RESUMO: Procura-se neste artigo analisar os aspectos relacionados à dignidade humana retratados na Declaração Universal dos Direitos Humanos sob a perspectiva de Max Scheler. Filósofo e intelectual alemão foi um dos pioneiros da fenomenologia, aprendida dos ensinamentos Edmund Husserl. Viveu de 1874 a 1928 em uma Europa de grandes acontecimentos da história, mormente quanto a Primeira Guerra Mundial e o nascimento de regimes ditatoriais violentos. Sua vida foi partilhada da presença de notáveis das diversas áreas do saber, o que de certa maneira contribui para a diversificação do seu pensamento, as quais congregam a sociologia, a antropologia filosófica, a metafísica, a política, a biologia, a psicologia, a cosmologia, entre outros ramos do conhecimento. A Declaração Universal dos Direitos Humanos tem concepção humanista e parte da singular dignidade da pessoa humana. E como tal pressupõe uma unidade de direitos, para que as relações humanas primem pelo pacifismo e sejam pautadas pela justiça, derivada de um senso comum. O homem, por ser um ser social participa de uma imensa variedade de atos sociais que se originam nele e buscam sua plenitude no próximo. Essa concepção retratada por Scheler pode ser observada na relação de reciprocidade inerente aos direitos assegurados através da Declaração, em uma trajetória de respeito à dignidade humana, mormente no que se refere aos resultados para as pessoas, tanto das que tem os seus direitos respeitados e assegurados quanto daquelas que de qualquer maneira atuam para que a observância dos direitos se efetive. Em vista da reciprocidade e da solidariedade evidenciada na Declaração, os conhecimentos trazidos pelo filósofo, a partir da cultura do homem, que compõe o seu próprio microcosmo, e seu macrocosmo, servem para estabelecer uma compreensão da universalidade dos direitos descritos, visto que se articulam em um sentido amplo, passando a compor a totalidade de mundo do homem.
Palavras-Chave: Scheler – homem – dignidade humana – microcosmo – macrocosmo
ABSTRACT: Wanted this article analyze aspects related to human dignity portrayed in the Universal Declaration of Human Rights from the perspective of Max Scheler. German philosopher and intellectual was one of the pioneers of phenomenology, Edmund Husserl learned of the teachings. He lived from 1874 to 1928 in a Europe of great events of history, especially as the First World War and the birth of violent dictatorial regimes. His life was shared the presence of notables from different areas of knowledge, which in some way contributes to the diversification of their thought, which congregate sociology, philosophical anthropology, metaphysics, politics, biology, psychology, cosmology, and other branches of knowledge. The Universal Declaration of Human Rights has humanistic design and part of the singular dignity of the human person. As such rights presupposes a unit, so that human relationships excel by pacifism and be guided by justice, derived from a common sense. Man, being a social being participates in a wide variety of social acts that originate it and seek its fullness the next. This view portrayed by Scheler can be observed in reciprocal relationship inherent rights guaranteed by the Declaration on a path of respect for human dignity, especially with regard to the results for people, both of which have their rights respected and ensured as those that anyway act to the observance of the rights to become effective. In view of reciprocity and solidarity shown in the Declaration, the knowledge brought by the philosopher, from the culture of man, which makes up its own microcosm and macrocosm his serve to establish an understanding of the universality of rights described as articulate in a broad sense, giving rise to all the world of man.
Key-Words: Scheler – man – human dignity – microcosm – macrocosm
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1 A Declaração Universal dos Direitos Humanos e sua proximidade com a filosofia de Max Scheler. 2 A importância da pessoa para Scheler na concretização dos atos. 3 A ordem dos valores como um a priori. Considerações finais. Referência bibliográfica.
INTRODUÇÃO
Este artigo tem o objetivo de apresentar uma análise acerca da dignidade humana, fundamento da Declaração Universal dos Direitos Humanos, sob a perspectiva de Max Scheler, filósofo e intelectual alemão que viveu os temores da Primeira Guerra Mundial. Embora não tenha participado dos acontecimentos que cercaram a elaboração do documento universal, seus conhecimentos são contextuais para uma abordagem fundamentadora dos princípios que norteiam a Declaração. Nesse ponto abre-se um parêntese para esclarecer que neste artigo será utilizado o termo Declaração para fazer remissão à Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Não se trata de tarefa simples sistematizar a dignidade humana no direito positivo, quiçá condensar as mais diversas manifestações filosóficas a respeito, embora considerando um avanço histórico da participação da pessoa na atuação do Estado contemporâneo. O fato de haver vários significados e sentidos atribuídos à dignidade humana denota a amplitude da expressão de valor social, o que se constata na dificuldade em se adotar um conceito preciso.
A dignidade da pessoa humana, retratada na Declaração, com o sentido de assegurar ao homem condições mínimas de respeito e existência, será abordada nesse artigo, consoante alguns dos postulados e concepções de Max Scheler, que não obstante não tenha vivenciado o período em que se concretizou a elaboração do documento universal, de uma maneira notável, conseguiu expressar as qualidades que cercam o ser humano, capacitando-o a operar em vista da dignidade dos demais membros da sociedade e de maneira recíproca na própria dignidade.
Max Scheler nasceu em 22 de agosto de 1874, em Munique, Alemanha e faleceu em 19 de maio de 1928. Estudou filosofia e sociologia e se aproximou de Edmund Husserl, ocasião em que personificou sua identificação com a fenomenologia. Conviveu com figuras proeminentes de sua época, das mais diversas áreas do conhecimento, o que contribui para a diversificação do seu pensamento.
Os estudos de Scheler são incisivos contra o reducionismo e destacam a grandeza do ser humano, como um ser essencial para a concretização dos atos, considerado como pressuposto. Nesse contexto, a pessoa tem participação crucial em todo ato, em razão das interconexões havidas pelo fato da pessoa estar inserida em um ato e tê-lo consigo em seu “microcosmo” e fazer parte do mundo que atinge e influencia o próprio ato no “macrocosmo”. Assim se forma o conhecimento como uma relação ontológica, a partir da relação entre as pessoas em que qualquer delas participa no que outra pessoa é em si mesma.
A Declaração possui uma concepção humanista como uma unidade de direitos, para que as relações humanas primem pelo pacifismo e sejam pautadas pela justiça, derivada de um senso comum. Essa interpretação humanista aproxima-se do mencionado por Scheler, notadamente, quanto a identificar-se como um ser superior, não sendo possível estudar o homem sem compreendê-lo diante do contexto em que está inserido.
Assim permite-se entender que o homem, por ser um ser social participa de uma imensa variedade de atos sociais que se originam nele e buscam sua plenitude no próximo. Não se trata, porém, de uma evidência primária da existência do próprio eu, mas de que o ser do outro é apreendido com evidência imediata pelo sentido interno.
A dignidade humana fomentada na Declaração carrega em si intensa carga de reciprocidade, tratada como a relação que une a comunidade de homens no exercício e observância dos direitos, a qual se aproxima do conceito vinculado ao princípio da solidariedade de Scheler, no que se refere à corresponsabilidade de todos por todos. A reciprocidade e a solidariedade, tratada na Declaração em consonância com os conhecimentos ofertados pelo filósofo, a partir da cultura do homem, que compõe o seu próprio microcosmo, e seu macrocosmo, servem para estabelecer uma compreensão da universalidade dos direitos descritos, visto que se articulam em um sentido amplo, passando a compor a totalidade de mundo do homem.
Scheler faz uma crítica a Kant quanto ao imperativo categórico, o que no seu entender está atrelado à experiência de valor entendida como um ato emocional. Na Declaração a concepção da dignidade humana se mostra cercada de valores positivos que somente podem ser percebidos pelas pessoas, o que as torna eticamente responsáveis para a realização da solidariedade.
O que se evidencia é que ao agir eticamente, a pessoa se faz parte do mundo que a envolve, bem como reconhece que é esse mundo que influencia o seu mundo interior, demonstrando a contribuição para o desenvolvimento dos mundos, de acordo com a suas obrigações voltadas para os atos com valores superiores. E através das ações positivas, cada pessoa assegura uma elevação da qualidade do mundo externo e consequentemente do seu próprio mundo interno, perfazendo em atos graduais com valores profundos, visto que acarreta a demonstração da necessidade de consciência no desenvolvimento do mundo.
1 A Declaração Universal dos Direitos Humanos e sua proximidade com a filosofia de Max Scheler
Após séculos de lutas, e sob os resquícios das atrocidades perpetradas pelo Holocausto da Segunda Guerra Mundial, o homem recebeu um roteiro de direitos, universais, expressos na Declaração Universal dos Direitos Humanos, celebrada em 1948, pela Assembleia Geral das Nações Unidas. Direitos históricos, conforme ensina Bobbio, derivados de intensas lutas em defesa das liberdades.[1]
Documento que buscou, através de um sentido profundo, expressar direitos com o objetivo de proteger os destinos da humanidade, alçando a dignidade do homem como alicerce para a concretização de um futuro pacífico conforme se depreende do artigo 1º do Preâmbulo da Declaração:
“Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo.”
Não se trata de tarefa simples sistematizar a dignidade humana no direito positivo, quiçá condensar as mais diversas manifestações filosóficas a respeito, embora considerando um avanço histórico da participação da pessoa na atuação do Estado contemporâneo. O fato de haver vários significados e sentidos atribuídos à dignidade humana denota a amplitude da expressão de valor social, o que se constata na dificuldade em se adotar um conceito preciso. A história de cada povo e os seus elementos culturais também contribuem para a dificuldade no estabelecimento de um sentido final para a expressão, além de ser notório que as necessidades humanas são variáveis, na medida em que acompanham o contexto de cada época.
Nesses termos, a dignidade humana pressupõe o exercício de direitos minimamente suficientes em assegurar o bem-estar de todos, o que de maneira geral envolve relações com terceiros, o Estado e as demais pessoas da comunidade. Nota-se haver um núcleo essencial, do qual partem todos os conceitos de sentido e significado para a dignidade humana, qual seja o homem, mormente em seu estado da natureza[2], ponto de partida para todas as ações estatais, o que garante o contínuo estado de desenvolvimento e construção para o conceito da dignidade humana.[3] Há que se ressaltar que o estado da natureza garante à pessoa autonomia para fazer suas próprias escolhas, esse atributo tão próximo da concepção da dignidade humana permite ao homem contribuir enormemente para o desenvolvimento do mundo, e através de uma força de reação e composição recíproca, ter o próprio mundo interno modificado.
A dignidade da pessoa humana, retratada na Declaração, com o sentido de assegurar ao homem condições mínimas de respeito e existência, se adequa aos postulados e concepções de Max Scheler, filósofo alemão, que embora não tenha participado do momento em que se concretizou a elaboração do documento universal, viveu as agruras que cercaram a Primeira Guerra Mundial e de uma maneira notável conseguiu expressar as qualidades que cercam o ser humano capacitando-o a operar em vista da dignidade dos demais membros da sociedade e de maneira recíproca na própria dignidade.
Max Scheler foi um grande intelectual alemão e um dos pioneiros no estudo de fenomenologia no início do século XX. Viveu em uma Europa de grandes acontecimentos da história, mormente quanto a Primeira Guerra Mundial e o nascimento de regimes ditatoriais violentos. Morreu em 1928, preocupado em entender as mudanças sociais, diante dos acontecimentos que acompanhou e vivenciou. Foi encarregado pelo Ministério de Relações Exteriores de representar a Alemanha durante as negociações de paz em Haia e em Genebra, com o final da guerra. Dessa realidade deixou vários textos sobre a situação presenciada, tais como Die Ursachen des Deutschenhasses[4], publicada em 1917, e Die Idee des Ewigen Friedens und der Pazifismus[5], obra póstuma publicada em 1931.
Nasceu em 22 de agosto de 1874, em Munique, na Alemanha e estudou filosofia e sociologia a partir dos ensinamentos de Wilhelm Diltney e Georg Simmel. Durante seus estudos se aproximou de Edmund Husserl, ocasião em que se personificou a identificação com a fenomenologia. Conviveu com figuras proeminentes de sua época, como Max Brod, Martin Buber, Arnold Zweig, Albert Einstein, Wlater Rathenau, Paul Tilich, Wertheimer, Köhler, Eduard Erdmann, Otto Klemperer, entre tantos outros notáveis das mais diversas áreas do estudo, que de certa maneira contribuíram para a diversificação do seu pensamento, o que se constata em suas obras, as quais congregam a sociologia, a antropologia filosófica, a metafísica, a política, a biologia, a psicologia, a cosmologia, entre outros ramos do conhecimento.
A importância da teoria filosófica de Scheler para o estudo proposto nesse artigo se faz na medida em que seu pensamento e filosofia foram incisivos na luta contra o reducionismo das ciências, de tal modo a destacar que o ser humano é considerado como uma “unidade de ser concreta e essencial de atos de essência diversa”[6], complementada de maneira precisa, conforme segue:
“A pessoa é fundamental para a entidade dos atos, enquanto ela é pressuposto da concretização deles, isto é, de sua inserção no ser. Por causa de seu caráter de fundamento, a pessoa jamais poderá ser definida apenas como mero conjunto de atos. Por outra parte, ela tampouco é uma coisa substancial continuamente existente, que cada homem carrega consigo. Ela não é nada além ou acima dos atos, mas “existe e experimenta a si mesma na realização dos atos”. Sem se dissolver no ato, a pessoa está sempre integralmente nele. De ato a ato se processa, por conseguinte, uma variação constante, um puro “tornar-se outro” da totalidade da pessoa“[7].
2 A importância da pessoa para Scheler na concretização dos atos
Dessa conceituação acerca da pessoa, registra-se a sua real magnitude e participação no que diz respeito a todo e qualquer ato em que esteja de alguma maneira envolvida, em razão das interconexões havidas pelo fato da pessoa estar inserida em um ato e tê-lo consigo em seu “microcosmo” e fazer parte do mundo que atinge e influencia o próprio ato no “macrocosmo”. Assim se forma o conhecimento como uma relação ontológica, a partir da relação entre as pessoas em que qualquer delas participa no que outra pessoa é em si mesma.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos tem, nos dizeres de Lima, concepção humanista e parte da singular dignidade da pessoa humana[8]. E como tal pressupõe uma unidade de direitos, para que as relações humanas primem pelo pacifismo e sejam pautadas pela justiça, derivada de um senso comum.
De acordo com essa interpretação, o homem, como mencionado por Scheler, se faz o elemento precursor, como um “ser superior e sublime, acima de toda a vida e seus valores, acima da totalidade da natureza”[9]. Não há que se falar ou estudar o homem sem compreendê-lo diante do contexto em que se insere, com valor essencial e racional, que supera todos os valores de realização, de tal modo que Scheler emprega ao homem a expressão de “beco sem saída da natureza”[10] condensando a capacidade humana de ser ao mesmo tempo a concentração e o maior propósito da natureza. De maneira tal que o desenrolar da história deve ser analisado tendo como ponto de partida e chegada, o homem.
Tudo isso leva o filósofo a estudar a problemática a partir da antropologia filosófica, da qual se configura uma ciência da “essência e da estrutura essencial do homem”[11]. E é com o fundamento nessa antropologia que se permite alcançar elementos seguros que sirvam de premissa para as ciências que tenham no homem seu elemento condutor. Notabiliza-se a preocupação de Scheler sobre a incerteza e indeterminação que permeiam a concepção da essência do homem[12].
O homem, por ser um ser social participa de uma imensa variedade de atos sociais que se originam nele e buscam sua plenitude no próximo. Não se trata, porém, de uma evidência primária da existência do próprio eu, mas de que o ser do outro é apreendido com evidência imediata pelo sentido interno, o qual, segundo Scheler, deve ser estritamente distinguido da autopercepção, voltada para o próprio eu, de outra forma, colocando a evidência do tu antes da própria evidência.
Dessa relação intrínseca entre a pessoa e o outro, evidencia-se a importância da própria pessoa para a entidade dos atos, sobretudo por se considerar que ela funciona como pressuposto básico da concretização de qualquer ato. O que se concebe, portanto é que, em vista de seu caráter de fundamento, a pessoa não pode ser definida como conjunto de atos, o que resultaria em uma concepção minimalista. Assim, a pessoa não é nada além ou acima dos atos, mas existe e experimenta a si mesma na realização dos próprios atos. Denota-se que os atos não devem ser observados isoladamente, apenas como atos, mas com a perspectiva de que há a pessoa para a sua real concretização.
Essa concepção retratada por Scheler pode ser observada na relação de reciprocidade inerente aos direitos assegurados através da Declaração, em uma trajetória de respeito à dignidade humana, mormente no que se refere aos resultados para as pessoas, tanto das que tem os seus direitos respeitados e assegurados quanto daquelas que de qualquer maneira atuam para que a observância dos direitos se efetive. Diante desses elementos visualiza-se uma necessária carga de reciprocidade, a qual se notabiliza no âmago da Declaração, complementada pela universalidade, essencialidade e superioridade normativa.[13]
A reciprocidade tratada como a relação que une a comunidade de homens no exercício e observância dos direitos se aproxima do princípio da solidariedade de Scheler, no que se refere à corresponsabilidade de todos por todos, resultando no conceito de pessoa global.[14]
De conhecimento que, com o fim dos massacres humanos desencadeados pelas duas grandes guerras, o homem se viu em uma situação retratada por Arendt como uma “atmosfera de desintegração”,[15] na qual os abalos proporcionados em sua mais intima dimensão se fizeram notórios. A elaboração da Declaração, consagrada como documento que assegurasse a máxima dignidade humana se fez emergencial, com o propósito de garantir que a humanidade não se visse novamente diante de tamanha carnificina, muito embora ainda se tenha casos de flagrante desrespeito à vida. Nessa conformidade de uma nova parametrização para o respeito ao ser humano, em sua profunda essência, há em Scheler, uma análise elucidativa, derivada da cultura que contempla uma abordagem acerca dos mundos do homem.
Scheler, nesse sentido, estabelece fontes para uma interpretação esclarecedora, ao diagnosticar que a “cultura do homem está no centro dos interesses”.[16] A cultura é de certo modo, preponderante para a interpretação das manifestações humanas, funcionando como guia para análise do comportamento do homem, considerada por Scheler com uma “categoria do ser, não do saber e da experiência”. Caracterizada como um molde para a totalidade do ser e capaz de representar em cada homem, um mundo em si. E neste microcosmo individual, não há que se compreender somente em aspectos imanentes próprios, mas uma concepção superior que envolve ideias em uma representação ampliada de mundo, com valores essenciais das coisas. Tal premissa confere a cada homem um mundo em particular num complexo indeterminado de experiências. O que leva o filósofo a crer na “autoconcentração do grande mundo, o macrocosmo, em um centro espiritual, individual e pessoal, o microcosmo”[17]. Há, a partir dessa ideia, uma correlação de sentidos da vida do homem em seu mundo interno, no mundo externo.
Em vista da reciprocidade e da solidariedade evidenciada na Declaração, os conhecimentos trazidos pelo filósofo, a partir da cultura do homem, que compõe o seu próprio microcosmo, e seu macrocosmo, servem para estabelecer uma compreensão da universalidade dos direitos descritos, visto que se articulam em um sentido amplo, passando a compor a totalidade de mundo do homem, mesmo que sem a própria consciência quanto a esta formação.
O despojamento da pessoa funciona como significado central para o pensamento filosófico de Scheler, nele a pessoa se faz humilde para aceitar o outro e dessa maneira também influenciar o outro, em uma atitude de desprendimento e de admiração do mundo, na medida em que cada pessoa vive o mundo e contribui para a própria situação do mundo.
E através desse sentido do conhecimento que Scheler, aborda a ideia da fenomenologia. A qual passou a ser invocada como uma atitude de observação, em que o dado não é um conceito adquirido, mas considerado criticamente, mantendo o mundo suspenso, vez que a apreensão do objeto nunca pode ser completa.
3 A ordem dos valores como um a priori
A principal obra de Scheler, da fenomenologia foi Formalismo em Ética e Não Formal (ou Material) Ética do Valor, em que se constrói, através da crítica aos ensinamentos de Kant, um a priori, expresso em um imperativo categórico, universal. Scheler se contrapõe a essa ideia, defendendo que o a priori é abstrato, não podendo satisfazer a obrigação pessoal com outra pessoa e a obrigação consigo mesma. Esse a priori surge na experiência de valor, o que se explica pelo fato do dado ter um valor anterior à sua própria percepção.
O valorizar, nesse sentido refere-se a um ato de significar, intencionalmente, como um ato emocional. Scheler esclarece haver dois atos emocionais de valoração, o ato do amor e o ato do ódio, em que no primeiro, o valor da pessoa, ou do objeto se engrandece, enquanto no ultimo, o de ódio, ocorre um movimento de destruição, como ressalta “Pero mientras que el amor es um movimento que va del valor más bajo al más alto y em que relampaguea por primera vez em cada caso el valor más alto de um objeto o de una persona, el ódio es um movimento opuesto”[18]. E de acordo com o próprio filósofo, as pessoas tendem para aquilo que tem maior valor, havendo uma hierarquia de valores, consoante uma ordem de preferência.
A partir dessa premissa a análise dos valores presentes na concepção da dignidade da pessoa humana, tão loquazmente apresentada na Declaração Universal de Direitos Humanos, se mostra carregada de sentimentos positivos, em nome da proteção do elemento mais essencial para o desenvolvimento da concepção essencial, a pessoa. Concebida como o ser capaz de sentir os valores e sua ordem de classificação. Nessa experiência de valor, que Scheler esclarece sua ética a priori, de acordo com uma escala de valores, do inferior para o superior que são sentidos de maneira individual por cada pessoa.
A pessoa se representa como uma unidade de diferentes tipos e natureza, que se faz notar em cada ato, mas não se reduz ao próprio ato. Seu significado é determinado pela forma com que traz algum significado para o mundo. Não é uma questão sobre o que a pessoa é, mas de quem ela é para o mundo. Diante dessa abordagem, “a pessoa é indefinível e só pode ser apreendida através do seu valor”[19], e esse valor está intimamente ligado a uma apreensão do outro.
A escala de valores somente pode ser percebida pelas pessoas, o que as torna eticamente responsáveis. A responsabilidade está em empregar os valores mais altos nessa relação, de tal maneira que a ética está para a prática de atos superiores de solidariedade, o que o filósofo chama de ato de amor, que é empregado em termos de um sentido cristão da agape , como o amor-doação. Contrariamente, responder aos atos por meio de ações odiosas terá um valor baixo e será considerado anti-ético. O bom, portanto, representa um movimento para os valores mais superiores da escala. A pessoa, na experiência dos valores positivos é conclamada a aprofundar seus atos de amor, em sentido contrário, na prática dos atos de ódio, a pessoa é desestimulada pelo próprio fim dos valores negativos.
Os ensinamentos de Scheler se adequam com precisão ao pressuposto da preservação e cuidado com a vida humana retratada na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Esclarece como recém-mencionado, que as práticas de amor são estimuladas pelo próprio valor positivo que carregam, de tal ordem que quanto mais profundo for o ato praticado, mais estimulada estará a pessoa a continuar e avançar em sua prática, por outro lado, as ações de ódio, trazem consigo a carga negativa que conduzem para um fim. Quanto mais profundo for o valor, maior será o chamado individual para agir em prol do bem, o que não ocorre com a prática dos valores superficiais.
O que o filósofo muito bem esclarece é que ao agir eticamente, a pessoa se mostra parte do mundo que a envolve, bem como reconhece que é esse mundo que influencia o seu mundo interior, demonstrando a contribuição para o desenvolvimento dos mundos, de acordo com a suas obrigações voltadas para os atos com valores mais profundos. Não há como prescindir dessa abordagem ao se analisar a questão da dignidade da pessoa humana, tão retratada na Declaração Universal dos Direitos Humanos, notadamente quando se visa à prática ética de respeito aos seres humanos, na sua mais ampla concepção, mormente quanto a prática de atos positivos de respeito à assistência nos mais diversos graus, como condição para o engrandecimento de cada pessoa que o pratica, na medida em que contribui para o auxílio dos desfavorecidos. Essas ações positivas asseguram uma elevação da qualidade do mundo externo e consequentemente o mundo interno de cada pessoa, perfazendo em atos graduais com valores profundos, visto que acarreta a demonstração da necessidade de consciência no desenvolvimento do mundo. Scheler menciona como humanização[20], essa capacidade de cada pessoa em seu mundo interior, de se conduzir por valores profundos.
Resta cristalino que o ser não se desenvolve individualmente, cada pessoa se faz membro do todo, de tal modo que o desenvolvimento individual carrega em si valores compartilhados com os demais membros do grupo. A contribuição com o mundo externo, a partir de valores positivos ou negativos, servirá para a formação do próprio mundo interno. Assim o problema da comunidade é um problema pessoal, uma vez que esse mundo externo contribui constantemente para o infindável processo de formação do mundo interior, assim expresso pelo filósofo “Soy uma parte del mundo; estoy cercado por el mundo”[21]
Scheler descreve as participações das pessoas em diversos tipos de comunidade e acrescenta a experiência, independente da vontade das pessoas, de compartilhar atos positivos e negativos a partir de certo tipo de atração a que estão inclinados por fazerem parte do grupo. A pessoa, de um modo geral é o centro do ato, a sua unidade de execução, porém há também os atos sociais, que são aqueles dirigidos às outras pessoas, o que faz que o ato somente se complete com a participação do outro que o aceita. O que reforça a ideia já apresentada que a pessoa, possui em si não apenas o seu mundo, mas diferentes mundos externos, em constante desenvolvimento e interação.
Da concepção de pessoa coletiva, o filósofo descreve três tipos: o Estado, a cultura e a Igreja. A principal diferença entre eles está no alcance da responsabilidade. Assim no Estado todos os cidadãos são corresponsáveis por quaisquer outros cidadãos, na cultura, a responsabilidade está demarcada pelas fronteiras criadas por valores compartilhados pelos seus membros, e a Igreja possui maior responsabilidade não tendo fronteiras, fundada na solidariedade.
A solidariedade está intimamente intrincada com as disposições da Declaração Universal, essa interpretação traz muito significado para a sua compreensão, mormente quando Scheler esclarece que a solidariedade assume dois tipos distintos de responsabilidade, uma voltada para as próprias ações e a outra, chamada de corresponsabilidade, voltada para as ações dos outros. Essa corresponsabilidade não afeta a autonomia do indivíduo, e é ela que permite que a pessoa questione como os atos negativos sejam praticados pelos outros e como a própria participação nesse ato contribui para a formação do mundo. E um ponto de real destaque é que a solidariedade representa o compartilhamento da própria vida com a comunidade, o que a obriga a lutar contra o mal ali presente, pois existe a sua responsabilidade na participação desse ato, como bem assente:
“De este hecho y de la proposición, independiente de la experiência, de que todo amor genera um amor recíproco (em cuanto es experimentado de alguma manera) y por consiguiente es causa de que haga su aparición um nuevo bien moral – pues también el “amor recíproco” es em cuanto amor, portador del valor “moralmente bueno” – se infiere um principio que vamos a llamar el “princípio de la solidaridad de todos los entes morales”. Este principio disse que todos son corresponsables de lo que valen moralmente todos; que “todos salen por uno” y “uno por todos”.[22]
A comunidade é o contexto em que a pessoa é formada e realizada, participa desse mundo e contribui com ele em uma relação cíclica, a responsabilidade é partilhada entre seus membros para com a comunidade e para consigo mesmo consequentemente. Portanto Scheler reconhece que o núcleo da pessoa não está no seu corpo físico, mas em seu ato de doação, de amor ao outro, fundamento em que se tem a real percepção da pessoa. E essa concepção do filósofo acerca do valor a partir da compreensão do outro, ou seja, “é possível que outra pessoa possa me conhecer mais do que eu me conheço e ele ou ela possa ser capaz de dirigir-me a minha maneira de ser ideal”[23] traduz com precisão a concepção da Declaração Universal dos Direitos Humanos de respeito à dignidade humana a partir da solidariedade e da fraternidade.
Nesse sentido Scheler ressalta:
“O homem tem que aprender novamente a compreender a grande e invisível solidariedade de todos os seres vivos entre si na vida total, a solidariedade de todos os espíritos no espírito eterno e, ao mesmo tempo, a solidariedade do processo do mundo com o destino da evolução do seu fundamento supremo e a solidariedade deste fundamento com o processo do mundo. E o homem deve aceitar esta inter-relação do mundo não como uma simples teoria, mas compreendê-la de uma forma viva e praticá-la e exercitá-la externa e internamente”[24].
Concebida como um dos princípios que norteiam a Declaração, a solidariedade, entendida como assistência recíproca entre membros de um mesmo grupo[25], pode muito bem ser interpretada pela concepção scheleriana, na qual se considera como a base para um futuro mais justo e pacífico, um futuro onde as pessoas coletivamente e em solidariedade assumam a tarefa de transforma-lo para o bem de todos.
Considerações Finais
A Declaração Universal dos Direitos Humanos consagrou, através de um documento elaborado pela Assembleia Geral das Nações Unidas, o valor inestimável da dignidade da pessoa humana. Foi consignada a importância da pessoa para o avanço de toda a humanidade. Como tal, pressupõe que seja assegurado a todos o exercício de direitos, que se mostram o mínimo para que seja garantida a paz no mundo.
Essa concepção humanista evidenciada foi observada e retratada nos ensinamentos do filósofo Max Scheler, que viveu as agruras da Primeira Grande Guerra e demonstrou preocupação com as mudanças sociais decorridas. Fatores que de maneira primaz, influenciaram a humanidade e foram inspirados pelas pessoas em uma relação cíclica.
O pensamento de Scheler a respeito do ser humano destaca o seu caráter de fundamento para a prática dos atos, notadamente pela circunstância de ser o elemento central das interconexões entre os mundos internos e externos da pessoa, mormente quanto à análise da história. Esse entendimento sublime se coaduna com o princípio da dignidade humana, pressuposto da Declaração. A contextualização do homem é elemento preponderante para a sua real compreensão acima da totalidade da natureza.
A antropologia filosófica de Scheler procurou estudar a essência e estrutura do homem para obtenção de elementos seguros para um estudo profundo, chegando a afirmar que, através dos atos sociais a concepção do outro tem forte relação com a própria definição do homem. O que evidencia a questão da reciprocidade inerente ao desenvolvimento do homem, consequentemente da aceitação e respeito da Declaração que prima pelo respeito de todos.
Fator de destaque se faz presente na experiência de valor atribuída ao filósofo, constando como um significar intencional, em que o valor da pessoa se engrandece por um ato de amor ágape, que traz em si o sentido da solidariedade, como um sentimento de responsabilidade com as próprias ações e de corresponsabilidade atinente às ações dos outros, o que se faz elementar para a consecução do exercício dos direitos humanos.
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[1] BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. p. 20
[2] Idem, Ibidem, p. 42.
[3] SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 8. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 49.
[4] Nossa tradução: “As causas do ódio alemão”
[5] Nossa tradução: “A ideia da paz eterna e pacifismo”
[6] MATHEUS, Carlos. Max Scheler e a gênese axiológica do conhecimento. São Paulo: Margem, 2002. p. 13-27.
[7] Idem, Ibidem.
[8] LIMA, Alceu Amoroso. Os direitos do homem e o homem sem direitos. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1974. p.5.
[9] SCHELER, Max. Visão filosófica do mundo. Trad. Regina Winberg. São Paulo: Perspectiva, 1954. p. 37
[10] Idem, Ibidem, p. 30
[11] Idem, Ibidem, p. 73
[12] SCHELER, Max. La idea del hombre y la historia. Buenos Aires: Elaleph.com, 2000. p. 04.
[13] RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 28.
[14] SCHELER, Max, apud STEGMÜLLER, Wolfgang. A Filosofia Contemporânea. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012. p. 130.
[15] ARENDT, Hannah. Origens do Totalitarismo. Trad. Roberto Raposo. São Paulo: Companhia das Letras, 1989. p. 301.
[16] SCHELER. Op. cit., p. 25.
[17] Idem, Ibidem. p. 26.
[18] SCHELER, Max. Esencia y Formas de la Simpatía. 3.ed. trad. José Gaos. Buenos Aires: Losada, 1943. p. 208.
[19] Disponível em: <http://plato.stanford.edu/entries/scheler/> Acesso em: 30 mai 2015.
[20] SCHELER, Max. El Saber Y La Cultura. Buenos Aires: Elaleph.com, 1999. p. 45
[21] SCHELER, Max. El puesto del hombre en el cosmos. Buenos Aires: Losada, 2004. p. 44.
[22] SCHELER, Max. Esencia y Formas de la Simpatía. 3.ed. trad. José Gaos. Buenos Aires: Losada, 1943. p. 210.
[23] Disponível em: <http://plato.stanford.edu/entries/scheler/> Acesso em: 30 mai 2015.
[24] SCHELER. op. cit., p. 122.
[25] ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. Trad. Alfredo Bosi. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 934.
Mestrando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Possui Especialização em Segurança Pública pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (2008). Bacharelado em Direito pela Universidade de Guarulhos (2003). Bacharelado em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública pela Academia de Polícia Militar do Barro Branco (2000). Capitão da Polícia Militar do Estado de São Paulo, exerce as funções como Analista do Setor de Processos Judiciais do Centro Integrado de Apoio Financeiro da Polícia Militar do Estado de São Paulo. Professor de Polícia Judiciária Militar e de Direito Administrativo Disciplinar da Escola Superior de Sargentos da Polícia Militar do Estado de São Paulo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Wellyngton Marcos de Ataide da. A dignidade humana retratada na Declaração Universal dos Direitos Humanos através da observação de Max Scheler Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 set 2015, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/45193/a-dignidade-humana-retratada-na-declaracao-universal-dos-direitos-humanos-atraves-da-observacao-de-max-scheler. Acesso em: 23 dez 2024.
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