RESUMO: A prova tem o condão de formar a convicção do magistrado acerca de fatos alegados. O direito processual do trabalho possui um dinamismo próprio e, por conseguinte, terá a aplicação de princípios inerentes a ele quanto à distribuição do ônus probante entre as partes. Este artigo fará verificações acerca do ônus da prova, especialmente no processo do trabalho.
Palavras-chave: ônus da prova; processo do trabalho.
INTRODUÇÃO
As provas esclarecem e apresentam informações ao magistrado, no intuito de convencer o juiz da ocorrência de determinados fatos, e o orientá-lo para proferir sua sentença.
Sejam por meio de provas testemunhais, periciais, documentais ou qualquer outra admitida, os litigantes procurarão formar o entendimento do magistrado para exarar uma sentença que melhor lhe favoreça.
Dentro deste panorama, é fator culminante que os sujeitos processuais tenham em vista como estará dividido o encargo probatório de cada um, afim de que não percam a oportunidade de demonstrar da melhor maneira possível os fatos que alegaram.
A Consolidação das Leis do Trabalho traz orientações acerca do ônus da prova, mas por ser simplório em suas disposições, tem-se admitido, a utilização subsidiária da disciplina processual civilista. Entretanto, não se apresenta de maneira uniforme esta interpretação, cabendo várias interpretações sobre o tema.
1. DO ÔNUS DA PROVA – ASPECTOS GERAIS
A expressão do latim onus significa carga, fardo, peso, gravame. Já o vocábulo prova, que tem origem no latim “proba”, de “probare”, quer dizer demonstrar. Portanto, o ônus da prova é atribuição conferida à parte de demonstrar ao Juiz, os fatos que alega ter acontecido, ou seja, é uma responsabilidade de se produzir uma prova a fim de formar a convicção do magistrado acerca dos fatos trazidos aos autos.
Alexandre Freitas Câmara (citado por ROCHA, 2007) ensina que ônus da prova é “todo elemento que contribui para a formação da convicção do juiz a respeito da existência de determinado fato”.
O ônus da prova trata da necessidade de que a parte produza prova dos fatos trazidos aos autos, que tenham relevância e que sejam controvertidos. Seu intuito será que o magistrado sentencie a seu favor.
O sucesso das alegações da parte está diretamente relacionado à sua atividade probatória, no seu interesse em demonstrar os atos que satisfarão o direito invocado.
Cabe lembrar neste momento que não há obrigação legal da parte produzir suas provas, a realização destas é dependente da vontade da parte e de igual forma, não há uma sanção pelo seu não cumprimento. Tem-se que o ônus a prova é uma espécie de vantagem conferida à parte para formar a certeza do juízo sobre os fatos que narrou, o que demonstra uma total influência sobre o julgado.
Esclarece Emília Simeão Albino Sako (2008, p. 28) que:
ônus subjetivo da prova refere-se à definição do que deve ser provado, enquanto ônus objetivo diz respeito à regra jurídica que define a quem cabe produzir a prova (CPC, art. 333; CLT, art. 818; CDC, art. 6º e 38).
Sobre um aspecto geral, diante de fatos alegados sem a devida prova, o Estado-Juiz decidirá em desfavor da parte a quem incumbia a produção da referida prova, vez que o fato exposto será tido como inexistente. Assim, a parte arcará com a responsabilidade da sua falta de ação, ou melhor, da sua falta de provas, trazendo por consequência lógica, o indeferimento de suas exposições fáticas.
Pontes de Miranda (1996, 6:270), faz as seguintes considerações sobre ônus da prova:
O ônus da prova é objetivo, não subjetivo. Como partes, sujeitos da relação jurídica processual, todos os figurantes hão de provar, inclusive quanto às negações. Uma vez que todos têm de provar, não há discriminação subjetiva do ônus da prova. O ônus da prova, objetivo, regula consequência de se não haver produzido prova. Em verdade, as regras sobre consequências da falta de prova exaurem a teoria do ônus da prova. Se falta prova, é que se tem de pensar em se determinar a quem carga a prova. O problema da carga ou ônus da prova é, portanto, o de determinar-se a quem vão as consequências de se não haver provado; ao que afirmou a existência do fato jurídico (e foi, na demanda, o autor), ou a quem contra-afirmou (negou ou afirmou algo que exclui a validade ou eficácia do fato jurídico afirmado), seja o outro interessado, ou, na demanda, o réu.
Por outro ângulo, caso a prova não tenha sido apresentada pela parte que lhe incumbia, o seu pedido poderá ser considerado procedente em virtude da apresentação da prova pela parte adversa que lhe seja favorável.
Destarte, independente de qual litigante tenha produzido a prova, o magistrado levará em conta os fatos conforme demonstrados.
Neste momento cabe lembrar que em ocorrência de revelia haverá presunção de veracidade quanto aos fatos alegados pelo autor, não sendo necessária produção de outra prova, exceto em casos de matéria de direito que somente poderá ser comprovada por meio de perícia ou documentos.
Assim, caso o autor, mesmo com a declaração de revelia, não produza as provas a que tinha o dever, o magistrado poderá rejeitar seu pleito, já que a confissão ficta produz presunção apenas sobre a matéria de fato e não de direito.
2. DOS PRINCÍPIOS QUE REGEM O ÔNUS DA PROVA
Em linhas gerais, o ônus da prova advém de três princípios primordiais, que são: o princípio da indeclinabilidade da jurisdição; do dispositivo e da persuasão racional.
Quanto ao princípio da indeclinabilidade da jurisdição, o magistrado não pode se eximir de proferir um julgamento quando não a compreender ou achá-la muito complexa. É a Carta Magna que confere acesso ao Poder Judiciário a todos aqueles que tiverem seu direito violado, e nem mesmo a lei e o aplicador desta poderão impedir ou abster-se de efetuar uma apreciação. Mesmo havendo lacuna ou obscuridade na lei, deverá proferir decisão, nos termos do art. 126, do Código de Processo Civil (BRASIL, 1973).
Vicente Grego Filho (1996) nos ensina que "nula é a sentença citra petita, qual seja a que deixa de apreciar pedido expressamente formulado. Esta última viola o princípio da indeclinabilidade da jurisdição".
No segundo, somente as partes têm o encargo de produzir as provas, onde o juiz poderá apenas determinar complemento para elucidação, sendo vedado a este uma posição ativa na produção de provas. Cabe lembrar ainda que as partes somente poderão dispor daqueles direitos disponíveis, e não daqueles denominados de indisponíveis, tais como a vida, e a saúde.
PROCESSUAL: JULGAMENTO FORA DO PEDIDO: ALTERAÇÃO DO CONTORNO JURÍDICO-FÁTICO DELINEADO PELAS PARTES: INEXISTÊNCIA DE QUESTÃO DE ORDEM PÚBLICA: VEDAÇÃO LEGAL: SENTENÇA NULA.
O Poder Judiciário não pode substituir a vontade das partes e modificar o objeto da ação e os contornos jurídico-fáticos delineados pelas partes, sob pena de afronta ao princípio dispositivo. Desse modo, a sentença extra petita é nula, pois contraria a disposição do art. 128 do CPC, eis que ausente questão de ordem pública que pudesse ser declarada de ofício. Recurso obreiro conhecido e provido: sentença anulada com retorno dos autos ao Juízo de origem para outra seja proferida, observados os expressos limites da lide e os pedidos deduzidos pela parte Autora. TRT-10 - RECURSO ORDINARIO: RO 397200602110000 DF 00397-2006-021-10-00-0. Julgamento: 06/12/2006. Órgão Julgador: 2ª Turma. Publicação: 09/02/2007
Por fim, no princípio da persuasão racional, o juiz quando apreciar as provas deverá julgar com fundamento nestas e não com base em suas convicções. Mesmo que tenha liberdade para apreciar os fatos e as provas, deverá demonstrar assim que seu julgamento foi feito a partir de um raciocínio lógico e coerente.
NULIDADE DA SENTENÇA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. A sentença pode até ser considerada injusta ou equivocada na apreciação das provas carreadas aos autos; contudo, se estiver devidamente fundamentada, tais defeitos não lhe dão a pecha de nula por negativa de prestação jurisdicional. In casu, o julgado consignou, pormenorizadamente, as razões da não consideração das declarações prestadas pela testemunha do obreiro, não havendo que se falar, portanto, em nulidade da sentença por negativa de prestação jurisdicional, pois devidamente fundamentada, ainda que contrária aos interesses da parte. Restam afastadas, por corolário, as alegações de ofensa aos artigos 93, inciso IX, da Constituição da República, 165 do Código de Processo Civil e 832 da CLT. Recurso a que se nega provimento, no particular. TRT–RO-00553.2001.000.23.00-6 – Ac. TP. n. 500/2002. Fonte: DJ/MT nº 6.379. Data de Publicação: 16/04/2002. Data de Circulação: 17/04/2002-4ª f. Pág. 29
Feitas estas considerações, é de se analisar que a Consolidação das Leis trabalhistas, tem algumas particularidades, principalmente no tocante aos sujeitos de sua lide. Assim, no tratamento da questão do ônus da prova, alguns outros princípios devem ser observados.
Um princípio de suma importância é o princípio da prova pré-constituída. Neste, o encargo probatório pertence àquele que possui a obrigação de cumprir alguma formalidade estabelecida em lei.
A aplicação deste princípio é facilmente observada na Súmula 338 do Tribunal Superior do Trabalho:
338. Jornada. Registro. Ônus da prova – Nova redação – É ônus do empregador que conta com mais de 10 (dez) empregados o registro da jornada de trabalho na forma do art. 74, § 2º, da CLT. A não apresentação injustificada dos controles de freqüência gera presunção relativa de veracidade da jornada de trabalho, a qual pode ser elidida por prova em contrário.
Verifica-se no teor desta súmula que a não observância pelo empregador quanto à apresentação dos registros de horário gera uma presunção relativa do horário que é alegado pelo empregado em sua inicial.
Cabe ponderar que através desta súmula, o TST presume a fraude nos documentos apresentados pela empresa, e assim inverte o ônus da prova, tendo em vista que em primeiro plano, o autor seria o detentor do ônus da prova por se tratar de fato constitutivo do seu direito.
Veja-se a seguinte decisão:
TRT-PR-22-01-2008 TERCEIRIZAÇÃO. PRAZOPARA JUNTADA DE DOCUMENTOS EM PODER DA REAL EMPREGADORA E NOVO PEDIDO DE INTIMAÇÃO.
Situação fática: na audiência dita inicial foi concedido prazo para o tomador de serviços complementar sua documentação, exatamente para poder ir buscá-la junto à real empregadora. Este não falou nos autos na data aprazada e, quando falou, nada trouxe, tendo apenas solicitado a intimação da empresa que já não tinha comparecido na primeira audiência. Rejeitado este novo pedido, argüiu-se cerceamento de defesa, a qual se rejeita. Em verdade, citado para comparecer à audiência una, os documentos indispensáveis à sua defesa, já deveriam ter sido juntados no primeiro momento, sem que a Exma. Juiza estivesse obrigada a conceder novel prazo a tal fim. O princípio da concentração dos atos processuais exige a apresentação da prova documental pré-constituída junto com a contestação (art. 845 da CLT c/c arts. 297 e 396 do CPC). Logo, o indeferimento posterior de intimação (e, ainda assim, por meio de manifestação extemporânea, repise-se) está de acordo com o estabelecido no ordenamento processual, porque os documentos não seriam novos e também porque não foram razoáveis os fundamentos para o requerimento. Como tomadora de serviços, em face da obrigação de vigilância, a parte ré já deveria ter os documentos respeitantes aos empregados da prestadora que realizou serviços a seu favor. Não há cerceamento de defesa, pois teve oportunidade até maior que a legal para apresentar os documentos. Se não exerceu o direito no momento oportuno, deverá arcar com o ônus da sua inércia. O princípio da ampla defesa encontra limite nas matérias já cobertas pela preclusão. Do contrário, infindáveis seriam os prazos, perenes seriam as lides, impossibilitando-se a consecução dos ideais de segurança jurídica, de pacificação social através do poder estatal de dizer o direito, bem assim de igualdade das partes. Preliminar rejeitada, porque não configurado o cerceamento de defesa, inexistindo, de conseqüência, violação ao art. 5º, LV, da Constituição Federal.TRT-PR-00151-2007-017-09-00-5-ACO-01824-2008 - 1A. TURMARelator: UBIRAJARA CARLOS MENDESPublicado no DJPR em 22-01-2008
Outro exemplo em que se pode constatar este princípio é nos casos em que o empregador tem em seu poder alguns documentos que se refiram ao contrato de trabalho, tais como recolhimentos previdenciários e de FGTS.
Além disso, quando tratamos dos princípios processuais civis, a equivalência entre as partes pode ser considerada como uma regra. Em contrapartida, o princípio inerente ao direito material do trabalho, que também se alastra e dependendo do caso concreto pode ser aplicado ao direito processual trabalhista, é o princípio da Proteção, que busca amparar o empregado hipossuficiente.
Essa particularidade do Processo do Trabalho que traz a proteção dos interesses do trabalhador se revela como meio de efetivação prática das leis trabalhistas.
O professor Amauri Mascaro Nascimento in Curso de Direito Processual do Trabalho (2001) nos traz seu ensinamento que “em processo trabalhista deve reger o princípio da igualdade das partes em matéria de ônus da prova. Entretanto, a lei cria numerosas presunções legais em favor dos trabalhadores, dispensando-os, assim, parcialmente, dos ônus probatórios”.
Quanto ao tema, outro ensinamento nos é trazido pelo professor Wagner D. Giglio (2005, p.84):
“Essas características do Direito Material do Trabalho imprimem suas marcas no direito instrumental, particularmente quanto à proteção do contratante mais fraco, cuja inferioridade não desaparece, mas persiste no processo. Basta lembrar, para corroborar esta última afirmativa, que a superioridade patronal se revela, em juízo, pelo melhor assessoramento jurídico que pode obter, pela facilidade na produção da prova, especialmente a testemunhal, colhida entre seus subordinados, e pela maior idoneidade econômica para suportar as delongas e as despesas processuais. Embora muitas outras fossem necessárias,algumas normais processuais de proteção ao trabalhador já existem, a comprovar o princípio protecionista. Assim, a gratuidade do processo, com isenção de pagamento de custas e despesas, aproveita aos trabalhadores, mas não aos patrões; a assistência judiciária gratuita é fornecida ao empregado, mas não ao empregador; a inversão do ônus da prova através de presunções favorece o trabalhador, nunca ou raramente o empregador; o impulso processual ex officio beneficia o empregado, já que o empregador, salvo raras exceções, é o réu, demandado, e não aufere proveito da decisão; na melhor das hipóteses, deixa de perder”.
Ora, um dos objetivos primordiais do princípio da proteção ao hipossuficiente trabalhador é abrandar o encargo conferido à este, cujas dificuldades de prova são maiores que o empregador.
Cabe ressaltar aqui, que a hipossuficiência é analisada sob o âmbito probatório, isto é, se uma das partes, geralmente o empregado, não tem condições de produzir determinada prova que somente o empregador tenha meios de fazê-las, este se encarregará de trazer aos autos as devidas provas.
3. DO ÔNUS DA PROVA NO PROCESSO DO TRABALHO.
Para o magistrado o ônus da prova é irrelevante, tendo em vista que este apenas aprecia as provas em sua totalidade, sem identificar quem as produziu, utilizando-se da teoria objetiva.
No âmbito do Direito Processual Civil, o ônus da prova incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito e ao réu, quanto à existência do fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, nos termos do artigo 333, I e II, do Código de Processo Civil (BRASIL, 1973).
Já o Código de Processo Penal (BRASIL, 1941) assevera que:
Art. 156. A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício: (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)
I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida; (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)
II – determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante.
Entretanto, o legislador trabalhista apresentou uma regra diferente quanto ao ônus da prova: aquele que alega deve provar a alegação, independentemente de se tratar de fato constitutivo, impeditivo, modificativo ou extintivo do direito, ou da posição das partes do processo, regra ditada pelo artigo 818 da Consolidação das Leis do Trabalho (BRASIL, 1943).
Nota-se que o CPC é mais amplo e completo em seu dispositivo, mas é importante lembrar que sua aplicação é apenas subsidiária no direito processual do trabalho, nos termos do artigo 769 da Consolidação das Leis Trabalhistas (BRASIL, 1943). Ademais, não existe omissão de normas nesta última.
Não obstante, a jurisprudência e a doutrina fazem constantes aplicações subsidiárias do artigo 333 do CPC (BRASIL, 1973), pelo que o dispositivo laboral é superficial, utilizando-o assim como um complemento.
REGRAS DO ÔNUS DA PROVA. PROVA DOS FATOS CONSTITUTIVOS, EXTINTIVOS, MODIFICATIVOS E IMPEDITIVOS DO DIREITO. Inteligência do artigo 333, do CPC e artigo 818 da CLT. O processo do trabalho contém norma precisa sobre o ônus da prova e o distribui de modo uniforme e equilibrado entre as partes. Via de regra, sejam quais forem as respectivas alegações, positivas ou negativas, de fatos constitutivos, modificativos, impeditivos ou extintivos, a prova incumbe a qualquer das partes que as formule. Compete à parte trazer aos autos elementos convincentes de suas assertivas, para fins de formação do convencimento do Juízo a seu favor . (TRT/SP - 03010200820202000 - RO - Ac. 8ªT 20090936366 - Rel. LILIAN LYGIA ORTEGA MAZZEU - DOE 10/11/2009)
A título ilustrativo, lembramos que o ilustre jurista e professor César Pereira da Silva Machado Júnior (2001), apresenta um roteiro acerca do ônus da prova, quais sejam: 1º) se há princípios de direito do trabalho em favor do empregado; 2º) se pode ser aplicado o princípio da aptidão para a prova; 3º) se há regras de pré-constituição da prova; 4º) se há máximas de experiência comum; 5º) para somente depois se analisar o teor do art. 333 do CPC.
É imperioso ressaltar outrossim, que o juiz se valerá da regra do ônus da prova no momento em que se deparar com a inexistência de provas nos autos ou para desempatar em casos de prova dividida.
Vale mencionar que a chamada prova dividida ou prova empatada ocorre em ocasiões que as partes litigantes provam os fatos que aduzem e assim o magistrado não define a quem pertence o direito.
Um caso bem claro de ocorrência de prova dividida é quando duas testemunhas apresentam seu testemunho em sentido contrário, de forma que uma desmente a outra. Neste caso, a prova não seria cabal, sem elementos que dessem preferência a qualquer um. Consequentemente, observa-se que a parte a quem pertencia o ônus de prová-la, não se desvencilhou assim do seu encargo.
Ainda no campo da prova dividida, compactuamos com o posicionamento de que o magistrado deverá valer-se do princípio da persuasão racional, julgando por meio da prova que mais lhe convenceu, vez que não pode se eximir de proferir uma decisão. Aqui poderá, por exemplo, verificar se as testemunhas presenciaram a ocorrências dos fatos ou ainda se possuíam segurança nas respostas, dentre outras.
Neste aspecto, tem-se algumas ementas que acareiam a matéria:
PROVA DIVIDIDA- VALORAÇÃO- Diante da prova dividida, cabe ao juiz aquilatar o valor probante que está a merecer cada depoimento, consoante o princípio da livre convicção motivada inscrito no artigo 131 do Código de Processo Civil, sendo imperioso que se prestigie a valoração dessa realizada por quem presidiu a instrução processual e manteve contato direto com as testemunhas. Recurso ordinário conhecido e desprovido. (TRT da 9.ª Região, RO 03214.2004.021.09.00-1, 3.ª Turma, Relator Juiz Altino Pedrozo dos Santos, DJPR de 28/07/2006)
Prova dividida. Apresentando-se a prova dividida, a decisão deverá pautar-se pela distribuição do ônus da prova, segundo critérios legais ditados pelos artigos 818 da CLT e 333, I e II, do CPC. (TRT – 9ª R – 4ª T – Ac. nº 2261/98 – Relª. Juíza Rosemarie Pimpão – DJPR 30.01.98 – pág. 165).
Ônus da prova – Artigo 818 da CLT e artigo 333 do CPC – Violação. 1. As normas legais concernentes à distribuição do ônus da prova são "regras de julgamento", cuja finalidade é dotar o juiz de um critério para decidir a lide nos casos em que não se produziu a prova, ou a prova revelou-se insuficiente para formar-lhe o convencimento. Destinam-se, enfim, a permitir ao juiz sair de um impasse, já que também não lhe é dado abster-se de compor o conflito de interesses. 2. Daí se segue, a contrario sensu, que é logicamente inconcebível a vulneração do artigo 818 da CLT e do artigo 333 do CPC sempre que o órgão jurisdicional soluciona o litígio com base nas provas efetivamente produzidas. A violação a esses preceitos legais somente se pode divisar quando, por inexistente ou insuficiente a prova, o juiz, invertendo inadvertidamente a distribuição do ônus da prova,julga a causa em desfavor da parte a quem, segundo a lei, não tocava o ônus de produzir a prova não produzida. 3. Agravo de instrumento não provido. (TST – 1ª T – AIRR nº 51.165/2002.900.03.00-7 – Rel. João Oreste Dalazen – DJ 20.05.05 – p. 883) (RDT nº 06 de Junho de 2005).
Entretanto, para os litigantes é condição inerente à sua qualidade de parte, de forma que estará em condição mais vantajosa aquele que cumprir com o seu encargo de provar determinado acontecimento.
Tendo em vista que o dispositivo contido na CLT (BRASIL, 1943) é por demais simplista, utilizam-se as regras processuais civilistas (CPC, art. 333) nas quais, cabe ao autor a prova do fato constitutivo do seu direito e ao réu dos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do seu direito.
Assim, quando a parte pleiteia determinado direito, tem que produzir fatos que revelem esse direito, isto é, fatos que tem a força de demonstrar a razão do direito alegado, ou ainda aquela situação que deu origem à relação aduzida na exordial. O autor deverá evidenciar o direito e sua ligação com os fatos ocorridos.
Nos ensina assim José Frederico Marques (1979, p. 188):
“Mas que são fatos constitutivos? São aqueles que, se provados, levam à conseqüência jurídica pretendida pelo autor. A relevância ou não de determinado fato para a produção de certo efeito jurídico é dada pelo direito material, porque nele estão definidas as relações jurídicas e os respectivos fatos geradores de direitos subjetivos. [...] Ao réu incumbe a prova da existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, ou seja, o fato que, a despeito da existência do fato constitutivo, tem, no plano do direito material, o poder de impedir, modificar ou extinguir o direito do autor”
Alguns exemplos de fatos constitutivos: a ofensa que o reclamante alega que o reclamado tenha feito ao pleitear danos morais, período de trabalho sem registro, diferenças de depósito de FGTS, existência de salário por fora, não pagamento de 13º, horas extras, equiparação salarial, dentre outros.
Quanto aos fatos impeditivos, modificativos e extintivos, estes devem ser provados pelo demandado dentro do sistema de demonstração dos argumentos levados aos autos.
É importante mencionar que existe grande dificuldade para ser feita a diferenciação dos fatos impeditivos, modificativos e extintivos, conforme nos ensina Rui Manuel de Freitas Rangel (2000, p.158), que afirma ainda que a melhor solução é caracterizá-los no caso concreto, de forma relativa:
“(...) Esta classificação dos factos jurídicos em constitutivos, impeditivos e extintivos não tem uma significação absoluta e abstracta, mas antes, relativa e concreta porque depende, em cada caso concreto, da função que o facto desempenha na acção de acordo com a posição das partes e o efeito jurídico que cada uma pretende obter por via do processo.”
A escritora Heloisa Pinto Marques (1999, p. 532) faz as seguintes considerações:
“Quando o réu admite o fato alegado pelo autor, mas lhe opõe outro que lhe impeça os efeitos, estamos diante de fato impeditivo. Na hipótese do trabalho aos domingos, por exemplo, a reclamada, admitindo o trabalho aos domingos, alega que era compensado nas segundas-feiras. Neste caso cabe à reclamada demonstrar que havia folga naquele dia. Os fatos extintivos são aqueles opostos o direito alegado, com condições de torna-lo inexigível. Acontece, por exemplo, quando reclamada admite que o reclamante trabalhava aos domingos, sem compensação, mas aduz ter pago os valores devidos a este título. Competirá, pois à reclamada demonstrar o pagamento. Por fim, fatos modificativos são aqueles que, sem negar os fatos alegados pelo autor, inserem modificação capaz de obstar que o reclamante trabalhava aos domingos no estabelecimento empresário, mas que nesses dias o trabalho era voluntário, com fins de benemerência, já que a empresa cedia os equipamentos e material para produzir alimentos para serem distribuídos para a comunidade e que não havia obrigatoriedade de comparecimento. Compete à reclamada sua demonstração.”
Nestes termos, fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito é o fato que leva a não procedência do direito alegado pelo autor.
Segue abaixo uma ementa que trata do assunto:
VÍNCULO DE EMPREGO. FATO IMPEDITIVO, MODIFICATIVO OU EXTINTIVO. Alegando a reclamada fato impeditivo, modificativo ou extintivo ao direito postulado, atrai para si o ônus da prova. As provas oral e documental comprovam as alegações da reclamada, pois demonstram trabalho autônomo. Ausentes os requisitos do artigo 3o da CLT, não há como se declarar o vínculo de emprego. Recurso provido. (TRT/SP - 01122200801802006 - RO - Ac. 8aT 20090747032 - Rel. Silvia Almeida Prado - DOE 15/09/2009)
Em se tratando matérias probatórias, vejamos o que diz a súmula nº 6, item VIII, do TST:
TST Enunciado nº 6 - RA 28/1969, DO-GB 21.08.1969 - Incorporação das Súmulas nºs 22, 68, 111, 120, 135 e 274 e das Orientações Jurisprudenciais nºs 252, 298 e 328 da SBDI-1 - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005
Quadro de Carreira - Homologação - Equiparação Salarial
VIII - É do empregador o ônus da prova do fato impeditivo, modificativo ou extintivo da equiparação salarial. (ex-Súmula nº 68 - RA 9/1977, DJ 11.02.1977)
Sob este aspecto, o Colendo TST procurou definir expressamente que em se tratando de equiparação, o empregador deverá trazer aos autos, todas as provas de fatos impeditivos, modificativo ou extintivos da equiparação salarial.
Neste sentido, segue a ementa a seguir:
EMENTA: EQUIPARAÇÃO SALARIAL. ENCARGO PROBATÓRIO. A teor da Súmula nº 6, item VIII, do Colendo TST, ``é do empregador o encargo da prova do fato impeditivo, modificativo ou extintivo da equiparação salarial'', ônus do qual a demandada não se desincumbiu a contento, porquanto o conjunto probatório constante nos fólios evidencia a existência dos requisitos autorizadores da equiparação salarial previstos no artigo 461, § 1º, da Consolidação das Leis do Trabalho, razão pela qual, é de ser mantida a sentença que deferiu a diferença salarial pretendida e suas repercussões. TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA SEXTA REGIÃO. 1ª Turma - Proc. TRT RO- 00764-2008-009-06-00-5. Relator - Desembargador Valdir Carvalho.
Outro caso típico do encargo do empregador em provar suas alegações ocorre quando há argumentação de que determinado acidente de trabalho não teria ocorrido caso o empregado não tivesse descumprido as normas de segurança e as orientações dos especialistas em segurança no trabalho repassados pela empresa. Assim, os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito à indenização ou ainda uma culpa exclusiva do empregado pelo acidente do trabalho devem ser demonstrados pela empresa.
Vale ressaltar que as regras de distribuição do ônus probatório produzem um sistema técnico, onde a circunstância do autor ter que provar seus fatos constitutivos não anula o encargo do réu de ter que provar os fatos impeditivos, modificativos e extintivos. Destarte, cada parte deverá apresentar a comprovação dos fatos aduzidos.
CONCLUSÃO
O Código de Processo Civil se mostra com um meio hábil de orientar até mesmo as relações trabalhistas quando se trata de ônus da prova. Tal fato se justifica pelas disposições simplistas contidas na Consolidação das Leis do Trabalho, que carecem assim de um maior complemento. Caberia nestes termos ao autor a prova de seus fatos constitutivos e a réu, os fatos impeditivos, modificativos e extintivos do direito do autor.
É sabido ainda que o detentor do ônus de produzir as provas deverá cumprir o encargo que lhe é conferido para ter os fatos trazidos em juízo avaliados e decididos a seu favor, não havendo assim consequências diversas. Tem-se assim uma faculdade de produzir as provas e não uma obrigação.
A correta distribuição do encargo de produzir estas provas deve ser analisada pontualmente para o encontro da verdade real, que se mostra com o intuito mais importante na entrega da prestação jurisdicional.
advogada inscrita na OAB do Paraná, atuante desde 2008; Pós graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Faculdade Arthur Thomas em Londrina-Pr.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DéBORAH DE MEIRA MáLAQUE, . Ônus da prova: peculiaridades no processo do trabalho Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 mar 2016, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46115/onus-da-prova-peculiaridades-no-processo-do-trabalho. Acesso em: 23 dez 2024.
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