RESUMO: Possibilidade de dispensa de licitação para contratação de fundação de apoio na Administração Pública Federal
Palavras chave: Dispensa de licitação. Fundação de Apoio.
Introdução
A contratação direta pela Administração Pública, isto é, sem procedimento licitatório prévio, é exceção ao dever geral previsto na Constituição da República (art. 37, XXI), somente sendo possível nas hipóteses previstas em Lei federal – competência privativa da União (CRFB, art. 22, XXVII).
Na lição de Marçal Justen Filho, isso significa que “a Constituição acolheu a presunção (absoluta) de que prévia licitação produz a melhor contratação – entendida como aquela que assegura a maior vantagem possível à Administração Pública, com observância do princípio da isonomia”. Mas a própria Constituição se encarregou de limitar tal presunção absoluta, facultando contratação direta nos casos previstos por lei.
Assim, os casos de dispensa de licitação estão delineados, de forma taxativa, nos incisos do art. 24 da Lei n. 8.666/1993, expressando situações em que se facultou à Administração Pública realizar, ou não, procedimento licitatório, a mercê de seu poder discricionário de conveniência, oportunidade e, sobretudo, interesse público.
No tocante à contratação, pela Administração Pública de forma geral, das fundações de apoio, destaca-se a legislação pertinente, a qual prevê, no inciso XIII do artigo 24 da Lei nº 8.666/93, hipótese de dispensa de licitação “na contratação de instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, ou de instituição dedicada à recuperação social do preso, desde que a contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins lucrativos;
Por sua vez, tendo como base jurídica a legislação acima citada, a “Lei das Fundações de Apoio”, Lei nº 8.958/94, estabelece, de forma mais específica, no artigo 1º, a contratação de Fundações de Apoio por ICTs e IFES: “As Instituições Federais de Ensino Superior - IFES e as demais Instituições Científicas e Tecnológicas - ICTs, de que trata a Lei nº 10.973, de 2 de dezembro de 2004, poderão celebrar convênios e contratos, nos termos do inciso XIII do caput do art. 24 da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, por prazo determinado, com fundações instituídas com a finalidade de apoiar projetos de ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico e tecnológico e estímulo à inovação, inclusive na gestão administrativa e financeira necessária à execução desses projetos. (Redação dada pela Lei nº 12.863, de 2013)”
Dos requisitos para a contratação de Fundação De Apoio
Com efeito, por simples análise do dispositivo acima transcrito, existem diversos requisitos para a contratação direta vindicada nesse procedimento, tanto referente à instituição que será contratada (requisitos subjetivos), como ao contrato que se pretende firmar (requisitos objetivos).
No que diz respeito à formação de tais entidades, estas devem ser constituídas na forma de fundações de direito privado, sem fins lucrativos e serão regidas pelo Código Civil Brasileiro. As Fundações de Apoio não são criadas por lei nem mantidas pela União. Sujeitam-se, portanto, à fiscalização do Ministério Público, nos termos do Código Civil e do Código de Processo Civil, à legislação trabalhista e, em especial, ao prévio registro e credenciamento nos Ministérios da Educação e do Ministério da Ciência e Tecnologia, renovável bienalmente.
O prévio credenciamento junto aos Ministérios da Educação e da Ciência, Tecnologia e Inovação é requerido em razão da relação entre as Instituições Federais de Ensino Superior – IFES, as Instituições Científicas e Tecnológicas – ICTs e as Fundações que tem a finalidade de apoiar o desenvolvimento de projetos de ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico e tecnológico.
Pertinente destacar que o Decreto nº 7.544/2011 incluiu o § 2º ao art. 4º do Decreto nº 7.423/2010, prevendo que “a fundação de apoio registrada e credenciada poderá apoiar IFES e demais ICTs distintas da que está vinculada, desde que compatíveis com as finalidades da instituição a que se vincula, mediante prévia autorização do grupo a que se refere o § 1º do art. 3º”.
Ainda no que se refere aos requisitos subjetivos, há que verificar se a Fundação atende aos requisitos do art. 1° da lei 8.958/94 e do art. 24, XIII da Lei 8.666/93, quais sejam: a) ser brasileira; b) ser incumbida regimental ou estatuariamente da pesquisa, ensino ou do desenvolvimento institucional; c) possuir inquestionável reputação ético-profissional; e d) não ter fins lucrativos.
Em relação à “inquestionável reputação ético-profissional”, por ser um conteúdo indeterminado, cabe citar a doutrina do Professor Marçal Justen Filho, que lembra:
A exigência de “inquestionável reputação ético-profissional” tem de ser enfocada com cautela. Deve ser indiscutível a capacitação para o desempenho da atividade objetivada. Exigem-se as virtudes éticas relacionadas direta e necessariamente com o perfeito cumprimento do contrato. Disputas ou questionamentos sobre outros temas são secundários e não se admite um policiamento ideológico ou político sobre o contratado. Não é possível impugnar a contratação pelo simples fundamento da discordância com a ideologia adotada pelos sujeitos envolvidos na instituição.
No tocante ao contrato a ser firmado com a Fundação de Apoio, nos termos da legislação federal, estes deverão ter prazo determinado e podem ter por objeto a gestão administrativa e financeira estritamente necessária à execução de projetos de ensino, pesquisa e extensão e de desenvolvimento institucional, científico e tecnológico.
Abordados os requisitos objetivos e subjetivos, é importante ressaltar o mandamento descrito na Súmula 250 do Tribunal de Contas da União, determinando regras específicas à contratação de entes sem fins lucrativos, na forma do art. 24, XIII da Lei 8.6666/93:
“A contratação de instituição sem fins lucrativos, com dispensa de licitação, com fulcro no art. 24, inciso XIII, da Lei nº 8.666/93, somente é admitida nas hipóteses em que houver nexo efetivo entre o mencionado dispositivo, a natureza da instituição e o objeto contratado, além de comprovada a compatibilidade com os preços de mercado.”
Em outras palavras, há que se demonstrar a correlação entre objeto do contrato e a incumbência estatutária da entidade contratada, o que se verifica no procedimento em tela.
A referida súmula da Corte Federal de Contas trata da obrigatoriedade de comprovar a compatibilidade com os preços de mercado, o que leva aos mais diferentes métodos, tais como juntada de propostas de outras instituições e verificação do preço praticado pela pretensa contratada junto a outros órgãos/entidades públicos.
Em relação aos custos operacionais devidos à Fundação de Apoio, estes também devem ser comprovados com base nos preços de mercado, não sendo bastante a fixação de percentual do valor total da contratação, conforme disposto na jurisprudência consolidada do TCU:
O Tribunal tem deliberado pela impossibilidade do estabelecimento de remuneração de fundação de apoio fundada em taxa de administração, comissão, participação ou outra espécie de recompensa variável, que não traduza preço certo fundamentado nos custos operacionais dos serviços prestados (Acórdãos nº 716/2006 - P, 1233/2006 – P- 2295/2006 - P - Relação 152/2006 GAB VC,6/2007 - P, 50/2007 - P, 503/2007 - P, 2193/2007 - P, 1525/2007 - 2ª C, 2448/2007 - 2ª C, 2645/2007 - P, 160/2008 - 2ª C,401/2008 - P, 599/2008 - P, 792/2008 - 2ª C, 1973/2008 - 1ª C, 2038/2008 - P e 253/2007 - P - Relação 9/2007 GAB GP)]
Quanto à utilização dos recursos a esse aspecto, importante ressaltar que recentemente a Lei 8.958/94 sofreu alteração por meio da Lei 12.863/2013, trazendo ao mundo jurídico várias novidades na execução e fiscalização dessa espécie de contratação.
Art. 3º. Na execução de convênios, contratos, acordos e demais ajustes abrangidos por esta Lei, inclusive daqueles que envolvam recursos provenientes do poder público, as fundações de apoio adotarão regulamento específico de aquisições e contratações de obras e serviços, a ser editado por meio de ato do Poder Executivo federal.
O dispositivo prevê a adoção, pelas fundações de apoio, de regulamento específico - que editado pelo poder executivo federal - para as aquisições e contratações de obras e serviços, ou seja, afasta a aplicação da lei 8.666/93 e correlatas.
Nesse passo, em 21 de maio de 2014, foi publicado o Decreto nº 8.241, regulamentando o dito art. 3º da Lei nº 8.958/1994, dispondo sobre as regras para aquisição de bens e contratação de obras e serviços pelas fundações de apoio, conforme se observa na redação do art. 1º, in verbis:
Art. 1º Este Decreto regulamenta o art. 3o da Lei no 8.958, de 20 de dezembro de 1994, para dispor sobre a aquisição de bens e a contratação de obras e serviços pelas fundações de apoio no âmbito de projetos de ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico e tecnológico e estímulo à inovação, inclusive na gestão administrativa e financeira necessária à execução desses projetos, em apoio às Instituições Federais de Ensino Superior - IFES e demais Instituições científicas e Tecnológicas - ICT.
§ 1º O disposto neste Decreto aplica-se às contratações cujos recursos sejam ou não provenientes do Poder Público, desde que tenham por objeto o apoio às IFES e às demais ICT nos projetos referidos no caput.
§ 2º Os procedimentos regidos por este Decreto atenderão aos princípios da impessoalidade, da moralidade, da probidade, da publicidade, da transparência, da eficiência, da competitividade, da busca permanente de qualidade e durabilidade, e da vinculação ao instrumento convocatório.
§ 3º Não se submetem a este Decreto as aquisições referentes às despesas administrativas desvinculadas da execução do projeto.
Não obstante as recomendações acima ressaltadas relativas aos comandos legais que regulam a contratação direta de fundação de apoio, a Corte de Contas, por meio do paradigmático Acórdão nº 2.731/2008 – Plenário, expediu diversas recomendações que merecem todo o zelo, e estrita observância:
1) Que os projetos desenvolvidos não se perpetuem, isto é, não permitam a existência de projetos sequenciais no tempo, sem a necessária justificativa técnica ou acadêmica (Acórdão 2.731/2008)];
2) Que não sejam emitidos empenhos sob a alegação de inviabilidade de execução orçamentária temporal, isto é, não emitam empenhos em nome da própria IFES ou em nome de fundações de apoio sob a alegação de inviabilidade de execução orçamentária temporal, em especial em proximidade de final de exercício; (Acórdão 2.731/2008)]
3) Que seja respeitado o princípio da impessoalidade, isto é, não permitam que as ações a serem realizadas pelas fundações de apoio possam ser conduzidas ou tenham como participantes parentes de dirigentes e/ou servidores das IFES ou de dirigentes das fundações de apoio, em respeito às orientações éticas para impedimentos de nepotismo na Administração Pública; (Acórdão 2.731/2008)]
4) Possibilidade excepcional de repasse antecipado, isto é, vedação à liquidação antecipada de despesa ou repasse integral de recursos para a fundação de apoio. O Tribunal admite o repasse antecipado de recursos quando justificar-se a formalização de convênios (Acórdãos nº 2295/2006 - P – Relação 152/2006 GAB VC) vedando, contudo, a prática para os casos de contratos por caracterizar liquidação antecipada da despesa (Acórdãos nº 2259/2007 - P – Relação 41/2007 GAB GP)
5) Vedação à contratação indireta de pessoal, isto é, o TCU tem deliberado pela ilegalidade da contratação indireta de pessoal por fundação de apoio interposta para a execução de atividades inerentes ao seu plano de cargos e salários, por constituir burla ao instituto do concurso público (Acórdãos nº 3548/2006 - 1ª C, 6/2007 - P, 218/2007 - 2ª C, 370/2007 - 2ª C, 2448/2007 - 2ª C, 599/2008 - P, 1378/2008 - 1ª C, 302/2006 - P, 706/2007 - P e 1508/2008 - P). A evolução mais recente da jurisprudência é no sentido de que as IFES evitem novas contratações, por intermédio de fundações de apoio, para o exercício de atividades inerentes ao seu plano de cargos e salários, promovendo, na forma do cronograma homologado pelo Acórdão nº 1520/2006 - P, a gradual substituição dos contratados por servidores públicos concursados (Acórdãos nº 3472/2006 - 1ª C e 2645/2007 - P)];
6) Necessidade de demonstrar a correlação entre o objeto do contrato e a incumbência estatutária da entidade contratada, isto é, a contratação de instituição sem fins lucrativos, com dispensa de licitação, com fulcro no art. 24, inciso XIII, da Lei nº 8.666/93, somente é admitida nas hipóteses em que houver nexo efetivo entre o mencionado dispositivo, a natureza da instituição e o objeto contratado, além de comprovada a compatibilidade com os preços de mercado” – Enunciado 250 da Súmula do TCU].
Considerações Finais
Sendo assim, percebe-se que o inciso XIII do artigo 24 da Lei nº 8.666/93, combinado com o artigo 1º da Lei das Fundações de Apoio, Lei nº 8.958/94, bem como o Decreto nº 7.423/2010, permitem a contratação, por dispensa de licitação, de Fundação de Apoio por Instituições Federais de Ensino Superior - IFES e as demais Instituições Científicas e Tecnológicas – ICTs, desde que atendidos os requisitos legais.
REFERÊNCIA
JUSTEN Filho, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 16. ed. São Paulo: Dialética, 2014
Advogado da União - AGU desde DEZ/2010, formado em Direito, em 2007, na Universidade Federal de Pernambuco - UFPE.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LINS, Viktor Sá Leitão de Meira. Contratação de Fundação de Apoio na Administração Pública Federal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 dez 2015, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/45728/contratacao-de-fundacao-de-apoio-na-administracao-publica-federal. Acesso em: 23 dez 2024.
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