e IV. assinatura do emitente ou do mandatário especial, o sacador.
Dispõe o art. 2º, segunda alínea, da Lei Uniforme, que a época do vencimento deve, também, constar da letra, mas, à sua falta, não se descaracterizará o instrumento como título de crédito porque a lei dispõe que, neste caso, a letra será à vista.
Cabe ressaltar que o sacado de uma letra de câmbio não tem nenhuma obrigação cambial pelo simples fato de o sacador ter-lhe endereçado a ordem de pagamento. Haverá vinculação ao pagamento do título somente se anuir em receber à ordem que lhe é dirigida. Nada o obriga a aceitar a letra de câmbio, nem sequer a prévia existência de obrigação perante o sacador ou o tomador. O sacado somente assumirá obrigação cambial, pelo aceite, se o desejar. O ato praticado pelo sacado quando concorda em acolher a ordem incorporada pela letra se denomina "aceite". É o aceite ato de sua livre vontade (COELHO, Fabio Ulhoa; p. 247).
Procede-se o aceite através de simples assinatura do sacado lançada no anverso do título, podendo ser firmado também no verso, se estiver identificado o ato praticado pela expressão "aceito" ou outra expressão esclarecedora.
Vale dizer que a falta de aceite não resulta na extinção da letra de câmbio. O sacador permanece o responsável e o sacado nenhuma obrigação assumiu em relação ao título, mesmo que haja a menção de seu nome na letra. No caso de o sacado ao receber a letra de câmbio para o aceite não a devolve, retendo-a indevidamente, está sujeito à prisão administrativa, bastando para isso o requerimento do juiz.
Trata-se de medida coercitiva, de natureza civil, destinada a forçar a restituição da letra ao seu portador legitimado. Não é sanção penal e, por isso, deve a prisão ser imediatamente revogada na hipótese de devolução ou pagamento do título ou, ainda, se não for proferido julgamento em 90 dias a contar da execução do mandado de prisão (COELHO, Fabio Ulhoa; p. 219).
Importante, ainda, referir que, sendo a letra de câmbio um título de crédito, perfeitamente admissível é o endosso. Segundo COELHO, a letra de câmbio é título sacado, em regra, com a cláusula "à ordem". Isto significa que o seu credor pode negociar o crédito por ela representado mediante um ato jurídico trasladador da titularidade do crédito, de efeitos cambiais, chamado endosso. Conceitua-se, então, endosso como o ato cambiado que opera a transferência do crédito representado por título "à ordem". É claro, a alienação do crédito fica, ainda, condicionada à tradição do título, em decorrência do princípio da cartularidade. (COELHO, Fabio Ulhoa; p. 250).
O primeiro endossante será sempre o tomador; o segundo endossante é o endossatário do tomador e assim sucessivamente. Não há qualquer limite para o número de endossos, podendo ele ser endossado diversas vezes, como pode, naturalmente, não ser endossado.
Pode-se falar em duas espécies de endosso, quais sejam "em branco" e “em preto”. O primeiro não identifica o endossatário e o segundo o identifica. O endosso deriva tão somente da assinatura do credor do título lançado no seu verso, podendo ser feita sob a expressão “pague-se a João Carlos”, referindo-se ao endosso em preto, ou simplesmente “pague-se” ou outra expressão equivalente, nesse caso, endosso em branco.
É importante advertir que poderá, também, o endosso ser feito no anverso do título, não obstante, neste caso, é imperiosa a identificação do ato cambiário praticado, isto é, não poderá o endossante se limitar a assinar a letra.
Para COELHO, em regra, são dois os efeitos produzidos pelo endosso: transferência da titularidade do crédito representado na letra, do endossante para o endossatário; e vinculação do endossante ao pagamento do título, na qualidade de coobrigado, conforme profere o artigo 15 da Lei Uniforme. Vale lembrar que há endossos que não produzem um ou outro dos efeitos mencionados (COELHO, Fabio Ulhoa; p. 250).
Sendo título de crédito, pode a letra de câmbio receber aval. O avalista é responsável da mesma forma que o seu avalizado, como expressa o art. 32 da Lei Uniforme. Isto quer dizer que o avalista responde pelo pagamento do título perante o credor do avalizado e, realizado o pagamento, poderá voltar-se contra o devedor. O pagamento de uma letra de câmbio pode ser feito de forma total ou parcial, garantido por aval. Através desse ato cambial de garantia o avalista garante o pagamento do título em favor do devedor principal ou de um coobrigado. O devedor em favor de quem foi garantido o pagamento do título é chamado de avalizado.
Pelo pagamento, extinguem-se uma, alguma ou todas as obrigações representadas por um título de crédito. Se o pagamento é feito por um coobrigado ou pelo avalista do aceitante, são extintas a própria obrigação de quem pagou e mais as dos coobrigados posteriores; se o pagamento é feito pelo aceitante da letra de câmbio, extinguem-se todas as obrigações cambiais. (COELHO, Fabio Ulhoa; p. 262).
Lembramos, por fim, que o endosso não pode ser parcial, é integral, e que o aceite e o aval podem ser parciais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ante o exposto, podemos inferir que os títulos de crédito, como produtos da prática mercantil e da doutrina jurídica, constituem o instrumento de maior relevância e eficácia no âmbito comercial, de maneira a promover e facilitar a circulação de créditos e dos respectivos valores a estes inerentes, e, consequentemente, propiciando a garantia de maior segurança das atividades econômicas empresariais.
De tal modo, torna-se inquestionável sua fundamental importância para a evolução do direito comercial moderno, tendo em vista a celeridade com que os títulos de crédito oferecem aos negócios, que, ao certo, sem a sua ajuda especial, não poderiam ser realizados na quantidade em que se realizam. Aí, pois, indubitavelmente, a importância dos títulos de crédito, mesmo nos dias atuais.
Cumpre, porquanto, recordar o conceito do mestre Cesare Vivante: “título de crédito é um documento necessário para o exercício do direito literal e autônomo nele mencionado”.
REFERÊNCIAS:
BRASIL. Código Civil. Lei n° 10.406, de Janeiro de 2002.
COELHO, Fábio Ulhoa; Curso de Direito Comercial – v. 1: direito de empresa. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
COSTA, Willie Duare. Títulos de Crédito. 4. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2008, 5ª tiragem.
MARTINS, Fran. Títulos de Crédito.5 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, v 1.
REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 21 ed. São Paulo: Saraiva, 1998, v. 2.
OLIVEIRA, Jorge Alcibiades Perrone de; Títulos de Crédito. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1996, v 1.
Bacharelando do Curso de Direito da Universidade Federal do Rio Grande - FURG É Vice-Presidente do Conselho da Comunidade da Vara de Execuções Criminais da Comarca do Rio Grande/RS. Realizou intercâmbio na Faculdade de Direito, da Universidade de Coimbra (UC), em Portugal. Experiência em projetos de extensão e pesquisa com ênfase no Cooperativismo, Economia Popular Solidária, Execução Penal, Direitos Humanos, Gênero, Questões Decoloniais e Sistema Penitenciário.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: HATJE, Luis Felipe. Breves noções da Teoria Geral dos Títulos de Crédito para análise da letra de câmbio Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 31 ago 2015, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/45091/breves-nocoes-da-teoria-geral-dos-titulos-de-credito-para-analise-da-letra-de-cambio. Acesso em: 23 dez 2024.
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