1. Dos Princípios Gerais do Regulamento
Art. 3° A camaradagem é indispensável à formação e ao convívio da família militar, contribuindo para as melhores relações sociais entre os militares.
§ 1° Incumbe aos militares incentivar e manter a harmonia e a amizade entre seus pares e subordinados.
§ 2° As demonstrações de camaradagem, cortesia e consideração, obrigatórias entre os militares brasileiros, devem ser dispensadas aos militares das nações amigas.
1. 1 Camaradagem
A camaradagem significa o sentimento de amizade, de solidariedade entre pessoas, com interesses comuns. É o sentimento que une as pessoas, que enfrentam as mesmas dificuldades, as mesmas lutas e desfrutam das mesmas alegrias. Porém, a camaradagem não deve ser confundida com corporativismo ou permissividade e sim contribuir para o espírito de corpo, a civilidade e a lealdade que deve existir entre os militares da ativa, da reserva e reformados.
A defesa dos mesmos princípios e das tradições em comuns são fatores de camaradagem que levam, se necessário, ao sacrifício da própria vida do militar. Os militares como um todo forma uma família única e indestrutível, embora nessa família seja necessário respeitar a função de cada membro e compreender que todos são importantes no cumprimento da missão.
O espírito de corpo, a amizade, e a lealdade são aspectos de manifestação de camaradagem.
O espírito de corpo é a identificação legítima entre os integrantes de uma Corporação. É a sensação de pertencer a um Corpo coeso, indivisível, indestrutível. Esse valor reflete, portanto, o grau de coesão da tropa e de camaradagem entre seus integrantes. Ele se exterioriza pelo uso comum do fardamento, condecorações, distintivos, pelo canto de canções militares, etc. O espírito de corpo significa visualizar o companheiro de farda como uma parte do seu próprio corpo.
Quanto à amizade ela é caracterizada por um elo contendo sentimentos de afeição, carinho, consideração, lealdade e respeito que existe entre pessoas consideradas amigas.
Por fim a lealdade é característica daquele que é fiel aos seus compromissos, à sua profissão, aos superiores, pares e subordinados, e, principalmente ao povo e à causa pública.
Todo militar deve tratar sempre: com respeito e consideração os seus superiores hierárquicos, respeitando-lhe à autoridade de que se acham investidos por lei; com afeição os seus pares e com bondade, dignidade e urbanidade os seus subordinados.
A camaradagem deve fluir de forma espontânea entre os militares, mas o desrespeito às suas normas pode configurar transgressão disciplinar, previsto nos itens do Anexo I do Regulamento Disciplinar do Exército como: Deixar, quando estiver sentado, de demonstrar respeito, consideração e cordialidade ao superior hierárquico, deixando de oferecer-lhe seu lugar, ressalvadas as situações em que houver lugar marcado ou em que as convenções sociais assim não o indiquem (RDE-2002, Anexo I, item 90); Deixar, deliberadamente, de corresponder a cumprimento de subordinado (RDE-2002, Anexo I, item 92); Deixar, deliberadamente, de cumprimentar superior hierárquico, uniformizado ou não, neste último caso desde que o conheça, ou de saudá-lo de acordo com as normas regulamentares (RDE-2002, Anexo I, item 93); 98. Desacreditar, dirigir-se, referir-se ou responder de maneira desatenciosa a superior hierárquico (RDE-2002, Anexo I, item 98); Censurar ato de superior hierárquico ou procurar desconsiderá-lo seja entre militares, seja entre civis (RDE-2002, Anexo I, item 99); Ofender, provocar, desafiar, desconsiderar ou procurar desacreditar outro militar, por atos, gestos ou palavras, mesmo entre civis (RDE-2002, Anexo I, item 99); Promover ou envolver-se em rixa, inclusive luta corporal, com outro militar (RDE-2002, Anexo I, item 102), entre outros.
Todas as formas de saudação militar, bem como os sinais de respeito e a correção de atitudes caracterizam sempre o espírito de disciplina e de apreço existentes entre os militares.
É importante destacar que: “As demonstrações de respeito, cordialidade e consideração, devidas entre os membros das Forças Armadas, também o são aos integrantes das Polícias Militares, dos Corpos de Bombeiros Militares e aos Militares das Nações Estrangeiras.” (Portaria Normativa nº 660-MD, de 19-05-2009, art. 2°, § 2°).
O militar manifesta respeito e apreço aos seus superiores, pares e subordinados pela continência; dirigindo-se a eles ou atendendo-os, de modo disciplinado; observando a precedência hierárquica; e por outras demonstrações de deferência (Portaria Normativa nº 660-MD, de 19-05-2009, art. 3°, incisos I-IV).
Art. 4° A civilidade, sendo parte da educação militar, é de interesse vital para a disciplina consciente.
§ 1° É dever do superior tratar os subordinados em geral, e os recrutas em particular, com interesse e bondade.
§ 2° O subordinado é obrigado a todas as provas de respeito e deferência para com os seus superiores hierárquicos.
1.2 Civilidade
O Direito surgiu com a necessidade de regular a vida em sociedade, estando ele umbilicalmente ligado à sociedade e vice-versa. Daí a sempre nova lição de um antigo brocardo: “ubi societas, ibi jus” (onde está a sociedade está o Direito). A recíproca também é verdadeira: “ubi jus, ibi societas” não se podendo conceber qualquer atividade social desprovida de forma e garantia jurídicas, nem qualquer regra jurídica que não se refira à sociedade (REALE, 2001, p. 2). No entanto, a civilidade não significa apenas cumprir as regras do Direito e sim todo o complexo de normas que regulam a vida em sociedade, incluindo aí as regras de Moral, os costumes.
Civilidade, portanto, é o respeito pelas normas de convívio entre os membros de uma sociedade. No meio militar civilidade é a conduta social do militar, seja no âmbito da família, seja no meio militar ou na comunidade, ou ainda, na relação com as demais autoridades públicas ou privadas e com as pessoas em geral. É o amor pelo interesse público e o pelo bem comum. A civilidade é caracterizada pelo respeito às normas de convivência social. Não se deve confundir civilidade com civismo, embora ambos sejam valores que devem ser cultuados pelos militares. Civilidade é o respeito às normas de convívio entre pessoas, na sociedade; já o civismo é o culto pelas instituições e símbolos da Pátria.
Muitas pessoas, geralmente apegadas a fatos isolados, acreditam que a educação militar é desapegada das normas de civilidade, o que não é verdade. Todos os regulamentos e normas militares indicam a importância da civilidade na formação do militar. O próprio Regulamento Disciplinar do Exército indica que “A civilidade, sendo parte da educação militar, é de interesse vital para a disciplina consciente”.
No âmbito das Forças Armadas o Estatuto dos Militares prevê entre os preceitos de ética militar o de cumprir seus deveres de cidadão e o de proceder de maneira ilibada na vida pública e na particular (Lei Federal n. 6.880, de 09-12-1980, art. 28, incisos XII e XIII). Já no Código da Polícia Militar do Paraná (Lei Estadual 1.943, de 05-07-1954), no artigo 102 está descrito entre os deveres do militar: o de “zelar pela honra e reputação de sua classe, observando comportamento irrepreensível na vida pública e particular, e cumprir com exatidão seus deveres para com a sociedade (letra “d”).
1.3 A relação entre superior e subordinado
O Regulamento Disciplinar do Exército prescreve que é dever do superior tratar os subordinados em geral, e os recrutas em particular, com interesse e bondade, e, por sua vez, o subordinado é obrigado expressar todas as provas de respeito e deferência para com os seus superiores hierárquicos.
As organizações militares se estruturam sobre os princípios da hierarquia e da disciplina e a compreensão da relação existente entre superior e subordinado é aspecto fundamental desses princípios. As normas existentes no ordenamento jurídico são inúmeras no sentido de disciplinar a relação entre superior e subordinado.
No Estatuto dos Militares, por exemplo, está disciplinado que “São proibidas quaisquer manifestações coletivas, tanto sobre atos de superiores quanto as de caráter reivindicatório ou político” (Lei Federal n. 6.880, de 09-12-1980, art. 45). Por sua vez o superior deve “ser justo e imparcial no julgamento dos atos e na apreciação do mérito dos subordinados” (Lei Federal n. 6.880, de 09-12-1980, art. 28, inciso V), bem como “a obrigação de tratar o subordinado dignamente e com urbanidade” (Lei Federal n. 6.880, de 09-12-1980, art. 31, inciso VI).
O próprio Código Penal Militar (Decreto-Lei n. 1.001, de 21-10-1969) tipifica vários delitos vinculado à relação entre superior e subordinado, tais como: o Motim e a Revolta (art. 149); Violência contra superior (art. 157); Desrespeito a superior (art. 160); Recusa de obediência (art. 163); Rigor excessivo (art. 174); Violência contra inferior (art. 175); Ofensa aviltante a inferior (art. 176) etc.
Já no Anexo I do Regulamento Disciplinar do Exército também há várias condutas tipificadas como transgressão disciplinar, todas vinculadas a relação entre superior e subordinado, como: “Apresentar-se a superior hierárquico ou retirar-se de sua presença, sem obediência às normas regulamentares” (item 89); “Deixar, deliberadamente, de corresponder a cumprimento de subordinado” (item 92) “Deixar, deliberadamente, de cumprimentar superior hierárquico, uniformizado ou não, neste último caso desde que o conheça, ou de saudá-lo de acordo com as normas regulamentares” (item 93); “Desacreditar, dirigir-se, referir-se ou responder de maneira desatenciosa a superior hierárquico” (item 98); “Censurar ato de superior hierárquico ou procurar desconsiderá-lo seja entre militares, seja entre civis” (item 99); “Ofender, provocar, desafiar, desconsiderar ou procurar desacreditar outro militar, por atos, gestos ou palavras, mesmo entre civis” (item 100); “Promover ou envolver-se em rixa, inclusive luta corporal, com outro militar” (item 102), entre outras.
Importante complementar que a relação entre superior e subordinado deve ser amigável, respeitosa e calcada no profissionalismo. Os militares manifestam respeito aos seus superiores, pares e subordinados pela continência e pelas demais formas de cumprimento; na forma de tratamento uns com outros; observando a precedência hierárquica; e por outras demonstrações de deferência.
Art. 5° Para efeito deste Regulamento, a palavra "comandante", quando usada genericamente, engloba também os cargos de diretor e chefe
1.4 Significado de “comandante”
O Regulamento Disciplinar do Exército às vezes discrimina todas as autoridades, que pode praticar determinado ato, outras vezes não, utiliza somente a palavra “comandante”, englobando, entretanto, as palavras “diretor” e “chefe”. Por exemplo, prevê o § 3°, do artigo 47 do regulamento que “A interrupção ou o adiamento de LE, LTIP ou punição disciplinar é atribuição do comandante do punido, cabendo-lhe fixar as datas de seu início e término”. Evidentemente a palavra “comandante” citada no artigo engloba também as palavras de “diretor” ou “chefe”, quando tiver competência para praticar os atos administrativos citados na norma.
No caso também de reclassificação de comportamento, que é realizado por meio de "nota de reclassificação de comportamento", uma vez decorridos os prazos regulamentares, o processo se inicia, no caso de punição disciplinar, através de solicitação do interessado ao comandante imediato (RDE-2002, art. 51, § 8°, II). A palavra comandante citada abrange também “diretor” ou “chefe”, quando tiver competência para praticar os atos administrativos citados na norma.
Outro exemplo, no caso de cancelamento da punição disciplinar, o interessado necessita ter o requerente conceito favorável de seu comandante (RDE-2002, art. 59, inciso III). Nesse caso a palavra “comandante” também está sendo empregada genericamente e engloba também “diretor” ou “chefe”. Em síntese, em cada caso o intérprete deverá analisar o sentido que está sendo usada a palavra “comandante”, conforme advertido pelo artigo citado.
1.5 Cargo, função e título
O Regulamento Disciplinar do Exército utiliza as expressões de “comandante”, “diretor” e “chefe” como sinônimos de “cargos”, o que pode gerar alguma confusão terminológica.
Na definição legal “Cargo público é o conjunto de atribuições e responsabilidades previstas na estrutura organizacional que devem ser cometidas a um servidor, sendo criado por lei, com denominação própria e vencimento pago pelos cofres públicos, para provimento em caráter efetivo ou em comissão (art. 3º da Lei n. 8.112, de 11-12-1990, art. 3°). De fato “Cargo público é o lugar dentro da organização funcional da Administração Direta e de suas autarquias e fundações públicas que, ocupado por servidor público, tem funções específicas e remuneração fixadas em lei ou diploma a ela equivalente (CARVALHO FILHO, 2011, p. 754) ou ainda, cargo público pode ser definido também como “o menor centro hierarquizado de competências da Administração direta, autárquica e fundacional pública, criado por lei ou resolução, com denominação própria e número certo” (GASPARINI, 2012, p. 319). Cargo público difere da função pública já que a “Função Pública é a atividade em si mesma, ou seja, função é sinônimo de atribuição e corresponde às inúmeras tarefas que constituem o objeto dos serviços prestados pelos servidores públicos” (CARVALHO FILHO, 2011, p. 754).
Nas organizações militares o cargo, o posto e a graduação, às vezes se confundem. Os cargos privativos dos oficiais de carreira são vitalícios, porque destinam a receber um ocupante em caráter definitivo. A perda da função somente ocorre através de processo judicial. De fato os oficiais militares são cargos de provimento vitalício, devido à previsão constitucional (CF-88, art. 142, § 3°, VI), conforme adverte Gasparini (2012, p. 331).
Os oficiais das Polícias militares e corpo de bombeiros militares dos estados e do distrito federal também possuem regras similares devido à previsão constitucional (CF-88, art. 42, combinado com o art. 142, § 3°, VI). As constituições estaduais repetem as regras da Constituição Federal. No caso da polícia Militar do Paraná tal previsão se encontra no artigo 45, § 4° da Constituição do Estado do Paraná de 1989.
Em relação às praças não há a vitaliciedade na ocupação do cargo. No caso do ingresso nas corporações militares através de concurso público, elas adquirem, na forma da lei, que regula cada organização militar a estabilidade, no caso de nomeação para cargo de provimento efetivo, que confere ao seu ocupante a segurança, mas pode ser demitido através de processo administrativo ou judicial.
Quanto à hierarquia militar ela é a “Ordenação da autoridade, em níveis diferentes, dentro da estrutura das Forças Armadas e Forças Auxiliares” (Decreto n. 88.777, de 30-09-1983, n. 15); nesta hierarquia existe uma escala hierárquica com a fixação ordenada dos postos e graduações: o posto é o grau hierárquico do oficial Decreto n. 88.777, de 30-09-1983, n. 28) e a graduação o grau hierárquico das praças Decreto n. 88.777, de 30-09-1983, n. 13).
O oficial possui ainda a carta patente, conferido pelo Presidente da República, no caso de oficiais das Forças Armadas ou pelos Governadores dos Estados e do Distrito Federal, no caso dos oficiais das Forças auxiliares. Essa carta patente é o título que comprova a nomeação do militar para determinado posto na hierarquia militar. Com ela se comprova as prerrogativas, os títulos, os direitos, os deveres correspondentes ao cargo.
Dessa forma o Posto é o lugar que o oficial ocupa na hierarquia militar e o título a função que lhe corresponde. De maneira similar a Graduação (e também o cargo) é o lugar que a praça ocupa na hierarquia militar.
No âmbito das Forças Armadas é submetido ao Conselho de Justificação, a pedido ou "ex officio" o oficial das forças armadas, que for acusado oficialmente ou por qualquer meio lícito de comunicação de ter procedido incorretamente no desempenho do cargo (Lei Federal n. 5.836, de 05-12-1972, art. 2°, inciso I, letra “a”). Em relação às praças disposição semelhante se encontra no art. 2°, inciso I, letra “a” do Decreto n. Decreto n. 71.500, de 05-12-1972. O cargo destacado na legislação significada o próprio posto ou gradual do militar.
Por exemplo, no caso de crime de Tortura, “A condenação acarretará a perda do cargo, função ou emprego público e a interdição para seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada” (Lei n 9.455, de 07-04-1997, art. 1°, § 5º). Assim, no caso dos militares, a perda do cargo significa a perda do próprio posto e graduação, que são cargos dos militares e não apenas o título de “comandante”, “diretor” ou “chefe”.
O Código Penal Militar estabelece no seu artigo 55, entre as penas principais, a suspensão do exercício do posto, graduação, cargo ou função, o que pode sugerir que o posto e a graduação não são cargos militares. Entretanto “Ao trazer a possibilidade de suspensão do exercício do cargo, entendemos que a lei penal militar pretendeu referir-se ao funcionário público não militar que possa ser condenado por um crime militar, não abrangendo os militares, já que o posto e a graduação, acima já definidos, são os cargos respectivamente do oficial e da praça” (NEVES e STREIFINGE, 2012 p. 220).
Em síntese o posto e a graduação são os cargos públicos dos militares; quando ocupados se fundem, mas ao tornarem-se vagos ocorre o desmembramento: o cargo permanece na estrutura hierárquica e o militar, no caso da inatividade, por exemplo, somente permanece com ou posto no caso de oficial, ou graduação no caso de praça. Então, as palavras: “comandante”, “diretor” ou “chefe” são títulos militares de ocupantes de determinados cargos (ou postos) militares e não cargos em si.
Art. 6° Para efeito deste Regulamento, deve-se, ainda, considerar:
I - honra pessoal: sentimento de dignidade própria, como o apreço e o respeito de que é objeto ou se torna merecedor o militar, perante seus superiores, pares e subordinados;
II - pundonor militar: dever de o militar pautar a sua conduta como a de um profissional correto. Exige dele, em qualquer ocasião, alto padrão de comportamento ético que refletirá no seu desempenho perante a Instituição a que serve e no grau de respeito que lhe é devido; e
III - decoro da classe: valor moral e social da Instituição. Ele representa o conceito social dos militares que a compõem e não subsiste sem esse.
1.6 Importância dos Conceitos de Honra Pessoal, Pundonor Militar e decoro da Classe
O artigo 14 de o Regulamento Disciplinar do Exército define transgressão disciplinar como toda ação praticada pelo militar contrária aos preceitos estatuídos no ordenamento jurídico pátrio ofensiva à ética, aos deveres e às obrigações militares, quer seja na sua manifestação elementar e simples, quer seja na forma mais grave, que afete a honra pessoal, o pundonor militar e o decoro da classe.
Segundo o próprio regulamento “Será sempre classificada como ‘grave’ a transgressão da disciplina que constituir ato que afete a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe” (RDE-2002, art. 22). A aplicação da punição disciplinar de ser proporcional à gravidade da transgressão, dentro de certos limites, cabendo para a transgressão grave, a punição de prisão disciplinar até o licenciamento ou exclusão a bem da disciplina. Ou seja, toda a punição que afete a honra pessoal, o pundonor militar e o decoro da classe é considerada “grave” e pode ser aplicada a ela a punição de exclusão ou licenciamento.
O cancelamento dos registros de punição disciplinar somente pode ser concedido se a punição, objeto do cancelamento não ofender a honra pessoal, ao pundonor militar ou ao decoro da classe (RDE-2002, art. 59, inciso I).
Em relação às praças sem estabilidade assegurada (no caso do Exército Brasileiro) o licenciamento a bem da disciplina será aplicado pelo Comandante do Exército ou comandante, chefe ou diretor de organização militar, dentre outras hipóteses, quando a transgressão afetar a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe, no caso em que a repressão imediata, se torne absolutamente necessário à disciplina (RDE-2002, art. 32, § 1°, inciso I).
Já em relação ao Guarda-Marinha, ao Aspirante a Oficial e as demais praças das Forças Armadas com estabilidade assegurada, constitui motivo para submissão ao Conselho de Disciplina, o fato dessas praças terem sido acusadas oficialmente ou por qualquer meio lícito de comunicação social de terem praticados, dentre outros fatos, ato que afete a honra pessoal, o pundonor militar ou decoro da classe (Decreto n. 71.500 de 05-12-1972, art. 2°, inciso I, letra “c”). Em reação aos oficiais, semelhante disposição se encontra no artigo 2°, inciso I, letra “c da Lei n. n. 5.836, de 05-12-1972. Na Polícia Militar do Paraná também, no artigo 5°, inciso II, letra “c” da Lei n.16.544 de 14-07-2010 encontra-se disposição semelhante. Em síntese, a prática de ato que afete a honra pessoal, o decoro da classe e o pundonor militar sempre constituem fato grave e pode culminar na exclusão, no licenciamento, na demissão e na perda do posto ou graduação.
As decisões judiciais também apontam no sentido que a prática de ato que afete a honra pessoal, o decoro da classe e o pundonor militar são fatos graves: “[.....]1. Hipótese em que ex-policial militar estadual busca a reintegração no cargo público e o pagamento dos vencimentos desde o ato que a excluiu do quadro. [.....] 3. Ficou demonstrado no processo administrativo disciplinar que a recorrente tinha ciência de que o seu companheiro, também ex-policial, transportava a droga no carro em que viajavam. Assim, não há falar em ilegalidade da decisão que a excluiu dos quadros da Polícia Militar, diga-se, não pelo crime de tráfico ilícito de entorpecentes, mas por ato irregular que afetou o pundonor policial-militar e o decoro da classe. 4. Agravo regimental não provido” (AgRg no RMS 32.526/MT, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 27/03/2014, DJe 04/04/2014).
No Tribunal de Justiça do Paraná também a jurisprudência é no mesmo sentido: “conselho de justificação oficial da polícia militar do estado prática de condutas irregulares graves incompatíveis com o cargo atos lesivos à imagem da corporação perante os subordinados e à comunidade local ofensa à honra, pundonor militar e decoro da classe incapacidade para permanência na ativa ou indignidade para o oficialato decisão do comandante-geral mantida justificação improcedente. [....]” (TJPR - 1ª C.Criminal - CJ - 500132-7 - Curitiba - Rel.: Oto Luiz Sponholz - Unânime - - J. 12.08.2010).
No âmbito do Superior Tribunal Militar permanece a mesma sistemática de que ato ofensivo ao pundonor militar e o decoro da classe é conduta incompatível com sentimento do dever e a ética militar: “conselho de justificação. capitão-aviador do efetivo do comando da aeronáutica. incompatibilidade com o oficialato. [...]. incapacidade do oficial para permanecer na ativa. condutas incompatíveis com o sentimento de dever militar, o pundonor militar, a ética e o decoro da classe. penalidade de reforma do justificante. decisão por maioria” (n.: 0000004-98.2010.7.00.0000 (2) UF: DF Decisão: 11/09/2014, Processo: CJ - Conselho de Justificação, Relator: Min. José Américo dos Santos data da Publicação: 24-11-2014 Vol: Veículo: DJE).
É de fundamental importância a definição de tais conceitos devido à importância deles no meio militar. É importante destacar que são conceitos “abertos”, cabendo o aplicador de a punição descrever os motivos que o levaram a concluir que determinada transgressão lesou esses valores militares.
1.6.1 Honra Pessoal
Honra pessoal é o sentimento de orgulho próprio. Espera-se que o militar tenha consigo padrões éticos e morais inabaláveis. Honra pessoal é o conjunto de qualidades que torna o militar merecedor da consideração pública, devido sua conduta ilibada, sua retidão profissional e seu caráter.
1.6.2 Pundonor Militar
Pundonor militar é o dever de o militar pautar a sua conduta como a de um profissional de hombridade ou de integridade. O pundonor militar se caracteriza pelo esforço do militar em compatibilizar sua conduta como um profissional correto e íntegro.
1.6.3 Decoro da Classe
Decoro da classe é o "valor moral e social da Corporação". Os militares, no seu conjunto, formam uma classe, com padrões éticos e morais e a conduta de cada membro deve ajustar-se segundo o estilo e os objetivos da própria instituição.
REFERÊNCIAS
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, 24ª. Edição. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2011.
Brasil.. Lei n 9.455, de 07-04-1997, define os Crimes de Tortura. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9455.htm, acesso em 14-06-2015.
_________. Decreto-Lei n. 1.001/1969 de 21-10-1969, Código Penal Militar. Disp. em: http://legislacao.planalto.gov.br/legisla/legislacao.nsf/Viw_Identificacao/DEL%201.001-1969?OpenDocument, acesso em 10-06-2015.
________. Lei n. 6.880, de 09-12-1980, Estatuto dos Militares. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6880.htm, acesso em 10-06-2015.
________. Lei n. 5.836, de 05-12-1972, dispõe sobre o Conselho de Justificação. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970-1979/L5836.htm, acesso em 10-06-2015.
________. Decreto n. 71.500, de 05-12-1972, dispõe sobre o Conselho de Disciplina. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d71500.htm, acesso em 10-06-2015.
________. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, de 05-10-1988. Diário Oficial da União n. 191-A, de 05-10-1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm, acesso em 07-06-2015.
________. Decreto n. 4.346, de 26-08-2002. Diário Oficial da União 27-08-2002. Regulamento Disciplinar do Exército. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4346.htm, acesso em 06-06-2015.
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________. Superior Tribunal Militar: n.: 0000004-98.2010.7.00.0000 UF: DF Decisão: 11-09-2014, Processo: CJ - Conselho de Justificação, Relator: Min. José Américo dos Santos data da Publicação: 24-11-2014 Vol: Veículo: DJE. Disponível em: http://www2.stm.jus.br/pesquisa/acordao/2013/90/10002112/10002112.pdf, acesso em 15-06-2015.
GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo, 17ª edição, São Paulo: Saraiva, 2012.
NEVES, Cícero Robson; STREIFINGER, Marcelo. Manual de direito penal militar, 2. ed. – São Paulo : Saraiva, 2012.
PARANÁ. Lei Estadual n. 1943, de 23-06-1954 – Código da Polícia Militar do Paraná, publicado no Diário Oficial n. 98 de 05-07-1954. Disponível em: http://www.legislacao.pr.gov.br/legislacao/listarAtosAno.do?action=exibir&codAto=14555&indice=8&anoSpan=1960&anoSelecionado=1954&isPaginado=true, acesso em 08-06-2015.
_________. Decreto nº 7.339, de 08-06-2010, Regulamento Interno dos Serviços Gerais da Polícia Militar do Paraná, disponível em: http://www.aprapr.org.br/wp-content/uploads/2011/11/Decreto7339RegulamentoInternodosServicosGeraisdaPMPR3.pdf acesso em 03-06-2015.
_________. Lei 16.544 de 14-07-2010, que dispõe que o processo disciplinar, na PMPR publicada no Diário Oficial nº. 8262 de 14-07-2010. Disponível em: http://www.legislacao.pr.gov.br/legislacao/listarAtosAno.do?action=exibir&codAto=56213&codItemAto=435524, acesso 11-06-2015.
________. TJPR - 1ª C.Criminal - CJ - 500132-7 - Curitiba - Rel.: Oto Luiz Sponholz - Unânime - - J. 12.08.201). Disponível em: https://portal.tjpr.jus.br/jurisprudencia/j/1999371/Ac%C3%B3rd%C3%A3o-500132-7#, acesso em 15-06-2015.
REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito, 25ª edição, São Paulo: Saraiva. 2001.
Mestre em políticas públicas pela Universidade Estadual de Maringá (2016), graduado no Curso de Formação de Oficiais pela Academia Policial Militar do Guatupê (1994), graduado em Administração pela Faculdade Estadual de Ciências Econômicas de Apucarana (1998) e graduado em Direito pela Universidade Estadual de Londrina (2009), com aprovação no Exame da Ordem dos Advogados do Brasil. Possui experiência na docência militar nas disciplinas de Direito Penal, Direito Processual Penal e Direito Administrativo. Possui ampla experiência em Polícia Judiciária Militar e experiência no setor público, principalmente em gestão de pessoas e formulação de projetos.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Douglas Pereira da. Comentários ao Regulamento Disciplinar do Exército: artigo 3° ao 6°. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 set 2015, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/45145/comentarios-ao-regulamento-disciplinar-do-exercito-artigo-3-ao-6. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Gabriel Bacchieri Duarte Falcão
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