Resumo: O imposto sobre serviços de qualquer natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, incide sobre os serviços constantes da lista anexa da Lei Complementar nº 116/03, independente de serem prestados em conjunto com atividade não tributada. Dessa forma, o STF pacificou o tema, no enunciado de súmula vinculante nº 31, que proíbe a incidência do ISS sobre a locação de bens móveis. Esta conclusão baseia-se na ideia do conceito de serviço traçado pela Constituição da República. Depreende-se que a Lei Complementar Federal que traça os serviços passíveis de submissão a exação tributária pertencem ao grupo do conceito de serviço delineado na Lei Maior.
Palavras-chaves: Processo Administrativo Tributário. Jurisdição única. Princípio da Verdade Material.
Sumário: 1. Introdução. 2. Conceito Constitucional de Serviço. 4. Conclusão. 5. Referências.
1. INTRODUÇÃO
No intuito de evitar a guerra fiscal entre os entes federados municipais, a atual Constituição da República estabelece critérios uniformes para a instituição e cobrança dos impostos de competência constitucional dos municípios. Os dispositivos constitucionais são regulamentados por lei complementar, no caso do ISS, pela Lei Complementar nº 56/87, anexa ao Decreto Lei 406/68, e pela Lei Complementar nº 116/03.
2. CONCEITO CONSTITUCIONAL DE SERVIÇO.
De início, resumidamente, a jurisprudência do STF veda a incidência do Imposto sobre Serviços quanto à locação de bens móveis, pois o direito tributário não poderia alterar conceitos jurídicos de direito privado, como a definição de serviços. A expressão constava da Lei Complementar nº 56/87, anexa ao Decreto Lei 406/68, no item 79, declarada inconstitucional pelo Supremo, nos termos do RE nº 116.121, verbis:
TRIBUTO - FIGURINO CONSTITUCIONAL. A supremacia da Carta Federal é conducente a glosar-se a cobrança de tributo discrepante daqueles nela previstos. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS - CONTRATO DE LOCAÇÃO. A terminologia constitucional do Imposto sobre Serviços revela o objeto da tributação. Conflita com a Lei Maior dispositivo que imponha o tributo considerado contrato de locação de bem móvel. Em Direito, os institutos, as expressões e os vocábulos têm sentido próprio, descabendo confundir a locação de serviços com a de móveis, práticas diversas regidas pelo Código Civil, cujas definições são de observância inafastável - artigo 110 do Código Tributário Nacional. (STF - RE 116.121, Relator(a): Min. OCTAVIO GALLOTTI, Relator(a) p/ Acórdão: Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 11/10/2000 – grifos acrescidos)
Entendimento consolidado na Súmula Vinculante nº 31, verbis:
Súmula Vinculante 31
É inconstitucional a incidência do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza
- ISS sobre operações de locação de bens móveis.
Nessa toada, o art. 110, do CTN, ao estabelecer que a lei tributária não alterará os conceitos oriundos do direito privado para definir institutos e conceitos utilizados para definir ou limitar competências tributárias. Assim, o conceito de ‘serviço’, deverá ser aquele advindo do direito privado, conforme decidiu o Supremo:
"(...) 1. A não incidência do ISS sobre a locação de bens móveis decorre da impossibilidade do poder de tributar vir a modificar o conceito constitucional de serviço que provém do direito privado. Tal conclusão afasta a competência do sujeito ativo com relação a qualquer dos diplomas que tenham disciplinado as normas gerais sobre o imposto. Não é por outro motivo que o item da atual lista de serviços que previa a possibilidade de fazer o tributo incidir sobre a atividade em questão foi objeto de veto presidencial." (RE 602295 AgR, Relator Ministro Roberto Barroso, Primeira Turma, julgamento em 7.4.2015, DJe de 23.4.2015).
Não obstante, o anexo da LC 116/03, bem como a LC 56/87, anexa ao Decreto Lei 406/68, devem ser interpretados de forma restritiva, sendo a atuação legislativa dos Municípios vinculada ao rol previsto na norma federal. Ainda, do conceito de serviço, vindo das disposições de direito privado, tem-se que o serviço demanda uma obrigação de fazer, não se confundindo com uma obrigação de dar, conforme seria o aluguel de bem móvel. Didático, neste sentido, o entendimento do STF:
Ementa: TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA. LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS ASSOCIADA A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LOCAÇÃO DE GUINDASTE E APRESENTAÇÃO DO RESPECTIVO OPERADOR. INCIDÊNCIA DO ISS SOBRE A PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. NÃO INCIDÊNCIA SOBRE A LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS. SÚMULA VINCULANTE 31. AGRAVO REGIMENTAL. 1. A Súmula Vinculante 31 não exonera a prestação de serviços concomitante à locação de bens móveis do pagamento do ISS. 2. Se houver ao mesmo tempo locação de bem móvel e prestação de serviços, o ISS incide sobre o segundo fato, sem atingir o primeiro. 3. O que a agravante poderia ter discutido, mas não o fez, é a necessidade de adequação da base de cálculo do tributo para refletir o vulto econômico da prestação de serviço, sem a inclusão dos valores relacionados à locação. Agravo regimental ao qual se nega provimento.(STF - ARE 656709 AgR, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 14/02/2012 – grifamos)
O item 3.01 da lista de serviços da LC 116/03, aprovada no Congresso Nacional, que dispunha sobre a locação de bens móveis foi vetado pelo Presidente da República, com as seguintes razões:
O STF concluiu julgamento de recurso extraordinário interposto por empresa de locação de guindastes, em que se discutia a constitucionalidade da cobrança do ISS sobre a locação de bens móveis, decidindo que a expressão "locação de bens móveis" constante do item 79 da lista de serviços a que se refere o Decreto-Lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968, com a redação da Lei Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 1987, é inconstitucional (noticiado no Informativo do STF no 207). O Recurso Extraordinário 116.121/SP, votado unanimemente pelo Tribunal Pleno, em 11 de outubro de 2000, contém linha interpretativa no mesmo sentido, pois a "terminologia constitucional do imposto sobre serviços revela o objeto da tributação. Conflita com a Lei Maior dispositivo que imponha o tributo a contrato de locação de bem móvel. Em direito, os institutos, as expressões e os vocábulos têm sentido próprios, descabendo confundir a locação de serviços com a de móveis, práticas diversas regidas pelo Código Civil, cujas definições são de observância inafastável." Em assim sendo, o item 3.01 da Lista de serviços anexa ao projeto de lei complementar ora analisado, fica prejudicado, pois veicula indevida (porque inconstitucional) incidência do imposto sob locação de bens móveis[1].
Nesse sentido, somente será tributada pelo ISS a atividade entendida como serviço, obrigação de fazer, na forma constitucionalmente estabelecida. Assim, a empresa não poderá ser compelida a pagar o Imposto sobre Serviços se não houver prestado serviço, já que o aluguel de mídias móveis é mera obrigação de dar. Para se resguardar de possível lançamento e imposição de pagamento por parte do ente tributante municipal caberá ao sujeito passivo da relação tributária resguardar-se por mandado de segurança preventivo ou ação declaratória de inexistência de relação jurídico-tributária.
Enfim, no writ pretende-se assegurar o direito líquido e certo do impetrante de não ser compelido a pagar uma exação tributária por fato gerador inexistente. Quanto à ação declaratória de inexistência da relação jurídica tributária o objetivo é o mesmo, impedir que a exação tributária recaia sobre quem não é sujeito passivo, entretanto, neste procedimento caberá à produção de provas na fase instrutória do processo.
3. CONCLUSÃO
Em suma, não haverá incidência do ISS sobre a locação das mídias móveis, tendo em vista a interpretação restritiva da lista de serviços do anexo da lei complementar nº 116/03, sendo de observância obrigatória pelos municípios. Com esse viés, não incidirá o ISS sobre um fato que não seja a prestação de serviços, tendo por meta a taxatividade das hipóteses de incidência, ordenadas pela Constituição de 1988 e regulamentadas por Lei Complementar. Por fim, para evitar o lançamento e a cobrança indevida do Imposto sobre Serviços quanto à locação de bens móveis, caberá ao sujeito passivo o manejo de uma ação declaratória ou mandado de segurança preventivo.
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1) BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 116.121, Tribunal Pleno. Brasília, 11 de outubro de 2000. Disponível em:
http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=206139. Acesso em: 27/06/2015.
2) BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 602295 AgR, Primeira Turma. Brasília, 7 de abril de 2015. Disponível em:
http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=8273399. Acesso em: 27/06/2015.
3) BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ARE 656709, Segunda Turma. Brasília, 14 de fevereiro de 2012. Disponível em:
http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=1801906. Acesso em: 27/06/2015.
4) BRASIL. Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003. Acesso em: 29/06/2015. Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/leicom/2003/leicomplementar-116-31-julho-2003-492028-veto-13883-pl.html.
[1] BRASIL. Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003. Acesso em: 29/06/2015. Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/leicom/2003/leicomplementar-116-31-julho-2003-492028-veto-13883-pl.html
Procurador da Fazenda Nacional. Pós-graduado em Direito Tributário e em Direito Processual Civil. Bacharel em direito pela Universidade Católica de Pernambuco.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VICENTE FéRRER DE ALBUQUERQUE JúNIOR, . Não incidência do ISS sobre a locação de bens móveis, observância do conceito constitucional de serviço Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 set 2015, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/45200/nao-incidencia-do-iss-sobre-a-locacao-de-bens-moveis-observancia-do-conceito-constitucional-de-servico. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
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