RESUMO: O presente artigo discorre a respeito das particularidades da Área de Preservação Permanente e da Reserva Legal, consoante disciplina dada pela Lei nº 12.651/2012, conhecida por Novo Código Florestal.
Palavras-chave: Código Florestal. Lei nº 12.651/2012. Áreas especialmente protegidas. Área de Preservação Permanente. Reserva Legal.
INTRODUÇÃO
Inaugurada a vigente ordem constitucional e atentando-se para o crescente movimento de proteção ao meio ambiente, o qual passou a ter notoriedade internacional desde a Convenção de Estocolmo de 1972, o constituinte originário de 1988 elegeu o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental a ser preservado pelo Poder Público e por toda a sociedade, consoante normatização trazida pelo art. 225, § 1º da Constituição:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
O comando do inciso III, § 1º do art. 225 da Constituição Federal, acompanhado pelo art. 9º, VI, da Lei nº 6.938/81, determina que o Poder Público deve definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção.
A Lei Maior traz, no referido dispositivo, a obrigatoriedade de definição de áreas ou espaços territoriais especialmente protegidos, conceito genérico que abrange as unidades de conservação da natureza, definidas na Lei nº 9.985/00, bem como a reserva legal e as áreas de preservação permanente, reguladas pela Lei nº 12.651/12.
RESERVA LEGAL E ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE SEGUNDO A LEI Nº 12.651/2012
Conforme dispõe o art. 3º, II, da Lei nº 12.651/2012, novo Código Florestal, Área de Preservação Permanente - APP é uma área especialmente protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.
A Área de Preservação Permanente constitui uma limitação ao direito de propriedade, calcada no princípio da função socioambiental da propriedade, insculpido no art. 186, inciso II, da Constituição Federal. É, pois, considerada área ambientalmente relevante, cuja vegetação e demais recursos naturais devem ser preservados. Caracteriza-se, via de regra, pela intocabilidade e pela impossibilidade de exploração econômica direta.
Cumpre ressaltar que, pela disciplina dada pelo Código Florestal, a simples ausência de vegetação não descaracteriza a classificação em Área de Preservação Permanente, ou seja, a área será considerada como tal ainda que não esteja coberta por vegetação.
O Código Florestal também conceitua Reserva Legal, dispondo, em seu art. 3º, III, tratar-se de área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, delimitada nos termos da lei, com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa.
A Reserva Legal também é caracterizada como limitação ao direito da propriedade, calcada na sua função socioambiental. No entanto, diversamente do que ocorre com a Área de Preservação Permanente, a Reserva Legal apenas será criada em imóveis rurais, nos termos do art. 4º, inciso I, da Lei 4.504/64 (Estatuto da Terra). Desse modo, as propriedades rurais deverão manter, além das Áreas de Preservação Permanente nela eventualmente existentes, um percentual mínimo, definido em lei, de cobertura vegetal nativa necessária à conservação da biodiversidade e à proteção da fauna e flora nativas.
Um outro traço distintivo entre a Área de Preservação Permanente e a Reserva Legal é o de que nesta é possível, conforme disposto no § 1º, do art. 17, do Código Florestal, a exploração econômica, desde que esta seja feita mediante manejo sustentável, previamente aprovado pelo órgão competente do Sistema Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA. Ou seja, a lei permite, a utilização e exploração da área correspondente à Reserva Legal contanto que não haja a descaracterização dos recursos florestais e os ecossistemas protegidos.
Impende ressaltar, ademais, que o percentual de Reserva Legal em cada propriedade rural é variável conforme a localização geográfica desta e a natureza da vegetação nela contida, de acordo com os limites estabelecidos pelo art. 12 do Código Florestal. Com efeito, a localização da área protegida não é de livre escolha do proprietário ou possuidor do imóvel, uma vez que deverá ser aprovada pelo órgão ambiental competente, que, por sua vez, observará diversos critérios, tais como a bacia hidrográfica do local, o zoneamento ecológico-econômico e a possibilidade de formação de corredores ecológicos com outras áreas de proteção.
Antes, porém, da localização da Reserva Legal ser aprovada pelo órgão ambiental, necessário que o imóvel rural esteja incluído no Cadastro Ambiental Rural – CAR, registro público eletrônico de âmbito nacional, que passou a ser obrigatório com o advento do novo Código Florestal, objetivando integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento.
Importante mencionar que o novo Código Florestal possibilitou ainda que, respeitados os requisitos nele previstos, o cômputo das Áreas de Preservação Permanente eventualmente existentes no imóvel rural no cálculo da Reserva Legal, a fim de se alcançar o percentual mínimo exigido pelo art. 12 daquele diploma legal.
Quanto às questões relacionadas à redução das mencionadas áreas ambientalmente protegidas, impende trazer algumas considerações.
Conforme preceitua o art. 8º do Código Florestal, é possível a supressão de vegetação em Área de Preservação Ambiental, em casos de utilidade pública, interesse social ou em situações de baixo impacto ambiental, desde que haja prévio ato administrativo autorizativo por parte do órgão ambiental competente. Norma semelhante, constante do antigo Código Florestal (art. 4º da Lei 4.771/65), já foi questionada junto ao Supremo Tribunal Federal na ADI 3540. Por ocasião do julgamento da referida demanda de controle abstrato-concentrado, o Supremo considerou constitucional a norma impugnada e fez uma importante distinção entre a supressão de uma área ambientalmente protegida – que deve se dar através de lei, nos termos do art. 225, § 1º, III da Constituição – e a supressão da vegetação nela existente. Esta última hipótese, conforme ponderou a Corte Constitucional, não implica na supressão da própria área protegida.
Além disso, assentou o STF que, a necessidade de autorização administrativa para a supressão da vegetação de uma Área de Preservação Permanente, ao invés de um retrocesso, constituiria uma proteção extra conferida pelo legislador, de modo a tornar possível o prévio controle estatal da atividade potencialmente lesiva à área ambientalmente protegida.
No que diz respeito à Reserva Legal, o art. 12 da Lei nº 12.651/12 traz em seus parágrafos hipóteses de redução do percentual mínimo da respectiva área. Mencione-se, por exemplo, a possibilidade de redução da área de Reserva Legal em até 50% nos imóveis localizados na Amazônia Legal nos casos em que o município contar com mais de 50% da sua área ocupada por unidades de conservação de domínio público e por terras indígenas.
Outrossim, o mesmo artigo traz hipóteses nas quais não será exigida a Reserva Legal, tais como os referentes aos empreendimentos de abastecimento público de água e tratamento de esgoto e áreas adquiridas ou desapropriadas para implantação ou ampliação da capacidade de rodovias ou ferrovias.
No caso de haver desapropriação por utilidade pública, as Áreas de Preservação Permanente devem ser consideradas para fins de valor indenizatório. Desse modo, o valor da indenização devida deve abranger toda a propriedade, inclusive, sendo ela imóvel rural, a área de Reserva Legal. A esse respeito, importantes ressalvas faz o Superior Tribunal de Justiça. Com efeito, no caso das Áreas de Preservação Permanente, ainda que seja devida a indenização, são incabíveis os juros compensatórios, uma vez que, ao menos via de regra, não é permitida a exploração econômica em tais áreas. Destarte, não é possível o pagamento de juros compensatórios referentes às Áreas de Preservação Permanente existentes em áreas a serem desapropriadas, sob pena de enriquecimento sem causa do indenizado, eis que tais áreas são insuscetíveis de exploração econômica.
Além disso, entende o Supremo Tribunal Federal que Áreas de Preservação Permanente referentes às matas ciliares de rios navegáveis são bens públicos dominiais, sendo, por consequência, excluídos do cálculo do montante a ser indenizado ao proprietário do imóvel a ser desapropriado. Tal entendimento está inclusive assentado no enunciado de súmula nº 479.
CONCLUSÃO
Em atendimento ao comando insculpido no art. 225 da Constituição Federal, a Lei nº 12.651/2012, novo Código Florestal, trouxe importante disciplina à Área de Preservação Permanente e à Reserva Legal, espécies de áreas especialmente protegidas.
Referida norma legal, ao dispor minunciosamente a respeito da caracterização, exploração e proteção de tais áreas protegidas, consagrou os princípios do desenvolvimento sustentável, da função socioambiental da propriedade, bem como da proteção ao bem ambiental.
REFERÊNCIAS
AMADO, Frederico. Direito Ambiental Esquematizado, São Paulo. Método. 2012.
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Juris, 2010.
SILVA, José Afonso da. Direito ambiental Constitucional, 2ª Ed. São Paulo, Malheiros Editoras, 2010.
THOMÉ, Romeu. Manual Direito Ambiental. In: Revista Ampliada e Atualizada, 4ª vol. São Paulo: Editora JusPodivm, 2014.
Graduada em Direito pela Universidade Federal do Maranhão. Pós-Graduada em Direito Público pela Universidade Anhanguera-Uniderp. Servidora Pública do Ministério Público Federal lotada na Procuradoria da República em Imperatriz/MA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MORAIS, Natanne Lira de. Aspectos relevantes acerca da reserva legal e da área de preservação permanente segundo a Lei nº 12.651/2012 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 fev 2016, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/45961/aspectos-relevantes-acerca-da-reserva-legal-e-da-area-de-preservacao-permanente-segundo-a-lei-no-12-651-2012. Acesso em: 23 dez 2024.
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