Resumo: O presente trabalho visa a análise e o estudo de uma importante ação existente no nosso ordenamento jurídico pátrio em vigor, qual seja, a ação do Mandado de Segurança. Portanto, serão observados a sua previsão constitucional e legal, os requisitos para o seu ajuizamento e as teorias que são hodiernamente sustentadas pela doutrina e pela jurisprudência brasileira para a possibilidade da sua desistência pelo impetrante após a prolação de sentença de mérito. Serão também demonstrados os seus aspectos processuais, com a sua finalidade e objetivos, além do atual entendimento jurisprudencial sobre o tema.
Palavras-chave: Mandado de Segurança – Possibilidade de Desistência – Impetrante – Entendimento Jurisprudencial Pátrio.
Abstract: This study concerns the analysis and the study of an important existing share in our Brazilian legal order in force, namely, the Writ of Mandamus action. Therefore, will be observed its constitutional and legal provisions, the requirements for your filing and theories that are supported by the doctrine in our times and the Brazilian law for the possibility of their withdrawal by the petitioner after the delivery of merit award. They will be also demonstrated its procedural aspects, with its purpose and objectives, beyond the current jurisprudential understanding of the subject.
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO 2. PREVISÃO CONSTITUCIONAL E LEGAL 3. REQUISITOS PARA A IMPETRAÇÃO DO WRIT 4. DESISTÊNCIA DO MANDADO DE SEGURANÇA 5. ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL 6. CONCLUSÃO 7. REFERÊNCIAS.
1. INTRODUÇÃO
Inicialmente, cumpre-se destacar a significativa importância da ação de mandado de segurança no nosso ordenamento jurídico pátrio, já que tem previsão constitucional expressa desde a Constituição de 1934, quando apareceu pela primeira vez, estando ausente apenas na Constituição de 1937.
Na atual Constituição Federal de 1988, a ação constitucional ganhou uma significativa ampliação do seu objeto, quando previu expressamente a possibilidade da sua impetração para tutelar tanto direitos individuais, quanto direitos coletivos.
Por conseguinte, a ação mandamental tem um rito mais célere e visa tutelar direitos líquido e certo, sendo, geralmente, casos que requeiram um maior tipo de urgência, desde que o direito dito por violado esteja devidamente comprovado pelo impetrante, de forma imediata e documentalmente, a fim de possibilitar um provimento jurisdicional também mais rápido.
Neste contexto, a partir da violação de um direito líquido e certo, por uma autoridade pública ou por uma pessoa jurídica de direito privado no exercício de atribuições do poder público, é que nasce para o impetrante (de forma individual) ou para os impetrantes (de forma coletiva) a possibilidade de se usar este remédio constitucional tão importante chamado de Mandado de Segurança.
No entanto, diz-se que o mandado de segurança, também conhecido doutrinariamente como “writ”, é uma ação que deve ser proposta de forma residual, isto porque a constituição federal é expressa em mencionar que a sua impetração somente será cabível nos casos em que não sejam cabíveis as hipóteses de habeas corpus ou de habeas data.
Regulamentado através de lei federal específica, o rito da ação do mandado de segurança é próprio e não se subsume inteiramente aos regramentos Código de Processo Civil, que só deve ser aplicado de forma subsidiária.
Por fim, há de ser ressaltado que o objeto a ser tutelado através do mandado de segurança pode ser repressivo ou preventivo, ou seja, a ação pode ser intentada em face de um ato praticado que violou direito líquido e certo do impetrante, assim como pode ser ajuizada em face de uma ameaça de lesão que possa ser causada ao interessado, demonstrando, nesta última hipótese, o seu caráter preventivo.
2. PREVISÃO CONSTITUCIONAL E LEGAL
O mandado de segurança tem previsão expressa na nossa atual Constituição Federal de 1988 dentro do título que trata dos direitos e garantias fundamentais. Por estarem neste título direitos de extrema importância no nosso ordenamento jurídico, parte da doutrina os classificam como cláusulas pétreas, no entanto, o entendimento que predomina é de que nem todos os direitos e garantias fundamentais previstos expressamente na Constituição Federal são cláusulas pétreas, podendo haver a supressão de alguns deles.
E é nesse contexto que encontramos o mandado de segurança individual e coletivo, cujas previsões estão no artigo 5º, LXIX e LXX, respectivamente:
“LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público;
LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:
a) partido político com representação no Congresso Nacional;
b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados” (grifos não constam do original)
Portanto, apesar da ação de mandado de segurança não ostentar um caráter de cláusula pétrea, é válido ressaltar que a sua supressão do nosso ordenamento jurídico pátrio seria considerado um grande retrocesso constitucional, tendo em vista que se trata de uma importante ação que visa coibir a atuação ilegal, essencialmente do poder público, de modo a proteger os direitos de pessoas físicas e jurídicas perante a sociedade.
Regulamentando o texto constitucional, primeiramente foi editada a lei 1.533/1951, que alterou os dispositivos do Código de Processo Civil relativas ao mandado de segurança. Posteriormente, foi editada a lei 12.016/2009, revogando na íntegra a lei anterior, de modo a disciplinar o mandado de segurança individual e coletivo.
Resumindo o objeto desta ação mandamental, o seu artigo 1º dispõe acerca do mandado de segurança da seguinte forma:
“Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça”.
Assim, vê-se que o mandado de segurança é uma ação que visa tutelar um objeto em situações específicas e previstas legalmente, quais sejam, um (i) direito líquido e certo, (ii) não amparado por habeas corpus ou habeas data, (iii) quando ilegalmente ou com abuso de poder, (iv) qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade. Basicamente, são esses os requisitos para que uma pessoa física ou jurídica possa impetrar um mandado de segurança, conforme serão melhor pontuados a seguir.
3. REQUISITOS PARA A IMPETRAÇÃO DO WRIT
Neste tópico, veremos os requisitos um a um suficientes para o ajuizamento da referida ação mandamental.
O primeiro requisito é o direito líquido e certo. A doutrina o classifica como sendo aquele direito que pode ser comprovado de pronto, de imediato pelo impetrante interessado, ou seja, aquele que pode ser demonstrado de forma documental no exato momento em que se ajuíza a ação. Assim é que pacífico o entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido de que não há dilação probatória dentro do rito processual do mandado de segurança.
O artigo 6º da lei citada reforça esse entendimento, vejamos o dispositivo em sua literalidade:
“A petição inicial, que deverá preencher os requisitos estabelecidos pela lei processual, será apresentada em 2 (duas) vias com os documentos que instruírem a primeira reproduzidos na segunda e indicará, além da autoridade coatora, a pessoa jurídica que esta integra, à qual se acha vinculada ou da qual exerce atribuições”.
Ora, conclui-se que o direito dito por violado deve estar cabalmente demonstrado e instruindo a petição inicial no momento da sua propositura, sob pena de ser extinta a ação sem julgamento do mérito. Se, porventura, o direito violado demandar instrução probatória mais complexa e aprofundada, o interessado terá que se valer do rito ordinário previsto no CPC, podendo produzir todas as provas em direito admitidas, se por outro lado o impetrante for se valer de novas provas documentais obtidas após a extinção da ação sem resolução do mérito e ainda tiver dentro do prazo decadencial permissivo do mandado de segurança, poderá intentar novamente a ação mandamental, demonstrando de forma cabal a violação do seu direito.
A única hipótese em que se admite que o impetrante ofereça o “writ” sem que esteja presente a documentação essencial para demonstrar a violação do seu direito, é quando o mesmo esteja em repartição ou estabelecimento público ou em poder de autoridade que se recuse a fornecê-lo, conforme estabelece o §1º do artigo 6º, senão vejamos:
“§ 1o No caso em que o documento necessário à prova do alegado se ache em repartição ou estabelecimento público ou em poder de autoridade que se recuse a fornecê-lo por certidão ou de terceiro, o juiz ordenará, preliminarmente, por ofício, a exibição desse documento em original ou em cópia autêntica e marcará, para o cumprimento da ordem, o prazo de 10 (dez) dias. O escrivão extrairá cópias do documento para juntá-las à segunda via da petição”.
Neste diapasão, exceto no caso acima mencionado, caso o autor intente um mandado de segurança sem que esteja instruído sem o documento essencial para demonstrar, de forma inequívoca, a violação do seu direito, não poderá ser amparado por este rito específico por inadequação da via eleita, podendo, repita-se, buscar a tutela jurisdicional através do rito ordinário ou intentar novo MS, mas neste último caso desde que dentro do prazo decadencial legal de 120 dias e com as novas provas que possam amparar o seu pleito.
O segundo requisito está no caráter residual do mandado de segurança. Assim, caso o direito a ser amparado possa ser tutelado através do habeas corpus ou através do habeas data, não caberá o ajuizamento do “writ”, devendo o interessado propor uma daquelas ações constitucionais, a depender do caso concreto. Segundo disposto na Carta Magna caberá habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder e caberá habeas data para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público ou para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo.
Portanto, não sendo hipóteses de habeas corpus ou habeas data, poderá o interessado se valer do mandado de segurança para afastar do mundo jurídico o ato que violou o seu direito.
Outro requisito para o cabimento do MS é ter sido praticado um ato que esteja eivado de ilegalidade ou abuso de poder. Segundo a doutrina de Guilherme Freire de Melo Barros “o certo é que qualquer ato administrativo, discricionário ou vinculado, que não obedeça à Constituição ou à legislação infraconstitucional, pode ser objeto de verificação pelo mandado de segurança”. Já o abuso de poder, que sem dúvida também se caracteriza como uma ilegalidade, podemos dizer que estará configurado quando o ato da autoridade praticante do ato o fizer com desvio de finalidade (ocorre quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto na regra de competência) ou com excesso de poder (quando o agente público atua além de sua competência legal).
Por fim, o mandado de segurança visa proteger pessoas físicas e jurídicas de atos ilegais praticados por autoridade pública ou por agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do poder público. Ou seja, vê-se que esta ação tem especial cabimento nas hipóteses em que a prática do ato ilegal esteja diante do exercício de uma função pública, não sendo possível que seja ajuizada em face de ato praticado por particular, exceto quando este esteja no exercício de atribuições do poder público, conforme ressalva expressamente o próprio texto constitucional.
4. DESISTÊNCIA DO MANDADO DE SEGURANÇA
Como regra geral no nosso ordenamento jurídico, temos a previsão do Código de Processo Civil dentro do artigo 267 no sentido de que o autor, após decorrido o prazo de defesa, não poderá desistir da ação sem que haja o consentimento do réu. Vê-se, portanto, que não se trata de um direito da parte autora interessada em desistir da ação em qualquer fase processual.
Isto porque doutrina e jurisprudência entendem, de forma pacífica, de que é um direito também do réu em ver a resolução da lide, com o julgamento do mérito da causa. O próprio CPC expressou esse entendimento, quando determinou a prévia oitiva do réu quando o autor pretender desistir da ação após o exercício do contraditório. Portanto, o réu também tem o direito de ter formado em seu favor a coisa julgada material, caso obtenha sucesso ao final da ação.
Segundo entendimento do Professor Márcio Mauro Dias Lopes, “porque o réu que apresentou contestação, assim como o autor, também tem direito a uma sentença de mérito. Na contestação, o réu formula pedido(s) e, portanto, tem o direito de ver esse(s) pedido(s) apreciado(s) pelo juízo”.
No entanto, frise-se, que mesmo o réu não tendo concordado com o pedido de desistência formulado pelo autor da ação, terá o dever de apresentar uma justificativa ao juízo motivando a sua discordância, sob pena de restar configurado abuso de direito, conduta que não é admitida no nosso ordenamento jurídico, entendimento este que é pacífico no âmbito do STJ:
“Segundo a dicção do art. 267, § 4º, do CPC, após o oferecimento da resposta, é defeso ao autor desistir da ação sem o consentimento do réu. Essa regra impositiva decorre da bilateralidade formada no processo, assistindo igualmente ao réu o direito de solucionar o conflito. Entretanto, a discordância da parte ré quanto à desistência postulada deverá ser fundamentada, visto que a mera oposição sem qualquer justificativa plausível importa inaceitável abuso de direito” (STJ - RECURSO ESPECIAL REsp 1267995 PB 2011/0173074-4 (STJ)). (destaques não constam do original)
Essa é a regra geral prevista no Código de Processo Civil, porém, conforme dito anteriormente, o rito do mandado de segurança tem características específicas e que não necessariamente se aplicam as regras do códex processual. A principal característica do MS está no direito do interessado em ajuizar a ação em face de um ato praticado por uma autoridade pública eivado de ilegalidade, assim, não há pretensão resistida entre dois sujeitos processuais, mas sim de uma ação que visa anular um ato público viciado, que prejudicou direitos alheios.
Neste contexto, não há que se falar em concordância da parte contrária quando o impetrante pretender desistir do mandado de segurança e, assim, poderá fazê-lo a qualquer fase ou momento do procedimento. Por isso, entende-se que, mesmo após a prolação de uma sentença de mérito, mesmo que seja de procedência da ação, poderá o impetrante interessado desistir do “writ”.
O entendimento que não era pacificado e que encontrava divergências doutrinárias e jurisprudenciais ganhou um ar de pacificidade após o entendimento proferido pelo plenário do Supremo Tribunal Federal a respeito do tema, conforme veremos adiante.
5. ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL
O tema a respeito da desistência do mandado de segurança andou por grandes discussões e divergências, sobretudo em relação à desistência da ação em momento posterior à prolação de sentença de mérito. Vejamos, como exemplo, a decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região em decisão sobre o tema do início do ano de 2013:
“Ementa: AGRAVO INTERNO. MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSUAL CIVIL. DESISTÊNCIA DA AÇÃO APÓS SENTENÇA DE MÉRITO. TRÂNSITO EM JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. PROVIMENTO. 1. Cinge-se a controvérsia em saber se é possível a desistência de mandado de segurança após a prolação de sentença de mérito, em especial, transitada em julgado, questão essa que, recentemente, teve sua repercussão geral reconhecida e foi incluída na pauta de julgamento do STF (RE 669367 RG, Relator (a): Min. LUIZ FUX, julgado em 15/03/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-156 DIVULG 08-08-2012 PUBLIC 09-08-2012 RDECTRAB v. 19, n. 218, 2012, p. 24-29). 2. Torna-se impossível desistir do prosseguimento da ação (seja pela via ordinária, seja pela via mandamental), após a prolação de uma sentença, em especial quando esta resolveu o mérito. A se admitir a desistência, com consequente extinção do feito sem resolução do mérito (art. 267 , VIII, do CPC ), estar-se-ia transformação de uma sentença de mérito, já transitada em julgado, em uma sentença terminativa” (TRF-2 - AMS APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA AMS 200651010154619 (TRF-2) Data de publicação: 21/02/2013).
Apesar do entendimento acima citado, ao que parece, o tema restou pacificado após a decisão do STF a respeito, assim como no STJ. O Supremo Tribunal Federal ao julgar RE 669367/RJ, o seu Plenário decidiu que a desistência do MS é uma prerrogativa de quem o propõe e pode ocorrer a qualquer tempo, sem anuência da parte contrária e independentemente de já ter havido decisão de mérito, ainda que favorável ao autor da ação (RE 669367/RJ, Red. para acórdão Min. Rosa Weber, julgado em 02/05/2013). Portanto, entendeu-se que o “writ” é uma ação conferida em benefício do cidadão contra o Estado e, portanto, não gera direito à autoridade pública coatora de ver o mérito da questão resolvido.
Os principais argumentos veiculados pela Ministra Relatora foram os seguintes:
a) O impetrante pode desistir de mandado de segurança a qualquer tempo, ainda que proferida decisão de mérito a ele favorável, e sem anuência da parte contrária.
b) O mandado de segurança, enquanto ação constitucional, com base em alegado direito líquido e certo frente a ato ilegal ou abusivo de autoridade, não se reveste de lide, em sentido material.
c) Não se aplica, ao mandado de segurança, a condição disposta na parte final do art. 267, § 4º, do CPC (“§ 4º Depois de decorrido o prazo para a resposta, o autor não poderá, sem o consentimento do réu, desistir da ação”).
d) Mesmo após a sentença de mérito, é possível que o impetrante desista do mandado de segurança sem precisar renunciar ao direito. Logo, não incide o art. 269, V, do CPC.
e) Se, no caso concreto, for constatada eventual má-fé do impetrante, esta deverá ser combatida mediante os instrumentos próprios previstos na lei processual. O que não se pode é, com base nisso, querer impedir o autor de desistir da ação.
Contudo, apesar de parecer que o tema estava pacificado em âmbito jurisprudencial, o STF exarou decisão contrária ao entendimento acima esposado, quando um impetrante resolveu desistir do MS após a sentença apenas para evitar o trânsito em julgado da decisão que lhe foi contrária. Restou entendido que haveria um abuso de direito por trás da intenção de desistir do impetrante, evitando o fim da discussão com a constituição da coisa julgada. Assim, o STF impediu, neste caso, a desistência do “writ” requerida pelo impetrante, vejamos abaixo:
“É possível que o impetrante desista do MS após já ter sido prolatada sentença de mérito?
Em regra, SIM. Existem julgados do STF e STJ admitindo (STF. RE 669367/RJ, Min. Rosa Weber, julgado em 02/05/2013; STJ. 2ª Turma. REsp 1.405.532-SP, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 10/12/2013. Info 533).
O entendimento acima parecia consolidado. Ocorre que, em um caso concreto noticiado neste Informativo (nº 781 do STF), o STF afirmou que não é cabível a desistência de mandado de segurança, nas hipóteses em que se discute a exigibilidade de concurso público para delegação de serventias extrajudiciais, quando na espécie já houver sido proferida decisão de mérito, objeto de sucessivos recursos. No caso concreto, o pedido de desistência do MS foi formulado após o impetrante ter interposto vários recursos sucessivos (embargos de declaração e agravos regimentais), todos eles julgados improvidos. Dessa forma, o Ministro Relator entendeu que tudo levaria a crer que o objetivo do impetrante ao desistir seria o de evitar o fim da discussão com a constituição de coisa julgada. Com isso, ele poderia propor uma ação ordinária em 1ª instância e, assim, perpetuar a controvérsia, ganhando tempo antes do desfecho definitivo contrário. Assim, com base nessas peculiaridades, a 2ª Turma do STF indeferiu o pedido de desistência. STF. 2ª Turma. MS 29093 ED-ED-AgR/DF, MS 29129 ED-ED-AgR/DF, MS 29189 ED-ED-AgR/DF, MS 29128 ED-ED-AgR/DF, MS 29130 ED-ED-AgR/DF, MS 29186 ED-ED-AgR/DF, MS 29101 ED-ED-AgR/DF, MS 29146 ED-ED-AgR/DF, Rel. Min. Teori Zavascki, julgados em 14/4/2015 (Info 781).
Aderindo a este posicionamento do STF, a 2ª Turma do STJ afirmou expressamente que o impetrante pode desistir de mandado de segurança sem a anuência do impetrado, mesmo após a prolação da sentença de mérito (REsp 1.405.532-SP, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 10/12/2013).
6. CONCLUSÃO
A ação do mandado de segurança, que tem expressão previsão constitucional dentro do título referente aos direitos e garantias fundamentais, presta relevante papel dentro da sociedade, já que busca resguardar direitos de pessoas físicas e jurídicas em face de abusos e ilegalidades que possam ser praticadas por autoridades ou por pessoas jurídicas de direito privados no exercício de atribuições do poder público.
Desde que atendidos todos os requisitos para a sua impetração, conforme previstos em legislação federal em vigor, o interessado poderá ter em seu favor a proteção do seu direito violado, com o afastamento do mundo jurídico daquele ato praticado com vícios de legalidade.
Assim, por se tratar de uma ação que não se submete integralmente ao regime do Código de Processo Civil e que visa coibir ilegalidades praticadas por atos praticados em razão do exercício de atribuições do poder público, por se entender que o mandado de segurança não se reveste de lide em sentido material, a doutrina e jurisprudência pátrias pacificaram o entendimento de que o impetrante poderia desistir da ação a qualquer tempo, mesmo que após a prolação da sentença de mérito.
Contudo, recente decisão do STF resolveu mitigar o entendimento que parecia pacificado no âmbito jurisprudencial, quando houver por parte do impetrante interessado, o intento de desistir do “writ” com objetivo de fraudar o procedimento, interpondo sucessivos recursos, todos improvidos, a fim de evitar o trânsito em julgado da decisão.
Por fim, podemos considerar que esta ressalva no entendimento recente do STF se trata, em verdade, de um caso isolado, em que restou verificado que o intuito do impetrante era de evitar a formação da coisa julgada material, agindo com pura má-fé processual, o que não deve ser aceito no nosso ordenamento jurídico pátrio. Assim, prevalece a tese pacificada no sentido de que o impetrante pode desistir do MS mesmo após a prolação de sentença de mérito, desde que não fique caracterizado, no ato da sua desistência, o intuito abusivo de fraude processual.
7. REFERÊNCIAS
BARROS, Guilherme Freire de Mello. Poder Público em Juízo. 2ª Ed. JusPodivm. Salvador 2012.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, 14ª Ed. Saraiva. São Paulo. 2010.
ALEXANDRINO, Marcelo e PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado, 19ª Ed. Método. São Paulo. 2011.
JÚNIOTR, Humberto Theodoro. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I, 49.ª edição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2008.
Supremo Tribunal Federal, Informativo nº 781, disponível em < http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo781.htm>, acesso em 02/01/2016.
Blod do Dizer o Direito, Desistência da ação e consentimento do réu (Direito Processual Civil), disponível em < http://www.dizerodireito.com.br/2012/07/desistencia-da-acao-e-consentimento-do.html>, acesso em 01/01/2016.
Pós-graduado em Direito Ambiental e Gestão Estratégica da Sustentabilidade pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP; Graduado em Direito pela Universidade Católica de Salvador (UCSal).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TAVARES, Bruno Machado. A possibilidade de desistência do mandado de segurança pelo impetrante após a sentença de mérito Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 jan 2016, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/45766/a-possibilidade-de-desistencia-do-mandado-de-seguranca-pelo-impetrante-apos-a-sentenca-de-merito. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: ELISA CARDOSO BATISTA
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
Por: MARCOS ANTÔNIO DA SILVA OLIVEIRA
Por: mariana oliveira do espirito santo tavares
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